Capítulo XII – Uma Parte da Verdade

Junho chegara, solarengo. Agnès passava, agora, bastante tempo nos campos, fazendo os trabalhos de casa à sombra das árvores que envolviam o lago. Algumas vezes, era abordada por Draco Malfoy, usando o seu manto da invisibilidade. Nessas alturas, o estudo desaparecia da sua mente e ela própria desaparecia debaixo do manto.

Naquele dia, estava a debater-se para acabar um trabalho para Slughorn, sobre a poção Polisuco. Faltava-lhe um ingrediente, de que não se lembrava.

De súbito, foi agarrada pela cintura por mãos invisíveis. Soube logo quem era.

– Estava a ver que não aparecias hoje. – declarou a jovem, num tom levemente amuado.

– Tive de despachar a Parkinson. Caramba, aquela rapariga está a tornar-se insuportável! – volveu ele, beliscando-lhe o nariz.

A Ravenclaw soltou uma gargalhada bem-disposta.

– O que estás a estudar?

– A Poção Polisuco. Estou aqui com um problema. Falta-me um ingrediente...

– São moscas asas-de-renda. – foi a resposta pronta do loiro.

A jovem agradeceu e apressou-se a apontar aquele palpite. De seguida, atirou o caderno para a base da árvore mais próxima e puxou o manto de Draco, para poder entrar. Na sua pressa, a cabeça dele ficou visível uns instantes, contudo, nenhum deles se importou.

Não contavam que, de súbito, o manto lhes fosse tirado. Então, quando, relutantemente, pararam de se beijar, olharam para cima, a medo.

– Eu não acredito no que estou a ver!

Um Zabini furioso atirou a rapariga para o lado, enquanto agarrava Malfoy pelos colarinhos da camisa. Encostou-o a uma árvore com toda a força, fazendo com que algumas lascas de madeira se separassem.

– Era para isto que querias que eu a esquecesse? Para tu poderes andar com ela?

– Blaise, tu não percebes! Não era isto que eu queria, 'tá?

– Cala-te! Pensei que eras meu amigo.

E esmurrou o loiro, completamente enraivecido. Agnès conseguira levantar-se e avançava para aquele par, quando Malfoy a advertiu, numa voz um pouco imperceptível, devido ao sangue que lhe escorria para a boca:

– Afasta-te! Eu meleço isto! – ousou erguer o olhar para o outro, que o fitava furiosamente. – Blaise, tu não te atlevas a tocal-lhe!

– Não te preocupes, Malfoy. Eu seria incapaz de bater numa mulher. – replicou ele, por entre dentes.

– Ela não tem culpa. Eu enganei-a, tal como te enganei a ti!

Mesmo com os avisos do loiro, a Ravenclaw tentou fazer com que o agressor largasse a sua vítima. O moreno debateu-se, mas, após ter esmurrado o outro mais umas vezes, desistiu de o agredir. Tanto ele como Agnès caíram para trás, pesadamente.

Malfoy escorregou pelo tronco. Uma onda de mal-estar invadiu o seu âmago, sobrepondo-se às dores que o assolavam initerruptamente.

– Ouviste bem, Blaise. Eu enganei-vos aos dois. Fiz tudo para que tu a esquecesses. Para isso, tive de fingir ser amigo dela e, mais tarde, seu namorado. Tu viste-nos e ficaste convencido de que ela já não gostava de ti. Mas eu continuei o meu plano. Continuei com ela, menti-lhe.

– O quê? – perguntou a rapariga, desnorteada.

– Isso mesmo que tu ouviste. Eu menti-te este tempo todo. – cuspiu, simulando triunfo.

A jovem, pura e simplesmente, não queria acreditar naquelas palavras frias.

– Estás a querer dizer que…

– Sim! Estou a dizer-te que nunca gostei de ti. Nunca. Nem por um segundo. – interrompeu Draco, sentindo-se cada vez pior.

Tinha de continuar a mentir. Agora que Zabini sabia, a Ravenclaw estava em perigo iminente. Nunca devia ter deixado que as coisas chegassem àquele ponto.

– Acreditaste mesmo que eu te amava? Tu, uma defensora dos Sangues-de-Lama nojenta? Uma traidora de sangue?

Custava-lhe tanto dizer tudo aquilo!

– A minha única intenção era separar-vos. O meu melhor amigo merecia melhor do que tu. Tive de trair e enganar, mas, pelo menos, consegui que tu o esquecesses!

Agnès estava em estado de choque. Ele não poderia estar a falar a sério. Deveria fazer parte dos seus esquemas para não ser detectado.

– Prova o que estás a dizer. – ordenou Zabini, que, até àquele momento, não dissera mais nada.

Malfoy empalideceu. Hesitou por uns segundos, sabendo que só havia uma maneira de prová-lo. Suprimiu um suspiro e pegou na varinha, apontando-a à pessoa de quem ele mais gostava.

Crucio!

Com uma expressão de choque na face, a rapariga começou a estremecer horrivelmente. A sua boca abriu-se, deixando fugir um grito de dor, ao sentir centenas de facas a dilacerarem. E a pior de todas acabava de rasgar o seu já moribundo coração.

Impedimenta!

As dores acutilantes pararam, deixando-a como se tivesse levado uma sova. Deixou-se estar, contorcida contra o solo, sem reagir à voz de Zabini.

– O que é que tu fizeste?! – exclamou Blaise, furioso.

Malfoy levantou-se, ainda atordoado pelo feitiço do outro Slytherin. Tentou sorrir, como antes fizera, mas a única coisa que conseguiu foi fazer um esgar de dor.

– Fiz o que me pediste. Provei-te que não gosto desse lixo.

O moreno levantou-se, disposto a enfeitiçar o outro. Nunca tinha sentido tanta raiva por ninguém, nem mesmo pelo Trio Maravilha. Por seu lado, o loiro estava disposto a não se defender, caso o amigo lhe lançasse um feitiço. Estava plenamente consciente de que o merecia inteiramente.

Porém, ao invés de agredir o rapaz, Blaise baixou-se ao lado da rapariga e virou-a para si. Estava pálida e grossas lágrimas escorriam-lhe da face. Sem dizer mais nada, pegou nela ao colo e levou-a dali, sem dizer mais nada àquele que tinha sido o seu melhor amigo.

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Passara uma semana desde que Agnès tinha sido atacada. Desde então, não proferira nenhuma palavra, o que deixava Madame Ponfrey deveras ansiosa.

– Ela não responde a qualquer estímulo, quer físico, quer mágico. Não sei o que é que ela tem. Seja como for, terá de permanecer aqui. – explicou, gravemente, a curandeira de Hogwarts, a um Zabini muito atarantado.

Todos os tempos livres de que dispunha eram passados com a Ravenclaw, na Ala Hospitalar. Ela nem parecia notar que estava acompanhada. No entanto, ele não iria desistir.

O Slytherin sabia o que se passava. Não fora a maldição Cruciatus que a pusera assim. Fora o choque, o choque de saber que tinha sido enganada durante tanto tempo. Ele próprio ainda se sentia traído.

Falava com ela, mesmo sem se importar se ela ouvia ou não. Contava-lhe como se sentira mal, quando ela o apanhara em flagrante delito; como sofrera aquele tempo todo sem ela.

Mudara. Sabia agora disso. Quando o Potter, os Weasleys e a Granger a tinham ido visitar, na Terça-feira, deixara as divergências de lado. Estes mostraram-se muito surpreendidos com a mudança de atitude do Slytherin, contudo, nada disso lhe importava. Só Agnès.

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Malfoy estava exuberante. Finalmente, conseguira consertá-lo. Seria esse o dia D. Depois, nada poderia acontecer.

Apressou-se a comunicar aquela notícia a Madame Rosmerta, de modo a que esta contasse aos Devoradores da Morte.

Encostou-se à porta. Se tudo corresse bem nesse dia, não se teria de preocupar com a segurança dos seus pais e de Agnès. Nunca mais.