Disclaimer: Nada mudou: os personagens continuam pertencendo a J.K. Rowling e eu não ganho absolutamente nada com isso.
Obrigada, Marck Evans , beta mais lindo.
Capítulo 23
Sirius se sentia culpado e não conseguia dormir. Sabia que fora o responsável pela briga com Snape, mas o que o estava remoendo mesmo era imaginar Harry se humilhando para que permanecesse ali ou tendo de decidir entre acompanhá-lo ou ficar com o namorado. Tentou evitar a amargura ao pensar que provavelmente Malfoy levaria a melhor. Tinha de se habituar a viver sozinho. Mas, se tivesse que voltar àquela casa odiosa da sua família, era bem capaz de enlouquecer. Remexeu-se na cama mais uma vez. A preocupação com Harry não ia deixá-lo dormir, então jogou o lençol longe, vestiu uma roupa e foi até o quarto dele. Se ainda estivesse acordado, aproveitaria para conversar com ele.
Bateu levemente na porta e sem esperar resposta, entrou, encontrando o quarto na penumbra. Ficou um momento parado e quando ia sair, ouviu Harry dizer tão baixo que quase pensou ter se enganado:
- Entre.
Sirius considerou voltar outra hora, mas realmente não conseguiria dormir se não conversasse com ele. Lentamente, caminhou até a cama, sentou-se na beirada e disse, sua voz com aquela rouquidão que ainda tinha pelo longo tempo sem falar:
- Não conseguia dormir. Então, vim verificar se você estava bem.
- Também não estou conseguindo. Tenho medo dos meus sonhos. – Harry disse simplesmente.
Sirius sentiu um aperto no peito. Estava muito escuro para ver, mas ele lembrava-se com perfeição da palidez do rosto de Harry, as profundas olheiras, o ar cansado e abatido. Sua voz soou muito séria, quando respondeu sinceramente:
- E eu tenho medo de acordar. Dormir sempre me afastou da realidade que era muito pior que qualquer pesadelo que pudesse vir a ter. Despertar é dor.
Por um momento, seus olhares se encontraram. Encontrou uma compreensão nos olhos verdes que não deveria existir ali. Não era justo que alguém tão jovem quanto Harry já exibisse aquele olhar carregado de solidão. Sirius se sentiu mais inútil que nunca. Sempre estivera longe quando o rapaz precisou dele. Um sentimento protetor tão grande o atingiu que Sirius o empurrou de leve para abrir espaço na cama. Deitou-se ao seu lado, abraçando-o e dizendo em voz muito baixa:
- Não posso impedir os pesadelos, Harry, mas pelo menos estarei aqui se acordar durante a noite ou se ficar agitado demais.
Não era muita coisa, mas era o que podia fazer no momento. Viu o sorriso de Harry ao responder:
- E eu estarei aqui, pela manhã, para te mostrar que despertar vale a pena.
Sirius retribuiu ao sorriso e Harry se aconchegou mais, fechando os olhos. Permaneceu um longo tempo acompanhando a respiração ritmada do rapaz, sentindo o perfume do cabelo macio que roçava ocasionalmente sua pele. Quando finalmente percebeu que Harry dormia, permitiu-se adormecer também.
Sirius acordou assustado, sentindo um toque frio em seu braço. Ofegou e tentou controlar o pânico que ameaçava dominá-lo. Lentamente, abriu os olhos dando-se conta de onde estava. A mão de Harry encostava-se no seu braço e estava muito fria. O rapaz estava num sono bastante agitado e Sirius distinguiu trechos de frases que pareciam pedido de clemência. Envolveu Harry com seus braços, fazendo movimentos circulares com uma das mãos nas costas dele, sussurrando palavras de conforto com os lábios encostados à testa dele. Perdeu a noção do tempo que ficou assim até que percebeu o corpo trêmulo se acalmando e o rapaz retomar um sono mais tranqüilo. Manteve-o seguro em seu braços até adormecer também.
Um som baixo e irritante despertou Sirius. Remexeu-se incomodado, sentindo um calor agradável de encontro a seu corpo. Esticou os braços procurando desfrutar mais aquele contato, mas a fonte de calor se afastou. Seus dedos encontraram apenas o vazio e a contragosto, ele abriu os olhos. Com esforço, localizou Harry saindo do quarto. Voltou a fechar os olhos, achando que ainda estava sonhando. Um sonho particularmente bom, quente e cheiroso. Esforçando-se, ainda podia sentir o outro corpo pressionando o seu e aquela lembrança pareceu conduzir dolorosamente todo seu sangue para um único ponto.
Ouviu o som de alguém entrando no quarto e abriu novamente os olhos, encontrando os verde de Harry.
- Desculpe, Sirius. Não quis acordá-lo.
A compreensão de com quem esteve fantasiando o atingiu lentamente. Tentou dizer algo, mas não conseguiu. Harry continuou:
- Pode voltar a dormir. Prometo ficar quietinho ou sair daqui, se preferir.
Sirius finalmente reagiu. Puxou discretamente o lençol que o cobria para ter certeza que Harry não percebesse seu estado e falou:
- Não, pode ficar. Que barulho foi aquele?
- Despertador. Para eu não perder a hora da poção do Draco.
- Nossa. Muito barulhento. Você sempre dorme tão pouco? – Sirius falou, bocejando.
Harry assentiu silenciosamente e Sirius continuou:
- Devia tentar dormir.
- Não vou conseguir. Agora, durma.
Sirius observou Harry pegar um livro, sentar-se ao lado da janela e iluminar apenas ao redor para ler. A luminosidade não chegava até onde Sirius estava, que em poucos minutos adormeceu novamente, vendo o rapaz concentrado em sua leitura.
Mais tarde, ao descer para tomar café, encontrou somente Harry na cozinha lendo o jornal.
- Bom dia.
- Bom dia.
Sirius se serviu e passou a comer silenciosamente, perfeitamente ciente da ausência de Remus e Snape e que ainda não tinha conversado com Harry sobre a briga. Comia, incomodado com o silêncio, mas sem coragem de quebrá-lo.
- Já terminou? – Harry perguntou afinal.
Sirius assentiu, ainda com a boca cheia e Harry sorriu.
- Acho que não. Precisamos conversar sobre a ontem. Eu vou subir e cuidar de Draco. Nos encontramos no meu quarto. – Harry levantou-se e já ia saindo, quando completou. – Ah, por favor, vá direto para lá. Nada de aprontar pelo caminho.
Sirius se sentiu indignado. Ia dizer uns desaforos por ser tratado como criança, mas ao terminar de engolir, não havia qualquer sinal de Harry. Terminou o café da manhã e subiu atrás de Harry, encontrando-o no quarto de Draco. Ficou observando o rapaz parado ao lado da cama, muito sério, segurando a varinha e lançando um feitiço no outro.
- O que é isso?
Harry não se voltou e nem pareceu se surpreender.
- São os feitiços de limpeza e os que não permitem a pele dele se ferir por ficar muito tempo deitado.
Sirius disse, surpreso:
- É preciso fazer todos os dias?
- Sim. Como não sabemos a natureza da maldição que o atingiu é preciso muito cuidado com excesso de magia. O estado dele é monitorado o tempo todo para verificarmos se não estamos piorando a situação.
Sirius ouviu a explicação em silêncio, acompanhando a movimentação de Harry pelo quarto. Assustou-se quando ouviu:
- Já terminei. Podemos ir.
Ele assentiu e foram para o quarto de Harry. Ao chegarem, o rapaz foi direto ao assunto:
- Não me interessa o motivo pelo qual você e Severus brigaram ontem. O que me preocupa, agora, é saber como vamos fazer já que ele o expulsou daqui.
- Olha, Harry, eu sinto muito. Eu sei que me pediu para maneirar, mas o Snivellus me irrita. Eu...
Harry o cortou:
- Não adianta se desculpar comigo e continuar o chamando assim.
Sirius deu um suspiro e recomeçou:
- Ok. Snape me irrita e eu acabo perdendo a cabeça. Mas eu não quero causar problemas nem para você nem para Remus. Eu vi o quanto você é necessário aqui. Não posso pedir que venha comigo. Não pretendo voltar para aquela casa de jeito nenhum. Talvez se eu fosse viver entre os trouxas...
Harry passou a mão pelo cabelo, bagunçando-o ainda mais.
- Sirius, nós continuaremos preocupados com você. Eu consegui um tempo a mais para você permanecer aqui. Severus vai cuidar de Remus durante a lua cheia e, talvez, mude de idéia nesse meio tempo. Se não mudar, a gente pensa no que fazer. Eu só queria te pedir, por favor, não arrume nenhuma confusão até a ida deles para a cabana. São apenas três dias.
- Tudo bem, Harry. Vou evitá-lo ao máximo. – Fez uma pausa antes de dizer. – Você está ficando igual ao Remus, me tratando feito criança.
- Não, não estou. Talvez daqui a um ou dois meses. – Harry disse, sorrindo.
Sirius também sorriu levemente.
- Não sei se levará esse tempo todo.
Harry se levantou.
- Preciso ir treinar. Remus está te esperando no laboratório para que possa ajudá-lo com os ingredientes das poções.
Sirius assentiu e ficou observando o rapaz sair do quarto. Aquilo era tão estranho. O esperado seria que ele cuidasse de Harry, que ele fosse o adulto ali. Mas era freqüente às vezes em que situação se invertia. Era óbvio que seu afilhado tinha crescido com tudo que aconteceu. Como para reafirmar isso, lembrou-se da sensação do corpo dele contra o seu e as fantasias causadas por isso. Quando Sirius deu-se conta do tipo de pensamento que estava tendo com Harry, sentiu-se horrorizado. 'Ele é meu afilhado. Quase um filho para mim. Não posso pensar esse tipo coisa com ele.' Obviamente, isso só poderia ser atribuído ao longo tempo sem sexo. Harry era jovem demais para ele, não importava o quanto o rapaz houvesse amadurecido. Sirius não podia pensar nele de outra forma. Nem agora nem nunca.
Decidido, deixou o quarto, pronto para assumir suas responsabilidades e afastar a vozinha irritante em sua mente que insistia em dizer 'mentiroso'.
