Notas do Autor
Disclaimer: Todos os personagens do universo Harry Potter, assim como as demais referências a ele, não pertencem ao autor desse texto, escrito sem nenhum interesse lucrativo, mas à JK Rowling.
Capítulo 29 - Qualquer coisa pode acontecer
— Não! — Severus gritou para a porta, disparando um Bombarda em direção a ela, golpeando contra o titânio.
Acima de nós, a corrente e o ruído da água escorrendo escada abaixo era intenso, enchendo a antecâmara.
Não, não, não! Pensei com desespero e corri até a porta, conjurando bolsa para jogar a caixa do livro dentro e pendurá-la a tiracolo no meu corpo, ao mesmo tempo que o terceiro feitiço de Severus atingiu o metal e a porta se abriu com uma explosão. Apenas para que uma enchente entrasse com tudo.
Tentei segurar o umbral, mas a força da água me empurrou de volta para trás e me varreu para debaixo da superfície escura e gelada. O frio roubou todo o ar dos meus pulmões. Preciso encontrar o chão! Pensei desesperada, e no instante em que meus pés o tocaram, dei um impulso para o alto, puxando ar e avaliando a câmara escura em busca de Severus. Ele segurava o umbral com força, olhos fixos em mim e a mão estendida.
A água já estava na altura de meus seios, e corri até ele, lutando contra a correnteza que inundava a câmara, desejando que minhas forças se renovassem para lutar contra ela. A água parecia mais tranquila à volta dele, como se algum poder tivesse acalmado a força da sua corrente.
— Está com o livro? — Severus gritou para mim, por cima do rugido da água.
Assenti e percebi que a mão estendida dele não era para que eu a segurasse, ele manipulava a água para que a força dela não permitisse me derrubar novamente. Ele manteve a porta explodida forçada contra a parede e a manteve afastada até que eu pudesse sair.
Forcei meu caminho pela abertura e Severus deslizou pelo umbral, liberando o feitiço. A porta se fechou novamente, com tanta violência que eu me maravilhei diante do poder que ele tinha usado para afastá-la. A única desvantagem era que a água no corredor agora tinha muito menos espaço a preencher.
— Vá! — Ele ordenou, mas não esperei por aprovação antes de me lançar sobre ele.
— Sairemos juntos! — Gritei, me impulsionando e prendendo os pés em volta de sua barriga, subindo em suas costas. — Apenas faça o que precisa fazer. — Disse eu, enrolando com força os braços em seus ombros.
Não faltava muito até as escadas; escadas que agora eram uma cachoeira. Severus estendeu a palma da mão diante de nós, e a água recuou e estremeceu. Não era um caminho livre, mas uma brecha na corrente. Direcionei minha magia para ajudá-lo a manipular a água e ela se acalmou um pouco, lutando para obedecer os nossos feitiços combinados.
Severus tentou ir mais rápido, segurando minhas coxas com força suficiente para deixar hematomas. Passo a passo, a água subia de nível violentamente, já na altura do maxilar dele.
Quando chegamos às escadas, Severus quase escorregou no degrau coberto de lodo, e o arquejo dele não foi de choque, mas em busca de ar quando uma muralha de água jorrou pelas escadas. Como se a água tivesse se libertado dos nossos feitiços e uma onda poderosa fosse liberada para varrer o local, tão forte, que mesmo o nosso domínio sobre o elemento não pôde fazer nada contra ela.
Tivemos tempo o bastante para tomar fôlego, e seguramos um no outro com mais força, nos preparando para mais uma submersão. Mas o que aconteceu foi ainda pior, nós dois observamos em choque quando aquela porta no alto das escadas se fechou, nos selando em uma tumba de água.
Eu estava morta. Sabia que estava morta, e não tinha como escapar. Tinha consumido meu último fôlego e estaria consciente durante cada segundo até que meus pulmões estourassem quando eu tragasse aquele gole fatal de água.
Severus bateu em minhas mãos até que eu nadasse atrás dele, enquanto tentava acalmar o meu coração em pânico, e convencer meus pulmões a fazer cada segundo valer a pena conforme Severus alcançava a porta e encostava a palma da mão nela. Símbolos se incendiaram, mas ela se manteve firmemente fechada. Quando o alcancei, ambos empurramos contra a porta, mas o metal parecia zombar de nós enquanto se mantinha intacto.
Meus pulmões pareciam em fogo enquanto entravam em colapso e Severus ainda esmurrava a porta, quando senti minha magia se esvair como uma faísca de luz, quase como se estivesse fazendo a contagem regressiva das batidas do meu coração. Eu precisava tomar fôlego desesperadamente; precisava abrir a boca e respirar, só isso para acalmar a queimação dos meus pulmões. Senti minha força se esvair quando abri a boca e a água entrou por ela. E a tentativa de Severus de alcançar meus dedos, foi perdida por mim.
Então, a porta foi destruída. O Lumus fraco da varinha de Severus, que se mantinha por um fio, foi suficiente para que eu visse os três rostos répteis cinzentos, sibilando com dentes como os de peixes conforme dedos finos com brânquias nos puxavam das escadas para seus braços. Sereianos.
Mas não consegui mais aguentar, quando aquelas mãos finas seguraram meu braço, a água entrou mais em minha boca, cortando pensamentos e sons. Meu corpo convulsionou, e tudo escureceu no momento em que tive a vaga sensação de ser lançada pela água, tão rápido que ela forçou minhas pálpebras a abrirem e finalmente, ar. Ainda o ar gelado da Escócia, mas finalmente, o ar.
Só que meus pulmões ainda estavam cheios de água e foi necessário que um punho golpeasse o meu estômago para que eu vomitasse água nas águas rasas do lago. Inspirei ar, piscando diante das luzes brilhantes que piscavam diante de mim enquanto eu recuperava a consciência. Uma tosse e um arquejo não muito longe de mim, me fizeram virar a cabeça enquanto me arrastava pela água para ver Severus vomitando também... mas vivo.
E, no trecho de água entre nós, com cabelos verdes colados às cabeças estranhas e cruéis olhos amarelos, os sereianos, encarando-nos ferozmente. O sol estava nascendo atrás deles e me perguntei como não me dei conta do tanto de tempo que ficamos lá embaixo.
A criatura que estava no centro falou algo naquela língua completamente estranha para mim, mas Severus balançou a cabeça em resposta e eu ouvi o seu barítono rouco sussurrar algo para os três. Os sereianos assentiram em resposta e, sem nem um único olhar para mim, eles mergulharam de volta no lago.
Severus veio até mim, seu corpo muito mais alto já estava com água apenas na cintura e ele me arrastou em um nado até a margem. Meus movimentos ainda estavam letárgicos pelo meu quase afogamento e eu agradeci aos deuses pelo meu companheiro estar em melhores condições do que eu. Assim que nós dois chegamos a um recesso tranquilo de areia, desabei.
Minha garganta ardia, e a areia fazia a pele em minhas bochechas pinicar. A mão de Severus apertou a minha e eu só tive tempo de olhá-lo, antes de sentir o puxão da aparatação. Eu não conseguia conceber quanto poder Severus possuía dentro dele, para logo após um episódio de afogamento e quase morte, conseguir aparatar, mas é óbvio que ele conseguiu.
Perdi totalmente as forças que eu achava que já havia recuperado quando aterrissamos no chão da minha sala de estar, derramando areia e água no carpete.
Ouvi a voz de Draco gritar da sala de jantar atrás de nós:
— Que diabos?
Olhei para o lado e vi que ladeavam o que parecia ser um mapa aberto na mesa. Dean, Remus e Harry estavam todos de olhos arregalados, surpresos com nossa aparição repentina.
Me virei para Severus que, como eu, continuava tombado no chão. Seus olhos estavam semicerrados e ele respirava com certa dificuldade.
— Como foi possível? — Perguntei com a voz fraca.
— Minerva… — Ele suspirou por mais ar. — Ela manteve o meu título de diretor mesmo após tantos anos, foi nomeada para liderar Hogwarts mas nunca removeu minha autoridade e os Sereianos do Lago Negro são criaturas independentes, mas respeitam a liderança do castelo. Eles são gratos pelo habitat que vivem e a forma que demonstraram isso hoje foi salvando o "diretor por merecimento", segundo eles, foram as exatas palavras de Minerva em uma conversa de anos atrás.
Eu comecei a rir de alegria. Cada risada doía, e achei que poderia vomitar de novo, mas continuei. Uma felicidade calorosa me inundando.
— Alguém pode nos explicar, por favor? — Chiou Draco, da sala.
Permanecemos no chão, recuperando o fôlego e rindo baixinho.
— O quê? — Severus indagou.
— Você e Minerva. — Disse entre risadas. — Eu morria de medo de ambos, no meu primeiro ano, os dois professores mais austeros de Hogwarts. Mas olhem só para essa história: ela justifica você como diretor para os Sereianos, enquanto você a amava incondicionalmente como uma mãe.
Os outros nos observavam, mas senti um riso sair dele, sussurrado inicialmente, até se transformar em uma gargalhada rouca e crua. Era o mesmo riso meu, impulsionado pela histeria do que passamos, e pelo alívio profundo de termos sido resgatados. Nos olhamos e sorrimos de novo.
— Senhores…? — Harry falou, numa pergunta silenciosa.
Severus gemeu quando ficou de pé e areia caiu ao redor quando ele ofereceu a mão para que eu me levantasse. Seu aperto era firme, mas seus olhos escuros estavam surpreendentemente suaves quando segurei a mão dele.
Fomos instantaneamente limpos e aquecidos por um feitiço lançado por Dean. E me apressei em tirar a bolsa ainda pendurada a tiracolo. Quando meus dedos alcançaram a caixa metálica, o metal os feriu de tão frio que pareceu queimar. Soltei o objeto na mesa. Ele emitiu um estampido, e todos se encolheram, xingando.
Severus apontou o queixo em direção a ele.
— A reação dela é pela temperatura, mas recomendo sermos cautelosos e usar o mesmo princípio da câmara. — Ele olhou os rostos curiosos ao redor e recitou a frase das runas estampadas na porta da câmara: "Se você nasceu em berço mágico, aqui não é o seu lugar." — Então apenas nascidos trouxas, se aproximam. Hermione ainda está se recuperando, então, destranque-o, Thomas.
Dean se sentou em uma das cadeiras da minha mesa de jantar e puxou a caixa de titânio para ele.
"Você também é um mentiroso?" Sibilou o mesmo sussurro que tínhamos ouvido na câmara.
— Não. — Respondeu Dean, baixinho.
"Você quer escrever em mim?"
— Não. — A voz do meu melhor amigo soou segura.
Os outros não disseram uma palavra, embora eu sentisse a confusão deles fervilhando pela sala. Apenas Severus e eu continuamos observando com atenção a interação entre a caixa e Dean.
— Abra. — Dean falou.
"Diga "por favor"."
— Por favor. — Pediu ele.
O Livro ficou em silêncio por quase dois minutos inteiros, então, disse: Você também é um mentiroso, Dean Thomas.
Eu me levantei do meu lugar aos tropeços, ainda cansada demais, mas ergui minha mão e a pousei sobre a caixa.
— Abra! — Ordenei com raiva e finalmente a caixa destrancou
Os olhos verdes de Harry estavam sombrios quando ele me encarou. — Aquela voz… ela...
— O medalhão dos Gaunt? — Perguntei, lembrando da narrativa dele sobre a destruição daquela horcrux. Harry confirmou com a cabeça. — Foi o que pensei.
— Jamais quero ouvi-la de novo. — Ele sussurrou.
— Você vai, Potter. — Falou Severus do meu lado, enquanto levantava a tampa de titânio. — Porque virá conosco da próxima vez. Hermione precisou relatar sua aventura com o medalhão, então será mais útil se você estiver presente, já que estava lá de fato.
Eu estava cansada demais para pensar no que ainda tínhamos de fazer. Então apenas olhei para dentro do recipiente à minha frente. Não era um livro de papel e capa de couro, e imediatamente entendi porque ele poderia ser guardado em uma câmara cercada de água.
Sua capa era feita de placas de um metal que eu não soube identificar, amarrado por quatro anéis de ouro, e com o brasão de Hogwarts entalhado com precisão impecável bem no centro dela. Severus o deixou dentro da caixa enquanto olhávamos, mas alcançou a capa e a virou para vislumbrarmos a primeira página. As folhas internas eram de algum material que parecia tecido.
— Essas páginas… — Remus sussurrou. — Que material é esse?
— Teias de Acromântula. — Severus respondeu baixinho. — Talvez esse seja o verdadeiro motivo para uma colônia dela viver há tantos anos dentro da Floresta Proibida.
— Você acha que elas foram trazidas pelos fundadores? — Perguntei.
Severus continuou observando o livro.
— Que língua é essa? — Perguntou Harry.
— Runas Antigas. — Draco respondeu e eu lembrei que essa era uma das matérias que ele e eu cursamos juntos, sem Ron e Harry.
— O que dizem? — Perguntou Remus.
— É o Livro de Admissão de Hogwarts. — Os olhos escuros de Severus pousaram nos meus. — Ouvimos uma lenda que diz que ele foi forjado com um dos fragmentos do Livro Original.
— A lenda do Livro Original é real? — Remus perguntou, de olhos arregalados, olhando entre Severus e eu.
— Aparentemente. — Severus respondeu.
— Vocês vão pedir a um especialista em Runas que o leia em busca de pistas? É só um livro de nomes, você acha que há alguma pista nele, professor? — Foi Dean quem perguntou.
Severus negou com a cabeça. — Não. O que ouvimos sobre ele, é que devemos juntar dois livros que foram forjados com traços do Livro Original. Achamos um. Agora precisamos do outro. — Severus fitava as runas gravadas nas páginas finais do Livro de Admissão. — Nosso contato disse que o Diretório de Puro-Sangue é o outro livro que procuramos. Não essas cópias, o Diretório original dos Sagrados Vinte e Oito.
— Parece fácil demais uma única fonte fornecer duas dicas certeiras. — Remus pontuou e os outros balançaram a cabeça em concordância.
— Há condições para pegar o Diretório. Ele está vigiado e protegido com feitiços de sangue ligados ao criador dele e deve ser dado voluntariamente pelo descendente direto; sem truques, sem mágica envolvida. — Respondi mecanicamente.
Dean xingou, Remus apertou a ponte do nariz com os dedos num sinal claro de desânimo.
— Vocês sabem pelo menos onde ele está? — Foi Harry quem perguntou.
— Não. — Severus retomou a palavra e virou-se para mim. — Você pode contatar seu amigo, Krum, de forma rápida? Acho que é válido acioná-lo e perguntar sobre pistas na pesquisa dele em Durmstrang
— Sim. — Confirmei. — Tenho o contato dele.
— Isso não é necessário. — Foi Draco quem falou e todas as cabeças no recinto se viraram para ele, que fitava o fogo, mas levantou os olhos para encontrar os de Severus. — Mas você não vai gostar.
— Oh, porra. — Severus estremeceu ao meu lado.
Todos nós fitamos os dois Sonserinos enquanto Draco descruzava os braços e ia em direção ao pote de Flu ao lado da minha lareira.
— Algum de vocês dois vai explicar? — Eu perguntei impaciente.
— Theodore Nott. Ele é o descendente direto do criador do Diretório. — Severus respondeu desanimado.
— Bem… — Dean sempre tentando ver o lado bom das coisas. — Então é uma sorte que ele esteja fodendo a sua mãe, Malfoy.
— Obrigado pelo lembrete, Thomas. — Draco rosnou, antes de gritar o destino dele e sumir nas chamas verdes.
Harry tossiu quando a nuvem de fuligem o atingiu. Enquanto eu enterrava minha cabeça em minhas mãos.
— Vocês não estão animados? Temos um bom palpite, sabemos quem é o herdeiro. Narcissa tem acesso direto à cama de Nott. Finalmente estamos um passo à frente de todos eles. — Dean enumerou os motivos pelo qual nós devíamos estar felizes.
As narinas de Severus se dilataram delicadamente e, por um momento, me perguntei se ele atacaria Dean pela demora no raciocínio dele. Mas, ao mesmo tempo, eu entendia o ânimo de Dean por finalmente estarmos próximos de colocarmos as mãos em algo que poderia ser a chave para a liberação da magia.
Eu sorri para o meu amigo e estendi minha mão para alcançar a dele. Dean entrelaçou os dedos nos meus e sorriu de volta para mim.
— Eu também estou feliz por encontrar uma pista tão sólida que nos leve mais perto da vitória, Dean. Mas estamos tão acostumados a precisar batalhar muito e a ter perdas irreparáveis do nosso lado, que não são todos de nós que conseguem enxergar essa descoberta como algo bom.
A garganta de Dean oscilou levemente.
— Sim, certo… — Disse ele.
— Não queremos dar esperanças a ninguém porque ainda não sabemos se estamos no rastro certo. — Continuei.
— Eu… Vou conter minha animação, então. — A voz de Dean soou áspera. — Você sabe o quanto eu quero devolver ao Ivan o que foi roubado dele.
— Sim, eu sei. — Disse suavemente, lembrando o quanto Dean sonha que seu namorado recupere seus poderes.
— Por ora, vamos torcer para que Draco consiga convencer Narcissa a se encontrar com Nott. E espero que o próximo encontro desse improvável par seja lucrativo para nós. — Harry reforçou, me dando um olhar cúmplice.
A boca de Dean se contraiu e seus olhos brilhavam intensamente quando ele acenou com a cabeça.
Harry sorriu e suspirou, interrompendo o silêncio carregado e reclamou sobre querer ouvir a história toda sobre a tumba de água que quase nos matou. Mas Remus ainda tinha algo a dizer sobre nossos planos atuais.
— Mesmo que Nott concorde com um encontro... Teremos ainda que enfrentar Lucius. — Meu antigo professor disse.
Fechei meus olhos diante da afirmação de Remus e a confiança que eu tinha acabado de reforçar em Dean, desmoronou bem na minha frente.
— De fato. — Severus concordou, seus lábios crispados em uma linha fina.
— Temos Severus agora. — Harry afirmou ferozmente.
— Ao menos isso. — Suspirou Dean.
Todos nós ficamos em silêncio. Harry se levantou e foi até a cozinha colocar uma chaleira no fogo para preparar um chá. Severus e eu fomos para o sofá. Dean e Remus nos deram alguns minutos de privacidade.
— Você está bem? — Ele perguntou quando me aconcheguei ao seu lado e estiquei minhas pernas pela extensão do estofado.
— Sim. — Respondi. — Eu ainda estou ansiando desesperadamente por um banho, só os feitiços de limpeza de Remus não foram suficientes para tirar o fedor daquela água lodosa, mas sinto que existem assuntos ainda pendentes. O banho pode esperar.
— Mais tarde eu vou mimar você. — Ele prometeu, beijando minha têmpora.
Harry, Dean e Remus vieram para a sala de estar alguns minutos depois, uma bandeja com o chá fumegante e alguns biscoitos flutuavam ao lado deles e pousaram suavemente na minha mesa de centro. Remus nos serviu uma xícara e se acomodou na poltrona de leitura, enquanto Harry sentava-se no canto mais distante do sofá e apoiava meus pés em suas coxas. Dean se lançou no tapete, esticando-se por inteiro como se estivesse se alongando para nosso treino diário do castelo.
— Como era o Theodore na Sonserina, Severus? — Remus perguntou. — É possível que o caso amoroso dele com Narcissa Malfoy realmente nos garanta a lealdade dele?
— Theodore era… obsessivo em sua busca por coisas. Ele lembra um pouco a mim mesmo na idade dele. — Confessou Severus.
O rosto de Harry mostrou um pouco de surpresa. Ele tinha visto as memórias de Severus, mas meu melhor amigo costumava ficar afetado quando um de seus pais era discutido, mesmo que indiretamente, em uma conversa.
— Você diz como com você em relação à… — Eu tossi bruscamente, impedindo Remus de continuar a frase dele, ele me olhou confuso por alguns segundos até se dar conta de Harry aos meus pés. — … Tudo? — O lobisomem completou.
— Sim. — Severus confirmou. — Com a óbvia diferença de que o alvo de seus anseios ainda está vivo. — Disse Severus e eu respirei fundo quando senti as mãos de Harry estremecerem.
— Eu consegui notar que Narcissa é realmente importante para ele. Nott praticamente me implorou para trazê-la conosco. — Falei para todos, mudando o alvo da conversa de volta para Nott e Narcissa, para poupar Harry de seu desconforto.
— Será que Nott se aliaria a nós se garantirmos a segurança dela a longo prazo? — Perguntou Dean. — Até Lucius Malfoy estar morto, não tenho certeza se ela está realmente segura.
— Ela está. Acreditem vocês ou não. — Severus declarou. — Lucius é um bastardo sádico e um pai de merda, mas ele nunca tocaria num fio de cabelo da esposa. Acho que ela é a única pessoa que ele ama.
— Ele a ama? — Harry parecia confuso. — Então por que ele dividiu a mulher com um seguidor?
— O poliamor é uma realidade que foge à sua, Potter, mas ainda é uma realidade válida. — Severus soou ácido e Dean riu. Todos olhamos para o homem deitado no tapete.
— O quê? — Dean disse aos nossos rostos ansiosos por seu comentário. — Eu e o Ivan experimentamos algumas vezes. — Ele virou-se para Harry. — E você não vai duvidar do meu amor pelo meu namorado porque fizemos sexo em conjunto com outras pessoas, vai, Harry?
Harry parecia levemente chocado, mas conseguiu responder que "não" com a cabeça.
— Certo, agora que temos uma pista sólida e concordamos em não soarmos tão animados com o que vem pela frente, alguém quer falar sobre a lista? — Dean começou.
— Que lista? — Lupin perguntou curioso.
— A lista do balde! — Dean respondeu exasperado.
— Ah não! — Gemi, mas o sorriso em meu rosto entregou minha diversão.
— O que é uma lista do balde? — Severus perguntou.
— É uma lista de coisas que você quer fazer antes de morrer. Já ouviu o termo "chutar o balde"? — Do canto do meu olho, eu vi Severus e Lupin negarem com a cabeça. — Bem, isso é basicamente ao que ele está se referindo. É uma lista das coisas que você quer fazer antes de morrer.
Severus fez um barulho pensativo.
— Como saímos de uma animação por pistas para uma lista mórbida tão rapidamente? — Lupin comentou e todos nós rimos.
— Não é mórbida. É legal. — Eu afirmei.
— O que você tem na sua lista? — Severus me perguntou.
— Eu gostaria de viajar por todas as Sete Maravilhas do Mundo Antigo; quero aprender a pilotar motos; caminhar em uma geleira; e, talvez até… — Olhei para os rostos que me encaravam e optei por não completar a frase "transar em um iglu", seria estranho. — Coisas assim… Eu quase tenho dinheiro guardado suficiente para ir ao Alasca ver a Aurora Boreal.
Houve uma pausa. — Sozinha? — Era a voz de Severus.
— Meu irmão tem filhos demais para ir comigo. — Sorri em direção a Harry. — Mas Dean e Ivan certamente topariam.
Dean concordou entusiasticamente com a cabeça. — Ivan é o único de nós que tem dinheiro, mas vamos ver.
Atirei um sorriso para Dean antes de olhar para Severus. — O que acha? O que você vai fazer depois que os treinos em Hogwarts terminarem?
— Ainda não decidi. — Ele respondeu em voz baixa. — Tudo depende de algumas coisas.
Um simples pensamento me passou pela cabeça.
— Seu contrato com Hogwarts é apenas para este ano? — Perguntei.
De repente, me lembrei de ouvir alguma coisa sobre a duração do contrato de Severus, mesmo que não encontrássemos a chave para desbloquear a magia, ele estaria fora ao final do ano letivo. A ideia de que ele precisa partir em alguns meses, fez meu estômago revirar.
— Eu só concordei em vir por um ano para Hogwarts.
Ninguém na sala disse uma palavra. E acho que todos aqui concordam em uma coisa: Severus não gostava de ensinar e ele nunca escondeu isso. Em diversos discursos de início de aulas, quando ensinava Poções, ele reafirmou sua insatisfação com a docência. Por que ele iria querer ficar e treinar a equipe novamente se nós não conseguíssemos desbloquear a magia?
Merlin, a ideia dele voltar para o exílio onde estava antes de chegar aqui em setembro fez-me tão triste, que a excitação de toda a descoberta sobre os livros, desmoronou. Ao mesmo tempo em que me fez sentir como uma idiota egoísta. Quem era eu para ficar triste com alguém deixando para trás algo que não o faz feliz? Que espécie de amor eu sentia por Severus que não me deixava sentir alegria em saber que ele iria embora certamente para fazer algo melhor com a sua vida?
Mas ao mesmo tempo… nós fizemos promessas um ao outro, certo? A ideia dele indo embora e me deixando era uma droga. Mesmo assim, engoli a tristeza e forcei um sorriso no meu rosto, evitando olhar para ele.
— Entendo.
O frio na sala caiu vários graus. Todos sentiram o mal estar pairando no ar e, abençoado seja Dean, levantou-se animado e bateu palmas para tirar nosso ânimo do limbo.
— Então... Quem está com fome?
No campo de quadribol, quatro dias depois, Severus apareceu com mais duas pessoas. O primeiro que reconheci era um dos professores da escola de magia africana. E o segundo foi uma agradável surpresa.
— Viktor. — Caminhei em direção a ele, ignorando Severus, para dar-lhe um abraço. — Não sabia que estava vindo!
Ele me abraçou de volta. — Minhas reuniões no Ministério da Magia Britânico não demoraram tanto tempo quanto eu tinha previsto.
— Bem, então obrigado por voltar. — Respondi, realmente feliz pela presença dele.
Alguém fez um barulho mal-humorado. — Hermione.
Viktor soltou uma risada curta, dando um passo atrás e soltando-se do nosso abraço. Seu rosto estava inclinado para baixo, quando ele sussurrou "alguém é territorial, hmm?"
Eu me virei para olhar para o homem cujo olhar estava queimando um buraco dentro do meu crânio. As coisas estavam estranhas desde a conversa sobre a lista do balde, mas tivemos coisas demais em nossas mãos nos últimos dias para discutirmos sobre um futuro que nem sabíamos se, de fato, se concretizaria.
— Vai me apresentar? — Eu perguntei, gesticulando em direção ao bruxo da Uagadou.
— Não. — Severus respondeu, mantendo um olhar duro em seu rosto.
Enrolando meus lábios sobre os dentes, eu levantei minhas sobrancelhas para ele. Merlin, alguém estava em um humor terrível, porém o meu estava excelente. O sorriso no meu rosto ficou ainda maior.
Severus levantou uma de suas sobrancelhas para mim e seus olhos escuros, percorreram para cima e para baixo, silenciosamente me dizendo que ele não ia me apresentar até que ele eu agisse como ele queria. Por um segundo, pensei em ignorá-lo e apenas apresentar-me, mas… se Severus gostava de jogar jogos, eu adoro ganhá-los.
Consegui não sorrir quando me adiantei e o abracei, sem me preocupar que ele me fizesse parecer uma idiota se não me abraçasse de volta, mas ele apertou sua bochecha no topo da minha cabeça e enrolou-se em volta de mim, me abraçando. Seu corpo estava duro e tenso quando ele fez isso, e quando ele finalmente se afastou, eu olhei para cima. Ele estava nervoso e carrancudo, mas seus olhos eram quentes quando pousaram sobre os meus, e uma de suas mãos se manteve nas minhas costas quando me virei para o bruxo de pele escura que nos olhava com curiosidade.
Ele se chamava Dume Kawame e é especialista em línguas antigas.
— Ei, é bom conhecê-lo. Obrigada por ter vindo. — Eu estendi a minha mão para pegar a dele e senti a mão de Severus cair no instante em que eu me apresentei.
— Dume Kawame. — Ele disse com um sotaque difícil.
— Hermione Granger.
— Oh sim, eu conheço seu nome, e o de Harry Potter. — Ele falou. — Ele já fez uma visita à nossa escola.
Eu assenti com a cabeça para ele e sorri.
— Você comentou comigo que Harry mora na Inglaterra. Onde? — Viktor perguntou num tom curioso.
— Ele está hospedado na minha casa, agora, na verdade. — Expliquei.
— Eu não sabia. — Viktor sorriu.
Antes que a conversa se estendesse em torno de Harry, Severus mudou o rumo dela.
— Lupin vai levá-lo até uma das salas de estudo e mostrar os textos que estamos precisando de tradução. — Ele orientou Dume e eu vi que Remus realmente estava à beira do campo acenando para nós.
Depois disso, Severus iniciou o treino da equipe de Hogwarts e o dia correu relativamente bem. Não havia muito a ser feito enquanto esperávamos que Draco voltasse com notícias de que Narcissa tinha convencido Theo a nos entregar o Diretório. Então, continuamos nossas vidas.
Depois que se passaram as três horas de treinamento e muitos da equipe já tinham saído, Dean e Cho entre eles, Viktor me puxou de lado, aproveitando um dos momentos em que Severus e Filius conversavam na borda do campo.
Meu ex-affair me deu um olhar sério.
— Eu ouvi uma coisa enquanto eu estava no Ministério e preciso falar com você.
Ah, merda, preparar alguém para notícias nunca foi uma coisa boa.
— Ok.
Ele lançou um olhar na direção de Severus, antes de começar a falar o que ele sentiu a necessidade de me dizer.
— Há um rumor de que você vai ser cedida para Beauxbatons ao final deste ano letivo.
Meus ouvidos começaram a zunir. Meu estômago se agitou. Beauxbatons? Com Claire? Se isso não fosse ruim o suficiente, a equipe francesa já tinha um sólido time de pesquisadores. Eu nunca iria ter relevância lá. E mais importante ainda: não quero ir para Beauxbatons.
Viktor tocou meu ombro.
— Eu tenho influência na Bulgária. Se você decidir que quer tentar algo diferente e dobrar aquela sociedade de puros-sangues preconceituosos, tem meu apoio lá. E o do Ivan, tenho certeza…. — Ele me lançou um olhar. — Qualquer opção é melhor que a França. Snape tem conexões na África e Lupin no Brasil, então, não há muito que três de nós não possamos fazer com nossos contatos.
Totalmente ciente de que este não era o momento de perder a cabeça, me forcei a acenar com a cabeça para o homem que tinha me dito notícias que ele não tinha a obrigação de compartilhar.
Fiquei pensando uma e outra vez no que ele me disse. Todo mundo sabe o quanto eu adoro Hogwarts. É minha casa desde que cheguei no mundo mágico. Eu lutei por essa escola, estou aqui mesmo depois de anos que a guerra acabou. Os nascidos-trouxas foram autorizados a escolher a instituição onde queriam treinar habilidades e pesquisar uma solução para a magia e eu, obviamente, sequer cogitei sair daqui. Eu trabalhei duro e não descansei durante todo esse tempo para buscar a "cura" da extinção da magia e é dessa forma que eles me retribuem?
Avisos de Vector, antipatia de Robards e fofocas que alguns membros da equipe tinham feito recentemente, passaram pela minha cabeça e eu não conseguia decidir se ficava triste ou ia até o escritório de Robards e fazia o inferno descer sobre ele.
Sim, Robards ainda era nosso chefe, nada havia sido provado sobre ter sido ele a facilitar a entrada de Lucius e sua horda de comensais no dia do sequestro de Minerva. E se havia uma pessoa que poderia estar por trás deste movimento de me "expulsar" de Hogwarts, esse alguém era aquele rancoroso e idiota do Robards.
— Obrigado por me dizer. — Consegui falar a Viktor apesar de por dentro estar numa confusão de sentimentos.
— Não desperdice o seu potencial, certo?
Concordei com ele, sentindo uma enorme onda de emoção ruim subir em meu peito e o sorriso no meu rosto sentiu falta da bravura que sempre demonstrava.
— Eu vou pensar em alguma coisa.
— Me avise se precisar, pode ligar ou me enviar um Patronus. — Viktor disse sinceramente.
— Obrigado, Viktor. Eu realmente aprecio isso. — Eu fui sincera, mesmo que a notícia que ele me deu me fizesse querer chorar.
Ser despachada para o covil de Claire e suas seguidoras? Aparentemente, meus pensamentos foram escritos na minha cara. Krum me deu um sorriso triste, que me fez sentir pior ainda.
Um toque suave em minhas costas me fez levantar os ombros.
— Dume e Viktor estão ficando essa noite aqui no castelo. Jante conosco. — Severus disse, parando ao meu lado.
Bile beliscou minha garganta, e eu tive que manter meu olhar longe dele.
— Eu preciso ir para casa. Obrigada.
Ele me ignorou.
— Eu vou no carro com você até Saint Mungus.
— Severus, eu quero ir para casa. — Repeti firmemente.
— Irei com você para o hospital e esperarei pelo seu plantão. Quero garantir que você venha jantar. — Respondeu ele, já se virando. — Onde estão suas coisas? — Severus nem sequer esperou por mim, para dizer mais alguma coisa, ele começou a caminhar na direção da minha mochila.
Droga.
— Severus… — Chamei, seguindo-o. Ele olhou por cima do ombro, mas não parou de andar.
— Você não tem nada programado esta noite. Pare de ser difícil.
— Eu tenho coisas para fazer. Eu tenho que ir para o supermercado mais tarde, ou talvez praticar um pouco de meditação…
Ou chorar, ou gritar...
Ele acenou com a mão para que eu me calasse. Eu ia matá-lo. — Severus!
— Ele é difícil, não é? — Viktor disse, se aproximando.
— Esse é o eufemismo do século. — Disse Dume em seu sotaque forte.
— Ele é insuportável. Eu realmente não sei como alguém ainda não lançou um Avada Kedavra nele.
Os dois homens soltaram uma risada. Do outro lado do campo, avistei Severus jogando minha mochila por cima do ombro.
— Não adianta tentar argumentar com ele, não é? — Perguntou Viktor.
— Nem um pouco. — Respondi.
— Ele é um turrão. — Dume endossou.
Viktor riu. — Ele é. Fazia a vida de Karkaroff um inferno.
Suspirei. Eu poderia sair depois de algum tempo. Esperançosamente.
Encontrei Severus no meu carro, para onde ele aparentemente já tinha levado a minha bolsa e a abriu para pegar as chaves. Nós entramos e ele acenou para os homens, antes deles entrarem no carro estacionado ao meu lado... Assim que estávamos lá dentro, eu lancei-lhe um olhar.
— Poderia ter ficado com eles ao invés de ir comigo até o hospital. Eu tenho uma cirurgia complicada e você vai ficar trancado no meu consultório, sozinho.
Ele me deu aquele mesmo olhar irritante.
— Eu sei quando você está sendo infantil e quer fugir de alguma coisa, Hermione.
Olhei para ele, incrédula. — Você está sendo rude.
— Não me importo.
Não é uma surpresa. Liguei a ignição e saí do estacionamento decidida a ignorar meu namorado carrancudo e mergulhar meus pensamentos no fato de que, em breve, eu estaria fora de Hogwarts.
Meu chefe me odeia, a relações-públicas do castelo pensa que eu não levo a equipe a sério, metade dos meus colegas acha que sou uma vagabunda e o idiota ao meu lado disse que ia embora no final do ano letivo. Isso sem contar todos os problemas que tínhamos para resolver antes que esse ano terminasse. Ainda havia um livro perdido, um fantasma com frases enigmáticas me deixando confusa e uma decisão difícil sobre o momento que se aproximava da concretização de uma profecia que envolvia não só a mim e a Severus, mas um garotinho adorável que eu faria tudo o possível para proteger.
O que diabos eu estava fazendo com minha vida? Tudo o que eu tinha trabalhado, de repente parecia ser tirado de mim. O que eu ia fazer? Meu nariz coçou em resposta.
Chegamos em Saint Mungus em silêncio. Eu queria chorar. Eu realmente queria chorar, e com certeza não queria fazê-lo em qualquer lugar perto daqui. Mantive meu olhar para baixo e mal tínhamos entrado no meu consultório, quando senti uma tosse sufocante na garganta. Eu sabia que precisava me afastar.
— Fique à vontade. — Murmurei com uma voz que soou estranha até pra mim. — Eu já volto. — Menti, já saindo de volta pela porta que entramos, desesperada para fugir.
Entrei no depósito de suprimentos do final do corredor e nem sequer acendi a luz, antes que eu batesse com tudo na borda de uma das prateleiras. Minha garganta colapsou e eu solucei. Não chore, não chore, não chore. Não faça isso, Mione. Você não pode fazer isso. Consegui aguentar trinta segundos, antes que o próximo soluço atingisse meu peito, seguido por outro e outro.
Sentada no chão do depósito, tentei me convencer que ser transferida não era o fim do mundo. E tentei não levar isso pro lado pessoal, mas eu sabia que estava sendo descartada de Hogwarts apenas porque eu tinha me envolvido com Severus. Mesmo sabendo que eu o escolheria de qualquer forma, ainda era doloroso demais ser chutada dessa maneira de um lugar que eu chamava de casa. Isso só me fez chorar ainda mais. Eu era uma idiota. Uma estúpida de merda idiota.
— Hermione, o que você… — A voz de Severus irrompeu abruptamente.
Em retrospectiva, iria perceber que eu não o ouvi entrar, porque ele não bateu. Ele só entrou, como se não houvesse uma chance de que eu estivesse fazendo algo no depósito que ele não iria querer ver. Eu fui pega desprevenida e não consegui abafar o próximo soluço para tentar escondê-lo.
Eu perdi o olhar horrorizado de Severus, antes que ele viesse para dentro e fechasse a porta atrás dele. Não vi ele cair de joelhos ou pôr as mãos em mim, abaixando sua cabeça até sua testa encostar na minha.
— Hermione… — Ele disse no tom mais macio e afetuoso que ouvi. — O que houve?
— Nada. — Consegui falar, mesmo que a parte superior do meu corpo estivesse tremendo.
— Pare com suas mentiras e me diga por que está chorando! — Ele ordenou enquanto acariciava minhas costas com sua mão.
— Não estou chorando.
— Você é a pior mentirosa que eu já conheci. — Ele mudou-se para esfregar o meu ombro. — Por que você está chateada?
Todas as vezes que ele perguntou, de alguma forma, consegui chorar mais.
— Isso é estúpido. — Funguei.
— Mais do que provável, mas diga-me de qualquer forma. — Ele disse com uma voz suave.
Eu não conseguia respirar. — Eles vão me despachar para a França. — Consegui formar a frase em meio aos soluços.
A mão no meu ombro não parou de fazer círculos reconfortantes.
— Quem te disse?
— Viktor. — Respondi.
Algo rápido e cruel saiu da boca dele, provavelmente uma maldição.
— Ele não está mentindo, não é? — Eu segurei no seu colarinho.
Severus suspirou em cima da minha cabeça.
— Você me diz. Ele é seu amigo, não meu.
Mas eu sabia que era só uma forma dele adiar a confirmação. Meu coração e minha cabeça estavam bem cientes dos sinais que recebiam.
— Minerva me avisou, mas eu não ouvi. — Eu disse a ele. — Eu sei que não é o fim do mundo, temos uma guerra para vencer. Isto é tão estúpido e embaraçoso, mas não consigo parar de chorar.
Severus colocou os braços ao meu redor e me mandou ficar quieta enquanto me puxava um pouco mais perto.
— Você é melhor que isso. Pare de chorar. — Ele sussurrou no meu ouvido.
— Não posso.
— Você pode e você vai. — Ele disse com ternura. — Não consigo imaginar como se sente agora, mas você é melhor do que isso. Você é a bruxa mais inteligente e poderosa da sua geração. Em dois anos, você vai agradecer Robards por ser um estúpido.
— Eu dediquei os melhores anos da minha vida a Hogwarts…
— Não, você não fez. Você não atingiu o seu auge mágico ainda. Você é jovem e tem muito mais a fazer.
Eu estava inconsolável. Severus estava me dizendo que eu ainda tinha mais anos pela frente, e nem isso conseguiu me fazer sentir melhor.
— Bruxa, pare neste instante. — Ele pediu em uma voz grave. — Sei que isso é culpa minha, e eu juro que eu vou compensá-la. — Ele murmurou.
— Não é sua culpa. — Eu disse abafada contra ele. — Eu não me arrependo de nada. Eu teria escolhido você, sempre. A culpa é minha por ser uma idiota quando se trata de apego ao meu lar. Acho que… por ter perdido o meu lar de infância e os meus pais… me apeguei demais a Hogwarts e sempre fiz tudo o que queriam que eu fizesse. Não falhei em nada e é assim que retribuem? Tentado me enviar para França, dentre todos os lugares? Minerva e Vector sabem o meu histórico com Claire.
Não liguei a mínima que eu parecesse uma grande bagunça e funguei no ombro dele. Eu estava sentindo o peso de uma centena de universos em meus ombros, sentindo meus sonhos na iminência de escorregarem para longe de mim. Eu sabia que estava sendo dramática, mas era muito.
— O que eu vou fazer, Severus? — Perguntei como se ele tivesse todas as respostas.
Severus me olhou nos olhos enquanto falava.
— Você vai continuar sendo a profissional que é. Prometo. Eu nunca colocaria sua carreira em risco. — Eu funguei e fiz um ruído aquoso na minha garganta, avisando sobre outra rodada de lágrimas. — Não. Eu não vou te decepcionar. Agora pare de chorar, isso me faz sentir náuseas.
Isso era quase engraçado. Limpei meu rosto com as costas da minha mão e ele fez uma careta enquanto apanhava alguns pedaços de papel higiênico e me entregava.
— Controle-se. — Ele ordenou.
Eu quase ri, limpando o meu rosto com o papel que ele me deu.
— Você não pode me dizer para "me controlar", Severus, isso não funciona assim.
— Você deveria fazer o que eu digo. — Disse ele, arrancando o papel dos meus dedos e enxugando minhas bochechas com um pouco mais de força do que necessário e o cenho franzido. Isso me fez dar um pequeno sorriso. — Você está uma bagunça. — Disse ele, continuando seu processo de limpeza. — Eu nunca tirei você como uma bebê chorona.
— Eu não sou! — Protestei e tentei pegar o papel de volta, mas ele segurou a minha mão, plantando um beijo na minha palma.
— Não é o que eu vejo. — Ele disse e esfregou um pouco forte debaixo do meu nariz, fazendo-me estremecer. — Desculpe, eu não estou acostumado a isto.
— Você nunca teve de limpar o rosto de uma garota antes?
Ele se afastou para observar seu trabalho. — Nunca.
Soltei um suspiro profundo, facilitado por sua admissão. — Nesse caso, obrigada pela honra.
Severus finalmente deixou cair as mãos do meu rosto.
— Vamos lá para sua sala.
— Sigo você em um minuto. — Disse.
Um suspiro exasperado mais tarde, ele pegou as minhas mãos e me puxou.
— Não. Você vai agora.
— Severus, sério, me dê um minuto. — Eu dobrei meus joelhos para que ele não pudesse me arrastar.
Com um pouco mais de força, ele me puxou para a frente.
— Para que você possa chorar mais? Não. Venha. Eu pedi ao Longbottom para trazer chá.
Eu funguei e ele me deu um olhar sujo em troca.
— Você é uma puta mandona, você sabe disso? — Perguntei-lhe ao mesmo tempo que eu o deixei me levar para fora do depósito.
— E você é insuportável, você sabe? — Ele atirou de volta.
Bufei quando seguimos pelo corredor.
— Eu usei essas mesmas palavras para descrevê-lo para Viktor e Dume, querido.
Um muxoxo saiu da sua boca, mas ele não discutiu mais.
Encontramos Neville na minha mesa, derramando água quente em nossas xícaras. Ele olhou para cima e imediatamente franziu a testa.
— Estou bem. — Eu disse antes que ele falasse alguma coisa. — Realmente estou; só estou sendo um bebê.
— Certo, beba seu chá! — Severus ordenou. — Longbotton, suponho que você cuidará dela, sim?
— Sim, senhor. — Neville murmurou e eu quase sorri, porque ele soou exatamente como o aluno de Severus Snape, anos atrás.
Severus se aproximou e beijou minha testa.
— Onde você vai? — Perguntei, levemente confusa por ele ter feito questão de me acompanhar ao hospital e agora já partir.
— Oh, eu tenho um ajuste de contas com o meu chefe. — Severus disse, a voz dura.
— Espere. O que eu você vai fazer? — Falei de repente, entrando em pânico novamente, com o pensamento de Severus tirar satisfação com Robards.
— Hermione, você realmente quer ficar aqui com essas pessoas? — Severus me perguntou, soando incrédulo. — Nem todo mundo merece sua lealdade.
— Ainda tenho alguns meses antes de terminar o ano letivo.
— Muita coisa pode acontecer em alguns meses, Hermione. Amanhã podemos pegar aquela droga de livro e devolver a magia a todos. Ou Lucius pode explodir aquele castelo com todos nós dentro. Qualquer coisa pode acontecer.
Ele estava certo novamente. Tudo pode acontecer. Eu ia deixar o medo obter o melhor de mim e me manter em um lugar que eu não era mais bem-vinda? Manter-me com uma organização que obviamente não me queria mais porque eu namorava o meu orientador? Quão estúpido isso seria? Se a Hermione Granger que saiu para caçar Horcruxes com dezoito anos me visse agora, ela ia me bater por ser uma covarde.
Uma pequena parte de mim percebeu que não precisava me apressar em uma decisão. Ainda havia treinamentos e pesquisa. Eu tinha tempo, não muito, mas tinha.
— Você está certo. — Eu disse e endireitei minha espinha. — Não tenho nada a perder, mesmo se as coisas não derem certo.
— Ok. Longbottom. — Severus se despediu.
— Espere! — Segurei o pulso de Severus. — Me prometa que não vai matá-lo. Robards.
Eu vi o rolar de olhos dele.
— Ok.
— Isso não soa como uma promessa para mim.
— Eu prometo, Granger. — Ele resmungou e eu peguei o pequeno sorriso que cruzou o rosto de Neville quando ele ouviu o murmurar do nosso antigo professor.
— Você tem certeza que não quer que eu faça isso? — Severus perguntou sério, seus olhos como duas pedras negras ardendo em uma fúria gelada, num lembrete gentil de como esse homem tinha um passado sombrio. Ele parecia realmente pronto para matar Robards e eu estaria mentindo se dissesse que não estava pelo menos um pouco apavorada.
— Eu tenho certeza.
Ele acenou com a cabeça e um segundo depois, saiu pela porta. Eu ouvi a risada nervosa de Neville antes de ouvir o som da sua voz.
— É divertido vê-lo se dobrar às suas vontades.
— Ele não fez isso.
— Ah, ele fez. Snape pode ser um bastando, mas você o tem na mão. Claramente.
Notas Finais
Foram tantas e tantas coisas que aconteceram na minha vida nesse último mês, que eu não sei nem por onde começar a explicar para vocês tudo o que atrapalhou as atualizações da fic. Então ao invés de me explicar, vou apenas pedir perdão a vocês.
Se ainda tiver alguém aqui que não tenha desistido de mim, por favor, me perdoe.
Prometo que, em breve, as atualizações estarão em dia.
Quem estava com saudades do Robards? Era óbvio que ele mexeria os pauzinhos para afetar nossa heroína, né? Uma vez covarde, sempre covarde.
Há um Easter Egg para outra história minha neste capítulo, alguém achou?
Em contagem regressiva para o final da história, teremos mais cinco capítulos pela frente até que essa aventura chegue ao fim. Obrigada por quem ficou até essa reta final. Amo vocês!
