Notas do Autor
Disclaimer: Todos os personagens do universo Harry Potter, assim como as demais referências a ele, não pertencem ao autor desse texto, escrito sem nenhum interesse lucrativo, mas à JK Rowling.
Capítulo 24 - Toda a escolha diz quem eu sou
O sol brilhava forte agora, a luz banhando a piscina próxima de nós e sua luz dançava no teto acima de nós. A força com que ele me segurava assim que chegamos, estava aos poucos se dissipando e foi o horror de quase tê-lo perdido que fez com que eu me concentrasse em me segurar no homem que estava agora ao meu alcance, ainda adormecido. A cabeça dele descansava no meu peito e eu enterrei meus dedos em seu cabelo enquanto cronometrava a minha respiração com a dele e lembrava das últimas horas difíceis que passamos.
O resgate foi tenso e Severus quase morreu em sua determinação alucinante de destruir o quartel general rebelde. Eu congelei a piscina até que seu corpo voltasse a uma temperatura normal e o segurei durante os pesadelos que o assolaram ao longo de toda a manhã. Eu tive que impedi-lo mais de uma vez quando os tremores que assolavam seu corpo se tornaram intensos e gritos saíram de sua boca. Trabalhei com a varinha para fechar os cortes em suas costas e convoquei Winky para trazer suprimentos da Ala Hospitalar e até mesmo para ir até minha casa e apanhar o frasco com o unguento que o próprio Severus me deu quando meu antebraço estava ferido.
Os tremores só diminuíram quando eu o embalei com a minha voz, sussurrando que era eu, sua parceira e amiga quem estava ali, curando-o. Eu narrei para ele que fui atrás dele, que o encontrei e que poderíamos viver o que quiséssemos agora, que ninguém nunca mais iria arrancá-lo de mim. Chega de missões separadas, Severus, tudo o que fizermos, faremos juntos. Sussurrei que aquilo não era uma ilusão, que nós éramos reais e que eu era a única que pude tocá-lo enquanto ele queimava, porque nossos poderes eram compatíveis. Nós somos compatíveis. E sussurrei mais e mais palavras sobre nós, até que ele estava dormindo e finalmente em paz, mesmo que os seus dedos ainda segurassem com força o meu quadril. Eu agradeci aos deuses por conseguir diminuir aquela tensão esmagadora de fogo que se contorcia nas veias dele e ouvi-lo respirar em alívio.
Quando ele acordou pela primeira vez, nos olhamos por longos minutos, antes que ele me beijasse. Um beijo suave, carinhoso, que ele interrompeu apenas quando nossa necessidade por ar falou mais alto. Ele se deitou ao meu lado, ambos agora olhando o mundo lá fora, que estava mergulhado em laranja e a temperatura do ar, nem muito fria e nem muito quente, parecia agradavelmente equilibrada, enquanto que a coloração do céu me lembrou o dia em que nos beijamos pela primeira vez, naquele momento em nossa viagem até a casa de Harry.
— Eu não olho para o céu há dias. — Foi a primeira coisa que Severus disse, seus olhos pregados na imensa abertura que o castelo fornecia, na borda infinita da piscina.
— Eu realmente não posso dizer o mesmo, Remus e eu dormimos ao relento não mais que um punhado de dias atrás. — Respondi suavemente.
— Ele já passou por isso muitas vezes. — Severus ficou em silêncio por um segundo. — Você também?
A autoconsciência da nossa nudez se esvaiu da minha mente, a facilidade e intimidade dos nossos beijos e da nossa conversa agora serviram para me deixar flexível e relaxada.
— Sim, eu... na guerra, dormia na barraca quando não estava em vigília, mas era quase o mesmo. — Murmurei.
— Você estava lá fora, era ainda uma adolescente e passou por tudo aquilo. — Sua declaração foi o equivalente a ser jogada em um lago gelado. — Enquanto eu estava aqui, nesse mesmo castelo, aquecido e posando de diretor cruel e aparentemente lutando em lados opostos daquela guerra.
— Oh, sim, nós achávamos naquela época… — Eu tropecei nas palavras e Severus se virou para me olhar.
— Eu não esperava que vocês soubessem. Era o meu papel naquela época. Mas eu não quero falar sobre isso esta noite. Eu prefiro aproveitar essa paz.
— Acho difícil que você esteja pensando em paz, Severus. — Eu disse suavemente. — Você quase se matou ontem.
— Deixei que o rugido em minhas veias que pedia por vingança me dominasse. — Ele confessou, voltando a olhar o céu à nossa frente.
— Eu não acho que você destruiria a mansão apenas por vingança, Severus. — Minha voz agora soava firme enquanto eu olhava para o perfil do homem ao meu lado. — O que eu acho é que você gosta de sofrer. A prova disso são as cicatrizes que carrega, são marcas que mostram o quanto você já pagou pelos pecados que cometeu. Mas ainda assim, você não acha que vai ser o suficiente para expiar os erros do passado e sempre vai se colocar em risco, se outras pessoas puderem se beneficiar pela sua morte.
Ele não me respondeu, mantendo o olhar fixo no céu arroxeado onde estrelas começavam a brilhar. Eu desviei o olhar dele e me juntei a sua contemplação ao firmamento, quando ele por fim, falou.
— Você não é muito diferente. — Sua voz saiu grossa. — Embora eu ainda esteja tentando enxergar qual é o pecado que você precisa apagar da sua alma intocada e límpida.
— Ah, então você está chateado porque fui resgatá-lo. — Concluí.
— Não.
— E é claro que você não vai admitir isso. — Eu sufoquei minha irritação. — Mas você está certo ao dizer que não preciso apagar nenhum dos meus pecados, porque está tudo bem em seguir em frente, Severus. Eu não vou carregar uma culpa por anos e anos de um erro que cometi no passado. Ao contrário de você, eu sei me perdoar. — Fechei os meus olhos, cansada demais para expressar mais indignação pela raiva dele por eu tê-lo salvado. — Eu também não quero falar sobre isso. Será que podemos só… observar o céu? É algo que costumo fazer quando preciso colocar tudo sob uma nova perspectiva. Quando tudo parece esmagador demais, eu apenas olho para cima e percebo que sou apenas uma pessoa pequena e limitada nesta vastidão sem fim.
— No entanto, você tenta fazer tudo. E isso inclui o seu ato de heroísmo indo em meu resgate. — Ele sussurrou.
— Essa é a minha natureza. Eu sou uma grifinória, sempre serei.
— Sua natureza é uma contradição, Hermione. — A voz de Severus retumbou no silêncio. — Você fez o que fez durante a madrugada e agora diz que não pode fazer muito.
— E você dizer que nunca foi um herói e sempre tentar se matar para salvar os outros, não é uma puta contradição? — Eu rebati com uma pergunta retórica. — Então acho que podemos concordar que ser contraditório é um elemento da natureza humana.
— Não importa quem você queira que eu seja, Hermione, sempre vou travar uma batalha entre quem fui e quem eu deveria ser. — Ele respondeu, sua voz não estava irritada, mas ele talvez estivesse cansado demais de explicar sobre sua essência para pessoas que não entendiam o que foi ter uma vida dupla por anos e anos.
— Quem você acha que deveria ser? — Perguntei suavemente. — Sem remorso em todos os momentos e tudo mais? — Severus ficou em silêncio e eu inclinei o meu corpo mais em sua direção. — Se tudo fosse diferente, o que você faria?
— Tudo está como está, então não posso responder. — Severus disse.
— Então sonhe. — Sugeri. — Quem você seria sem a primeira guerra de Voldemort e sua vida depois dela?
— Provavelmente eu seria um perfeito Tom Riddle. — Ele respondeu simplesmente. — Um mestiço orgulhoso o suficiente para cuspir os preconceitos puristas que aprendi com os meus colegas de Casa.
Sua honestidade me abalou.
— Vou reformular minha pergunta. — Eu não me atrevi a perguntar por que ele levaria adiante tais estigmas, se sua própria mãe foi manchada por um. — Se todas as circunstâncias fossem diferentes, o que você faria?
Severus ficou quieto por tanto tempo que eu pensei que ele poderia não me responder, mas respondeu.
— Eu ainda seria um mestre em poções. Essa é uma constante que nunca mudaria. — Ele fez uma pausa e me olhou novamente. — Você? Sua escolha de profissão seria outra?
Mesmo que eu tenha feito a pergunta primeiro, não tive resposta quando ela se virou contra mim. Não no início, pelo menos. Mas as palavras vieram em ondas. Eu teria uma carreira no Ministério, provavelmente. Se eu não tivesse sentido de perto a mácula daquele lugar quando estava sob a influência de Voldemort. E eu ainda seria uma lutadora, então com certeza estaria criando leis que garantissem uma vida melhor para criaturas e pessoas menos privilegiadas.
— Eu acho que… eu entendo o que você diz com "tudo está como está". Eu não sei quem eu seria sem tudo isso, e é difícil pensar em quem eu teria me tornado sem a guerra. O que eu sei é que eu não acho que estaria aqui. — Com você, eu terminei na minha cabeça.
— Arrependimentos? — Ele sussurrou.
— Honestamente? — Eu ri da estupidez da minha pergunta. Claro que Severus queria honestidade. Eu voltei a olhar para o céu, sentindo-me de repente consciente de novo da proximidade do corpo nu dele com o meu. — Alguns, mas não o suficiente para me impedir de tirar esse momento para admirar o céu com você. — Uma pergunta que nunca o fiz pontilhou na minha mente. — O que Robards fez para você ter aceitado voltar para Hogwarts?
— Garantiu sua presença na equipe pelo ano em que eu concordei em estar lá. — Ele disse sério.
A melhor parte da afirmação dele foi quando eu virei o pescoço para olhá-lo, e peguei a sombra de um de seus raros sorrisos. Se eu estivesse pensando bem, me daria conta de que ele se referia à profecia sobre a leoa. Mas talvez fosse o lugar onde estávamos, ou o momento em que nos seguramos um no outro pelo que tínhamos acabado de passar, mas meu olhar para ele foi invadido por pensamentos ousados demais. Oh, merda. Isso nunca é bom, porque minha língua não se controla.
— Eu amo quando você sorri. — Sussurrei para ele antes de conseguir me parar.
Severus me olhou.
— Você pensa em mim sorrindo com frequência, Granger?
— Não. — A meia-verdade estava lá. — É que eu não me lembro de você conseguindo fazer isso.
A expressão dele se transformou em paciente e era em momentos assim que eu percebia o quanto de apreço Severus nutria por mim, ou ele me despedaçaria com um único comentário por eu ter sido insensível ao ponto de ter pronunciado essas palavras erradas.
Ele sorriria se não tivesse tido a família destruída por ideologias puristas. Ele provavelmente sorria antes da chegada da amiga que significou o suficiente para quebrá-lo quando ele a perdeu, e antes das guerras e ameaças. E das desconfianças que rondavam sua vida até hoje. Severus sabia sorrir, ele só não teve muitas oportunidades para fazer isso ao longo dos anos. Com o estômago revirando, olhei de volta para o céu, afastando meus pensamentos.
— Sobre o que você quer falar? — Sussurrei.
— Nada. Mas você insiste em conversar esta noite.
— Nossos silêncios geralmente não são estranhos. — Confessei por fim, me sentindo ridícula pelo quão nervosa estava. — Acho que as últimas horas, a falta de notícias, a perspectiva de você ter morrido ou eu ter perdido você para sempre, me deixaram ansiosa demais e agora que estamos juntos aqui, quero preenchê-lo com alguma coisa.
Talvez até eu tivesse fazendo isso, porque, com Severus acordado, era muito difícil não pensar na presença dele ao meu lado, ou no calor da sua pele nua junto à minha sob o cobertor.
— Essa é uma confissão em tanto. — Sua voz soou mais grave do que qualquer outra coisa que ele disse até agora.
Eu me virei para ele, descansando minha cabeça na mão apoiada no cotovelo em contato com o tapete de pele de urso. Severus acompanhou todo o meu movimento, seus olhos não deslizando dos meus, mesmo que meu torso estivesse todo exposto para ele.
— Confissões em meio a guerra são comuns. — Eu disse.
— Não há diferença entre confissões se quem estiver fazendo-as for uma pessoa leal. As palavras serão verdadeiras independentemente da época. — Severus descansou as mãos atrás da cabeça, parecendo relaxado. — A guerra pode até intensificar isso, mas você, por exemplo, nunca vai desistir de algo.
— Isso não é inteiramente verdade. — Sussurrei. — Para voar, eu preciso desistir de ter os meus pés no chão e eu tenho alguns problemas.
— Problemas de controle. — Ele emendou, sem desviar ainda os olhos dos meus.
Severus não estava me tocando, mas senti cada pedacinho dele. O ar frio da noite parecia carregado enquanto a energia crepitava ao redor de nós e eu me concentrei em suas íris escuras, comparando-as silenciosamente com aquela pedra negra da Chave de Portal que nos salvou mais cedo naquele dia. Era um contraste gritante com sua pele pálida. Parecia que a escuridão dos seus olhos eram feitas para macular a luz da sua pele pálida.
— Você saberia sobre essas questões. — Eu respondi em voz baixa, tentando controlar o martelar familiar em meu peito que costumava me assolar quando estava com Severus em momentos como este: um grau entre perto e muito perto. Mas, de alguma forma, não perto o suficiente.
— Sim, eu saberia.
— Você não pode controlar tudo, Severus. — A brisa brincou com o cabelo fino dele, varrendo-o para fora do lugar. Escová-lo de volta seria uma solução fácil, mas eu não confiava em mim o suficiente para tocá-lo estando tão próximos como estávamos. — Você pode tentar, mas sempre há rachaduras. Alguma coisa acaba escapando.
Ele fez um ruído baixo, mas eu não pude identificar o que significava porque o rosto de Severus estava trancado em Oclumência, mantendo aquela sua expressão devidamente impassível, porém nada menos que deslumbrante. Mesmo ele aqui, em recuperação pela recente tortura e com bolsas sob os olhos pelos dias difíceis que passou nas mãos de Lucius, eu ainda conseguia ficar atordoada e inebriada pela visão dele, enquanto me perguntava o que estava por trás da sua expressão. Inconscientemente, procurei por uma fissura em seu rosto para ter acesso a seus pensamentos, mas não encontrei nenhuma.
Foi Severus mesmo quem confessou, levando uma de suas mãos ao meu pescoço e beijando suavemente a minha boca.
— Essas questões de controle não se aplicam quando penso em nós dois. — Ele sussurrou. — Às vezes, eu sinto como se tivéssemos tropeçado neste sentimento todo. E eu gostaria que fôssemos devagar, eu quero conhecer você em tempo real, não enquanto estamos tentando, de novo, salvar o mundo. Mas, ao mesmo tempo, estou cansado de resistir a você.
Eu não sabia o que responder diante dessa confissão e o momento seguinte às palavras dele se estendeu e permaneceu suspenso em animação. Com a mão ainda em meu pescoço, os olhos dele finalmente saíram dos meus e caíram na minha boca e eu finalmente tive coragem de pousar uma das minhas mãos sobre a sua costela, o que me permitiu sentir a expansão de seu peito em uma inspiração.
Sem mais uma palavra, seus olhos voltaram aos meus e eu vi refletida naqueles orbes apenas a verdade das suas palavras e a energia excitante do tremor da expiração dele. A mão quente de Severus vagou do meu pescoço, passando pelo meu ombro, até a curva das minha cintura, antes de descansar na pele nua do meu quadril, e foi a minha vez de exalar com dificuldade.
A conexão entre Severus e eu se intensificava no toque, mas ela não me despertava apenas ali, mas em cada um dos meus sentidos também. Seu cheiro, o som da sua voz e a visão da sua pele pálida se mexiam ao mesmo tempo com todas as sensações que o toque dele fazia fervilhar sob a minha pele. E o gosto dele na minha boca, a confiança e liberdade que ele impunha ao me beijar, me faziam derreter em momentos como este. Porque ficar à mercê de Severus era inebriante e delicioso.
A permissão para continuarmos a partir dali foi concedida com um leve aceno de cabeça meu e Severus juntou a boca a minha novamente, me dando beijos pequenos e leves mordidas no meu lábio inferior, pegando nada além de provas do meu gosto aqui e ali. A promessa por mais me deixou impaciente e passei a perseguir sua boca cada vez que ele se afastava. Até que ele finalmente começou a me beijar corretamente, arrancando imediatamente um gemido de contentamento do meu peito. E o primeiro som que saiu da boca dele liquidificou as borboletas no meu estômago e as substituiu por faíscas de puro calor.
O mundo desapareceu ao meu redor enquanto eu detalhava a memória do toque dele sobre mim e navegava na sensação de senti-lo como nunca antes, em um ritmo maravilhosamente íntimo e febril. O calor e o desejo ditando o movimento daquelas mãos firmes que me seguravam, enquanto sua língua mergulhava na minha boca e depois saía dela para que eu pudesse ir buscá-la de volta dentro da boca dele e retribuísse o sugar delicioso dela.
Às vezes, parávamos o beijo, mantendo as nossas testas pressionadas e os olhos fechados enquanto o som de nossas respirações pesadas enchiam o ambiente à nossa volta quando cedíamos à demanda por oxigênio, mas rapidamente voltávamos a alimentar os desejos um do outro.
Beijar Severus era a coisa mais natural que eu já fiz. É intuitivamente fácil traduzir meus sentimentos por ele em um beijo. Sem precisar emitir nenhuma palavra, eu queria fazê-lo entender o quanto eu o queria. Queria fazê-lo enxergar em cada batida do meu coração e em cada respiração o quanto eu ansiei por esse momento.
Deslizei minha mão pela pele do seu peito e senti que os músculos do estômago dele se contraíram sob a palma da minha mão e quase soltei outro suspiro de prazer quando ele desviou os lábios dos meus e desceu para o meu queixo, depois pela coluna da minha garganta. Inclinei minha cabeça para trás e mantive meus olhos fechados.
— Oh, deuses. — Gemi, quando permiti que ele me empurrasse até que estivesse deitada de costas, diante da imagem de um Severus desgrenhado pairando sobre mim.
O membro duro e quente dele fez um delicioso roçar na minha coxa esquerda. Um movimento que nos deixou sugando respirações afiadas em conjunto e o meu coração bateu ainda mais forte e deixou todos os meus sentidos zumbindo com a mera promessa e a evidência do desejo dele por mim.
Eu estava sem fôlego, mas Severus manteve nossos quadris separados em uma demonstração de paciência que eu não tinha, principalmente após a nossa rodada de beijos nebulosos e toques insistentemente íntimos. Talvez fosse sua pesada Oclumência ou seus anos como espião que garantiram essa maneira controlada como ele me olhava agora. Mas não de uma forma que escondesse seus sentimentos, seus olhos queimavam de uma maneira honesta e aberta, mas ele não se mexeu por mais, apenas pairou sobre mim.
Enquanto ele me observava, eu me arrisquei mais e invadi o pequeno espaço entre nós, passando as minhas duas mãos por todo o comprimento do seu torso, mas deixando meu olhar preso em seu rosto, firmemente plantado em seus olhos, enquanto meus dedos enrolaram-se no comprimento do pau dele, em uma pergunta silenciosa e, talvez, perigosamente impulsiva.
Você me quer?
A mão esquerda dele parou a minha e a picada silenciosa da rejeição teve um efeito congelante em mim. Todas as sensações anteriores simplesmente morreram. Uma série de movimentos trouxe Severus de volta para descansar ao meu lado, mas eu mal me dei conta, mortificada demais pelo rubor quente do meu rosto, enquanto a realidade caía ao meu redor.
Uma insegurança assombrosa me dominou e eu me sentia como se tivesse caído rolando por uma ladeira escorregadia que me deixou esparramada no fundo e me sentindo estúpida por ser tão precipitada e presunçosa. Esfregando a mão sobre o rosto várias vezes, eu tentei mas não consegui limpar a dúvida dos meus pensamentos. Eu não sei mais ler as pessoas? Severus claramente me quer, eu sei disso. Eu senti.
— E-eu.. Fiz algo errado? — Gaguejei, mortificada com minha pergunta, mas tive que fazê-la. Eu me recusava a assumir que fui um trasgo em interpretar as ações dele. — Eu apenas pensei…
— Não. — Ele me interrompeu, virando a cabeça e me beijando profundamente, até que eu relaxei no ato quando a pontada de decepção desapareceu, trazendo um alívio necessário aos meus medos. — Eu quero isso, Hermione, confie em mim. — Seus lábios ainda estavam tocando os meus e suas palavras murmuradas me fizeram estremecer. — Mas não assim.
Podíamos nos entregar um ao outro pelo desespero do que passamos, mas eu entendi o que ele queria dizer com "não assim". Nós éramos recém chegados de uma quase tragédia e ele ainda carregava feridas da tortura, sem contar que estávamos em um quarto criado pelo castelo, um quarto acolhedor, mas impessoal. Podia parecer um bom momento para outras pessoas, mas nós éramos muito mais que isso. Era uma prova de paciência, respeito e compromisso da parte de Severus não querer nos lançar nos braços um do outro apenas por ter visto a morte de perto. Ele queria ter escolha sobre o momento em que seríamos um. E eu também queria isso. Mesmo com a sombra da guerra e da morte pairando sobre nós, ainda queremos nos amar quando escolhermos e não por causa das circunstâncias.
— Você está certo. — Sussurrei, quando me recompus o suficiente para segurar a mão dele e entrelaçá-la com a minha. — Me deixe apenas sentir você junto de mim, enquanto observamos o céu.
Severus deslizou um braço sob meu pescoço e me puxou para junto dele, colando pela, talvez, centésima vez naquela noite, os lábios aos meus. Apoiei minha cabeça no braço estendido dele enquanto nos beijávamos e eu gostaria de ter dito que eu queria me entregar a ele quando pudéssemos dizer isso ao mundo. Porque eu sei que Severus nunca teve alguém que quisesse que ele a assumisse. Mas ele não afastou a boca da minha por tempo suficiente para que eu o autorizasse a gritar para o mundo que eu era dele. Toda e completamente dele.
Quando eu abri os olhos novamente, a noite estava escura e silenciosa sobre nós. Foi a vibração insistente do meu telefone que vibrava em algum lugar do divã acima de nós que me acordou. Severus resmungou algo indecifrável e virou-se de frente, continuando a dormir.
Eu estava alerta em instantes após ler a dúzia de mensagens que haviam chegado com uma convocação urgente para que eu comparecesse ao St. Mungus: Minerva foi encontrada. Convoquei Winky enquanto me vestia e a orientei a levar Severus à minha casa assim que ele acordasse, e desci correndo os corredores e escadas de Hogwarts até o ponto de aparatação fora dos portões. Eu estava lá em segundos, sendo cercada pelos curandeiros mais jovens e por Neville enquanto vestia o jaleco verde limão e entrava na ala de terapia intensiva.
A diretora estava inconsciente e parecia frágil e pequena, ela estava sangrando de uma ferida no peito grande o suficiente para manchar os lençóis sob ela. Seu rosto estava pálido e seus lábios rachados e não havia como dizer há quanto tempo ela estava sangrando assim e nem se isso era uma ferida de garras de lobisomem. Meu único alívio era saber que a lua cheia ainda estava a dois dias de distância, mesmo assim, o ferimento me assustou.
Me concentrei na subida e descida rasa do peito dela enquanto usava minha varinha para executar todos os feitiços de diagnóstico que podia e ordenava ao meu assistente que providenciasse as poções repositoras de sangue. Reanimá-la era uma opção, mas eu notei muitos ferimentos quando removi o lençol do corpo dela, então decidi não fazê-lo. Minerva podia estar com uma quantidade alta de dor e isso podia levá-la ao choque. Neville empurrou o frasco de Dittany na minha mão e eu cuidadosamente despejei gotas da fórmula sobre as feridas da cabeça.
Enquanto trabalhava o melhor que podia sem mexer muito nela, pedi a um dos curandeiros aprendizes que tranquilizasse os homens na sala de espera e que eu mal cumprimentei quando passei. Dean, Harry e Remus aguardavam por essas notícias e eu pedi que a garota repetisse para eles que ela estava viva, mas inconsciente e que eu faria o melhor que pudesse.
A exaustão era mais do que apenas fadiga física; era um estado de espírito, quando finalmente terminei de tratar Minerva, cerca de seis horas depois. Depois de deixar o quarto dela, ainda devidamente inconsciente, arrastei a mão pelo meu rosto antes de passar para a próxima atividade, fazendo a longa caminhada até onde meus amigos ainda esperavam.
— Ah, Hermione! Como ela está? — Era Remus.
— Estável. Ainda inconsciente, mas estou otimista de que ela acordará em breve. Fechei todos os ferimentos, o mais perigoso foi o do peito, feito por garras. Foi difícil conter o sangramento. — Respondi e Lupin lamentou minha última frase. — Eu não sei o suficiente sobre os ataques de lobisomens transformados sem a influência da lua cheia, talvez você possa me ajudar com isso?
— Claro. — Remus aceitou prontamente.
— Onde está Draco? — Me virei para Harry.
— Está com Ginny e as crianças. Scorpius estava nervoso porque o pai sumiu pelo dia anterior inteiro.
— Entendo. — Respondi a Harry e me virei, dando um passo na direção de Dean e o abracei ternamente, nossa não-despedida anterior tinha sido no mínimo, dramática. — Você está bem?
— Inteiro. — Dean sussurrou no meu cabelo.
— Me desculpe por não ter me despedido de você, Dean. — Sussurrei, imprimindo mais força no meu abraço.
— O que importa é que você voltou para mim. — Ele falou novamente, dando um beijo prolongado na minha testa.
— E agora é minha vez de pedir que você investigue algo. — Eu disse seriamente.
— Tem a ver com a profecia? — Ele murmurou.
— Talvez. Eu ainda não consegui fazer conexões suficientes. Preciso que você vá a um lugar, sob o castelo. Você é o bruxo de nível mais alto que conheço e eu confio em você o bastante para encontrar respostas.
— Que lugar é esse Hermione? Você andou fazendo incursões em lugares perigosos por conta própria? — Dean perguntou com preocupação genuína em seus olhos.
— Digamos que em todas as vezes que fiz a incursão até lá, fui induzida por alguém. — Confessei, mantendo a identidade do fantasma de Regulus para mim. Se ele quisesse fazer uma aparição para Dean, nós discutiríamos isso depois. — Mas sinto que talvez possa haver respostas lá e eu estou com dois pacientes que precisam de mim agora, então estou pedindo que faça isso por mim. Mas não vá sozinho, leve Remus. Vocês dois possuem plenos poderes.
Pelos próximos quinze minutos, expliquei a Dean e Remus como chegar à tumba dos fundadores. Harry assistia minha explanação com uma ruga de preocupação nada discreta em sua testa.
— Você está nos dizendo que enfrentou sozinha uma mantícora? — O garoto que sobreviveu finalmente não se conteve.
— Sim. Eu… — Pisquei os olhos para ele, percebendo tardiamente que eu não devia ter narrado o quão perigoso tinha sido aquela situação. — Mas eu não sabia que aquela criatura estaria lá.
— Mas acabou de dizer que voltaria lá, se não fosse pelos cuidados que precisa desprender para Severus e Minerva. — Harry rebateu.
— Isso é verdade, mas nós precisamos encontrar respostas mais claras. As pessoas estão morrendo ao nosso redor, Harry. Eu preciso fazer alguma coisa!
— Talvez, mas você não pode se enfiar sozinha em uma tumba! Onde estava sua inteligência? — Ele devolveu irritado.
— Preciso olhar além do que sei e do que posso confirmar. — Rosnei de volta.
— Não sozinha! — Ele gritou.
— Estou ciente disso! — Me controlei, nosso tom de voz alto começando a chamar atenção de outras pessoas na recepção do hospital. — Estou ciente e isso não vai mais acontecer no futuro. Eu pedi ajuda a todos vocês para resgatar Severus e encontrar Minerva.
Os olhos de Harry tornaram-se minuciosos. — Sim, você fez. E o fato de termos conseguido resgatar os dois, prova o meu ponto de que não fazer as coisas sozinhas garante bons resultados.
— Ron morreu. Isso não é um bom resultado.
Harry empalideceu.
— Ainda não sabemos disso. — Ele disse numa voz fraca.
— Harry… — Estendi minha mão e segurei a dele. — Eu o vi lá, ele…
— Não vamos pensar o pior até que esteja provado. — Remus cortou. — Não precisamos de ninguém minando nossas esperanças. Certo?
Eu esperava mais discussão da parte de Harry, mas ele apenas assentiu.
— Se houver algo que eu possa fazer para ajudar nas buscas. — Harry disse com um suspiro.
— Eu aviso você. — Dean disse. — Draco garantiu que vai conversar com Narcissa para acionar o contato dela entre os rebeldes, ele só precisa de um pouco de tempo.
Eu quase me esqueci de Theo e Narcissa. Eles talvez fossem uma fonte de informações rebeldes que pudéssemos usar para prever os próximos passos de Lucius. Eu só não sabia se eu conseguia confiar o suficiente em algum dos dois.
— Certo. Por favor, eu vou me dividir entre o hospital e minha casa, me mantenham informada.
A caminhada de volta para o quarto de Minerva pareceu ainda mais longa, as luzes nos corredores do St. Mungus pareciam mais brilhantes, mas quando curandeiros e assistentes passaram por mim com sorrisos e olhares curiosos, percebi que meu sorriso de retorno estava se esvaindo a cada passo.
Bocejei duas vezes, apesar de ter dormido o suficiente durante o dia inteiro. Eu não podia estar cansada agora. Não quando ainda tinha horas de plantão a fazer acompanhando Minerva e um Severus lentamente se recuperando em minha casa. Virei a esquina da enfermaria onde Minerva estava, preparada para encontrar os curandeiros assistentes que deixei monitorando-a, mas me deparei com uma visão inesperada.
Severus.
Sentado na beira da cama de sua amiga e chefe, observando-a dormir. Eu quase limpei a minha garganta para anunciar sua presença e perguntar o que em nome de Merlin ele estava fazendo aqui, quando ele se moveu, estendendo a mão e cuidadosamente varrendo uma mecha do cabelo grisalho de Minerva para trás da orelha dela. Em seguida, ele cobriu a testa dela com a mão, então sua bochecha. O jeito que ele estava olhando para ela e cada movimento seu era o mais próximo de gentileza do que eu já tinha visto dele.
Mesmo que comigo ele também fosse aberto e honesto, ainda assim, a sua delicadeza me pegou desprevenida. Não por causa da ação, mas das emoções passadas em torno de cada um. Uma verdade que eu nunca desconfiei, estava agora sendo expressa com muita fluidez: Severus amava Minerva como se ela fosse sua mãe.
E quando a mulher mais velha estendeu a mão livre para cobrir a dele, o meu coração bateu tão rápido quanto a mão dele parou. Os olhos da diretora de Hogwarts demoraram a abrir, mas quando o fizeram, estavam brilhantes e focados nele. Como uma emocionada espectadora, eu vi mãe e filho que se escolheram numa vida solitária, trocarem duas palavras simultaneamente: "Sinto muito".
Palavras simples de falar, mas de significado complexo, e palavras poderosas demais na boca daquele homem que quase nunca as proferia. Duas palavras que poderiam atuar como o bálsamo que iniciava o processo de cura de feridas profundas e aproximar pessoas. Duas palavras que não podiam consertar a dor física que os dois passaram nos últimos dias, mas que mostrava que eles não deixaram de pensar um no outro enquanto sofriam em seus próprios cativeiros.
— Severus, onde estou? — Ouvi Minerva perguntar, tentando olhar ao redor, mas ela não conseguiu. Uma careta dolorosa aprofundou suas feições.
— Você não deve se mover. — Ele sussurrou.
— Eu não me lembro de nada.
Eu consegui ouvir o medo na voz fraca de Minerva e mais uma vez o meu coração se apertou ao ver uma pessoa sofrendo pela insanidade dessa guerra mágica.
— St. Mungus. — Ele respondeu num sussurro que eu mal ouvi quando dei um passo à frente e segui em direção a eles. — Você estava em poder de alguns lobisomens. Lupin veio em seu resgate. — Severus parou Minerva quando ela se moveu para se sentar. — Tente relaxar, sua velha teimosa.
E para minha surpresa, ela o fez. Talvez ela ainda estivesse desorientada, ou tenha ficado cansada pelo sorriso leve que deu para a última frase de Severus, mas a minha diretora de Casa relaxou completamente e fechou os olhos, respirando uma após a outra, enquanto Severus observava intensamente como se estivesse anotando cada movimento do peito dela e garantindo com o olhar que a respiração dela nunca parasse.
— Estou cansada. — Minerva sussurrou.
— E eu estou apavorado. — Severus murmurou de volta.
Decidi que era o momento certo para tornar minha presença conhecida, entrando totalmente na enfermaria depois de uma batida rápida na porta. Os olhos de Minerva se abriram e Severus virou a cabeça em minha direção, sem soltar a mão dela.
Me aproximei da cama, parando uma única vez para olhar o pergaminho encantado com suas leituras atuais. Nem bom, nem ruim. Minha perna roçou a de Severus quando me coloquei na frente da minha chefe.
— Seja honesta comigo, Hermione.
— Eu sempre serei honesta com você. — Eu sorri gentilmente para ela. — Eu sempre fui honesta com você, até mesmo quando corria risco de você me colocar em detenção com esse daqui. — Disse, apontando para o bruxo ao nosso lado enquanto dava um olhar carinhoso que fez um vislumbre de sorriso aparecer no rosto de Minerva. — O pior ferimento é o do seu peito, consegui fechá-lo, mas suspeito que sangre e reabra por algum tempo ainda. E precisaremos monitorá-lo durante a lua cheia. Remus vai nos ajudar com algumas informações de pesquisa, mas ele não soube garantir se haverá algum efeito nessa primeira que enfrentaremos e que está tão próxima.
A bruxa mais velha assentiu e seus olhos se fecharam quando administrei as poções que trabalhariam para curar seu corpo por dentro e acalmar sua mente. Logo sua respiração se acalmou, mas Severus não soltou a mão dela quando se colocou de pé e me assistia checar novamente suas leituras vitais.
— Severus…
Ele olhou para mim. — Sim?
— Você precisa ir para casa e descansar. — Disse.
— Eu descansei o suficiente hoje, então eu vou ficar aqui no sofá. Vou me certificar de que voltarei para casa em algum momento e…
Suas palavras morreram quando eu entrei em seu espaço, sem hesitar nenhuma vez, me coloquei na ponta dos pés e pressionei um beijo em sua testa em uma oferta de conforto. Deixei meus lábios permanecerem lá por um tempo indeterminado e só depois coloquei a cabeça na curva do pescoço dele. Parecia que uma eternidade já havia se passado quando seus braços lentamente se enrolaram ao meu redor, puxando-me para mais perto.
Alguns curandeiros aprendizes entraram e saíram do quarto, repondo poções e discutindo baixinho algumas das leituras de Minerva, enquanto assistiam timidamente o impassível Severus Snape segurar a mão de uma Minerva McGonagall adormecida com um braço, enquanto o outro estava fortemente enrolado na minha cintura. Neville nos viu. Dean e Remus também. E muito mais pessoas entraram no quarto para dar uma olhada na querida professora de Transfiguração. Acho que todos ali naquele hospital foram alunos de Minerva, exceto os estrangeiros.
Incrivelmente, eu não senti aquela crescente necessidade de explicar para nenhum deles por qual motivo estávamos naquela posição. Não senti aquele pânico caótico que me paralisava quando saíram aquelas reportagens que insinuavam que nós dois éramos mais que apenas amigos. Eu me dei conta de que a experiência de quase morte que passamos pode não nos ter feito fazer um sexo desesperado naquele quarto improvisado do castelo, mas ela serviu para me provar um ponto muito mais importante: eu falei sério sobre gritar para todo mundo que eu era dele.
Notas Finais
1. Novo Mundo ganhou cinco fanarts originais para a história, de duas artistas incríveis: Chiasan e Madmoseille Raposa arts. As fanarts podem ser encontradas pelo link em meu perfil.
Reverenciem muito essas artistas, elas merecem demais!
