Teen Titans

Capítulo 9: Espelho

A sala estava escura. Um suave odor de incenso pairava no ar sublime do aposento. A concentração era precisa nos dois jovens titãs. Ravena e Magi. A sessão de meditação era conduzida sem maiores problemas. Ambos permaneciam sentados em posição de lótus, respirando suave e lentamente. Não se ouvia mais nada na sala com exceção de sua própria respiração.

Ao se passarem aproximadamente 10 minutos, Luiz abriu seus olhos lentamente. Ele focalizou Ravena através da escuridão. Ela lentamente abria seus olhos. Seu olhar era tão sublime como sempre era para o garoto.

-sinceramente, acho que eu to pegando o espírito da coisa. - disse Luiz sorrindo.

-eu concordo. Você progrediu gradualmente nas últimas semanas. Surpreendeu-me bastante. Nunca alguém que meditara comigo conseguiu alcançar o mesmo grau de calma e sublimidade que eu alcancei. - confessou Ravena, erguendo a mão e levitando um copo de chá até a sua mão.

-então alguém mais já teve o privilégio?

-Estelar. Foi rápido. Ela disse que gostou muito, mas que descobrira que sua raça tinha alergia ao meu incenso...

Luiz riu em silêncio.

-como você se sente? - perguntou Ravena.

-muito bem. Sinto-me calmo e relaxado. Sinto que posso fazer muita coisa com meus poderes que eu não podia fazer antes.

-é mesmo? Mostre-me.

Luiz fechou seus olhos. Cerca de 2 segundos depois, o copo que estava nas mãos de Ravena havia sumido. Ele reaparecera na mão de Luiz. Ravena piscou em surpresa.

-nada mal. Suponho que tenha sede. - disse ela, levitando um outro copo de chá até sua mão.

Luiz riu com o comentário. Ele bebeu o chá lentamente, pensando um pouco no que havia lhe acontecido nas últimas semanas. Ele tinha vindo ao quarto de Ravena todas as noites. Ela sempre abria a porta, eles se fechavam no quarto e tudo que ela lhe dizia eram frases simples como "sente-se" ou "feche os olhos" ou "esvazie sua mente". É claro, era difícil esvaziar a mente. Mas aparentemente, ele havia conseguido.

Luiz retornou sua mente dos pensamentos. Ele viu Ravena ir até o seu armário. Ela voltou para o centro do quarto, trazendo uma caixa.

-abra. - pediu ela.

Luiz pegou a caixa com ambas as mãos e puxou a parte de cima. Ele viu, envolvido em seda azul-marinho, um espelho. Não pôde deixar de notar que era muito semelhante ao espelho de meditação que Ravena usava e que ele próprio visitara semanas atrás. Ele era talhado com símbolos rúnicos. A superfície reflexiva do espelho refletia seu rosto. Luiz viu a si mesmo. Seus cabelos negros que constantemente estavam desarrumados. Seus profundos olhos vermelhos, os quais Luiz gostava muito, pois lhe era uma marca registrada. Sua expressão curiosa que lhe definia. Ele moveu o olhar do espelho para Ravena.

-Ravena, o que é esse espelho?

-como você deve recordar-se, eu tenho um espelho que serve de acesso para minha mente, o qual eu uso para meditar. Certo?

-é, me lembro sim.

-esse espelho em suas mãos tem a mesma função. Eu o preparei nas últimas semanas, para quando você estivesse apropriadamente pronto para ir ao próximo passo.

-que passo?

-o passo de refletir seus pensamentos. Nas últimas semanas treinei você para esvaziar sua mente de pensamentos inúteis. Agora, está na hora de voltar a estes pensamentos inúteis e tentar entender o porquê de você ter os tido.

-hã, acho que entendi.

-ótimo. Feche os olhos e concentre-se.

Ravena observou Luiz sentar-se mais uma vez. Ele fechou os olhos e começou sua respiração lenta e constante. Porém, a sessão de meditação anterior fora tão longa e desgastante, que Luiz eventualmente afunda em sono profundo. Sua cabeça por pouco se chocara com a cômoda, graças aos poderes de Ravena, que o impediram de continuar a cair. Ela levitou o corpo de Luiz e o colocou delicadamente sobre sua cama. Ela o olhou por um tempo, e então voltou-se para seu armário. Era inútil tentar acordá-lo. Ela supôs que ele precisava mesmo descansar. Ela trouxe uma cadeira até si com seu poder e levitou um livro da prateleira. Ela o abriu e leu um terceiro trecho de um poema:

"e a triste incerteza sussurrante nas cortinas de cada pessoa

Excitou-me - preencheu-me com terrores nunca antes sentidos;

Tanto que agora, para diminuir o batimento em meu coração, eu repito:

"é um visitante adentrando através de minha porta -

Algum visitante adentrando através de minha porta, --

é apenas isso, e nada mais."

Ela fechou seu livro, levitando-o de volta para a prateleira. Permaneceu sentada, as mãos unidas em quanto pensava. Debatia-se sobre o motivo que a movia a querer guiar o caminho da alma daquele garoto. Não compreendia exatamente o que o levou até ela. Seu olhar focalizou o espelho de meditação que dera para Luiz. Por um instante, Ravena pensou em sair do quarto. Mas, eventualmente, a curiosidade de sua parte humana venceu seus princípios. Ela andou até o espelho e concentrou-se. Ela salta dentro da imagem reflexiva, que move-se com a consistência de um líquido trêmulo.

Depois de muito afundar em um longo vácuo de espaço, Ravena caiu sobre um tipo de pufe feito de um material muito fofo e macio. Ela levantou-se do pufe e tirou o capuz de sua capa para olhar melhor ao redor. Ela sabia que a mente de Luiz iria ser diferente da sua própria, mas não esperava tanta diferença. A começar pelo cenário. Ao invés de uma grande campina verde com um céu brilhante, ela encontrava-se em um tipo de corredor. Era muito longo, e mais a frente, várias portas iam surgindo. Ela andou cautelosamente através do corredor. O silêncio era tenebroso. Se não tivesse um controle grande sobre suas emoções, Ravena teria ficado incomodada com tal silêncio. Ela andou e alcançou a primeira porta do corredor. Havia um tipo de placa de identificação logo ao lado da maçaneta. Ravena passou a mão sobre a placa, limpando o pó que havia nela. Estava escrito "Pureza".

Ravena abriu a porta lentamente. Ela viu uma sala repleta com muitos brinquedos. Parecia uma grande loja de brinquedos, com o suficiente para agradar qualquer criança no mundo. Ela olhou ao redor, tentando encontrar algo familiar. Foi quando viu o lado esquerdo da sala. Sentado na frente da televisão, assistindo o que parecia um desenho animado, estava Luiz. Não o Luiz que ela conhecia. Este tinha cabelos negros, os dele mais curtos do que os do Luiz que ela conhecia. Ele tinha olhos castanhos. Seu corpo era menor. Não era o Luiz que ela conhecia. Era sua inocência. Uma criança de aproximadamente 9 anos, época anterior a sua mutação, o que explicava os olhos serem diferentes. O jovem Luiz olhava para a televisão sorrindo. Ravena deixou lentamente a sala.

-interessante. A pureza deve representar a época que ele era criança. Uma época em que ele não tinha poderes nem tinha que lutar contra o mal.

Ravena prosseguiu pelo corredor, logo alcançando a próxima porta. Ela limpou a poeira da placa, onde lia-se "conhecimento". Ela abriu a porta, revelando uma grande biblioteca. E no centro da sala, envolvido por livros, estava Luiz, do jeito que ela conhecia, com a única exceção sendo que ele utilizava um par de óculos de leitura. Ele lia um livro grande intitulado "Respostas já encontradas", enquanto ao seu lado haviam dois outros livros estavam empilhados. Eles eram intitulados "Perguntas a serem feitas" e "perguntas sem resposta". Ela fechou a porta.

-provavelmente, o lado curioso dele aprofunda-se de tudo que ele aprende nesta sala.

Ravena caminhou em frente, alcançando mais uma porta. Ela, como antes, limpou a porta, lendo a placa que dizia "divertimento". Ela abriu a porta, surpreendendo-se com a visão. Era uma sala ampla, e haviam três Luiz dentro dela. Um deles estava em um canto da sala, recostado em uma rede, aparentemente dormindo. Outro deles estava em frente a uma grande escrivaninha, com um conjunto de lápis de colorir aberto ao seu lado, enquanto desenhava algo que parecia ser o rascunho de uma história em quadrinhos(neste ponto, Ravena recordou-se que Luiz uma vez lhe revelara que um de seus sonhos era ser desenhista de quadrinhos). E por último, havia o terceiro Luiz, este estava sobre uma cadeira, lendo um livro intitulado "piadas que eu já contei", enquanto outro intitulado "piadas que não contei" estava aberto ao lado.

-diversão para ele significa descanso, alegria e passatempos? - disse ela enquanto saía da sala.

Ravena seguiu reto até a porta seguinte. A placa dizia "Coração". Ela hesitou em abrir a porta. Estaria entrando numa área muito particular e pessoal. Ao abrir a porta, ela viu uma sala de três cantos. Cada canto continha uma placa indicando a quem pertencia. Ela foi o primeiro canto. A placa indicava "Solidão". Ela esperou algo similar com seu arrependimento. Estava errada. O Luiz sentado ali observava a tela de uma televisão. E nela, era exibido um Luiz mais jovem. Ele estava sentado ao lado de uma cama de hospital. E deitada na cama, estava uma mulher. A mãe de Luiz. A máquina ao lado da cama indicava a morte da mulher. O jovem Luiz chorava. Surge outra pessoa. O pai de Luiz. A cena continua, mostrando um Luiz sendo expulso de casa pelo próprio pai. Um Luiz vagando até um Cole mais novo. Um Cole levando-o para viver em sua casa. Quando achou que a cena iria continuar e mostrar Luiz vivendo feliz, o Luiz que assistia pegou o controle remoto e voltou a cena até a parte que sua mãe estava na cama.

Ravena olhou o outro canto. Este tinha uma placa que dizia "Amizade". Ela viu que cada ponto da parede daquele canto estava preenchido com a foto de alguém. Robin, Estelar, Ciborgue, Mutano, Cole, até mesmo Sarah. Mas, estranhamente, ela não encontrou foto alguma dela. Isso pesou um pouco em Ravena. Será que ela alimentava esperanças de que ele realmente tivesse amizade por ela? Ela seguiu ao outro canto, onde estava escrito "Amor" e levou um choque. Havia um Luiz, o qual olhava uma televisão que exibia várias imagens. Imagens dela própria. Não era a Estelar ou a Sarah. Era ela.

Ravena saiu rapidamente da sala, o seu coração batendo acelerado.

-ok, sejamos racionais. Ele é solitário por ter perdido a mãe e o pai o expulsar de casa. Ele tem como amigos os titãs. E ele... não consigo nem dizer...

Ravena continuou. Continuou. Mas não havia saída. O corredor prosseguia infinitamente. Ela foi voando. Ela encontrou uma porta, e suspirou aliviada. A porta era diferente das outras. Não era feita de madeira, mas de metal, com grades. A placa indicava "perigo! Não abrir". Ela olhou por através das grades. Ela viu o primeiro Luiz. Ele tinha uma expressão furiosa. Dava socos em um grande saco de pancadas que parecia estar preenchido com chumbo, levando em conta que os punhos de Luiz estavam sangrando. Mais a frente, ela viu em choque outro Luiz, o qual cortava os próprios braços com uma lâmina de barbear. Outro Luiz encolhia-se no canto da sala, olhando nervoso para todos os lados. E o último Luiz da sala, o qual chorava e corria de um lado para o outro da sala, o pânico estampado em seu rosto. Ravena parou de olhar para a sala e encolheu-se ao lado da porta.

-Raiva... Desejo de morte... Paranóia... Desespero... Grande Azarath... eu não deveria ter vindo aqui... agora entendo porque ele tem tanta dificuldade em controlar suas emoções... ele deve ter sofrido... muito mais do que eu...

Ela encolheu-se, sentindo uma singela lágrima percorrer seu rosto. Ela estava surpresa. Faziam anos que não chorava. Ela estava presa na mente de Luiz e não sabia como sair, e ainda teria que ficar ao lado de tantos conflitos emocionais.

-por aqui... - ouviu-se uma voz familiar.

Ravena reconhecia aquela voz. Mas não poderia ser... como pode? Ela seguiu a voz pelo corredor, no qual uma nova porta invisível surge do nada. Ela abre a porta. Uma grande sala vazia. E no centro dela, estava ela própria. Ravena a verdadeira. Seu longo manto branco fundindo-se ao branco da sala.

-olá Ravena. Imaginei que um dia você fosse vir aqui um dia. - disse Ravena.

-como isso é possível? - perguntou Ravena.

-eu sou uma das emoções mais importantes para Luiz. Uma emoção que é importante para a vida dele, tão importante que a tua imagem é a que ele escolheu para representar esse sentimento. Essa qualidade.

-que sentimento é esse?

-você deve saber por essa altura do campeonato...

Ravena pensou por um momento. Então percebeu o que ela se referia.

-eu represento essa emoção para ele?

-sim. Você é o símbolo da emoção para ele.

-não creio...

-você deve ter visto a sala do coração não?

-sim...

-então não deveria estar surpresa. Afinal, como você mesma viu, ele te ama.

-eu...

-mas agora, você deve sair daqui. E devo pedir para não vir mais aqui. A mente dele não gosta de ser invadida por telepatia ou outros meios...

-espere! Eu tenho mais perguntas...

Ravena não pode perguntar nada, pois a Ravena branca fez um gesto com as mãos, e Ravena foi levitada para longe, para o alto, até desaparecer e reaparecer fora do espelho. Ela viu Luiz acordar.

-opa, desculpa Ravena. Eu abusei da tua hospitalidade. Acho melhor eu voltar pro meu quarto.

-lembre-se... amanhã... mesma hora... - disse ela, tentando manter a postura.

Luiz sorriu e deixou o quarto, levando o espelho junto. Ravena sentou-se na cama. Um sorriso involuntário surgiu em seu rosto. Sentia-se feliz. Muito feliz.

Enquanto isso, no longo corredor da mente de Luiz, Ravena branca estava encostada no lado de fora de sua sala.Ela reparou que sua porta estava empoeirada. Ela sacudiu o pó para longe e retornou para dentro. E, escrita na porta, estava apenas uma palavra...

"Esperança"...

continua...