Notas do Autor
Disclaimer: Todas as personagens do universo Harry Potter, assim como as demais referências a ele, não pertencem ao autor desse texto, escrito sem nenhum interesse lucrativo, mas à JK Rowling.
Capítulo 07 - O avesso do meu desejo
― Alguém tem alguma outra pergunta?
Você poderia dar uma mordida na tensão no Grande Salão. Ninguém, exceto Justin, tinha dito uma palavra nas últimas duas horas. Nós apenas nos sentamos lá, ouvindo Minerva passar por cima de detalhes sobre a pesquisa mais recente das atividades de magia negra que os pesquisadores de Durmstrang nos enviaram. Cada um de nós, sentados em torno das antigas mesas das casas, simplesmente ouviu e assentiu com a cabeça. Passar tanto tempo ouvindo os outros falarem, em vez de estar treinando ou cozinhando poções, é chato e doloroso o suficiente, se envolver nessa discussão então, seria ainda pior. Mas o verdadeiro culpado por trás do comportamento estranho e apático da equipe é o homem de vestes negras, nosso co-orientador que está de pé no canto da sala, ao lado da tela encantada onde a pesquisa estava sendo projetada.
Quando ninguém mais respondeu à pergunta de Minerva, eu balancei minha cabeça e respondi.
― Não.
Uma carranca marcou o vinco entre as sobrancelhas da diretora quando ela olhou ao redor da sala, esperando alguém dizer alguma coisa. Mas as palavras nunca vieram, e eu poderia dizer pelo jeito que suas bochechas apertaram que ela não entendia a apatia da equipe na última semana.
Na verdade, não faltava exatamente confiança a ninguém. Todos nós continuamos treinando, pesquisando, cozinhando poções e mostrando nossas habilidades mágicas aos examinadores do Ministério. Tudo estava normal. Exceto que nós estávamos quietos sobre o que nos incomodava. E, se alguém tinha um problema, geralmente não tínhamos ressalvas em expressar isso. Mas desta vez, o principal problema tinha dois braços e pernas e detinha certo "poder" para ferrar com a gente, então ninguém ia dizer nada.
― Ninguém? ― Minerva perguntou novamente, seu tom descrente. Nenhuma resposta. ― Certo. Se ninguém tem nada a dizer, acho que vocês estão livres para ir. Podemos nos encontrar aqui amanhã às oito, todos aqui no salão e depois iremos para o campo de quadribol juntos. ― Ela anunciou dando um aceno coletivo antes que a equipe se levantasse.
Fiquei alguns minutos falando com Dean, e só tinha acabado de pegar minhas coisas quando eu a ouvi.
― Hermione, tem tempo para vir ao meu escritório?
Meu instinto me disse que sabia exatamente que tipo de conversa estava prestes a ter com ela. Eu tinha visto o rosto de Minerva e meu interior estava bem ciente de que ela sabia que algo estava acontecendo. Infelizmente, eu também sabia que eu seria a primeira, e mais do que provavelmente a única, a quem ela viria com suas perguntas. Era a maldição de ter sido a sua maldita "menina dos olhos da Grifinória" quando eu era uma simples estudante aqui.
― Claro. ― Eu disse a ela, mesmo que a última coisa que eu quisesse era falar sobre isso.
Ela sorriu para mim e chamou-me para a frente.
― Vamos lá, então.
Joguei minha bolsa por cima do meu ombro, e a segui. Dentro de alguns minutos, estávamos subindo a escada em espiral e fomos ao escritório dela. Minerva tomou um assento atrás de sua mesa com um sorriso amigável no rosto.
― Você sabe que vou direto ao assunto com você, então, me diga o que está acontecendo. ― Ela proferiu.
Então… Por onde exatamente eu começo? Não que eu queria trazer problemas para ninguém, muito menos com meu próprio dilema de não parecer uma dedo-duro. Deslizei para a cadeira com a minha bolsa aos meus pés, levantei minhas sobrancelhas e imediatamente decidi jogar o cartão de burra pelo tempo que fosse possível.
― Com a gente?
― Todos vocês. A equipe inteira. O que está acontecendo? ― Minerva reforçou a pergunta.
― Eu não tenho ideia do que você está falando, Minerva.
― Hermione. ― Ela piscou, me mostrando com isso que já sabia que eu estava me fazendo de idiota. ― Todos estão agindo estranho. Ninguém fala, não vejo ninguém jogando conversa fora como de costume. Parece que é a primeira vez que todos vocês estão juntos aqui. Vocês não são meros alunos, Hermione, estamos todos trabalhando num consenso em busca de uma solução, somos um time. Então, quero entender o que está acontecendo, isso é tudo.
Quando eu pensei nisso, eu percebi que não deveria surpreender que ela tenha notado as diferenças. É claro que ela o faria, Minerva se importava. Estou sendo hipócrita de achar ruim ela ter me chamado para esta conversa. Não posso reclamar por Minerva se importar quando reclamei porque Snape não o fazia. Então preciso aceitar o fato de que ela ainda está ao nosso redor e notou nossa mudança.
Enquanto os treinos eram geralmente bastante sérios, sempre tinha havido um aspecto lúdico entre nós. Nos dávamos muito bem a maior parte do tempo e eu acho que é por isso que trabalhamos tão bem juntos. Ninguém era um superstar ou tinha um ego inflado. Nós somos uma unidade. Claro que não significa que não tenham atritos e discordâncias de vez em quando, mas isso é apenas a maneira que é, quando se trabalha em equipe. E agora, temos um problema em comum: Snape.
Se mesmo Dean tinha aberto a boca naquele dia nas arquibancadas para reclamar sobre ele não ser ativo, então havia obviamente um problema. Não acho que Dean já tivesse pensado em reclamar para Minerva sobre Snape, mesmo que eu o tenha visto balançar a cabeça em descrença ao ver o co-orientador andar em torno de nós em silêncio. Além disso, havia toda a minha merda com ele.
― Diga-me o que fazer. ― Minerva pediu, séria. ― Eu confio na sua palavra e preciso saber por onde começar.
O fato dela falar que confia em mim foi a minha morte. Resolvi ceder e baixei minha cabeça em rendição.
― Bem. ― Limpei minha garganta antes de continuar. ― O que exatamente posso dizer que não vai me deixar em problemas?
― O quê? ― Ela perguntou confusa.
― O que pode me deixar em problemas? Quero dizer, você sabe que alguém pode dificultar meus treinamentos, só para, propositalmente, empurrar meus resultados para baixo e rebaixar meu nível mágico. ― Disse-lhe com cuidado.
Assim que percebeu sobre quem eu estava falando, o olhar que ela me deu era incrédulo. Minerva me olhou como se eu tivesse cuspido na cara dela.
― Severus está relacionado? ― Dado o fato de que ela não tinha dito nada sobre o que iria me meter em encrenca, eu lhe dei um aceno de cabeça. ― Você está brincando comigo… ― Dei de ombros. ― Explique-me. E pode deixar de fora o seu problema com ele. O ressentimento de Severus com um membro do trio dourado não atingiria toda a equipe. ― Ela disse exasperadamente. ― E você sabe o quanto a respeito como pessoa. Não vou ser uma ratazana e deixar que você entre em problemas por ser honesta comigo, achei que você me tivesse em maior estima. ― Minerva realmente parecia ofendida que eu não queria dizer-lhe algo. Ela suspirou antes de continuar. ― Hermione, sei que está ciente de que eu não sou cega ou estúpida. Eu sei que Severus não foi amigável com Potter, mas eu pensei que isso tinha terminado ali. Me diga a verdade, eu quero ajudar. Todas as vezes que estamos treinando todo mundo está agindo tenso e ninguém quer falar nada durante nossas reuniões. Isso não é normal. ― concluiu ela.
Eu só queria sair deste escritório e me enterrar no trabalho do hospital mas, em vez disso, lidei com o que ela estava me pedindo.
― Não estou discordando de você. As coisas estão tensas e é uma droga, Minerva. Mas somos adultos agora, não aqueles adolescentes de antes da guerra que viviam choramingando pelos corredores. Então ninguém vai reclamar.
― Então me diga qual é a insatisfação com Severus. ― Ela inquiriu.
― Por que você sempre faz isso comigo? ― Eu gemi.
Ela riu.
― Porque você nunca me diz besteiras. ― Respondeu prontamente. ― Eu quero que as coisas voltem a ser da maneira como devem, então me diga o que precisa ser corrigido.
Ela não entendeu? Não foi ela quem nos ameaçou de exclusão do programa de Hogwarts se reclamassemos de Snape? Cada um de nós que tinha desistido de aniversários, uma vida social, relacionamentos, tempo com nossas famílias se sentiu intimidado por aquela ameaça no início do semestre.
― Eu sei, Minerva, mas você sabe que todos nós vamos ser cuidadosos. O que você esperava? Fomos avisados no começo para ter cuidado com o que podemos dizer sobre Snape, e então quando a gente vem para os treinos, ou vamos para casa, há essa tonelada de repórteres constantemente nos bombardeando sobre ele.
O suspiro que saiu dela me lembrou de um balão furado. Ela ainda não queria acreditar. De repente me senti um pouco mal por estar segurando a verdade, até que lembrei da ameaça muito real que Snape me deu, depois que eu o tinha ajudado, e então indignação e revolta passaram por cima de tudo.
― Está bem. ― Respirei fundo. ― Eu acho que todo mundo está um pouco inseguro da presença dele aqui. Eu acho. Só posso afirmar por mim mesma. Ninguém diz nada porque estamos todos provavelmente com muito medo de nos encrencar. E não ajuda que ele não é exatamente, ele. ― Um sorriso rachou o rosto da diretora. ― Estou falando sério, Minerva. Acho que em algum momento todo mundo esperou que ele fosse um pesadelo, que nos chamasse de inúteis e de desperdício mágico. Mas de alguma forma, é pior ter Snape não se importando. Ele não diz nada; não faz nada, está apenas lá.
Houve o incidente na sessão de fotos. E ele tinha me ameaçado, quando tudo o que eu tinha feito era ajudá-lo, mas guardei essa porcaria para mim. Não por causa do que ele disse, mas porque eu não era esse tipo de pessoa. E isso era um fato. Snape não fazia nada, não dizia nada. Ele não compartilha seu conhecimento ou a sua raiva, essa última, exceto comigo, claro.
― Santo Merlin. ― Minerva acenou com a cabeça e passou uma mão sobre os cabelos. ― Eu entendo.
― Veja, ele é um grande bruxo. Mesmo sendo mestiço, eu imagino que o nível mágico dele deva ser muito bom. Diante disso, ele não deveria nos desafiar? Reclamar? Dizer-nos quando estamos fazendo algo bom ou pelo menos nos ridicularizar quando fazemos algo espetacularmente ruim? Alguma coisa? Ele não reclama nem das nossas poções! Imaginei que talvez ele estivesse só se ambientando novamente a vida em Hogwarts, mas foi tempo suficiente agora. Você não acha?
― Eu entendo o que está dizendo. Faz sentido. ― Ela ajeitou os óculos quando olhou de relance para o teto. ― Não sei por que não pensei nisso antes. ― Minerva assentiu com a cabeça para si mesmo antes de olhar para mim. ― Pelo menos agora eu sei por onde eu devo começar.
Remexendo na cadeira por um momento, sentei e assenti com a cabeça para ela.
―É só isso?
Minerva me olhou pensativamente por alguns segundos, até que finalmente me deu um aceno.
― Agradeço por você ter falado comigo. Vou ter certeza de que possamos resolver isto. ― Ela disse resolutamente, o que era a minha deixa para ir embora.
― Certo, então eu vou indo. Até amanhã.
Agarrei os meus pertences e me levantei.
― E deixe-me saber se existe algo que possa fazer por você também. Não ache que eu não notei que você parece que está pronta para arrancar a cabeça de alguém. ― Ela disse, me dando um olhar divertido.
Nada escapa dessa mulher. Eu sorri e acenei para ela, que continuava sentada do outro lado da mesa.
― Estou bem, Minerva. Obrigada.
Suas feições aliviaram um pouco e uma emoção que eu não tenho certeza se reconheci, cruzou seu rosto quando dei um passo.
― Estou orgulhosa de você, Hermione, por tê-lo enfrentado. Especialmente agora que sei como todos vocês se sentem sobre sua presença aqui. Quero que saiba disso. Você é uma boa garota.
As palavras de Minerva fizeram eu me sentir ao mesmo tempo feliz e culpada. Dei-lhe um pequeno aceno e encolhi os ombros.
― Eu deveria ter dito algo a você anteriormente sobre a equipe. ― Respondi.
― Você disse algo agora e isso é tudo que importa. ― Ela devolveu.
Dissemos adeus uma à outra mais uma vez e então eu estava lá fora. Bolsa por cima do ombro, fiz lentamente a minha saída, pensando se tinha feito a coisa certa. Eu não estava otimista, mas o que mais era suposto fazer? Eu, dolorosamente, poderia passar por mais oito meses na ponta dos pés ao redor de Snape se eu fosse a única sendo afetada por sua presença, pensei, voltando pelo caminho velho e familiar, mas era a equipe inteira se sentindo incomodada. Algo realmente precisava ser ajustado.
Dois corredores depois e eu chego aos pés das escadas que me levariam ao piso inferior. Balanço para frente e para trás em meus calcanhares enquanto as espero mover-se até mim. Foi o rangido suave de pisadas leves que me despertou, o som não era nada de especial no chão de pedra do castelo, mas quando eu vi a bainha de um manto negro, meus ombros ficaram tensos. E eu olhei para cima, e claro que era a pessoa sobre quem eu tinha acabado de falar.
Limpei minha garganta, quando ele parou há um metro ou algo assim longe de mim e nos olhamos. E a profundidade dos seus olhos, era exatamente como eu tinha imaginado que seria, como eu tinha sonhado que era: uma escuridão brilhante, elegante e incrivelmente atenta ao peso do meu olhar. Santo Merlin, ele deve ser mesmo muito intenso.
O medo de que o talento dele como Legilimens atuasse sobre mim fez com que eu descesse meu olhar para seus antebraços cruzados. Posso notar os músculos tensos no seu peito por baixo do tecido do casaco negro, e os dedos da mão esquerda dele, que repousam sobre o antebraço direito e lembro do quão fascinada eu era por aqueles digítos longos e habilidosos. Engulo em seco, lembrando a mim mesma que agora eu o odeio, mas cometo o erro de olhar novamente para cima, para seus olhos, e os encontro trancados em mim.
Severus Snape estava me observando checá-lo.
Meus sentimentos entram em erupção e a jovem esperançosa dentro de mim, que eu matei na semana passada, renasce com força total. Tenho que me forçar a mantê-la sob controle, repetindo para mim mesma que eu arrastei esse homem para fora de um bar e o deixei em segurança em um quarto de hotel sem um único obrigado em troca, nem mesmo um sorriso, tudo que consegui foi uma ameaça. Dias depois, ele insultou Harry e enterrou qualquer apreço que eu tinha por ele. Por favor, Hermione, não se esqueça disso.
Recuperando-me do meu descontrole hormonal, esboço um sorriso usando apenas a metade do meu rosto que é capaz de mover-se.
― Oi. ― Cumprimentei, até me lembrar de adicionar rapidamente o resto da frase. ― Professor.
Aquele olhar desceu até as minhas mãos, talvez para verificar se eu estava segurando a minha varinha, e depois fez o seu caminho de volta para olhar o meu rosto. A expressão dele continuou fechada, mas os olhos pareciam mais brilhantes ainda do que quando nos olhamos pela primeira vez. Ergui meu queixo e pisquei para ele, forçando ainda o mesmo sorriso presunçoso em meu rosto.
As escadas pararam quase no mesmo instante em que ele respondeu com um "Olá" naquela voz profunda e em um tom mais baixo do que o habitual, como se lhe custasse dez anos de sua vida usar a voz com uma criatura tão insolente como eu.
Olhamos um para o outro bem nos olhos por uma fração de segundo, antes que eu levantasse minhas sobrancelhas e pisasse no degrau que as escadas do castelo me ofereceram. Virei para encarar o homem de pé e o vi fazer o mesmo movimento que eu, embarcando na mesma escadaria, mas tomando dois degraus abaixo.
Ele não disse mais nada. Eu também não, e mantive meus olhos fixos nas paredes do castelo, enquanto as escadas se moviam e nos levavam para baixo. Foram os três minutos mais inábeis da minha vida.
O problema com nossos orientadores, ou talvez com os professores em geral, que eu tinha descoberto ao longo da minha vida, era que eles tinham bocas enormes. A boca da Lula Gigante não deve ser nada, comparada com a de um professor. Mas, honestamente, a culpa foi minha.
Eu realmente devia saber melhor. Desde que éramos adolescentes pelos corredores desse mesmo castelo, os alunos mais velhos faziam piadas sobre o fato de Snape e Minerva serem uma dupla de fofoqueiros que mantinha Dumbledore a par de tudo o que acontecia com o corpo discente, e ainda assim, esqueci tudo o que eu tinha aprendido. Então eu não posso culpar ninguém além de mim mesma por confiar em Minerva.
Eu estava na metade do campo de quadribol, me encaminhando para o meu assento bem longe de onde as sessões de voo estavam acontecendo, e pensando, sobre o que eu poderia falar sobre a diferença na árvore genealógica Abbott na conversa de hoje com Hannah, quando alguém pisou bem no meio do meu caminho.
Foi um simples passo de lado, que aterrou o corpo maior que o meu só a trinta centímetros de distância. Eu sabia que não era Dean. Dean estava montado numa vassoura do outro lado do campo, e havia apenas dois homens na equipe com aquela altura. E dois deles eram muito agradáveis para fazer algo tão tempestuoso.
No instante em que eu fiz contato olho a olho com ele, eu soube que Minerva foi insensível ao ponto de mencionar o meu nome para Snape. Meu coração parecia que iria subir pela minha garganta. Ele não precisou dizer 'eu sei o que você disse' porque o odioso olhar no rosto dele disse tudo. Se ele ouviu meu discurso inflamado sobre Harry sem mover um músculo no rosto, então eu sabia que o quer que fosse que ele tivesse ouvido de Minerva, atingiu um nervo. Uma pessoa como Snape não gostava de ser criticada, porque ele provavelmente se achava perfeito.
Não que eu tivesse o chamado de um pedaço inútil de lixo, o que seria horrivelmente rude. Nem disse que ele era um péssimo bruxo, e que ele não merecia o cargo em Hogwarts. Nada remotamente semelhante a isso saiu da minha boca, mas, me coloco na situação dele, pensando em mim mesma com um ego dez vezes do tamanho do que eu atualmente tinha, e me perguntei como eu me sentiria. E sim, eu me sentiria muito chateada se alguém começasse a dizer o que eu precisava fazer de forma diferente.
Mas era verdade, ele estava afetando a equipe com aquele comportamento impassível, então, eu manteria minha palavra. Afinal, o que eu iria fazer? Pedir desculpas a alguém que não merecia? Eu fiz o que eu precisava fazer. Então fiquei bem onde estava, mesmo com ele parado no meu caminho, consegui acalmar o meu coração e endireitei os meus ombros, olhando-o de frente.
― Sim?
― Todos a postos, simulação de batalha! ― Madame Hooch gritou.
Minha valentia só foi até aí, porque a próxima coisa que eu fiz foi virar e correr em direção à linha onde começavam os duelos. Me posicionei entre Cho e Sarah, uma das recém chegadas de nível oito, que estava sempre tentando me vencer.
― Sinto que hoje é o dia, Granger. ― Ela sorriu.
A adrenalina de descobrir que fui dedurada para Snape ainda corria livremente pelo meu corpo. Isso significava que Sarah não tinha a mínima chance.
― Eu não sei, estou me sentindo muito bem hoje, mas vamos lá.
Os obstáculos transfigurados que os professores colocavam à nossa frente estavam espalhados por cerca de três quilômetro ao redor do campo, e se estendiam quase até a borda da Floresta Proibida, precisávamos duelar, enquanto pulávamos os obstáculos e chegar ao outro lado sem que nenhum feitiço nos atingisse.
O som do apito ecoou no ar e eu disparei em linha reta até me esconder atrás da primeira rocha, cerca de cinquenta metros de onde estávamos. Deslizei para trás dela, no mesmo instante que Justin, que hoje estava na mesma equipe que eu.
― A Sarah está te caçando. ― Ele soprou.
Eu bufei em diversão e me levantei, atirando o primeiro atordoador, que atingiu em cheio o escudo de Dean, e só não o perfurou porque ambos somos bruxos nível nove. Imediatamente, disparei com Justin até o próximo obstáculo. Dessa vez, nos separamos, eu me lancei sobre o que pareciam sebes vivas, enquanto ele se esgueirou atrás dos restos de um muro de pedras, quase sendo atingido pelo feitiço de Dean.
Enchi meus pulmões de ar e me atirei para correr o quilômetro final. Estava na metade do caminho quando ouvi o sussurro de uma feitiço e lancei o meu Protego no instante em que o feitiço estuporante de Sarah chegou perto o suficiente. Devolvi com um feitiço Incarcerous que atingiu suas pernas e a derrubou de cara no gramado. Corri os últimos metros prestando atenção ao meu redor, mas ninguém da equipe oposta veio me desafiar. Terminei com uma distância suficiente entre mim e o próximo bruxo, comemorando o quão bom é simular uma batalha, sem estar realmente aterrorizada.
Guardei minha varinha no coldre, enquanto respirava pausadamente, tentando controlar o meu fôlego e sorri para Sarah quando ela cruzou a linha de chegada, já sem as cordas que eu tinha lançado. Ela parecia um pouco irritada, mas conseguiu devolver o sorriso.
― Não sei como diabos você faz isso. ― Ela arfou.
― Eu treino. Muito. ― Respondi de volta, e quando ela me deu uma expressão que dizia 'besteira', eu ri. ― Tenho treinamento individual, ou tinha, até o semestre passado. Acho que Minerva vai retomá-los em breve. Os bruxos mestiços gostam de treinar com um nascido trouxa. Como nosso nível mágico é alto, o desafio é maior para eles. Você pode falar com ela para um horário particular também.
― Sério? ― Ela perguntou, um pouco incrédula.
― Sim. ― Respondi.
Ela limpou a testa dela e me deu um olhar agradecido.
― Ok, certo. Parece ótimo.
No momento que terminamos de conversar, toda a equipe tinha terminado sua simulação também e sabíamos que o treino de hoje estava terminado. Fui até onde estavam as minhas coisas, mantendo um olhar procurando por Minerva. Assim que apanhei minha bolsa, fiz meu caminho para a bruxa ocupada transfigurando os obstáculos que tínhamos acabado de usar de volta em pedras normais.
― Você está pronta para ir? ― Ela me cumprimentou.
― Estou pronta. ― Confirmei, observando o rosto dela e tentando achar qualquer sinal de que ela sentiu remorso por levar vantagem sobre a minha confiança.
― Tudo bem? ― Ela perguntou, quando notou que não me mexi de onde estava.
Olhei ao redor para me certificar de que ninguém estava muito perto e voltei a minha atenção para ela.
― Você disse a Snape o que eu te contei?
A velha bastarda teve a decência de parecer um pouco envergonhada.
― Tive uma conversa com ele esta manhã aqui. Achei que era hora. ― Ela nem concordou, nem negou.
― E você disse para ele que fui eu quem disse alguma coisa?
Seus olhos estavam cuidadosos e consistentes quando ela me respondeu.
― Ele deve ter adivinhado que foi você já que foi a única que o enfrentou com uma platéia.
E também fui vista por ele saindo do corredor do escritório de Minerva. Bem, estava feito, e não havia razão para resmungar.
― Você pode me procurar, se isso se tornar um problema. ― Minerva afirmou em um tom sincero e cuidadoso, que me fez acreditar nela.
Dei-lhe um sorriso tranquilizador que não necessariamente refletia como eu me sentia.
― Tudo bem, eu só estava... Curiosa, se você disse algo ou não. Nada de mais.
Finalmente, ela respondeu diretamente.
― Não, eu não disse nada. Severus é perceptivo.
Eu suspirei, sim, ele é.
― Certo. Obrigada, Minerva. Vejo você mais tarde então.
Suspirei novamente, sentindo o peso do mundo sobre os meus ombros. A última coisa que eu queria, era trazer uma atenção negativa para mim, especialmente se Snape estivesse envolvido. Hogwarts tinha ficado eufórica com a chegada dele, e embora eu fosse considerada uma das maiores bruxas da atualidade, eu entendia as prioridades. Um orientador valia mais do que um voluntário.
Acariciando meu telefone sobre o material da minha bolsa, pensei em ligar para Harry para reclamar, mas então pensei melhor, ele já teve decepção o bastante com Snape. Além disso, eu teria que explicar todas as minhas discussões com Snape para que tudo fizesse sentido, e eu ainda não queria que Harry soubesse que tomei as dores dele para mim. Pesei as opções e aceitei que manter tudo só para mim era a melhor maneira de lidar com tudo.
Há um ditado que algumas pessoas usam: cuidado com o que deseja. E quando crescemos, passamos a perceber o quanto há poder nas palavras. Então se eu desejo algo, e falo sobre isso, quase sempre, ele acontece.
E o meu subconsciente resolveu me lembrar algo que eu jamais me lembraria em sã consciência: houve uma época em que eu já desejei ser aprendiz de Severus Snape. Na minha lista de desejos sobre ele, era ele quem me ensinaria a ser uma bruxa excepcional, tal qual ele fora. E hoje, o destino resolveu se mostrar como a vadia inconstante e imatura que é, porque apenas um par de dias depois de dizer a Minerva sobre como todos fomos afetados pela falta de atenção do nosso antigo professor, minhas preces adolescentes foram finalmente atendidas.
Isso porque, um novo homem apareceu no castelo depois disso. Um homem com uma vara de ferro através de sua coluna, mantendo sua postura dura como aço e uma voz que não poderia ser mal interpretada.
Quantas vezes eu tinha pensado sobre, o quanto queria que Snape fosse o tipo de orientador que um bruxo do seu calibre tinha potencial para ser?
Eu só não me lembrei do fato de que o que eu pensava como 'orientador' ele aparentemente interpretava como 'carrasco' e os dias seguintes foram os mais árduos da minha vida, tanto mentalmente quanto fisicamente. Parte disso, era porque existia a minha própria pressão interna em ser sempre perfeita, na linha, exemplar, empenhada, e fazendo minha fama valer a pena. No entanto, a razão principal era Snape. Ele apareceu para os encontros com ódio estampado no rosto e olhos de falcão, que pareciam de repente avaliar tudo.
A primeira vez que ele gritou, a maioria da equipe estava ocupada duelando e de repente fez uma pausa de dois segundos. Foi como se a voz do próprio Merlin tivesse de repente descido sobre nós e nos dito que toda a magia já estava de volta ou algo assim.
― Mais intenso!
Duas palavras. Duas palavras que nos apanhou desprevenidos. Mais de cinco segundos se passaram e ninguém tinha se mexido ainda. Até que ele gritou novamente.
― O que vocês estão esperando? Feitiços mais potentes! Agora!
Isso trouxe todos nós de volta a ação. Dean, que estava duelando do outro lado do campo, encontrou meus olhos e telepaticamente nos comunicamos com as mesmas duas palavras: Que diabos? Cada um de nós intensificou os feitiços, mas Snape continuou com a sua voz irritada, determinada, e estranhamente fascinante, arremessando gritos no grupo inteiro. Meu estômago se agitava cada vez que eu o ouvia. Isso era exatamente o desejo que eu tinha feito.
Quando eu já estava ofegante porque o duelo que eu travava com Justin era feroz, eu sorri porque fui eu quem tinha provocado isso sobre nós. E esse era exatamente o motivo pelo qual uma versão mais jovem de mim, o admirava. Claro, ele era um idiota, e só estava agindo assim porque tinha sido pressionado a fazer isso por Minerva, devido a minha reclamação. Mas quando olhei em volta e todos estavam duelando num nível nunca visto antes, eu entendi que valeu a pena ter o babaca me odiando.
Não menos que cinco minutos depois, eu me arrependi por pensar em Snape com admiração. Outro desejo meu se realizou e meu orientador me notou no meio do campo de quadribol, mas não com a magnificência que eu tinha antecipado. É, eu tinha a atenção dele, mas não era tão fantástica quanto os meus sonhos tinham me dito que seria.
― Granger!
Levei um segundo para reagir a meu sobrenome sendo chamado. Quase todos aqui me chamam de Hermione, afinal, somos companheiros. Era difícil alguém em Hogwarts me chamar pelo meu último nome.
― Granger, que tipo de lançamento de feitiço lento é esse? Você está tentando mesmo? ― Ele rosnou.
O cabelo na parte de trás do meu pescoço se arrepiou e minha boca ficou seca, mas acelerei mais os movimentos da minha varinha. Ainda assim, ele continuou parado ao meu lado me assistindo duelar com Justin e comentando cada lançamento meu.
"Continua lenta." "Seu nível realmente é nove, Granger?" "Patético." "Que porcaria de feitiço foi esse?" "Você ao menos sabe lançar um feitiço estuporante, Granger?"
Ele atirou tudo na minha cara, nenhuma afeição no seu tom, muito menos orgulho. Cada vez que eu olhava para ele, seu rosto estava definido em desgosto enquanto me encarava.
― Mais intenso! ― Ele gritou de novo, olhando para mim com uma expressão que definitivamente não era agradável e exigindo o máximo da minha magia.
Mas meus pensamentos idiotas só conseguiram focar no brilho em seu olhos, a mesma luz de estrelas brilhantes que incendiaram o olhar dele, quando me encarou no meu sonho e sua voz sedosa sussurrou para mim, na beira da piscina do meu sonho:
"E eu vou tomar você como eu quiser".
Estremeci por inteiro e toda a minha concentração se despedaçou. Justin aproveitou a brecha no meu escudo e me atingiu em cheio com um atordoador. Snape apenas me olhou com desprezo, enquanto eu tentava me recuperar.
― Outra vez. ― Ele sibilou.
Deus do céu. Ele é um bastardo.
Me levantei, limpei meu suor e entrei em posição de duelo novamente. Eu podia lidar com isso. Pelo menos foi o que disse a mim mesma.
Eu estava deitada na minha cama, observando um facho da luz da lua que deixava as partículas de poeira dançando no chão. As cortinas das janelas estavam abertas e o luar enchia o ambiente, tornando tudo prata-azulado, o que fazia eu me sentir como se estivesse congelada em um momento eterno. Já passava da meia-noite e eu não conseguia dormir, meu corpo doía pelos efeitos do treino exaustivo de hoje, meus pensamentos estavam agitados pela mudança de atitude de Snape, meus olhos estavam pesados demais para ler e lá fora estava frio o suficiente para que eu não me interessasse em sair.
Eu nunca temi a noite, embora a ache pouco reconfortante nas horas mais sombrias, porém, o silêncio dela, compensa. À noite é onde costumo revisitar tudo que tenho feito com a minha vida, desde que a guerra pareceu acabar. É sempre no momento em que tento dormir, que as lembranças da batalha ou do dia, me atingem. E quando essas memórias tentam me sufocar, eu me sento na beirada da janela e contemplo as estrelas, pois elas sempre fazem com que eu me sinta maravilhosamente pequena e insignificante.
Percorri com os olhos o facho de luz até onde ele sumia, sobre a parede coberta por um retrato de Rowena Ravenclaw em tamanho real. Não era a primeira vez que reparei na imagem dela, mas hoje o meu olhar foi atraído para o vestido branco esvoaçante que parecia se mover ao luar. Espere, se movendo? Me sentei na cama apreensiva. As fotografias mágicas tinham parado de se mexer junto com a extinção da magia. Seria possível que esta ainda carregasse magia?
Minha pele se arrepiou quando apanhei minha varinha e murmurei um Lumus, antes de me aproximar da parede. Estendi a mão até o retrato. Tudo parecia parado agora. O vestido de Rowena estava imóvel e eu franzi a testa em confusão. A ponta dos meus dedos escovou a tinta branca do vestido dela quando encarei a imagem da fundadora de Hogwarts nos olhos, como se quisesse perguntá-la se ela estava pregando uma peça em mim. E então, tal qual o retrato de Ariana Dumbledore fez no dia da batalha, quando estávamos no Cabeça de Javali, a moldura girou nas dobradiças, e logo atrás dela, revelou uma passagem.
Uma brisa fria soprava nas profundezas escuras, puxando cachos rebeldes pelo meu rosto e senti um calafrio na espinha. Rowena era uma das fundadoras de Hogwarts, será que o espírito dela induziu o castelo para me mostrar alguma coisa? A magia dela teria esse poder? Funcionava no nosso mundo de magia restrita? Olhei para trás, para a minha cama cheia de livros, antes de inspirar fundo e avançar para dentro da passagem. A luz da minha varinha revelou que a passagem de pedra estava coberta por uma espessa camada de poeira. A brisa fria soprou mais uma vez, quase como se me convidasse para segui-la.
Teias de aranha pendiam de toda parte quando eu descia a longa escadaria que mergulhava para muito além da luz da minha varinha. Eu estava absurdamente tensa enquanto esperava por um único som que me enviaria correndo de volta ao meu quarto. Mas a descida estava silenciosa – silenciosa e morta, quase como se fosse uma passagem completamente esquecida.
A base das escadas surgiu logo, e parei diante de três portais igualmente escuros e imponentes. Onde eu estava? Não tive dificuldades de perceber que tal lugar era um dos espaços remotos e esquecidos do castelo: o chão estava coberto de poeira. Nem mesmo um traço de pegada.
Porque eu sabia como as histórias sempre terminavam, ergui minha varinha até os arcos acima dos portais, em busca de qualquer escritura ou runa antiga que estivesse entalhada em magia negra, caso entrasse em um deles. A brisa soprou de novo e muito mais forte na direção do arco mais à direita.
Quase dei um passo na direção dele, mas os pelos em meu braço se arrepiaram quando senti uma vibração na minha varinha, fazendo-a apontar para a escuridão que parecia mais forte do que em todo o resto. Sussurros se entremeiam à brisa, quase como se fossem os sussurros do Véu da Morte, no Ministério da Magia, o lugar onde Sirius desapareceu.
Estremecendo, corri de volta por onde eu tinha vindo. Seguir sussurros sombrios podiam me levar ao mesmo destino do padrinho de Harry, anos antes. O medo que percorreu o meu corpo me empurrou para cima e para cima, minha respiração pesada e meus passos ruidosos sendo os únicos sons. Mesmo resmungando com o cansaço, disparei escadaria acima até o quarto.
Eu suava quando cheguei de volta aos meus aposentos. Rapidamente puxei o retrato sobre as dobradiças, trancando a passagem de volta por trás dele e me atirei na minha cama. O que diabos foi isso?
Notas Finais
Snape fulo da vida e Hermione com ainda mais coisas para lidar, agora que finalmente chegamos em um ponto da história onde vamos mergulhar mais fundo no mistério do desaparecimento da magia.
As respostas do capítulo anterior foram incríveis e agora eu quero saber de você: quais os palpites sobre o que vocês acham que vem por aí? Contem tudo! Beijos e uma ótima semana.
