CAPÍTULO 03 - SEM NECESSIDADE PARA CONSPIRAÇÕES.

Enquanto Tenchi e a turma se divertiam na Terra, no distante Planeta Jurai, a vida prosseguia normalmente.

O primeiro e o único ato do verdadeiro Yosho (Katsuhito) após ter se recuperado foi o de abdicar do seu direito de suceder ao trono em favor da Princesa Aeka e do seu neto Tenchi, que seriam os futuros reis de Jurai.

Após a derrota de Kagato, todos os implicados na conspiração que destronou Aeka e Sasami foram removidos dos cargos e substituídos por pessoas de confiança. Contudo, Aeka resolveu não castigar ninguém.

Quanto ao neto de Yosho, ele poderia usufruir os seus direitos quando bem entendesse, porém ele decidiu voltar para a Terra e viver uma vida comum até atingir a maioridade plena.

Dias depois, a princesa Aeka foge de Jurai, em busca de seu amado e Sasami - junto com os cavaleiros e os guardiões de Aeka - parte em busca dela.

Para evitar uma nova crise semelhante ao que aconteceu quando o falso Yosho (Kagato) apareceu iludindo a muitos, o tio da Princesa Sasami foi nomeado regente no caso da ausência das duas princesas.

Ele e o conselho de ministros de Jurai cuidariam dos assuntos do dia a dia até que a Primeira Princesa e o Príncipe Herdeiro retornassem em definitivo.

A população em geral e a maioria dos membros dos clãs juraianos ficaram indignados ao perceber que foram enganados por Kagato e seus asseclas, mas ao mesmo tempo aliviados quando se comprovou a inocência das duas princesas e o fato do estrangeiro Tenchi ser descendente direto da Família Real de Jurai.

Com as cicatrizes do conflito já resolvidas, agora, a prioridade era reconstruir o que foi perdido, apagar antigos ressentimentos e pensar no futuro...

Contudo, havia alguém que remoia o passado com rancor. Uma dessas pessoas era o ex-comandante geral da poderosa Frota Estelar Juraiana, o veterano Almirante de Esquadra Nagumo.

Ele e a maior parte dos altos oficiais das forças armadas Juraianas foram os primeiros a declararem lealdade a Kagato, perseguindo as princesas reais e seus aliados por todo a galáxia.

O plano para capturar Aeka e Sasami era perfeito. Contando com a colaboração dos sistemas planetários aliados a Jurai e a Polícia Galática - manipulada por espiões infiltrados dentro da cúpula de comando da PG - não havia como a imensa frota de guerra esmagar uma mísera nave pirata chamada Ryo-Oh-Ki e um cruzador pilotado por policiais renegadas.

Depois, o sistema de defesa Juraiano era um dos mais perfeitos jamais construídos, dotado da mais moderna tecnologia que a Academia Galáctica de Ciências poderia oferecer.

Só que contrariando todas as expectativas, as princesas renegadas Aeka e Sasami, bem como seus aliados não apenas conseguiram escapar ao cerco imposto pela frota como tiveram a ousadia de entrar na área proibida do Sistema Jurai e derrotar a frota em épica batalha, com a ajuda da cientista louca Washu e da caçadora de recompensas Nagi.

Com a morte aparente de Kagato e a verdade revelada, houve uma comoção geral tanto em Jurai como nos planetas aliados a ele e na própria PG. O povo, sentindo-se enganado, exigiu a cabeça dos conspiradores.

Sem outra alternativa, Nagumo e todos os implicados no golpe tiveram que pedir demissão de seus importantes cargos.

Embora o retorno do verdadeiro Yosho e a absolvição das princesas - bem como a de seus amigos - tivesse sido uma vitória da verdade sobre a mentira, da luz sobre as trevas, da coragem sobre o medo, Nagumo não se conformava com o desfecho do caso..

Naquele momento o ex-almirante estava em estado depressivo em sua luxuosa e solitária residência, bebendo sistematicamente goles e mais goles do sakê juraiano, sentado numa poltrona em sua sala de estar.

Depois que ele perdeu o seu cargo, Nagumo foi obrigado passar para a reserva e estava atualmente desempregado, vivendo apenas da sua aposentadoria como ex-militar.

Embora, pelos padrões juraianos, esta fonte de renda fosse suficiente para viver, ele se sentia um mendigo, estando totalmente humilhado diante de seus pares.

Depois que sua participação no golpe foi revelada, sua esposa se separou e seus filhos o abandonaram. Somente a solidão e a amargura eram suas companhias agora.

Esta era a recompensa que ele recebia depois de décadas de lealdade e dedicação ao Império? Depois dele ter sacrificado o seu tempo, os seus afetos, os seus sonhos com o objetivo de aparelhar a maior força combatente da Galáxia?

Nagumo e seus colegas achavam que Jurai deveria expandir-se pela Via Láctea e pelo Universo, formando a base de um imenso império estelar.

Se eles tinham acesso à mais moderna tecnologia bélica, uma frota poderosa e poder de fogo suficiente para por de joelhos seus rivais, por que não usar?

O idoso almirante nunca se simpatizou de verdade com a Princesa Aeka. Para ele, a jovem princesa era ingênua, tola, frágil e não tinha a menor noção do que era um Império.

Contudo, a conspiração somente ganhou força quando ela resolveu ficar na insignificante colônia 0315 com a segunda princesa Sasami, ambas negligenciando seus deveres reais de chefe de governo e de estado... Sem falar na volta do lendário cavaleiro Kagato.

Kagato - e não a frágil princesa Aeka - seria a pessoa ideal, que tornaria viável seus sonhos de conquista.

Só que tudo foi por água abaixo por culpa de um simplório estudante, um terráqueo comum, um velho sacerdote, uma pirata espacial renegada, duas detetives fracassadas, uma caçadora de recompensas, dois cabbits, dois guardiões robóticos e dois cavaleiros mortos há séculos.

Este insignificante grupo logrou humilhar a mais poderosa força bélica da galáxia! Como? Impossível! Improvável!

Diferentemente do que a maioria achava, ele e seus colegas apoiaram Kagato não porque foram iludidos pela demonstração de seu falso poder Jurai do cavaleiro renegado.

Mas sim por causa de sua ambição. Sim, eles sabiam claramente que ele era um impostor e usurpador, mas nada mais importava rumo aos seus desígnios pretendidos.

O que ele não se conformava era o fato de que somente os membros da família real e alguns cavaleiros escolhidos tinham aquele poder sobre-humano que tornou possível a Jurai assumir uma posição de destaque na Galáxia, ao mesmo tempo impedindo revoltas internas.

Mesmo que o veterano almirante conseguisse subverter todas as forças armadas para tentar um golpe de estado, isto seria nada contra o imenso poder das princesas juraianas, dos seus cavaleiros protetores e principalmente daquele maldito terráqueo Tenchi.

Nagumo preparava-se para sorver outro gole quente do seu sakê quando o seu intercomunicador galáctico toca.

Pouquíssimas pessoas tinham acesso ao seu código de acesso e ele sabia que uma ligação naquelas horas não seria normal.

- Pronto, Almirante Nagumo?... - Responde o velho oficial, tentando manter a sua compostura militar apesar da bebedeira.

- Alô, Almirante, Aqui é Togo, Chefe do Gabinete Militar... - Responde uma voz metálica e inflexível do outro lado do intercomunicador.

- Bem... Ex-Almirante, você quer dizer, amigo Togo... O que deseja? - Pergunta melancolicamente Nagumo.

- Tem disponibilidade para participar de uma reunião de cúpula hoje à noite na Estação Militar Espacial Nagato? - Apesar do tom brando, era quase como que uma convocação compulsória.

- Bem... Do que se trata? Vossa Excelência sabe muito bem que não mais lidero a frota de combate juraiana... - Comenta educadamente Nagumo, intrigado com os motivos de tal convocação.

- Iremos debater um assunto de importância vital para a Frota. O Senhor Comandante está convocado a comparecer. - Responde Togo sem se alterar.

- Em caráter oficial ou extra-oficial?

- Saberá na hora. Espero ansiosamente pelo Senhor. Obrigado.

Desligando o intercomunicador, Nagumo medita com o resto de lucidez que ainda lhe restava.

Não, não podia ser uma reunião formal do gabinete de defesa, porque não tinham o hábito de convocar militares da reserva para tal... Tinha que ser algo bem grande... E sigiloso.

Após a destruição do sistema de defesa juraiano - quando Tenchi e sua turma invadiram o planeta principal na desesperada tentativa de derrotar Kagato e resgatar a princesa Aeka - foi construída com a ajuda dos engenheiros da Academia Galáctica de Ciências a imensa base estelar Nagato, a cerca de 50 mil quilômetros terrestres da atmosfera Juraiana.

Esta estação militar inteiramente blindada era muito maior do que a base central da Polícia Galática e estava fortemente armada, tendo cerca de cento e vinte naves de guerra juraianas classe cruzador para cima, sem falar nas centenas de naves menores de escolta e patrulha.

O seu poder de fogo era capaz de destruir sem dificuldades um planeta do tamanho de Júpiter ou mesmo uma pequena estrela..

A Nagato funcionava como um satélite militar gigantesco, girando ao redor do planeta central de Jurai, além de coordenar o intrincado sistema de barreiras, minas e satélites armados que protegiam o coração do Império.

Se Ryoko tivesse que desativar novamente o sistema defensivo juraiano, como fez da vez passada, seria praticamente impossível, já que teria que destruir por dentro a Base Nagato para ter este objetivo cumprido.

A nau capitânea do usurpador Kagato, a imensa fortaleza flutuante "Soja" (Serpentário), foi recolhida em segredo para o espaçoporto da Nagato, longe da vista de curiosos.

Embora fosse a mesma nave que raptara Aeka e não tivesse a tecnologia botânica que caracterizava a quase totalidade da frota juraiana, Soja tinha um poderio bélico imenso para ser ignorada e acabou se transformando em nau-capitânea da máquina bélica de Jurai.

Após ter tomado alguns remédios contra ressaca e uma ducha reforçada, Nagumo veste o seu uniforme militar de quando estava na ativa e toma uma espécie de táxi rumo ao espaçoporto principal da Capital de Jurai.

Chegando a área militar do espaçoporto, ele é recepcionado por dois oficiais de alta patente da Frota e é gentilmente convidado a se unir a eles, trocando o acanhado táxi por um veículo reservado para personagens de destaque.

Logo em seguida, ele e os oficiais chegam a um terminal de embarque, tomando um cruzador pesado juraiano que os levaria para a base Nagato.



Algumas horas mais tarde, Nagumo finalmente chega à base que ele não pode conhecer quando era Almirante da Esquadra e fica impressionado com a sofisticação e o aparato bélico que ela trazia.

Aquilo devia custar uma fortuna e com certeza a Academia Galáctica fez um ótimo trabalho, cedendo seus melhores técnicos e engenheiros, na costumeira troca de favores com o Império.

Através dos visores espalhados pelas docas da estação, ele vê a imensidão daquela fortaleza móvel, de cor negro-brilhante, símbolo do poder máximo da galáxia.

Ela era simplesmente imensa, e estava protegida por dezenas de naves de combate da 1a Frota da Guarda Juraiana, a força de elite máxima do Império, em formação de batalha.

Diante de tal visão de majestade, a sua grandeza cósmica acaba por comover o olhar do idoso oficial, fazendo-o derramar uma discreta lágrima que mal umedece o seu coração, duro como pedra.

O Ministro Togo o estava esperando, juntamente com uma guarda de honra vestida a caráter, estranha maneira de recepcionar um ex-almirante de reserva..

Togo era um militar baixinho, mas com corpo forte, olhar vivaz e usava um bigode espesso. Ele estava usando o seu habitual monóculo, além de trajar no momento, um uniforme que o identificava como Generalíssimo das Forças Armadas de Jurai.

Isto não era comum pelo rígido protocolo Jurai, porque os ministros de estado costumavam usar trajes cerimoniais civis em época de paz, apenas usando uniformes militares durante períodos de guerra.

A não ser que...

- Seja bem vindo, Almirante Nagumo. Em nome do Gabinete Militar de Jurai, eu o saúdo. - Diz Togo estendendo os braços e cumprimentando efusivamente o seu idoso colega.

- Estou impressionado, Generalíssimo Togo. Quanto à reunião... - Pergunta Nagumo com um ar visivelmente satisfeito, mas intrigado.

- Vamos indo para lá. Por favor, acompanhe-me. Não iremos passar pelo check-in. - Diz secamente Togo se referindo aos complexos procedimentos de revista e testes de identificação que as bases militares juraianas tinham para identificar suspeitos e prováveis terroristas.

O General Togo, o Almirante Nagumo, e a guarda de honra caminham por vários corredores com pistas rolantes até chegarem a um imenso elevador expresso. Lá, Togo dispensa os guardas e junto com o idoso almirante, entram no interior do mesmo.

Após poucos minutos, a cabine do elevador vai parar num corredor vasto e iluminado, bem protegido por vigias fortemente armados e por robôs guardiões em cada porta e esquina.

O experiente Nagumo repara que os procedimentos de defesa da estação são muito superiores aos de sua época.

Finalmente, a dupla de militares entra numa imensa sala de conferências decorada com as cores grafite e prata, que possuía uma mesa, vários assentos flutuantes e um telão computadorizado no fundo.

Após encontrarem seus assentos reservados na mesa de reuniões, Nagumo reconhece e cumprimenta os participantes.

Além de Togo, estavam lá o Almirante Yamamoto - seu ex-aluno da Academia Naval e atual comandante da Frota Juraiana; o Ministro das Informações Onishi - responsável pela área de espionagem militar; o cientista Doutor Marble - atual presidente da Academia Espacial de Ciências, após Washu ter sido expulsa (de novo) de lá; e Togusa Shimoda, o adido militar juraiano dentro da Polícia Galática e que foi responsável por ordenar ao comando da PG para que caçasse sem piedade as princesas Aeka e Sasami.

Após os cumprimentos e as amenidades de praze, a reunião tem início. Togo toma a palavra, abrindo a sessão, falando em voz grave e solene.

- Meus senhores e caros convidados. Eu, na qualidade de Chefe do Gabinete Militar de Jurai, abro esta reunião de suma importância para o destino de Jurai e do lugar merecido como potência galáctica.

- Acho que podemos ir ao ponto, caro colega Togo... - Diz em voz baixa e pausada o Ministro Onishi, um tipo intrigante e misterioso, que foi o responsável pela manipulação de informações junto aos meios de comunicação interplanetários no que dizia respeito ao falso Yosho (Kagato), bem como a séria obrigação de manter os juraianos na linha durante o tempo em que o usurpador esteve no poder.

Onishi era de meia idade, alto, magro e completamente calvo. Seu olhar era como o de uma pantera, pronta para espreitar o seu adversário. Ele trajava no momento um uniforme negro com detalhes em dourado e vermelho, identificando-o como membro do poderoso serviço secreto de Jurai, que tinha espiões e informantes por todos os sistemas planetários conhecidos da galáxia.

- É de conhecimento público que eu e os nobres colegas que estão aqui, tememos pelo destino de nosso glorioso planeta. Infelizmente, mais uma vez, as princesas Aeka e Sasami negligenciaram o dever que lhes cabem e desertaram de seus postos para procurarem... Aquele rapaz terráqueo que diz ser neto do lendário Yosho... - Diz Togo com visível azedume.

- Sem falar que depois dos últimos acontecimentos, o prestígio de nossas forças armadas foi abalado e nós nos tornamos motivo de chacota e gozação por toda a galáxia! - Complementa, exaltado, o Almirante Yamamoto.

Yamamoto era um homem aparentando ter cerca de 45 anos terrestres, de estatura média para alta, cabelos cortados em estilo escovinha e olhos inteligentes e vivazes. Culto, ele vinha de um dos clãs juraianos de maior riqueza e prestígio e fora um aluno brilhante, tendo ascendido rapidamente a cargos de confiança por ser assessor do Almirante Nagumo.

Ironicamente, ele sucedeu ao posto de seu ex-mentor por não estar implicado diretamente no golpe que derrubou a Princesa Aeka, pois naquele momento dirigia uma estação militar longe do local dos acontecimentos. Só que ainda se mantinha leal ao seu ex-comandante e deplorava o fato de tê-lo substituído no comando da Armada Juraiana.

- Desculpem, mas... O que quer dizer com isto, nobre colega? - Diz Nagumo, com certo tom de respeito ao seu pupilo e protegido, mas que acabara tornando-se seu sucessor. Ele não nutria qualquer traço de inveja ou ressentimento por isto ter acontecido, apesar de ter odiado a decisão do Conselho de Ministros de aposentá-lo prematuramente.

- Perdoe-me, Almirante, mas após a sua injusta demissão, nós tornamos um motivo de vergonha perante aos outros planetas. Aquela maldita pirata espacial Ryoko logrou destruir nosso sistema de defesa anterior, assim como a caçadora de recompensas renegada Nagi aniquilou várias de nossas melhores naves... Isto sem falar no caos causado por causa da cientista louca Washu e seus asseclas! - Diz com veemência o jovem Almirante de Esquadra, apontando para uma tela holográfica mostrando notícias colhidas nos meios de comunicação dos planetas vizinhos a Jurai, ao se referir a conclusão da aventura de Tenchi e sua turma.

O termo mais educado usado pelos órgãos de imprensa para classificar a atuação da Frota Juraiana foi o de "incompetente".

- Sem falar na falha clamorosa dos sistemas de vigilância da renomada Polícia Galática... Comenta Togusa. Um tipo sinistro, calado, de pele morena e com cabelo cor-de-rosa encaracolado, usando sempre óculos escuros. Pelo seu uniforme, o seu posto era equivalente ao de Coronel das Forças Secretas de Jurai.

- E dos sistemas de informação do Serviço Secreto Juraiano... - Complementa Onishi, fazendo autocrítica à atuação do seu antecessor no Ministério, que se suicidara ao ver o golpe de Kagato sido desmascarado.

- Na minha opinião, o erro de nosso estratagema foi o de simplesmente termos aprisionado as princesas Aeka e Sasami quando deveríamos tê-las assassinado na primeira chance que tivemos... - Volta a falar Nagumo em tom amargo, relembrando com ódio em seu coração a fatos passados.

- Mas, isto não iria causar uma repercussão negativa perante a plebe? - Tenta argumentar Togusa, expondo o ponto de vista dos Serviços Secretos de Jurai da época, que temiam o rompimento de relações diplomáticas de outros planetas aliados ao seu, devido às relações de amizade entre as famílias reais de um sistema com o outro...

- Infelizmente é uma regra de que dois reis não podem ocupar o mesmo trono, a mesma coroa, ao mesmo tempo. No momento em que as capturamos na Colônia 0315, deveríamos tê-las julgado sumariamente e as executado sem remorsos! - Fala Nagumo, inconscientemente dando um leve soco na mesa.

- Sem falar que subestimamos aquelas duas patéticas oficiais residentes da PG... - Comenta Togusa, ao se relembrar da cena em que foi visto falando com o superior imediato das oficiais Kiyone e Mihoshi naquele fatídico dia.

- E sequer sabíamos do paradeiro daquela pirata espacial chamada Ryoko e daquele ancião que dizia ser Yosho, bem como o seu neto... - Fala Onishi num raro momento de autocrítica..

- Chega, cavalheiros! Chorar pelo que já se passou não vai adiantar nada. Temos que encontrar uma solução rápida e definitiva para os nossos planos de restabelecermos a ordem em Jurai... - Togo tenta retomar o controle da reunião, falando com senso de realismo e frieza.

- Mas... General, isto não iria contra as sagradas tradições do planeta? Há milênios, a casa real de Jurai tem se mantido sem qualquer oposição, devido ao imenso poder oriundo das árvores sagradas que regem e mantém o planeta, que acabam confirmando o herdeiro ao trono... - Comenta o jovem Yamamoto, enquanto Nagumo o observa em silêncio, analisando a frase de seu ex-pupilo.

- Ou o nobre colega concorda que se deixarmos a inexperiente princesa Aeka junto com "aquele" plebeu reinarem sobre Jurai, nós estaríamos selando a decadência de nosso poder sob toda a Via Láctea? - Onishi intervêm na conversa, mostrando o desprezo que ele sentia por seres inferiores como os terráqueos da Colônia 0315 de Jurai, aquele insignificante planeta conhecido como Terra..

- Sim, concordo plenamente o que disse, mas... - Tenta contra-argumentar Yamamoto, mas sem muito sucesso.

- Eu acredito que mesmo que lideremos uma rebelião nas forças armadas e em certas facções da PG, correremos os riscos de sermos derrotados, mesmo assim. Por mais insatisfeitas que estejam com as princesas herdeiras Aeka e Sasami, os nobres dos clãs mais proeminentes não iriam permitir que os militares tomassem o poder. - Comenta Togusa mostrando os últimos relatórios do Serviço Secreto na tela de reuniões.

- Ou seja, temos que buscar uma liderança de consenso... Quem me dera se Lorde Kagato estivesse vivo... - Suspira Nagumo.

- Este é o problema? Nós, da Academia Galáctica de Ciências, poderemos fazer isto. - Fala o baixinho e excêntrico Doutor Marble que até então ouvira a conversa em silêncio.

Marble era um dos cientistas que haviam sucedido a insana Washu no comando da Academia - exilando a sua antecessora - e desde então trabalhara para fazer um estreito relacionamento com os poderes políticos e militares de Jurai.

Estes entravam na parceria com gordas verbas e estudantes de talento, e a Academia retornava com inventos e tecnologias que mantinham o planeta em posição de destaque invejável no cenário galáctico.

- Você ficou louco, velho? Todo mundo sabe que Lorde Kagato foi morto no duelo com aquele plebeu chamado Tenchi e... - Tenta protestar o Almirante Yamamoto.

- Seu corpo virou uma nuvem negra de energia negativa? Mas acredito que seja possível revivê-lo e mais do que isto, transformarmos ele num vassalo leal aos nossos desígnios... - Continua Marble sem ligar para o seu jovem interlocutor.

- Você está falando besteiras! Mesmo entre os lendários cavaleiros e os primeiros reis de Jurai, nunca ninguém jamais voltou da morte... Por mais que tivessem vivido séculos ou milênios! - Protesta Nagumo.

- Esperem, cavalheiros! Por favor, Doutor Marble, diga-nos com a sua sabedoria, como seria possível a volta de Kagato tornar-se verdade. - Fala tranqüilamente Togo como se esperasse esta resposta de seus colegas militares.

Dando uma tapinha nas costas do excêntrico cientista, ele o encoraja a continuar falando.

- Recentemente estava analisando os registros de pesquisas inacabadas de nossa Academia e descobri um dos projetos deixados pela minha antecessora antes dela ter sido exilada para a colônia 0315. Trata-se de uma máquina revificadora de qualquer organismo vivo... - Explica Marble, acionando um estranho teclado invisível semelhante ao de sua antecessora, que faz com que desenhos estranhos apareçam no telão da sala de reuniões.

- Continue... - Diz Nagumo visivelmente impaciente com tanta lenga-lenga científica.

- Nós concluímos há pouco tempo um protótipo secreto desta máquina no Centro de Pesquisas Avançadas e tivemos sucesso, primeiramente testando o invento em microorganismos, vermes, insetos e pequenos animais... - Comenta Marble mostrando na tela o resultado de seus estranhos experimentos, primeiramente visualizando os animais mortos e depois a seqüência de reavivamento dos mesmos.

- E o que aconteceu? - Pergunta laconicamente Nagumo.

- Tivemos praticamente 100% de sucesso. - Responde o cientista sem olhar para fora do teclado bizarro.

- E o senhor acha que esta máquina iria funcionar para trazer Kagato ao mundo dos vivos? - Intervém Togo, embora já soubesse o que o cientista iria responder em seguida, pois conversara em particular com ele antes.

- Perfeitamente! - Responde Marble sem hesitar.

- Eu até acredito que seria possível se tivesse sobrado alguma coisa, uma parte do corpo ou mesmo as cinzas de nosso Lorde Kagato... Mas ele foi totalmente desintegrado e encontrar qualquer vestígio do mesmo está além de nossa capacidade! - Tenta contra-argumentar Onishi, mencionando os informes do laudo referente à luta final entre Tenchi e Kagato na sala do trono real de Jurai.

- Não é tão bem assim... - Suspira desdenhosamente Marble como se fosse um paciente professor primário diante de alunos recém-entrados.

- Explique-se! - Diz secamente Nagumo.

- Há um mês e meio atrás, fomos chamados para analisar e purificar a câmara da sala do Trono, aonde ocorreu o embate fatal entre Lorde Kagato e aquele moleque. Um dos meus assessores detectou alguns resíduos moleculares no recinto no ar. Uma amostra foi coletada e, após minuciosas pesquisas, nós pudemos reconstituir o padrão do DNA de Kagato. - Comenta Marble, mostrando rapidamente um slide animado da pesquisa, terminando com um extenso gráfico mostrando a pesquisa feita em cima do DNA do vilão.

- Então é possível... Reconstituir o seu corpo via clonagem, não é mesmo? - Entusiasma-se Togusa, tentando dar uma de esperto.

- Se bem que não será tão simples. - Responde ceticamente Marble.

- Mas... - Togusa percebe que foi ingênuo ao tentar argumentar com o cientista, que era quase tão genial quanto a Washu.

- As técnicas de clonagem, por mais que sejam aperfeiçoadas, tem sempre um componente de aleatoriedade ou falha. O mais sensato seria reviver o espírito de Kagato, retirando-o da dimensão negra onde está, usando uma máquina experimental da minha antecessora... - Responde Marble, explicando o ponto aonde queria chegar.

- E como pretende fazer isto? - Pergunta Nagumo, ainda cético.

- Rastreando-o pelos traços de seu DNA usando um scanner interdimensional.

- Scanner interdimensional? - Exclama Togusa, intrigado com a exótica nomenclatura usada pelo cientista.

- Isto mesmo... Ele identificaria o usuário, arrancando sua alma inerte das profundezas do Hades para um molde previamente preparado. Esta técnica tem a vantagem de facilmente controlarmos a sua mente. - Responde Dr. Marble, tentando explicar com os termos mais simples possíveis para um bando de amadores em ciências avançadas.

- Genial! Assim não somente teremos o Grande Kagato de volta, mas também poderemos garantir a sua lealdade! - Entusiasma-se Onishi, se sentindo livre do problema adicional de lidar com as reações imprevisíveis do Cavaleiro Decaído de Jurai, caso fosse revivido.

- Exato. - Diz secamente Marble, sorrindo discretamente.

- Sugiro que passemos imediatamente à prática. De minha parte, vou fazer o possível para desviar o máximo de recursos do orçamento de defesa para uma conta secreta que será usada para os fundos de pesquisa. Almirante Nagumo... - Fala Togo, passando à parte prática da reunião.

- Sim, Senhor! - Diz Nagumo sem vacilar.

- Enquanto o odioso Conselho de Ministros atual estiver no poder, uma alternativa para não chamar a atenção de nossos "colegas" do ministério é nomeá-lo comandante do corpo de segurança que cuida da Academia Espacial. O Senhor será o nosso contato entre este conselho e o Doutor Marble! Se formos bem sucedidos, o senhor será reintegrado como Supremo Comandante da Frota Juraiana... - Diz Togo, olhando fixamente para o seu amigo de longa data.

- Agradeço muito, Senhor Ministro. - Agradece Nagumo, visivelmente grato por voltar à ativa. Embora o cargo em si não fosse grande coisa para quem comandou a Frota Juraiana inteira, ele sentiu que o caminho para a sua volta foi aberto pelo seu velho amigo.

- Ministro Onishi. - Continua o Astuto Ministro de Gabinete Militar, agora fitando o seu colega.

- Estou à sua disposição. - Responde Onishi, que detinha tanto ou mais poder quanto os militares presentes.

- Quero que rastreie o máximo de informações sobre os membros leais ao Conselho de Ministros atual e quem é fiel à nossa causa. Temos que separar o joio do trigo para que não incorramos em erros como antes...

- Sim Senhor! - Diz Onishi.

- Além do mais, peço que envie uma equipe de espionagem à Colônia 0315 para que vigiem os passos da odiosa Princesa Aeka e seus aliados para que eles nada fiquem sabendo até o golpe de estado se iniciar... - Explica Togo, procurando confiar na experiência de seu colega de ministério.

- Entendido. Farei o que o senhor mandar. - Diz Onishi, imerso em profundos pensamentos que ecoavam em sua mente tortuosa e astuta.

- E quanto a você, caro Togusa, eu quero que espione os movimentos da Polícia Galática para que ela não nos atrapalhe, além de fornecer o máximo de pistas falsas do que está ocorrendo... E se tiver algum paradeiro das odiosas pirata espacial Ryoko e da renegada caçadora de recompensas Nagi, por favor, me informe. - Sorri Togo, confiando na ambição e inexperiência do jovem adido militar.

- Considere cumprida a sua ordem! - Diz Togusa, sentindo-se finalmente importante numa reunião com gente hierarquicamente muito superior à sua.

- E quanto a você, caro Almirante Yamamoto... - A Voz de Togo sai pausada e ponderada, como se temesse ofender o impulsivo e jovem oficial.

- Sim. - Adianta-se Yamamoto, fazendo uma continência ao seu superior hierárquico.

- Não se preocupe. Embora o lugar de Nagumo como Comandante Supremo da Frota esteja garantido, você terá um lugar de destaque em nosso movimento. Quero que envie a 3a e a 7a Frotas na fronteira do Sistema Solar a título de manobras militares e que elas se mantenham em prontidão antes que o golpe se inicie... E o senhor terá a honra de capturar as princesas Aeka e Sasami quando o sinal for dado! Faça isto e será promovido a Almirante de Esquadra! - Exclama Togo, tentando conciliar as posições de seus subordinados imediatos.

- É uma honra servir ao poderoso Império Jurai, excelência. - Na realidade, Yamamoto não ficou nem decepcionado e muito menos inconformado com a iminência de devolver o seu cargo para o seu ex-chefe. Até ficou contente, porque ele gostava de ficar no comando direto de tropas e não atrás de um gabinete cuidando de detalhes administrativos e burocráticos.

- Obrigado a todos... Estão todos dispensados.

Em silêncio, todos os conspiradores se levantam de seus assentos, saindo da enorme sala.

A iluminação interna é desligada e o interior do recinto apenas permanece iluminado sinistramente pelo brilho verde e escarlate do telão, que mostra em último lugar os detalhes do gráfico da máquina revivificadora e o rosto em três dimensões de Kagato, o Cavaleiro Negro de Jurai.

Finalmente a tela se autodesliga, e a escuridão parece reinar.

Escrito por: Calerom

Terminado em 11/11/2003

Revisado em 12/12/2003;

myamauchi1969@yahoo.com.br