Título: Incógnito
Capítulo 2 – Entre Paredes
Certo... Nada era realmente normal... Nada, desde os sonhos até o seu estômago dando voltas. Harry abriu os olhos na manhã seguinte, corpo esticado na cama, e onde foi o pesadelo com Voldemort? Sim, substituído por um pesadelo com Draco Malfoy. E aquela dor insuportável na cicatriz? Seu estômago se revirava em – ansiedade?
Ergueu-se como se carregasse concreto nos ombros. Olhou ao redor e reparou que acordara mais cedo que os outros. Rony dormia pesadamente na cama do lado. Foi a passos vacilantes até o banheiro e lavou o rosto com bastante água enquanto tentava se lembrar do sonho, ou seria pesadelo? Não fazia a menor idéia, já que nada recordava a não ser a face pálida e imperativa de Malfoy e o seu estômago se contorcendo até a dor o despertar. Devia ter sido um pesadelo bem revoltante. Vestiu o uniforme sem pressa, estava mais que adiantado, calçou os sapatos e recolheu seus livros e pergaminhos. Tudo pronto, desceu para a Sala Comunal e encontrou Hermione sentada numa poltrona estudando o livro de Feitiços Antigos.
- Bom dia Harry, como passou a noite? – ela lhe lançara um longo e perscrutador olhar enquanto fechava o livro e o punha sobre o colo.
- Bom dia... Hum... Dormi bem, acho – tentou soar natural, mas estava meio que chocado, afinal, pelo que se lembrava, nunca sonhara com Malfoy antes.
- Acha? Quer me contar o que aconteceu? – ela insistiu amigavelmente.
- Não me recordo o que sonhei, só isso.
- Algo ruim?
- Não... Ou sim... Talvez... – a confusão de Harry fez Hermione sorrir e caminhar até o amigo, enlaçando seu braço de forma acolhedora.
- Fico mais aliviada em ouvi-lo falar assim, isso significa que não foi de todo ruim seu sonho.
Harry concordou com a cabeça e ambos seguiram ainda de braços dados até o Salão Principal. Ocuparam o lugar de sempre na mesa, e passaram a cumprimentar a todos, mas os olhos de Harry se focaram ao outro lado do salão, onde um loiro pra lá de esnobe dava sua entrada triunfante, o fazendo se lembrar de sua meta – arrancar à força o que houve naquela noite. E vendo Malfoy caminhar desinibido como em uma passarela de moda, capa negra deslizando com seus movimentos, e cada passos em linha reta, firme e decidido, cabelo com gel, fios domados e brilhantes sob os raios do sol daquela manhã, costas retas, ombros delineados e com o nariz alto o suficiente para intimidar qualquer um, o fez sentir a conhecida vontade de espancar, xingar e assassinar, que já estava acostumado desde o primeiro ano escolar. Seus olhos estreitaram ao notar Zabini entrando um passo atrás de Malfoy, não com a mesma postura é claro, e olhar em sua direção. Era impressão sua, ou a rincha passara de Draco Malfoy à Blaise Zabini? Estreitou os olhos quando o outro lhe confrontou mostrando o dedo médio sem nenhuma reserva e gesticulou com os lábios bem nitidamente um 'vai se ferrar, cretino'. Realmente, Malfoy poderia esperar, era melhor torturar e matar Zabini primeiro, e retribuiu o gesto da mesma forma dando um 'vá você idiota'.
- Harry! – Harry olhou para Hermione com um pouco de surpresa, ela estava a sua frente, e para foca-la precisou apenas desviar um pouco os olhos para o lado. – O que você está fazendo com esses... – tentou se expressar contrariada, mas só conseguiu revirar os braços. – Esses gestos e essas palavras sem som?
- Desculpe Mione, não era pra você... Foi... Foi chulo de minha parte.
Hermione olhou para trás ha tempo de ver Malfoy sentando ao lado de Pansy. Ela voltou os olhos para Harry que lhe deu um sorrisinho amarelo ainda se desculpando. – Entendo... Então ele voltou ao estado normal?
- Não... – incrivelmente para surpresa própria e de Hermione, sua voz soara triste. – Foi Zabini quem me provocou.
- Oh! – fez Granger tentando pensar. – Estranho...
- O que é estranho?
- Sei lá, Zabini costumava apenas rir e incrementar o que Malfoy falava para agredir, e nunca foi de começar os insultos.
Harry suspirou. – Ele não gosta de mim, eu sei, mas nunca foi de encrencar dessa forma, e quanto a Malfoy, nunca foi de me... Bem... Me ignorar, não sei se ignorar é a palavra certa, mas... Mas... Você me entendeu certo? – piscou algumas vezes enquanto esperava a confirmação da amiga.
- Entendo Harry... – ela garantiu.
Outro suspiro escapou da boca do rapaz de óculos, enquanto ele fitava o vazio. Rony havia chegado alguns minutos depois da conversa e devorava o café da manhã antes do início da primeira aula. Hermione o olhava de vez enquanto, erguendo os olhos de seu pergaminho. Estava terminando de acrescentar algumas anotações antes de entregar seu trabalho à professora McGonagall.
- Mione...
O chamado finalmente viera e ela ergueu a fronte rapidamente. – Sim Harry.
- Vamos ter aula com que Casa?
- Agora você quer dizer?
- Sim... – os olhos de Harry ainda permaneciam dispersos no espaço.
- Sonserina – Hermione notou a mudança de espírito. Harry se endireitara na cadeira e olhava para o outro lado do salão. – Sim Harry, com Malfoy e sua gangue.
- Vou arrancar dele tudo o que aconteceu aquela noite... – soou como um juramento para si mesmo.
- Melhor não fazer nada precipitado eu sugiro – ela tentou pôr um pouco de senso nas ações do amigo.
- Se precisar de ajuda Harry, pode contar comigo! – garantiu Rony com um sorrisinho.
Hermione ficou possessa. – Rony, não!
- Farei um plano, quero conversar com Malfoy sem a interferência dos amigos dele.
- Eu posso dar um jeito de despistar Crable e Goyle, afinal, eles não pensam muito mesmo. – Rony mal ouvira a namorada.
- Gente, não façam isso! – sussurrou apavorada. – Malfoy não está nos atazanando e isso é bom, por enquanto, melhor deixar assim e ver no que dá.
- Não consigo... Algo dentro de mim grita para tomar satisfações com ele – o olhar de Potter vibrou de entusiasmo, Hermione conhecia aquele olhar, olhar de quem nunca desistia do que queria, era uma das melhores qualidades do amigo, mas voltado para coisas mesquinhas, não era nada bom.
A primeira aula foi impossível chegar perto do sonserino, e o que mais o irritou, ele ainda continuava o ignorando, passou longe de sua mesa e se sentou ao fundo, sempre ao lado o seu melhor amigo – bem deveria ser melhores amigos, já que Zabini e ele andavam por toda Hogwarts juntos, mais juntos que Crable e Goyle nos primeiros anos. Depois veio o fim da aula e o desgraçado desapareceu num piscar de olhos, só foi encontra-lo na segunda aula, também com a Sonserina, seria agora ou só na segunda-feira, pois não teria aula com eles na parte da tarde, após o almoço e nem no dia seguinte.
No fim da segunda aula, Harry bem que tentou encontrar o sonserino, e quando o notou, ele estava andando mais a frente, prestes a virar um corredor. Apreçou os passos, pois sabia que Crable e Goyle foram diretamente ao Salão Principal, já que Rony fizera-lhe o favor de dizer em som alto o suficiente para ambos ouvirem, que nos almoços de quinta-feira serviam lasanha e assado, e mais um pouco de conversas casuais tratando de comida, foi a gota d'água para eles implorarem o término da aula e correrem para saciarem a gula. Nisso, realmente Rony havia ajudado a se livrar dos guarda-costas, mas o problema era que ficou o carrapato. Notou isso ao conseguir se aproximar de Malfoy e ouvir o que estavam falando.
- Sábado está se aproximando, você irá a Hogmeads comigo certo? – perguntou Zabini sem deixar de olha-lo nos olhos, e um olhar muito meloso pra variar, Harry pensou.
- Talvez... – foi a vez dele ouvir a voz arrastada e estranhamente mais baixa que o normal.
- Não vou deixar você escolher, você irá sim, comigo e tomaremos um bom firewisky até a madrugada lá no Pub. E nos divertiremos bastante – Blaise não tinha a mesma capacidade de ordenar como Malfoy, Harry também percebeu isso, Malfoy fazia suas palavras parecerem incontestáveis.
- Bem, se até lá eu estiver com humor para te aturar...
- Desse jeito você me entristece Draco! Sabe que ando percebendo que você está muito arredio nesses últimos dias – Blaise disse um tanto chateado.
- Oh! Que comovente – caçoou o outro.
- Você vai se distrair e curtir a vida nem que eu tenha que invadir seu quarto, te derrubar da cama e o arrastar até Hogmeads, ou não me chamo Blaise Zabini.
- Isso é uma ameaça? – Malfoy pela primeira vez nessa conversa, encarou seu interlocutor.
- Sim, afinal, você odeia quando entram na sua privacidade e te acordem no meio de seu sono de beleza – Blaise sussurrou com um sorriso.
"Ow! Zabini é tão..." – pensava Harry com cara de enjôo ao ouvir tanta gentileza vinda de um sonserino, coisa impossível para sua cabeça até então, mas teve que deixar os pensamentos de lado, pois Draco agora diminuía os passos enquanto procurava algo em seus materiais. Estava ficando preocupado de ambos pararem no meio do corredor vazio e notarem que ele vinha alguns metros atrás, esgueirando-se na penumbra do corredor que levava às masmorras. Masmorras? Harry olhou ao redor com certa perplexidade, não havia reparado onde estavam indo, agora sim, julgariam que ele estava os seguindo, o que de fato era meio que verdade. Mas algo correu em sua mente ao notar que Zabini continuava a caminhar falando algo, sem se ater ao fato que Malfoy havia parado de andar e buscava suas anotações de Runas Antigas, a qual emprestara para Parkinson no dia anterior. Seus olhos verdes rapidamente buscaram algum lugar camuflado ao redor, já que não daria tempo de retornar o corredor sem ser visto, e quando Draco finalmente achou suas anotações e ergueu os olhos para ver alguns centímetros de distância dele uma pessoa, e Zabini metros adiante finalmente notou que Draco ficara para trás e estava preste a se virar, Blaise encontrou o corredor vazio. Piscou algumas vezes e rodou no mesmo lugar, olhando pra todos os lados e nenhum sinal do loiro.
- OK senhor Malfoy! Bela escapada de meu convite – falou a si mesmo dando uma risada antes de voltar a caminhar até a Sala Comunal da Sonserina.
Draco trombou na parede de uma sala pequena e vazia depois de ter a boca tampada por uma mão quente e um corpo o forçado a entrar nesse cubículo imundo, pois olhava horrorizado a algumas teias de aranha velhas a enroscar-lhe no cabelo, caindo em sua face, esqueletos de besouros e baratas pintavam o cinza amarronzado das paredes e do chão como pontos pretos de vários tamanhos, nem queria imaginar como estariam suas costas. Se controlou o máximo que conseguiu e empurrou a pessoa que o prensava de modo bruto e o impedia de falar. Quando conseguiu que o outro o soltasse, passou a praguejar enquanto limpava o cabelo e vestes tentando se livrar daquelas coisas nojentas e do pó que sua capa acolheu pelo caminho.
Harry ficou em defensiva quando Draco conseguiu empurra-lo, mas deixou que um sorriso se formasse ao reparar que Malfoy só se preocupava em ficar limpo o máximo que podia.
"Como ele é fresco!" – não deixou de pensar.
- Que nojo! Que coisa... Argh! – esfregou as mãos pelos fios louros despenteando o antes impecável cabelo, e bateu nas vestes soltando o pouco de poeira que ainda teimava em não deixar sua roupa.
- Desculpe Malfoy – não conseguiu deixar de soar divertido.
Malfoy ergueu os olhos com raiva e o encarou. – Potter! Só podia ser, ninguém é tão estupidamente imbecil para fazer algo do gênero. Típico!
Harry parou de achar graça. – eu já pedi desculpas.
- Rindo da minha cara, quer dizer.
- Claro que não! – tentou soar sério, mas vê-lo se debater todo enojado antes de se preocupar com quem o raptara momentaneamente era muito divertido, mas teve o olhar azul metálico fulminante como resposta. – Uh... Bem, foi engraçado, mas eu realmente queria me desculpar e-
- Cala a boca Potter – cortou em tom baixo e rancoroso. – O que diabo foi isso?
Harry voltou a ficar sério notando que Malfoy ergueu a cabeça e o encarava por cima, com muita raiva, aliás. – Eu queria conversar com você.
- E não queria pedir minha opinião sobre se eu queria ou não ter essa conversa. E digo, foi um modo bem idiota de tentar chamar minha atenção.
- Pra começo de conversa Malfoy, eu não queria que você simplesmente me viesse com essas suas típicas patadas e me virasse as costas e fosse embora. Muito menos queria conversar com você na frente daquele seu amigo.
- Então resolveu utilizar seus parcos neurônios e me jogar numa salinha imunda como se não bastasse sua companhia repugnante – Draco tentou empurrar o grifinório do caminho, pois a sala era realmente muito apertada e ele estava bloqueando a porta, mas Harry manteve-se firme empurrando Malfoy também, para que ficasse no mesmo lugar. – Saia do caminho Potter, eu não quero respirar o mesmo ar virótico que você.
- Você não sairá daqui até me dizer que droga aconteceu naquela noite! – Harry já estava perdendo a paciência. – Eu tenho o direito de saber!
- Não vou dizer merda nenhuma! Nem agora nem nunca! – Draco avançou contra o moreno e o empurrou de encontro a porta num som abafado, e Harry não deixou perder o controle o empurrando de volta e o prensando contra a mesma parede.
- Você me atacou naquele dia! Eu quero saber o por que!
Harry não sabia se estavam ficando sem ar naquele lugar apertado, ou se era pelo nervosismo ou pelas agressões mútuas. Sua respiração como a de Malfoy estavam descompassadas e estavam quentes, e o loiro tinha um leve tom róseo nas maçãs do rosto, dando um ar delicado ao rosto pálido. Pensou se estaria assim também pela briga.
Os olhos de Harry desceram da face ao pescoço do sonserino, cujo colarinho estava um pouco aberto pelos constantes empurrões, quando se lembrou da descrição de Hermione, que Malfoy estava sangrando após ele ter arrancado seu colar. De fato, havia uma pequena linha rosada no lado direito do pescoço de Draco, algo bem claro como se já estivesse quase curado, mas estava lá. Não poderia simplesmente culpa-lo por ter-lhe atacado, pois também havia o machucado, só não sabia o por que de tê-lo feito dessa maneira, jamais arrancaria o colar ou o que fosse de alguém, preferia socar e azarar se esse fosse o caso, principalmente se o caso era Draco Malfoy.
Talvez inconscientemente, ou meio que viajando, utilizou a mão que não prensava o peito do sonserino o forçando a ficar no lugar, tocou o sinal com dois dedos e deslizou com cuidado a linha que manchava a pele suavemente branca daquele pescoço, parecia que aquele ferimento era um estigma causado por suas mãos, que vertia dor e maculava o corpo tão perfeito.
Draco sentiu um arrepio por aquele ato, coisa que nunca esperava que o rapaz a sua frente fizesse. Ele apertava o braço que o imobilizava, e que certamente a pressão em seu peito que o estava deixando sem ar, e para piorar, aquele toque. Mexeu-se como pôde, mas teve que retirar a mão que empurrava o outro também no peito para dar um tapa na mão que o tocava.
- Me solta Potter! Que merda você está fazendo? – finalmente teve a atenção do grifinório, que deixou seu pescoço para encarar seus olhos. – Me larga ou eu vou esquecer que sou monitor e te amaldiçôo agora mesmo.
- Eu nunca faria isso Malfoy, você sabe! – o moreno parecia meio que se culpando, a notar um leve atordoamento no olhar verde.
- Quê? – Draco tentava respirar, mas respirar junto com Harry estava difícil.
Harry finalmente se dignou a dar mais espaço no meio de ambos e diminuiu a pressão que fazia inconscientemente no outro, mas permaneceu com a mão ao peito que subia e descia descompassado.
- Eu poderia até fazer você ir para a enfermaria com alguma magia estúpida... Mas nunca dessa forma. – Harry só precisou dar um passo para trás e encostou-se na porta, estava completamente perdido. – Me diz Malfoy, por que eu iria agredi-lo e por que você me atacou?... Me atacou tão baixo – essa última sentença foi num sussurro, olhos nos olhos.
- Não devo satisfações pra ninguém, além de meu pai, muito menos a você Potter – seus olhos se turvaram com uma leve fonte de raiva mal contida. – Mas já que insiste tanto, foi você que me atacou primeiro, descabeçadamente e idiotamente como uma garota, mas deu o primeiro passo.
- Oh! – Harry debochou enquanto o canto de sua boca se curvava em desdém. – Por isso você me atacou covardemente pelas costas? Qual é Malfoy! – agora já havia desencostado da porta e quase chegou a empurrar o loiro, que se defendeu colocando o braço entre eles. Harry não se importou. – Você me obliviou e estuporou, pelas costas!
Os olhos do loiro não demonstraram nada além da frieza, mas o instante que ficou calado denunciou que se surpreendeu, e logo estava de volta ao estado normal. – Como você tem tanta certeza que eu lancei um Obliviate?
- Ótimo, você deixou fora o outro feitiço porque realmente você me estuporou, e é claro que eu tenho certeza que você me obliviou, não sou idiota Malfoy, então, por que eu iria esquecer que a gente brigou naquela noite? Eu nem me lembro de ter te encontrado aquele dia!
Um silêncio pesado caiu sobre a pequena sala e ambos não pararam de se encarar, até que Malfoy resolveu quebrar friamente o silêncio.
- Saia do meu caminho Potter, eu não vou pedir novamente. – Harry abriu a boca para responder, mas foi prontamente cortado. – Sou monitor, e preciso estar presente na minha Casa, já perdemos o almoço e a primeira aula.
- OK Malfoy, mas eu vou te perseguir até você dizer a verdade, pois não entendo e eu tenho o direito de saber.
- Claro Potter, se você conseguir fazer com que eu te escute. Agora, saia da frente.
Harry abriu um pouco a porta e olhou o corredor ainda vazio, todos deveriam estar no meio da aula. Caminhou para fora abrindo espaço para que Draco saísse logo em seguida. Quando o sonserino passava por ele de cabeça erguida e olhar frio, Harry não deixou de segurar seu braço e encostar mais perto.
- Sei que tem algo muito grave nisso tudo, pois Hermione me disse que você se recusou a comentar o acontecido até mesmo para Dumbledore e Snape.
Draco estreitou os olhos encarando a mão que o segurava antes de puxar o braço e se afastar. – Se você me tocar mais uma vez, Potter... Te quebro a cara e a maior parte dos ossos. Nunca mais toque em mim! – sibilou antes de dar as costas e seguir em direção ao seu Salão Comunal.
Harry permaneceu no lugar o olhando até que este desaparecesse na escuridão do corredor, suspirou enquanto examinava as mãos. "Tão quente..." pensou olhando as palmas avermelhadas "Deve ter sido o lugar pequeno e a raiva de nós dois". Tentou pensar em outra coisa, saberia de qualquer jeito a história toda, e o por que de ter brigado com Malfoy. O problema era que o único que sabia, ou melhor, que se lembrava de tudo, era aquele arrogante sonserino.
Deixou as masmorras até o seu Salão Comunal na Torre da Grifinória, e enquanto subia pelas escadas móveis, não deixou de notar a estranheza de serem tão opostos até mesmo no lugar onde se residiam. Ele vivia no ar, enquanto Malfoy vivia sob a terra. Sussurrou a senha e ao alcançar seu dormitório, foi diretamente para a janela e se sentou ali, olhando a paisagem. O céu estava avermelhado com o recolher do dia e o começo do anoitecer, era uma imagem triste. Ou era ele quem estava angustiado refletindo no horizonte distante algo de sua alma? Não saberia, a única coisa que sabia, era que estranhamente ficou triste com o modo como Malfoy começou a trata-lo, descobriu isso quando se sentiu renovado ao discutir com ele instantes atrás, só os dois, sem Crable, sem Goyle, sem Zabini, sem Hermione, sem Rony, sem ninguém... Somente os dois. Lembrou-se como Malfoy era fresco e riu, riu muito ao vê-lo daquele jeito, todo enojado. Pensando nisso, olhou suas vestes e notou que havia teias de aranhas nela, junto com alguns restos de besouros. Era nojento, mas não exagerava feito o sonserino. Riu mais uma vez balançando a cabeça e seguiu ao banheiro, já deveria estar acabando a aula e ele não podia perder a última do dia, e nem chegar na sala de aula naquele estado, como se acabou de sair de uma sepultura abandonada.
Draco bateu a porta atrás de si quando alcançou seu quarto, andou de um lado para o outro ainda nervoso.
"Maldito Harry Potter! O Desgraçado!".
Apoiou as mãos na escrivaninha e deixou a cabeça baixa, tentando se controlar. Nunca pensou que aquele desgraçado tivesse a coragem de fazer o que fez. Ah! Claro, ele era um grifinório, e grifinórios tinham a coragem como característica insuportável, até o Longbothon teve um curto ataque de coragem, pelo que lembrava em algum ano desses que se passou, seria o primeiro ou o segundo? Que se danasse também, não ia ficar recordando.
Abriu os olhos e seus globos oculares brilharam como mercúrio líquido. – Tem sempre que me atormentar quando o que eu mais quero é distância! – sussurrou entre dentes.
Para finalizar sua revolta, deu um safanão nas coisas sobre a escrivaninha e viu tinteiro, livros e pergaminhos voarem para o chão, espalhando-se e manchando o piso de pedra e parte do tapete verde escuro. Deixou o quarto e entrou no banheiro abrindo a torneira da banheira e deixando ela encher, enquanto se despia com certo nojo ao ver o estado de suas roupas.
"Quero que isso acabe logo..." – pensou desanimado.
Passou uma das mãos pelos cabelos, deslizando os dedos até as pontas e segurando uma mecha ergueu a vista para o espelho de corpo inteiro, logo a sua frente. Sua imagem lhe retornou sorrindo maroto.
Ele era alto, tinha ombros largos e peito forte, braços e pernas torneadas, nada muito musculoso ou exagerado, mas era levemente talhado, como se sua imagem fora feita por algum escultor que venera um deus graciosamente perfeito. Esbelto por natureza.
Seu cabelo estava um pouco desalinhado pelo acontecido a minutos atrás, sua franja caía sobre seu olho esquerdo indo se unir aos cílios longos que contornavam um olhar triste, naquele momento. Fios de um louro claro delicado, macios e brilhosos como seda. Ainda permanecia com os dedos enterrados neles, mas por pouco tempo, logo, direcionou-os até o rosto.
Feições delicadas e bem definidas, harmoniosamente branca, ou pálida, um pálido acetinado, e lá estava a cor roubada, a cor que Potter lhe roubou do sangue – levemente rosada nas maçãs do rosto. Seus lábios também eram róseos, constratando com sua pele, não tão finos como do grifinório, mas eram bem feitos. Dedos deslizaram por eles até o pescoço, seguindo a linha da mandíbula até o lado direito, e lá estava a maldita. Fina e imperceptível para um distraído, mas reveladora para um atencioso. Tão clara, mas ao mesmo tempo tão forte e marcante, causada pela prata pura de seu próprio adorno. Marca feita pelas mãos desesperadas de certo menino de ouro.
Ergueu a cabeça e se recompôs, estava deixando se levar pelo momento, só que um Malfoy nunca se deixava levar por nada nem ninguém. Ao menos era isso que seu pai sempre lhe ensinara. Riu mais uma vez, agora uma risada insana. Seu pai estava preso, manchando o nome da família. Será mesmo que em nenhum dia, ele não havia se deixado levar? Talvez nunca saberia, afinal, desde quando Lucius Malfoy foi de ter uma conversa de pai pra filho, numa noite de inverno, quando a curiosidade da adolescência pegava seu garotinho pelos pés sem que ele pudesse fazer nada, a não ser esperar por esclarecimentos, opinião e, porque não, saber sobre a fase em que ele também havia sido pego dessa forma?
Acordou de suas reflexões quando sentiu a água morna tocar seus pés, olhou para a banheira vendo que ela transbordava. Fechou a torneira e esvaziou um pouco o excesso antes de entrar cuidadosamente e se sentar num dos cantos, pegou o sabonete líquido e uma esponja macia para se limpar decentemente. Mas ao se olhar novamente no espelho, se lembrou do toque. Dois dedos deslizando como que analisasse a ferida minuciosamente, olhos verdes sobre sua pele. Tremeu fechando os olhos, franzindo as sobrancelhas e passou a esfregar o pescoço com fúria, como se assim se livraria do toque imundo.
Te odeio Potter...
E a dor o atingiu novamente, mas dessa vez, fez verter algumas gotas rubras que escorreu e pingou na água, se dissolvendo em seguida, só assim parou o que fazia para constatar que sua ferida se abriu e voltava a sangrar.
Derrubou tudo que segurava dentro da água e se encolheu abraçando os joelhos e de olhos bem apertados.
Só quero que me deixe em paz...
N/A: Bem, este é mais um capítulo, espero que tenham gostado! É uma pena que ninguém me mandou reviews... Mas tudo bem, quem sabe nesse capítulo certo?
No próximo capítulo: Potter é como fogo, vive em brasa quando o assunto é Malfoy. Malfoy é como água, ninguém consegue pegá-lo de jeito. E Zabini começa a desconfiar de algo. O quê será que ele vai aprontar? Lá vem ciúmes pela frente!
