Lembranças
XIII – Sem a luz dos seus olhos
Ávila decidira parar depois de horas de subida nas trilhas irregulares. Duo suava bastante e engolia a custo os gemidos de dor.
Ele estava muito cansado e dolorido, mas não ousou abrir a boca para deixar passar uma reclamação sequer.
O guerreiro se sentou ao chão depositando Trowa com cuidado. –Sumiu. – ele pensou quando notou que o vestido de Escarlate, que lhe mostrava as estrelas restantes havia desaparecido na sua cintura, onde estava amarrado.
-Descanse um pouco, criança. Eu vou manter guarda. – o guerreiro anunciou sem nada comentar sobre o vestido. Aquilo só poderia dizer que os dias de seu mundo estavam contados.
Duo não o contrariou, afinal cada pedacinho de seu corpo implorava por descanso.
Assim que ele se encostou por ali ao chão adormeceu e de imediato foi tragado para um mundo anestesiado de sonhos.
Caminhava por uma clareira sob a luz das estrelas quando avistou Heero caído ao longe, estava ferido. Era tão real, um sonho daqueles que quase se pode sentir a pele e o cheiro da outra pessoa. Duo se antecipou até o centauro ferido vendo que havia uma flecha em seu peito. O humano o abraçou com os olhos em lágrimas, seria aquilo uma prévia de uma despedida?
Duo não queria que fosse, ele sorriu fraco com as lágrimas banhando o seu belo rosto e entrelaçando seus dedos aos grossos de Heero.
Finalmente juntos se olharam com devoção. Seus olhos já se buscavam naturalmente como um rio que busca o mar, como um filho que retorna ao lar. Sempre.
Yui sorriu fraco, mas feliz. De repente o anjo de olhos roxos estava ali e parecia tão seu. E Duo pareceu lhe dizer que era só seu com aqueles olhos lindos.
Eles se beijaram finalmente e numa riqueza de sentidos. Como um sonho belo e aveludado e bom sonho de felicidade.
Duo fechou os olhos para sentir aquele beijo, aquela boca do centauro tão belo. Naquele beijo o humano soube que pertencia a Heero, simples, ele era de Heero Yui. Como um capricho da natureza a serviço das vontades de Yui.
Soube naquele momento que queria muito pertencer de corpo e alma aquele centauro. Pela sua cabeça passou detalhes de como faria para ser dele, como fisicamente seria possível se tratando de um centauro e um humano?
-Apenas será, Duo. Deixe que a magia do nosso mundo aconteça. – Yui falou sorrindo quando eles se separaram.
O humano acordou num sobre-salto. –Heero! – um gritou seco irrompeu pelos ares assim como o soprar do vento selvagem.
A ametista brilhava de forma insistente, quase enfurecida. Ela era a chave daquele mundo. Ela era a única capaz de encontrar o salvador e Duo seria a única criatura no mundo capaz de entender o salvador, quando eles o achassem.
Ele se levantou confuso. O sonho que teve. Heero o beijando, pedindo que deixasse a mágica acontecer.
-Eu o amo. – o humano constatou impressionado. Esteve sentindo aquilo desde o dia que o vira, desde o dia que o tocou e que o sentiu. Como fui burro em não entender que estava amando. –Eu pertenço a ele... Preciso libertá-lo dele mesmo.
Duo agora sabia que sua ametista podia lhe levar até o portal final. A saída e a entrada daquela que lugar.
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No alto dos picos Heero despertou com uma ligeira impressão que a voz de Duo havia chamado por seu nome, como se fosse um grito seco assoprando dentro de sua mente.
Os olhos azuis turquesa vasculharam aquele local estranho em busca de Duo, mas não havia ninguém ali. E ali não havia nada, absolutamente nada. Vida alguma, nem mesmo a gárgula que o havia levado.
Ele tentou se mover, mas estava preso. As patas, os pulsos... Mas porque? Um pânico se acedeu nas entranhas do centauro. Sempre fora livre correndo pela floresta, não podia se acostumar com as amarras, com um cativeiro. O sangue de Yui começou a esquentar e ele a se mover com força numa tola tentativa de buscar a liberdade e ir atrás de Duo. Estivera a um ponto de beijá-lo quando foi atacado.
-Duo! – Heero gritou agoniado.
-Tenha, calma. – uma voz feminina soou próximo dele.
-Quem? – mas não havia ninguém ali, ou havia. –Quem é? – ele falou trêmulo. Era um centauro e podia sentir a energia que estava rodando aquele lugar. Era diferente de magia, tão forte e violenta que podia arrebatar tudo que eles conheciam em pouco tempo.
-Nesse mundo vocês me conhecem como o conquistar. – a voz feminina falou.
Heero ficou mudo. Sua cabeça girou alucinadamente. Aquela criatura era temida desde os primórdios, desde a criação de seu povo, e, no entanto estava ali agora... O que significava isso?
Ele piscou os olhos azuis, mas não falou palavras, suspeitava que não podia falar, nem pensar, e por um breve momento esquecera-se de respirar numa inércia completa de seu corpo.
-Você não consegue entender... – o vento soprou forte e na frente de Yui surgiu uma mulher, vestida com o mesmo traje que cobria o corpo de Escarlate. O vestido bege que tinha o brilho das estrelas... –Gostou? – ela se voltou para ele se mostrando. O vestido antes brilhoso se moldava no corpo dela, porém opaco. Quase todas as estrelas haviam se apagado.
-Como? – foi tudo que o centauro conseguiu emitir e ela sorriu se aproximando sensualmente.
-Estive observando seu mundo durante anos eternos. Um mundo difícil de entender, Yui. Um mundo de magia, onde tantas coisas estranhas são possíveis. Estiveram sob minha visão durante muitos anos.
-Qual o motivo disso tudo? Porque não nos atacou antes.
-Aqui me chamam de o conquistador, por que eu conquisto os mundos, jovem. Para isso preciso entendê-lo... Senti-lo. – ela sorriu. Era uma mulher, linda por sinal. A pele clara e macia, os cabelos lisos e loiros, os olhos tão fortes e expressivos de um azul pálido, os lábios sorriam em sinônimo de satisfação. –Heero Yui, como quer salvar seu mundo se não o entende? – ela perguntou.
Heero mais uma vez não entendeu. Ele estava tão confuso.
-O salvador do mundo. Foi você que me interessou nesse lugar. Um ser que detinha toda a magia desse lugar. Impressionante. Esse poder, Yui é a essência pura desse mundo, quando eu o senti fui atraído.
-Mas...
-Os antigos magos sabiam que eu vinha, por isso esconderam o poder absoluto do mundo deles. Estive procurando por muito tempo e estava aqui, debaixo do meu nariz. Escondido dentro de um centauro... Claro. Os centauros estão nas mitologias, nas estrelas, são conhecedores do conhecimento profundo, ótimos observadores.
-Pelos Deuses. Do que está falando? – Yui sentia sua cabeça girar.
-Os sábios antigos esconderam o salvador na figura de um centauro, você. Cercado de magia, ninguém conseguia ver o que estava dentro de você. Teria sido quase impossível lhe encontrar...
-Como? Como pode ser... – Heero nunca havia se sentido como o salvador, nunca havia tido esse poder todo que aquela bela mulher dizia.
-A ametista me mostrou você. Ele foi o único capaz de te encontrar. A ametista me trouxe até você. – a mulher loira se aproximou lenta, penetrante.
-Duo... – Heero gemeu a olhando em desafio.
-A ametista despertou aquilo que estava preso dentro de você. Você se apaixonou, Heero. E isso, essa grande força que você direcionou àquele garoto me atraiu. E agora você está aqui nas minhas mãos. – ela sorriu acariciando o rosto de Yui.
-Então vai me matar? – ele a olhou com raiva. Não ia sucumbir, Se tivesse mesmo que ser o fim seria com honra.
-hahahahaha... Ainda não. Você é a vida desse lugar... E ainda está preso dentro desse corpo de centauro. Eu preciso da chave. A chave que vai te libertar... Eu quero essa força para mim. – ela falou. Seus olhos brilhavam em ansiedade.
Aquela criatura havia percorrido os mundos atrás do grande poder do deus daquele lugar, mas Heero continuava preso dentro de si e só a chave podia libertá-lo. A ametista.
-Se você o tocar... – Yui gemeu com raiva.
-Quem? A Ametista? É só um maldito objeto, Yui. Apenas será usado para te libertar e depois voltará à natureza... Entenda, de uma vez por todas que você é a única coisa importante aqui, o resto, é apenas força da natureza, energia mágica criada para seu deleite, tudo que há a sua volta, foi criado em torno de você. Para ajudá-lo... Não é diferente com a Ametista. – ela explicou com calma.
-Duo...
-Quando eu soube que os sábios haviam encerrado o poder máximo numa prisão e que haviam criado uma chave, eu fiz o mais esperto a fazer, procurar pela chave. Achei Sombras, que estava disposto a me ajudar... Mas o idiota falhou. Por isso Natal e Escarlate enviaram a Ametista para longe.
-Duo...
-Sim, ele foi mandado para o mundo dos humanos, e lá ficaria até necessitarem do poder dele para lhe encontrar. Foi uma vida tenebrosa... Longe de casa, os seres humanos não o compreendiam... Mas ele logo estará aqui com você.
Ávila parou em certo ponto. Estava quase chegando ao topo. Duo não estava bem. Ele parecia confuso, tonto... Como se estivesse ouvindo vozes, e de fato estava. Era como se Heero lhe chamasse... E ele precisava ir.
Trowa finalmente acordou. Confuso demais e novamente eles pararam.
-Duo. Onde está o Quatre? – o caçador perguntou confuso.
-Amigo. – Duo se abaixou tocando o rosto do caçador. –Ele está... Na natureza agora... Nos observando e nos dando força para chegarmos até o fim... – Duo tentou sorrir, mas falhou.
-Que merda, está dizendo? – Trowa o interrompeu nervoso. –Ele não morreu. Não! – o caçador gritou empurrando Duo.
O jovem humano teria ido atrás do caçador, mas um vento correu agressivo pelo local.
Ávila puxou o humano para junto de si, sentindo que aquilo era energia pura. Energia maléfica. Trowa também se deteve, talvez mais tarde pudesse entender como seu Quatre havia sido morto, mas agora o mais importante era se defender, porque a coisa que se aproximava não era do bem.
Os três se reuniram tensos. O vento cresceu furioso, como um tufão de energia bem diante de seus olhos espantados até ganhar a forma de uma mulher muito bonita. Ninguém teve muito tempo para reação, o vento aumentou capaz de arrastá-los.
-Duo! – Ávila fincou sua lança ao chão evitando ser tragado, mas Duo acabara sendo carregado para longe.
A mesma gárgula que levara Heero surgiu. Duo ainda tentou se livrar, mas como o faria? Sem outra opção ele foi arrastado pelos céus pela fera até sumir por cima das pedras.
-Vocês, dois não me têm mais serventia. – a mulher sorriu se dirigindo a Ávila e Trowa – Precisava de vocês apenas para proteger a ametista até ela me mostrar o salvador. Mostrar-me Yui, o centauro. – ela sorriu.
-Como? Heero? – Trowa não deixaria barato. Quem quer que fosse aquela mulher ia pagar.
Ele ergueu seu arco e evitando que ela escapasse atirou a acertando.
A flecha atravessou o ombro da mulher, mas não havia sangue, nem aparentemente havia dor.
-Inseto. – ela gemeu arrancando a flecha. –Eu usei você. Devorei o corpo da sua irmãzinha enquanto ela implorava e você tão idiota nunca desconfiou. Eu a matei.
-O que? Mas... Eu achei que tivesse sido o centauro. – débil ele falou.
-Eu precisava de um bom caçador atrás de um centauro. Eu já desconfiava que o salvador de vocês se escondia num desses seres.
-Me usou para caçar o centauro? – Trowa estava trêmulo.
-Foi tão simples. Eu a devorei e depois simulei as pegadas do centauro... Você foi um idiota fácil demais para... – o conquistador, não conseguiu falar, Trowa havia partido para cima dele, mas o que ele poderia fazer contra um ser tão poderoso?
Talvez na ânsia por vingar o sangue de sua inocente irmã ele nem tenha se dado conta que ao correr na direção do conquistador, havia corrido na direção a morte.
Foi rápido e talvez indolor para o bravo e digno caçador. Ele não chegou a tocar o corpo feminino do conquistador, explodira no ar, como consumido por dentro por alguma força.
-Não! – Ávila gritou. Todos haviam sido mortos... Por um sonho. Ninguém podia fazer mais nada a não ser Heero. O guerreiro correu na direção da mulher loira. –Está nas suas mãos, Heero! – ele gritou antes de ter o mesmo destino de Trowa. Sumindo no ar numa explosão.
-Tolos... Os sentimentos de você os destruíram. – a bela mulher falou com pena. Seus dedos finos se fecharam contra a flecha em suas mãos. –Talvez impor dor a humano faça o poder do centauro surgir. – ela voou subindo veloz para o topo da imensa montanha.
Duo foi jogado aos pés de Heero. O centauro estava preso.
-Duo, me solta! – Yui gritou.
Sem pensar Duo tentou desesperado romper as correntes que prendiam as patas e pulsos do outro, mas era magia que o prendia.
O conquistador surgiu bem atrás dele, sempre com aquele sorriso nos lábios.
-Duo! – Yui tentou avisá-lo, mas foi inútil.
O humano não teve tempo de processar os fatos, a mulher atrás de si se moveu tão rápida, como um feixe de luz o segurando muito forte pelos fartos cabelos.
-Agora, liberte-o. – ela exigiu afundando a flecha de Trowa no ombro esquerdo de Duo.
-Ahhh! – ele gritou com a dor de suas carnes sendo rasgadas.
-Deixe-o em paz! – Heero gritou vendo Duo sofrer nas mãos daquela mulher. Mas o que ele podia fazer? Estava amarrado.
-Heero! – tão apavorado o humano gemia com seus olhos cheios de lágrimas. – Que está havendo? Quem é essa mulher?
-Eu vou lhe mostrar quem sou eu, Pequena Ametista. – ela falou abrindo com fúria o paletó e camisa do uniforme dele deixando a mostra à pele alva. – Guarde bem... Meu nome, jóia. – ela gemeu baixo tocando o pescoço morno e macio de Duo com seus dedos.
A mulher o havia tocado. Os olhos violetas de Duo saltaram em dor, giraram sem órbita. Sem controle o corpo humano do rapaz passou a tremer de forma compulsiva. As imagens corriam sua cabeça, lhe deixando as mais cruciais sensações. Aquela coisa já havia varrido tantos mundos, tantos universos... Duo era pequeno para entender algo praticamente infinito. Seu corpo não estava pronto para isso... Nas mãos dela ele estava conhecendo tantas estranhas sensações que como um humano jamais saberia que existia, era demais, seu corpo estava beirando o limite.
-Duoo! – Heero observava espantado. Duo estava preste a sucumbir.
Seu corpo estava em colapso e ele passou a sangrar. Pelo nariz, boca, qualquer cavidade... Estava tendo uma convulsão...
-Heero... – o menino gemeu num esforço derradeiro. Mas Heero não deixaria que ele se fosse, nunca.
-Não! – Yui gritou em fúria e esse grito pareceu libertar as amarras que prendia sua alma, as barreiras que cercavam seu poder infinito. E quando ele abriu os olhos estava livre.
-Duo. – o centauro deu um passo à frente. O pequeno humano estava no chão, aos pés do conquistador.
Eles se estudaram por um tempo. Medindo forças. Os frios olhos azuis turquesa contra os azuis amenos da mulher. Mas Yui estava furioso demais. Fechando os punhos com raiva ele usou uma força que não sabia que tinha para jogar aquela loira longe, a fazendo cair num baque seco contra as pedras.
-H-Heero – Duo gemeu... A ametista estava brilhando quando o centauro abaixou junto ao humano lhe arrancando a flecha com pesar e dor.
-Idiota! Liberte seu poder... – a mulher gemeu se levantando. –Eu quero todo o seu poder, não foi para isso que viajei tantos mundos! – ela berrou com raiva. Havia descoberto que para Heero Yui a coisa mais importante agora era Duo e se o ameaçasse talvez, para defender o amado, Yui pudesse se libertar de uma vez por todas. –Eu quero... Esse poder ela ergueu os braços a terra tremeu violentamente.
-Meu Deus! – Duo abraçou com força o centauro.
-Que todos os elementos venham a mim! – a criatura gritou. Sua forma feminina envolta em poder foi se tornando uma espécie de demônio, desconcertado ao caminhar. O olhar furioso completamente branco encerrado numa pele grossa e negra. –Eu vou matar esse planeja. Vou sugar essa magia. – a criatura bateu as asas medonhas voando como um jato na direção de Heero e Duo.
A colisão não aconteceu. Duo fechou os olhos com força. A pedra pendurada em seu pescoço voltou a funcionar, como se estando perto de Heero aquele poder se intensificasse. Brilhou com intensidade e ele a tocou. O mundo girou veloz ao redor deles e os dois voaram nos ares sumindo. Pura mágica.
-Maldição... Fugiram. – aquilo que agora mais lembrava um demônio girou a cabeça chifruda apanhando a flecha com o sangue da ametista. A estranha criatura arrastou as garras ao chão voado desconcertada em seguida. –Sei onde estão, não iam longe. – com uma torrente violenta a criatura voava, levando consigo o que encontrava pela frente, deixando um rastro de destruição. As florestas pela qual passavam se consumiam em fogo e explosões.
O poder da ametista não os levou muito longe e agora que o conquistador dos mundos havia se instalado naquele planeta mágico, não havia lugar para se esconder.
-Abra os olhos. – Heero pediu a Duo. Estavam viajando rápido por alguma estranha dimensão. O humano não sabia aonde iam parar... Nunca tinha o controle sobre isso, mas agora abraçado ao centauro ele sentia-se tão seguro, como uma ave migratória que finalmente consegue achar seu lugar... A volta para casa.
-Heero... Eu sonhei com você... Não quero me separar nunca...
-Ametista, me liberte. – ele pediu abraçado a Duo. Seus olhos azuis encerrados nos violetas do humano. Tão certos e fortes e seguros e apaixonados.
-Eu... Amo você. Heero. – Duo falou sendo guiado para junto do rosto de Heero e como no seu sonho eles se beijaram.
Foi como se por aquele breve momento o mundo pudesse parar. O tufão a sua volta se silenciou. O beijo foi longo, quente e úmido e gostoso. Tantas sensações verdadeiras... Uma pessoa podia passar a vida toda esperando por algo como aquilo e se sentir satisfeita com aquele breve momento. Tão puro e forte e real.
Heero sentiu-se leve com o toque daquela língua quente dentro de sua boca. Era como se fogos de artifícios tivessem explodido dentro de seu estômago. Ele abriu os olhos completamente estarrecido. Havia vivido o melhor momento de sua vida, era fato. Duo era macio e quente, era um companheiro para sua jornada solitária. O amigo que descobrira.
Teria se entregado aquele momento. Queria fazer amor com Duo, mas não podia, não enquanto a ameaça do conquistador pairasse sobre suas cabeças e agora Yui entendia que tinha que salvar seu mundo, salvar seu amor.
Ele apertou a cintura de Duo com força separando seus lábios. Por um breve momento se olharam. Cada um vitorioso com o gosto do beijo na boca.
-Aqui! – Heero gritou quando viu passar uma porta. Ia levá-lo exatamente onde queria e Duo apenas se deixou levar. Agora Yui sabia o que fazia, afinal ele agora, conhecia aquele lugar como se fosse a palma da própria mão.
O humano se apertou mais ainda ao salvador, era seguro ali junto dele. Estava tão fraco e ferido. Ele fechou os olhos se entregando a Yui de bom grado.
Eles surgiram no ar flutuando, girando lentamente até chegarem ao chão.
Quando os pés de Duo tocaram a terra firme após ele rodopiar pelos ares abraçado ao peito de Heero ele olhou em volta, estavam no templo.
-Estamos na minha casa... – Yui falou firme o soltando.
O humano piscou sem dizer palavras, talvez estivesse tão admirado que não conseguia se pronunciar. Heero caminhava sobre duas pernas... Era um humano? Onde estava o centauro.
Ele caminhou de forma imponente. Agora vestia um mande trabalhado e elegante. Ao seu passar as ruínas iam se tornando em belas instalações. Era como se o tempo e o descuido nunca tivessem atuado por ali. Na verdade era a magia que restaurava o lugar.
-Minha magia sempre manteve esse planeta todo... Esse templo. – Yui falou parando no meio do salão principal notando as paredes, tudo a seu redor se modificar. –Uma vez que estive tanto tempo preso. Tudo ficou por estar... – ele completou.
-Você... Não era um centauro.
-Era apenas uma prisão. Somente um ser como um centauro podia segurar tamanho poder... Era pura magia de contenção, Duo. Mas você me libertou por completo quando... Quando me fez entender que a única magia que move o mundo, todos os mundos. O meu mundo o seu mundo... É o amor. – ele se virou para o rapaz.
-Heero... – aqueles olhos grandes do jovem piscaram úmidos. Ele sabia disso. O amor era a única coisa capaz de fazer mundo e pessoas melhores.
-Eu amo você, Ametista. E você se sacrificou tanto por mim. Foi mandado para o mundo dos humanos, para se esconder, sofreu tanto lá. Sendo incompreendido, mas agora jamais iremos nos separar... Eu prometo. – Heero estava belo e confiante.
-Heero. – uma lágrima caiu rolando pelo rosto do rapaz de longa trança.
-Duo, Ametista. A chave dos mundos. Aceita se casar comigo? – Heero se aproximou estando realmente emocionado. Talvez não fosse uma boa hora para um pedido de casamento, mas era urgente demais, ele tinha que se certificar que valeria apena lutar contra o conquistador, venceria por Duo. – Aceita? Se casar e ser feliz para sempre, como nos contos de fadas dos humanos?
-Aceito. – Duo sorriu o abraçando, mas seus lábios não chegaram a seu tocar. Uma explosão fez o templo tremer. Pelo teto irrompeu o estranho demônio.
-A faceta mais horrenda do conquistador. – Heero gemeu passando Duo para trás de si, o protegendo com seu corpo.
-Vejo... Que se libertou. Quanto tempo esperava por isso... E se eu soubesse que você só estava precisando tirar o atraso... – o demônio se moveu daquela forma estranha, desengonçada, ameaçadora.
-Cale essa boca, seu feioso. Respeite a minha casa, o meu mundo. – Heero falou.
-Vim aqui tomar seu mundo.
-Não vai levar nada daqui. – Heero gemeu frio quando uma bola de energia o acertou, e ele foi jogado contra uma das paredes do templo com força. A criatura se moveu rapidamente o golpeando e o tirando do caminho.
-Ainda é pouco. Tem muito mais poder para ser libertado. – o demônio falou quando ergueu Duo pelo pescoço. O garoto era a chave que libertava o poder de Heero.
-Duo... – Yui teria tentado livrar o humano, mas sua passagem foi interrompida por labaredas de fogo o fazendo recuar um passo atrás. Mas ele era o "dono" daquele lugar. Dominava qualquer coisa que fosse criada ali dentro. Fechando os olhos o fogo de apagou sob seu julgo.
-É tão pouco. – o demônio gritou girando com força chocando o corpo de Duo contra a parede.
Foi com assombro que Yui viu a mancha de sangue deixada pelo corpo do humano quando esse escorregou inanimado para o chão.
-Não! – a dor que sentiu de ver sua linda criança humana ser machucada daquela forma, de uma forma que o corpo frágil jamais podia suportar arrebatou seu coração. A raiva o cegou ele se viu tomado por uma força esplendida. Fora de qualquer limite.
Não havia palavras... Heero correu para cima do demônio e os dois mediram forças. Num choque violento.
As mãos entrelaçadas mediam forças, raios e choques de energia sobravam para todos os lados. Os olhos de Heero foram sendo tomados de um azul turquesa. A cor viva foi dominando todo o seu globo ocular e ele tremeu ligeiramente trincando os dentes, as imagens de Duo percorrendo sua cabeça... Duo... Sangrando... Sofrendo... Sorrindo lindamente como só ele conseguia fazer.
As mãos de Yui se fecharam sobre as do demônio as esmagando com raiva.
-Finalmente o poder supremo se levanta... – o demônio gemeu. –Eu estou perdendo... Era certo que estava sendo derrotado. Yui estava usando toda sua força contra o demônio que usara tocar na sua pessoa amada.
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O mundo mágico entrou em parafuso. Os elementos sendo mexidos... As florestas sendo engolidas por terremotos, as vilas lambidas por maremotos gigantes e línguas de fogo escapando dos vulcões.
Era como se aquele mundo pudesse sentir o mesmo que Heero. E nesse momento ele sentia uma raiva incontida.
Ele girou o corpo arremessando para cima o demônio. O conquistador se viu voando contra as paredes subindo destruindo o teto.
-Morra! – Heero gritou erguendo as mãos para o corpo alado que vinha agora contra o chão e alguma coisa como uma explosão estourou o corpo da criatura nos ares.
Cansado demais... Heero se ajoelhou. Lá fora a fúria pareceu se amainar um pouco.
-Duo... – ele se arrastou até o corpo do humano. –Fala comigo. Lembra que eu te pedi em casamento? Você aceitou... Não pode ir embora sem ser meu... – lágrimas brotaram dos olhos azuis de Heero. Lá fora o tempo se fechou, assim como o estado emocional que estava habitando Yui nesse momento. A chuva passou a cair pesada, assim que suas lágrimas passaram a escorrer.
-Eu... Já sou seu, Heero. – Duo abriu os olhos sorrindo.
-Duo. – um sopro de alivio tomou o salvador.
-Faça nascer um Sol lá fora. – Duo gemeu sorrindo. Eu vou ficar bem. – Completou.
-Um Sol?
-Uhum... O Sol no mundo dos humanos simboliza, entre outras coisas a esperança. –Duo sorriu tocando o rosto de Yui.
-Esperança. No nosso futuro? – Heero sorriu.
-Sim... Nosso amor inabalável e eterno. – Duo completou.
-Seremos felizes, Duo. Eu lhe prometi isso. – Heero sorriu ajudando o jovem a se sentar. –Eu amo, você, Ametista. – ele falou emocionado.
Os raios de Sol nasceram quando o céu se abriu na alegria do dia.
Do outro lado caída ao chão estava a mulher bela. A loira vestida com o mesmo vestido de Escarlate se ergueu, mas o vestido estava luminoso agora... Todos os brilhos no seu devido lugar. Heero estava agora em sintonia plena com seu mundo. Tudo estava equilibrado e harmonioso.
-Perdi. Minha faceta mais horrenda foi facilmente derrotada. – ela gemeu. –Ele é o ser mais forte que já conheci. É arriscado deixá-lo vivo, mas uma vez que não posso matá-lo, vou encerrá-lo novamente na prisão... – seus poderes arrastaram a flecha suja com o sangue de Duo até ela. – Tanto trabalho para libertá-lo, mas precisa ser mantido sob controle para o bem do universo.
De pé ela apontou como se segurasse um arco invisível na direção do casal distraído.
-Adeus...
-Heero! – Duo ainda teve tempo de gritar antes que o disparo se aproximasse.
Talvez o sonho de felicidade não pudesse existir para os dois, embora tivesse se prometido que seriam muito felizes. E talvez até o fossem, mas em mundos separados.
Duo não pensou. Ele amava Heero muito. Sem pensar empurrou Yui se jogando na frente dele, recebendo o golpe.
A ametista que ele trazia no pescoço foi atingida quando a flecha se enterrou em seu peito, desfragmentando a jóia em minúsculas partes.
-Nãaoo! – Heero gritou.
-De fato perdi... – a moça loira sumiu no ar, deixando apenas o vestido brilhante.
O conquistador dos mundos tinha muitas faces. Nesse dia ele perdera duas vezes para Heero Yui. Como a face mais horrenda e como a face mais bela... Assim decidira partir para outros mundos, havia tantos ainda para serem conquistados, e ele sabia que enquanto o ser chamado Heero Yui fosse vivo jamais se apossaria daquele mundo.
-Duo. – Heero desesperado observou a vida sendo sugada do menino em seus braços.
-Eu... Sinto muito. – Duo gemeu fraco.
-Não. – Porque diabos Yui não conseguia curar o garoto que amava? Afinal ele podia tudo, ou não?
-No mundo de onde vim... ahhh... – o jovem tossiu.
-Não fale.
-O sacrifício é a maior prova de amor que alguém... Pode dar a... Outra pessoa. –Duo estava chorando. –Eu amei muito você. Muito mesmo.
-Eu também...
-Adeus... – Os olhos violetas perderam vida...
Heero sentiu seu coração parar naquele momento. O corpo de Duo foi perdendo a consistência até se tornar uma pequena luz e sumir no ar...
Heero chorou. Assim como seu planeta chorou.
Mas Duo havia deixado tantas coisas boas. Heero havia tido em um momento, quando o beijou a maior felicidade do mundo... Isso valia apena. Por tudo. Ele havia beijado a pessoa que amava.
Ele por isso, por saber que foi amado com todas as forças que alguém consegue fazer tinha força para seguir em frente, certo do pensamento que um sai ele e Duos se veriam novamente.
Assim acabou a ametista. Trancando para sempre a porta entre o mundo dos humanos e o mundo mágico de Heero Yui.
Um ano depois
Um homem estava sentando numa poltrona ao lado de um leito. Seu semblante era cansado, quase desgastado. Ele esteve ali todos os fins semana, observando o jovem adormecido na cama.
-Senhor Maxwell. – a enfermeira entrou no quarto. –O senhor não acha melhor ir para casa... E voltar amanhã? Seu filho vai estar bem.
-Hoje faz um ano, que ele desmaiou quando foi para aquela excussão no museu. Desde então nunca mais vi os olhos dele... Tem uma cor linda. – O homem falou triste.
Ele se levantou hesitante como que se esperando um milagre.
-O jovem Duo é mesmo muito belo. – ela sorriu.
Um ano depois o milagre acontecia. Duo estava na cama... Mas seu pensamento estava longe, em outro lugar. Ele se levantou de subido, assustado.
-Duo! – O pai transbordou em alegria.
-Pai! – Duo o abraçou com força, feliz.
-Filho...
-Pai... E o Heero?
-Quem?
Duo se calou. O pai não sabia quem era Heero Yui. Mas Duo sorriu. Ele sabia que Heero havia arranjado uma forma de viajar até seu mundo humano... Eles se encontrariam em breve. Quando menos esperasse. O jovem Duo sorriu feliz.
Beijinhos,
Hina
