UM CUPIDO JEITOSO II
CAPÍTULO 02 – TUDO QUE O MOZINHO QUER...
No mesmo dia, depois da sesta, Afrodite começou a arranhar o peito do Mozão, a fim de acordá-lo. Carlo resmungou e meio adormecido, diminuiu os centímetros que o separavam da sua biba favorita, caçando-o com os lábios, tentando alcançar alguma carne... Dido ofereceu sua própria boca primeiro, depois o pescoço e Carlo foi avançando na exploração daquela pele de alabastro, puxando-o para baixo de si, já se acomodando entre as pernas longas e torneadas.
Como acontecia no verão, Afrodite ficava excitadíssimo com o contraste entre a pele bronzeada do marido e a sua. Ele ficava comparando, agarrado ao outro, se esfregando. Mas nessa tarde, enquanto comparava, outro casal veio à sua mente sem querer... Dido se viu imaginando Gino Michelle e Gecko na cama, naquele quarto de motel, o japonês com certeza era tão branco quanto ele, o tom norte-europeu se destacando... E Gino era um moreno de "fechar o comércio", como diriam suas tias. Perdido nesses pensamentos, nem notou que seu olhar desfocou até que deu um gritinho:
-Ai, Mo!
-Maledeto... transando comigo e pensando em outro!
-Ah, não, Mozão... eu não estava pensando em outro... Como eu posso pensar em outro tendo um moreno glorioso feito você metendo em mim tão gostosinho?... – o sueco fez um beicinho adorável enquanto envolvia o dito moreno num abraço de polvo e lhe beijava apaixonadamente.
Somente depois que estava satisfeito e bem acomodado no peito largo de Carlo é que Afrodite começou a sondar como poderia fazer pro Mozão ser seu cúmplice nessa "Operação Cupido".
-Eu sou um veado muito sortudo, pois tenho o italiano mais tesudo do planeta ao meu dispor...
-Bom se lembrar disso sempre...
-Todo mundo merecia ter um Mozão na sua vida...
-A fábrica de onde veio este já fechou. – resmungou Carlo – e jogaram a forma fora.
-Você já é meu! Mas to falando de ter um grande amor na vida...
Carlo abriu apenas um olho e depois de encarar o seu peixinho por uns minutos, suspirou:
-Eu deveria ter desconfiado.
-Do que?
-Você está com aquele olhar de novo.
-Qual, Mozão?
-Aquele olhar "vou casar alguém". Na certa, o Gino está com dor de cotovelo, choramingou pra você e agora, você quer ir lá e passar o xaveco no pretendente à mão da biba e garantir um final feliz.
-Ai, bruto. Do jeito que você fala, não tem romantismo nenhum.
-Dido, meu peixinho tontinho e irremediavelmente romântico, a vida é assim. Muitas vezes, é só uma boa foda. Não há a mínima chance para o happy end.
-Mas, Mozão. Sem arriscar, sem tentar, como a gente tem certeza?
-Tudo bem, você está certo nisso... Mas não quero que você sofra, Mozzie, se não der certo. As pessoas tem cada uma um jeito de reagir... Quem é o Príncipe Encantado de nossa Cinderela?
-Gecko.
Carlo se sentou na cama de repente, quase derrubando Afrodite no processo.
-Aquela araponga japa que grita até quebrar os vidros?
-Mozão, ele tem o maior agudo do planeta. E é o único japonês de olhos azuis VERDADEIROS que eu conheço.
-Gosto é que nem bunda, mesmo. Enfim, não é pra mim, cada um na sua. E você já tem um plano definido?
-Não... – Dido enrolou um cachinho na ponta do dedo. – Eu contei pra você pra ver se você me ajudava a pensar...
O italiano se levantou da cama, puxou o esposo de encontro a ele e deu-lhe um beijo.
-Pois tire a ruguinha de preocupação da testa. – Afrodite passou o dedo, vendo se tinha alguma. – Deixe tudo com seu Carlo, que eu resolvo pra você.
-É vero, Carlito?
-Si, é vero, Dido...
-Vamos tomar banho? Deixa que eu esfrego suas costas, Mozão.
Como bom cavaleiro que era, Máscara da Morte colocou a dita no rosto e Gino nem desconfiou que por detrás da fisionomia rabugenta havia um cérebro fervilhando, montando mil e uma estratégias. Afrodite estava borbulhante. Quando o Mozão dizia "deixa tudo com seu Carlo", era porque a coisa ia render.
Enquanto isso, em algum lugar de Tóquio...
O ensaio de uma banda de j-rock popular acabou e os integrantes estão brincando, implicando uns com os outros, numa algazarra de adolescentes. Gecko ri, fala alguns palavrões, e sai para uma outra sala. Os seus companheiros estão acostumados com esses silêncios repentinos e momentâneos. Geralmente eles acontecem em dois períodos: quando seu líder está inspirado e ele então sai correndo pra não perder o fio da meada. E quando eles vão sair em turnê e Gecko começa a sofrer de ansiedade. Ele não gosta que ninguém veja a sua "fraqueza" então ele se afasta. Como eles ainda vão lançar um disco novo, é quase certo que seja a primeira opção.
Apenas Matsumoto, o guitarrista e mais chegado ao cantor sabe que não é nem uma coisa nem outra. Faz algumas semanas que Jacob está inquieto... Ele aproveita que todo mundo se arrumou e se despediu rápido e vai atrás de Gecko. Ele está, como sempre, sentado na janela da sala, com o telefone ao alcance da mão e o olhar distante, além da capital do Japão.
-Vou dizer de novo: liga pra ele! Não deve ser tão difícil falar com um compositor aposentado...
-E eu vou repetir de novo: e eu vou dizer o quê? "Gino, aqui é o Gecko. Sabe, eu não consigo esquecer aqueles dias, cara. Dava pra você dar outro pulinho aqui no Japão e passar um tempo comigo? Tipo, para sempre?"
-Não vejo porque não. Só você não dizer o "para sempre", que a coisa vira. Quando ele se acostumar com a idéia, você cai matando.
-Acorda, Matsu! A vida não é um filme romântico! Porque ele não me ligou depois que voltou pra Europa? – e o cantor ergueu a mão pra calar o amigo – Vou te dizer porque. Porque não foi nada pra ele. Somente uma boa foda.
-Você não tem certeza. E nunca terá, já que não se arrisca. Eu leio os jornais, vasculho fofocas na Internet, ele continua sozinho.
-Ele é muito discreto. E vive num lugar calmo. A imprensa pode não saber de tudo...
Matsumoto jogou as mãos pra frente, como desistindo.
-Então continue remoendo suas saudades, cacete! Pelo menos faça uma boa música pra exorcizar, senão você vai acabar doente.
-Yeah, yeah, yeah... você só pensa em trabalho...
-Claro que não. Vou sair pra jantar com uma pessoa nova. As melhores coisas da vida: boa comida, boa bebida e se eu tiver sorte, terminamos a noite no motel. Como eu não estou apaixonado, nem ela, vai ser bom pra todo mundo.
-Bastardo sortudo! Vai lá, então.
-Você não vai ficar aí a noite toda, né?
-Não, mamãe. Pra você ficar tranqüilo, vou embora com você.
Ao sair do elevador para o saguão, Gecko colocou os óculos escuros. Haviam alguns fãs do outro lado da rua, o povo que sempre o acompanhava onde quer que ele fosse. Fez o caminho até o carro devagar, pra que eles tivessem tempo de fotografá-lo. Achava essas fotos muito chinfrins, até permitia que fossem divulgadas pelos sitezinhos na internet. Seu fã clube oficial tinha fotos de primeira, bem feitas, algumas autografadas, copyrights protegidos.
Fama. Beleza. Dinheiro. E tudo o que o dinheiro podia comprar. Menos um grande amor. Suspirou enquanto ligava o carro. Tinha que exorcizar mesmo aquela tristeza...
Gecko entrou em casa perguntando ao mordomo se tinha algum recado importante. O velho já sabia que "importante" se traduzia por "pessoal" e negou, completando que os compromissos estavam na agenda e os telefonemas no mural de recados do quarto. O cantor subiu as escadarias e tirou a roupa para um banho. Mirou-se no espelho: 1,90, pele muito clara, cabelos muito lisos e grossos pintados no momento de um ruivo cenoura, os fantásticos olhos azuis VERDADEIROS que muita gente daria o braço direito pra ter, 85 quilos bem distribuídos, ele era um falso magrelão.
"Um tesão. Todo mundo sonha em estar na cama comigo... menos quem eu gostaria que sonhasse..."
Foi tomar um banho relaxante, e depois de colocar o roupão, deitou-se no carpete branco do quarto e puxou o telefone sem fio. Pela enésima vez, passou os dedos pelos números do telefone da villa de Gino Michelle. (Com a desculpa de querer gravar uma música do compositor, pediu e o rapaz da gravadora do outro lhe deu). E num impulso, apertou o ON do telefone e discou. Alguns longos e ansiosos minutos se passaram enquanto a ligação internacional era completada. Gecko sentiu uma dor no estômago, uma tremenda vontade de desligar, mas manteve-se firme.
Até que o telefone começou a soar do outro lado e uma voz grave mas suave atendeu. O coração de Gecko se contraiu, assim como a mão que segurava o telefone. E ele ouviu a voz de Gino dizer ao fundo:
-Afrodite, amore, pra quem é?
-Não sei, querido. Ninguém responde. Aloooowww, hey, você, quem quer que seja, diga algoooo... Quem ligaria a essa hora pra não dizer nada?
-Deve ser trote. Desligue.
Gecko desligou. Ficou olhando para o telefone, pensando naquela voz. Era um homem. Gay. E Gino o chamou de amore. No segundo grau, ele tinha aprendido a falar "amor" em diversas línguas. Sabia o que significava "amore". As lágrimas começaram a escorrer e o primeiro soluço veio. Quando vieram chamá-lo pra jantar, ele estava encolhido numa posição fetal, abraçado a uma almofada, ainda soluçando.
Com muita paciência, forçaram-no a tomar um caldo, o mordomo deu-lhe um calmante e o colocou na cama. A última palavra que Gecko sussurrou antes de deslizar para um sono inquieto foi: "Afrodite".
N/A: Oh, dó. Até eu fiquei com peninha do Gecko. Mas calma, que o Mozão vai dar um jeito. 03/08/06.
