AVISO: Esta autora de forma alguma compactua ou faz apologia ao uso de qualquer droga/poção alucinógena.
Apesar da ausência de comentário (tsk tsk tsk), atingimos um bom tráfego de visitas no site, cerca de 5mil visualizações no fanfiction net! Então para comemorar, e incentivá-los, aqui vai mais um capítulo.
II – Got to Get You Into My Life
A primeira coisa que Snape percebeu assim que apareceu na lareira da Ala Hospitalar, foram os gritos, e por um segundo ficou atordoado, pois lembravam Belatriz quando estava inspirada durante as sessões de tortura. Rapidamente ele se encaminhou para a única cama rodeada por um biombo, o lampião fazia as sombras das pessoas saltarem ao redor. Quando ele afastou as cortinas, e olhou para a mulher deitada sob a cama, ninguém poderia julgá-lo por não a reconhecer imediatamente, os gritos, as pessoas falando, o cheiro... tudo isso o estava deixando um pouco confuso. Além disso, ela não parecia em nada com a Hermione Granger que estampava cada centímetro dos cadernos de Melissa.
O corpo pálido, sujo, emagrecido e nu, convulsionava enquanto ela tentava se desprender das amarras mágicas. Os ossos se destacavam em cada pequeno lugar onde deveria haver uma curva, a pele dos quadris parecia tão fina e repuxada, que Snape se surpreendeu por não ter nenhum osso exposto. Os cabelos estavam sujos e desgrenhados, com alguma substância pegajosa que Snape preferia não saber a origem. A boca manchada de batom vermelho naquela figura decadente não parecia certo, mas foi quando ele observou os olhos sem vida, com pupilas dilatadas que ele reconheceu o que estava acontecendo.
- ME SOLTEM! EU SOU A PORRA DA HERMIONE GRANGER! VÃO TODOS SE FUDER! DEIXE-ME VOLTAR! EU SÓ PRECISO DE ALGUM DINHEIRO! - ela se debatia ferozmente, demonstrando uma força que seu corpo parecia não possuir – POR FAVOR, HARRY! ME SOLTE! - ela pediu com uma voz infantil - CARALHO, EU PRECISO DA POÇÃO... VOCÊ NÃO ENTENDE!
- Severo – chamou Dumbledore, tirando-o do transe, seus olhos demorando a se deslocar da mulher a sua frente - Você sabe como ajudar?
- Oh, Professor – ela fingiu se acalmar, seus olhos mirando no vazio enquanto sua língua umedecendo os lábios – O senhor veio me salvar?! O herói Negro, não é?! - ela gemeu - Se o senhor me soltar daqui, posso fazer o que quiser. Você parece precisar de uma boa foda...
Snape assentiu fracamente pra Dumbledore que junto com Harry e Madame Pomfrey, tentavam segurá-la, já que os feitiços de contenção pareciam não ser suficientes. Mais ao canto, ele viu dois aurores do ministério e Arthur Weasley com olhares completamente chocados. Ele agitou a varinha sobre o corpo nu, um feitiço cantando saiu dos seus lábios. Hermione soltou um grito agourento, o corpo frágil paralisou, para logo em seguida convulsionar vomitando ao redor grande quantidade de uma substância verde lama, como se tivesse derramado um caldeirão de poção polisuco no chão. Ela parou de convulsionar, seu peito subindo e descendo dolorosamente.
- Soltem-na - ninguém pareceu ouvir o seu murmúrio - VOCÊS NÃO À OUVIRAM, EU MANDEI SOLTAR! - Sua voz de barítono, assustou a todos e chamou a atenção de Hermione, fazendo os gritos pararem.
Com um Finite Incantatem, Snape rompeu os feitiços que a prendiam. Hermione se acalmou, quando os vômitos cessaram. Ela não se lembrava do que estava fazendo em Hogwarts, ou porque estava nua, mas Harry estava lá e isso apertou o seu peito. Hermione massageou os pulsos no lugar que as cordas invisíveis a atracavam, ela gostaria de perguntar em que dia estavam, mas sabia que isso só pioraria as coisas.
- Alvo, abra a rede de flú para a, Srta. Granger – disse Snape calmamente, completando quando o diretor olhou incerto - Você sabe que isso não funcionará se ela for forçada.
- E você - disse ele apontando para ela, retirando sua capa e entregando para cobri-la, os olhos dela agora pareciam um pouco mais com o tom de chocolate que ele se acostumou a ter o encarando constantemente enquanto a mão ficava erguida em suas aulas - Nós vamos ter uma conversa.
- Vai se foder! – Exclamou ela, Hermione arrancou a capa da mão dele cobrindo-se, procurando a varinha - Não sou a porra de uma estudante! Muito menos sua aluna. Você não pode me obrigar a ficar.
- Você pode ir então - ele murmurou calmamente.
- EU QUERO MINHA VARINHA! - Ela começou a revirar as coisas ao redor – ONDE VOCÊ COLOCOU MINHA VARINHA, ENTREGUE, AGORA! - Ela falou pela primeira vez olhando nos olhos de Harry.
- Sua varinha fica! - Snape interrompeu antes que Harry pudesse dizer qualquer coisa - Você conhece as leis não conhece?! Você até escreveu algumas delas, pelo que ouvi dizer, quando você tinha um emprego regular. É preciso apenas um feitiço simples! E você será banida do mundo bruxo, não haverá volta! É isso o que você quer?!
Snape viu o medo rapidamente no olhar dela, mas também viu resignação. E ele sabia que ela preferiria partir, que ela não se importava mais com nada disso.
- Rony não gostaria disso – falou Harry baixinho.
- NÃO FALE O NOME DELE – ela gritou, as lágrimas rapidamente ganhando seus olhos - NÃO FALE DO QUE VOCÊ NÃO SABE!
- Vamos fazer assim, Granger – disse Snape respirando fundo - Você fica, nós conversamos, se após isso você quiser ir. Ninguém irá impedi-la e eu entregarei sua varinha – completou sombrio - Eu mesmo irei garantir isso. A qualquer momento você poderá voltar para o buraco de onde saiu. Porém, aconselho a se esconder melhor na próxima vez, pois acredito que não haverá tolerância, e você estará entregue à própria sorte.
- Bem - ele disse quando ela assentiu concordando – Me espere lá fora!
Assim que ela saiu acompanhada de Pomona, Snape se voltou para as pessoas na sala, bradando furiosamente.
- Alguém pode explicar o que está acontecendo?!
- Desde quando? - Exigiu.
- Dois anos – respondeu Harry triste – Pensamos que era temporário, que ela estava estressada... O trabalho..., Rony..., os pais... sem contar as merdas da guerra... Ela começou a sair, e parecia tão divertida, tão mais leve. – Ele disse balançando a cabeça - Depois de um tempo, os finais de semana se transformaram em festas diárias, as festas noturnas em dias inteiros. E quando nos demos conta ela já não era ela...
- Conseguimos manter as pessoas longe disso... - começou Arthur Weasley - Mas agora está ficando cada vez mais difícil, cada maldito bruxo parece ter um celular... Antes ela pelo menos usava um feitiço para não ser reconhecida, ela entendia que era um símbolo. Mas as coisas estão fora de controle, Snape. Não temos alternativa, teremos que levá-la.
Snape bufou de forma deselegante, indignado. O ministério só estava preocupado com os tabloides e como isso arruinaria a imagem perfeita do trio de ouro.
- Esta é uma situação delicada, Severo - começou Dumbledore - Você sabe bem como são as leis são rígidas em relação ao uso recreativo de algumas poções. Eles não se importaram se ela é uma heroína, ela é uma ameaça real para o Estatuto Internacional do Sigilo... Eles vão quebrar a varinha dela, Severo...
- O que você quer de mim?
- Ela é uma bruxa brilhante, merece outra chance...
- Ela estava em um beco na Londres trouxa – disse Harry mortificado - Não parecia ela... Estava oferecendo sexo, em troca de algum dinheiro, ela lançou feitiço na frente dele...
Snape suspirou profundamente, ainda que não tivesse nenhuma simpatia por ela. O fato era, entre os alunos que teve, provavelmente Hermione Granger a que tinha mais potencial. Snape se voltou para Alvo, convidando-o para uma conversa em particular, quando estavam longe o suficiente de ouvidos curiosos, ele disse:
- Existem algumas poções, posso fazer...
- Não vai funcionar Severo... - disse Dumbledore – Por isso chamei você, ela está usando o Utrem Gaudium.
- Porra... - era uma poção rara e complexa criada para aprisionar bruxos e bruxas através dos séculos. Apenas algumas gostas fariam qualquer um implorar pela vida ou morte, desde que pudessem ter mais um pouco. Não é algo que você consegue em qualquer lugar, apenas alguns poucos mestres tinham a autorização de produzir para fins acadêmicos – Como ela conseguiu... ?!
- Ela mesma produz, Severo. Encontrou em um livro no Departamento de Mistérios – disse Dumbledore com um sorriso fraco no rosto – Mas depois que ela saiu do ministério, ficou mais difícil ter acesso aos ingredientes. Desde então, as coisas saíram do controle...
- Você sabe que não existe uma forma de cura – falou sério - Ainda que por um milagre ela consiga expelir tudo do organismo dela sem enlouquecer ou drenar o núcleo de magia, ela ainda teria o vício.
- Nós temos que tentar, nós precisamos.
- Alvo é altamente improvável...
- Você conseguiu! - Disse Dumbledore definitivo – Ela também merece uma chance.
- Se ela quiser...
- Se ela quiser – concordou o bruxo mais velho.
- Você a manterá em Hogwarts?! - Perguntou Snape.
- Acho improvável que o lugar onde a batalha final aconteceu, onde ela viveu os momentos mais felizes na infância, e a tristeza de perder tantos amigos seja o mais recomendado – Dumbledore o encarou - Você sabe que ela precisa se afastar...
- Você quer que eu à leve?! - Perguntou surpreso, quanto mais Dumbledore pediria a ele durante a vida?! Ele poderia ajudar, mas se imaginou como um visitante esporádico, ele não quer ter mais uma responsabilidade - Você pensou que agora eu tenho Melissa?
- Eles vão levá-la, Severo. Mesmo que ela consiga escapar, assim que ela sair daqui eles a caçarão como um animal – disse o velho bruxo preocupado – Arthur está aqui para tirá-la de uma vez por todas do mundo bruxo. Nós precisamos protegê-la. Sei que o que estou pedindo é demais – suspirou triste – Sempre é... Mas eu não vejo como isso poderia funcionar de outra forma. Ela estará vulnerável em qualquer outro lugar, você sabe disso! Você se mantém em um lugar tão protegido quanto Hogwarts, por conta disso! Você teme por quem você ama... Não podemos interná-la no ST. Mungus como se fosse uma virose...
- Eu não tenho como...
- Você tem uma casa auxiliar, use-a... Posso fornecer toda a ajuda que você precisa, podemos nos revezar, Harry, Remo, Ginevra, Minerva... eu. Você não estará sozinho.
- Você sabe que o processo não funciona dessa forma...
- Não vamos nos precipitar... - desconversou – Converse com ela e tome você também sua própria decisão.
- Deixe-nos, Pomona!
- Severus...
- Está tudo bem – acalmou-a, andando em direção a saída do castelo, parando no meio do corredor, apenas para perceber que Hermione não havia se movido – Venha, Srta. Não temos a noite toda!
- Aonde vamos... - ela começou a caminhar atrás dele, segurando a capa ao redor de si.
Eles caminharam pelo terreno da escola, e em poucos minutos estavam à margem do lago negro.
- Não me interessa o que você tem a oferec... - Hermione disse ainda ofegante, assim que eles pararam
- Me diga, Srta. Granger – disse Snape parecendo seriamente irritado – Como uma das supostas mentes mais brilhantes de Hogwarts, conseguiu fazer a proeza de se viciar em uma poção. Você não parece em nada com a grifinória que andou por esses corredores.
- Ora, seu...
- Você é uma decepção maior do que imaginei – interrompeu Snape – Seis anos na minha sala de aula, e você não aprendeu nada?! Eu esperaria tamanha burrice do Potter ou Weasley...
Snape mal terminou de pronunciar as palavras, quando sentiu o impacto da mão dela no rosto pálido.
- Aí está - ele escarneceu, um sorriso no rosto – O fogo dos leões.
- Eu não me interesso pelo que você pensa, Snape – cuspiu - Só aceitei vir aqui para poder me livrar de todos vocês.
- O feitiço que eu usei em você. Você o reconhece? - Ela assentiu - Já deve ter usado muitas vezes, não é?! Para se manter funcional durante o dia, claro, quando ainda se importava de aparentar alguma coisa – desdenhou – O uso prolongado, faz perder o efeito, então é mais fácil ficar dopado no vazio – ele apontou para o pescoço dela - Vi as marcas atrás do seu pescoço - referindo-se as linhas verdes brilhantes, fazendo-a levar a mão ao local instantaneamente – Só costumam aparecer com vários anos de uso, você sabe o que vem depois, as alucinações, a dor excruciante que vai fazer você desejar ter um novo encontro com Belatriz, até você perder completamente a sua mente. Você deve está utilizando o que? Duas gotas na semanal, diga-me Srta. Granger quão drogada você está?!
Ele estava tão próximo da realidade que a incomodou. Ela fez todos os cálculos, sabia que não poderia tomar mais de uma gota por mês. Uma gota seria suficiente, e ainda assim, a longo prazo isso a mataria, mas seus cálculos diziam que iria demorar ao menos alguns anos. Mas sempre parecia acontecer algo que a fazia tomar um pouquinho mais, um dia estressante, as lembranças... Os sonhos...
- Nos últimos meses, quase diariamente – confessou como um pecado.
Snape ficou atônito, aquilo era demais, até para ele. Era um milagre que ela ainda tivesse alguma sanidade.
- Não me admira que você tenha se oferecido para fuder comigo por uma dose.
- Eu ofereci não foi?! - Ela perguntou, um leve rubor subindo pelas bochechas.
- Sim!
- Não foi o meu momento mais brilhante – ela disse fazendo-o bufar.
- Como você não enlouqueceu?! – Perguntou seriamente curioso.
- Eu tento utilizar oclumência, mas tem se tornado cada vez mais difícil de manter. Eu nunca fui boa nisso de qualquer maneira... Isso me ajuda a bloquear as lembranças... - ela murmurou, as lágrimas ameaçando aparecer novamente.
- Deixe-me adivinhar... Seu grande amor... - ele debochou segurando os braços dela antes que lhe alcançassem - Você realmente acha que foi a primeira pessoa que perdeu alguém que ama?! Todos perderam na guerra, Granger. O filho de Lupin não terá pais, Molly Weasley não terá a mesa cheia, os pais de Lila Brown não terão mais a filha... Todos levamos vazios...
- Você não tem mais a Lilian – ela completou corajosamente sendo ignorada.
- Todos perderam alguém, o mundo não gira ao redor da sua dor, ela não é maior que a dor de ninguém - ele explicou calmamente, soltando-a – Diferente, porém não maior. Tem várias formas de lidar com a perda, Srta. Granger, e você escolheu a pior delas.
- Eu deveria me tornar um sarcástico professor de poções que odeia o que faz? - Ela perguntou, seus braços cruzados sobre o peito.
- Se você quiser – disse ele para descontentamento dela – A questão é que a poção rouba seu poder de escolha. Então nem isso você poderá ser! Você não poderá escolher entre ser a heroína do mundo bruxo, ou uma mulher que pula de cama em cama, professora ou uma indizível. Você poderia ficar no reino unido ou aparatar para a américa. Jogar quadribol, ou fazer a merda de uma horta, não importa. Só importa o que você quer. Eu não vou ficar aqui tentando te convencer a lutar – disse Snape sério - Você age como se não tivesse ninguém, mas Potter, Dumbledore, McGonagal, Pomfrey, todos correram para lutar por você. Mas ninguém pode obrigá-la, você tem que quer lutar! Então vou te perguntar mais uma vez! O que você quer?!
O que ela queria afinal? Quando as linhas verdes apareceram, Hermione sabia que não haveria volta a partir dali. E depois disso ela não se deu mais ao luxo de pensar no amanhã, ela só queria mergulhar na sensação de plenitude que a poção trazia, planar na ausência da dor... ser carregada nas asas do nada. Claro que houve alguns pouco momentos de arrependimento. Quando o primeiro traço no pescoço apareceu, ela lembra de ter chorado, mas do que adiantaria?
- Você sabe tão bem quanto eu que isso é irreversível – disse ela – Minhas escolhas já não importam, se os meus dias estão contados.
- Eu criei um protocolo. A algum tempo atrás eu tratei um jovem com um caso parecido com o seu – disse Snape – Ele também achava que não tinha mais nada pelo que viver, os efeitos estavam um pouco menos avançados que em você. Por isso Dumbledore me chamou hoje! Você tem uma chance, Srta. Granger.
- A pessoa sobreviveu?! - Ela perguntou, e Snape pareceu ter visto esperança nos olhos dela.
- Sim, Srta. Granger – ele continuou sério - Foi um processo lento, angustiante, doloroso. Me recordo dele pedir para morrer várias vezes. A dor, a vontade de provar mais uma gota... Mas ele passou por isso... Será um processo doloroso, você pode morrer, pode enlouquecer, pode esgotar sua magia... Mas se você sobreviver, você poderá fazer o que quiser.
- Ele está bem? - Perguntou cética.
- Não tive mais notícias - disse Snape – Mas Dumbledore sempre vai visitá-lo e diz que ele parece feliz. Mas essa é a história dele, qual será a sua?! Você quer mesmo ser expulsa do mundo que você lutou para fazer parte, que você deu o seu melhor para mostrar que merecia?! Você quer deixar seus amigos para trás?! Você está pronta para renunciar tudo isso? Porque os aurores querem levar você! Você estava em um bar trouxa, oferecendo seus serviços, varinha sendo usada, tiveram que obliviterar várias pessoas! Você está colocando em segredo o mundo que vocês três protegeram com suas vidas.
Hermione ficou em silêncio. A tempos ela não sentia a dor de cabeça da sobriedade. Era como se um véu tivesse sido arrancado dos seus olhos, mas ela queria isso?! O mesmo véu que a cegava frente ao mundo a protegia da dor e solidão. Ela queria rasgá-lo definitivamente.
- Estou cansado! - Suspirou Snape observando-a - Há uma pequena janela de oportunidade aqui, Granger! Você não tem muito tempo. – Ele se virou para ir embora - Pense nisso! Estarei esperando você e sua resposta na sala do diretor. E Srta. Granger... - ele chamou, fazendo-a olhar imediatamente - Tome um banho, seu cheiro é repulsivo.
Ela assentiu, vendo-o caminhar de volta para o castelo, deixando-a para trás absorta em pensamentos.
Hermione olhou por uma das grandes janelas, a noite estava alta, e já descia para a sua despedida em direção ao horizonte. Ela puxou a capa ao redor do corpo, fazia anos que ela não voltava a Hogwarts, as lembranças eram dolorosas demais, por isso que ela recusou a vaga de Aprendiz em Transfiguração. Era estranho andar pelos corredores, como se nada houvesse mudado. Mas tudo mudou! A poção lhe entorpecia a mente, e estar lúcida naquele lugar era doloroso.
Pensar naquilo estava dando vontade de chorar novamente, algo dentro dela se agitou, ela precisava apenas de uma gota de poção, e não precisaria mais se preocupar ou sentir nada. Ela não precisava de ninguém, no dia do enterro do pai, ela prometeu que nunca mais se aproximaria de ninguém. Porque todos que ela amava nunca ficavam na vida dela. Ela não aguentaria sentir que perdeu tudo de novo.
Seus pés lhe guiaram pelos caminhos tão conhecidos, e ela não pôde deixar de rir quando estava à frente do banheiro dos monitores, ela não sabia a senha, mas os seus lábios pronunciaram aquilo que sentiu assim que conversou com Snape:
- Esperança.
- Seja bem-vinda de volta, Srta. Granger – cumprimentou a sereia da Tapeçaria, deixando-a passar.
Hermione entrou no ambiente tão conhecido, quantas vezes relaxara naquela piscina de espuma! Logo após a batalha final, ela e Rony correram até lá... e... Hermione cortou aquela linha de pensamento, lembrar dele era doloroso. Ela caminhou até o meio da sala e deixou a capa de Snape escorregar pelo corpo nu. A frente dela um espelho enorme, a moldura em bronze torcido em arabescos, ela caminhou até ele, seus olhos fixos no reflexo a sua frente, Hermione ergueu as mãos como se tentasse tocar a si mesmo.
Fazia um bom tempo que ela não se olhava assim, ela não lembrava de ser tão magra, sua pele machucada em mais locais que ela poderia contar, algumas cicatrizes da guerra, e outras tão mais recentes... Onde ela adquirira a marca na coxa que era semelhante ao corte feito por faca? Seus seios apresentavam marcas arroxeadas que pareciam ter sido feitas pela boca de alguém. Com quem ela esteve? O que fizeram com ela? O que ela permitiu fazerem com ela? OS cabelos estavam torcidos em um nó que provavelmente nunca mais seria desfeito, os fios espetados e ressecados, estavam presos em um emaranhado de sujeira. A imagem que o espelho refletia, não lhe lembrava ninguém que ela conhecia. Ela se sentia suja!
Quem era aquela mulher magra e machucada? Que horror tirou o brilho dos olhos dela, que agora eram ressaltados pela olheira profunda! Ela tocou nos lábios ásperos e ressecados, sua mão deslizou pelo seu rosto. Ela não se reconhecia! Ela não era mais a estudante de Hogwarts sedenta por se provar, mas também não era aquele corpo sem alma. Ela nem percebeu que as lágrimas desciam fartamente pelo rosto, enquanto os soluços ecoavam, logo a tristeza deu lugar a raiva fazendo-a soltar um grito de angústia. Hermione pegou um dos frascos próximo a ela e jogou de encontro ao espelho, fazendo-o estilhaçar. Ela se ajoelhou impotente, pequenos cacos espelhados espetando a pele já machucada, o que ela fez?! Ela não pediu para estar naquele lugar – seus braços se fecharam ao redor de si mesma – ela só queria sair dali. Está em Hogwarts era uma lembrança constante de tudo o que perdeu. Aos poucos os soluços foram silenciando, uma nova onda de náusea, fez ela vomitar o conteúdo inexistente do estômago.
Era naqueles momentos – cada vez mais raros – de lucidez, que Hermione queria lutar! Queria recuperar um pouco do controle da sua vida. Ela as vezes sentia falta do emprego no ministério, dos natais da toca, das noites calmas com um livro e uma xícara de chá. Uma minúscula parte dela se perguntava se ela poderia ter isso tudo de volta. A outra parte, sabia que o caminho era sem volta! Que a partir do momento que ela tomou a poção seu destino estava selado. Ela lembra de estar procurando algo que pudesse ajudar a esquecer e parar de sentir, a poção de Sono sem sonhos já não fazia mais efeito. E não era raro a noite que ela acordava gritando sozinha em casa. Então estava lá, a receita da Utrem Gardium, tão perfeita para o seu propósito! Não era isso que ela queria? Um Frasco de Alegria! Queria se sentir como os outros. Você precisa superar, Hermione.. Eles lhe diziam, e naquele momento ela achou que podia ter encontrado a saída! Ela não era idiota, sabia que iria morrer, mas ela queria morrer? Ou só queria que a dor passasse? Snape, havia dito que poderia ter uma chance! Uma mínima chance...
E gora ela estava ali, humilhada mais uma vez! Ela pensou que poderia controlar os impulsos, ela era inteligente, forte... Ela se precaveu de tantas formas, e ainda assim ela estava em Hogwarts, mais uma vez resgatada por Harry. Quando ele falou que Rony não iria querer que ela saísse do mundo bruxo, ela sentiu a dor da verdade lhe atingir. Ele queria que ela fosse diferente.
- Tenha uma vida extraordinária. Eu te amo – ela murmurou para si mesma, lembrando das palavras que Rony falou para ela ao se despedir.
Enquanto mergulhava na água quente, ela pensou que naquele momento não parecia nada extraordinária.
Sua cabeça girava cheia de pedaços de memórias desconexos, a lucidez, os flashes de memória, estavam começando a lhe dar dor de cabeça. Quando a água quente da torneira escorreu pelo corpo, ela involuntariamente suspirou e relaxou. Se viu transportada de volta para o quinto ano, e mesmo sem perceber brincou com a espuma multicolorida, e logo uma miscelânea de cheiros tomou conta do ambiente. Ela se esfregou meticulosamente, a esponja áspera de encontro a grossa camada de sujeira. Não foi possível fazer muito sobre o cabelo, ela o desembaraçou o melhor que pode, sabendo que seria uma batalha perdida.
Sua mente abençoadamente quieta, enquanto se enxugava com a toalha imaculadamente branca, e torcia o cabelo em um coque no topo da cabeça. Ela enrolou o corpo com o tecido felpudo, os dedos levemente trêmulos seguraram a capa de Snape, um tecido fino que tinha um cheiro marcante de sândalo que se destacava do restante. Quando ela terminou de fechar a fileira interminável de botões com os dedos trêmulos, Hermione Granger gostaria de ter o espelho de volta, pois ela a um longo tempo não se sentia tão como ela – o que quer que isso significasse – como naquele momento.
- Pensei que sua presença aqui ministro, era para estender a mão a uma amiga da sua família - disse Snape furioso – Dessa forma, sugiro que você leve os aurores!
- Nós não podemos...
- Sim. Você pode, e você vai – disse Snape o sangue em suas veias se agitando, já estavam nessa discussão a algum tempo e isto o estava irritando – Eu prometi a ela, não importa o desfecho da conversa, ela sairá daqui livre. Sua presença não é necessária.
- Ela tem que vir...
- Ela não vai a lugar nenhum... – Snape continuou, o tom de ameaça tomando conta da sua voz – Ela é a porra da Hermione Granger, você quer uma manchete no profeta falando em como o Ministério da Magia usa a imagem dos seus heróis e depois descarta?!
- Severo... - Arthur tentou apaziguar, eles não precisavam de mais escândalo. Óbvio que ele se preocupava com Hermione, ela era família. Mas havia normas a serem seguidas! - Você entende?! Ela não tem condições de ficar livre sozinha... Ela precisa de acompanhamento e supervisão.
- A merda da Ordem inteira pode tomar conta dela – disse Snape, olhou ao redor esperando Harry Potter e o seu complexo de herói salvá-la, mas ele sabia que o menino-que-sobreviveu-irritante-vezes não poderia ajudá-la de verdade.
- Mas nós temos protocolos a seguir, Dumbledore...
Quando retornou pelo corredor de pedra em direção ao escritório do diretor, seus passos ecoavam e os primeiros raios do amanhecer banhavam o castelo. Hermione estava decidida que mudaria de vida, e que se aquilo significasse a perda da sua varinha ela aceitaria resignada.
Ela podia sentir o suor se formando na testa – ela não se lembrava de ter dito a senha à gárgula - a coragem grifinória parecia distante agora. Sua mente ecoava o que Rony havia lhe dito.
Seja extraordinária...
O tremor das mãos estava aumentando – a escada subia em espiral – sua respiração começou a ficar descompassada.
Seja extraordinária...
Eles aumentariam até que ela estivesse fora de si – havia vozes dentro da sala do diretor – A garganta estranhamente seca.
Seja extraordinária...
Ela gritaria por um pouco mais de poção.
Seja extraordinária...
E quando as gotas encostassem nos seus lábios, ela pararia de sentir – a porta pesada se abriu, lá dentro todos pareciam alterados.
Seja extraordinária...
E seu mundo se resumiria ao vazio glorioso da inexistência.
Seja extraordinária!
- Mas nós temos protocolos a seguir, Dumbledore...
- Você quer falar de protocolo, Arthur?! - Vociferou Snape, seus dedos apontando para o rosto do Sr. Weasley, exasperado. Snape não sabia por que estava assim! Mentira, ele sabia muito bem... Ele sabia o que era achar que a poção era a última saída, a única forma. Ele não devia nada a ninguém, muito menos a ela, mas ele poderia ajudá-la, dar uma chance de encontrar seu próprio caminho. E quando as palavras saíram da sua boca, ele mal pode acreditar que as estava pronunciando - Então, eu Severus Snape, reivindico a curatela de Hermione Jean Granger!
Seja extraordinária!
- Eu quero –disse Hermione chamando a atenção de todos. Ela cumpriria a promessa que fez a Rony ou morreria tentando.
NA: O título desse capítulo faz referência a música composta e cantada pela banda trouxa The Beatles. Na época a letra foi relacionada a paixão por uma garota, mas alguns anos atrás Paul informou que na verdade era sobre o uso de maconha. Quem quiser pode dar um google!
Sobre o capítulo: Ele foi escrito em uma madrugada! E me sinto emocionalmente desgastada por tentar colocar em palavras esse tipo de sentimento! Não é raro nos sentirmos sozinhos e/ou deslocados, ansiosos, ou preocupados... Então particularmente pra mim, foi muito difícil tentar descrever! Essa fanfic em alguns aspectos também é uma jornada de autoconhecimento, creio que Hermione não é o tipo de pessoa que embarca em algo assim por acidente! Acho que ainda vamos descobrir muitas coisas! Mas no momento ela só quer falar isso! Enfim, se você tem pensamentos ruins recorrentes, por favor! Saiba que existem pessoas que podem te ajudar!
Eu gostaria de saber sua opinião. Por favor comente!
