Cap. 10 – Por Quem os Sinos Dobram

– Não, Saga, não atende, por favor! – murmurou Shina no ouvido do Major.

– Não posso, Shina, esse é o telefone de emergência... – replicou Saga.

– Aaaaaahhhhh – protestou a menina, beijando o peito nu do homem abaixo de si.

Saga suspirou. – Olha, se não for coisa realmente séria eu juro que mato um! – disse, afastando a menina de cima de si, que sentou na cama e fez um biquinho, emburrada. Saga sentou-se a seu lado e sorriu. – Calma, minha pequena rebelde, que a gente já continua de onde parou! – riu. – Alô? Só podia ser você mesmo, seu encosto! – disse o Major ao telefone. Tampou a escuta e voltou-se para Shina. – É o Shaka!

A menina emburrou ainda mais. Ela não sabia de fato quem eram Mu e Shaka, mas sabia que sempre que um dos dois estava envolvido, era encrenca na certa. E quando os dois estavam envolvidos juntos, então, aí a coisa era séria mesmo.

– Fala, estorvo, que eu estava em meio a algo importante... Sim, você me interrompeu, loirão... É óbvio que eu não estou sozinho, né? Que pergunta idiota! ... Putz, tava tão na cara assim, é? Preciso aprender a me controlar mais... – riu Saga. – Mas foi pra saber disso que você ligou na droga do telefone de emergência, loirão? ... O QUÊ? Não, é brincadeira sua, né?... PUTA QUE O PARIU! O que você e o loirinho vão fazer?... Vir pra cá, claro, como eu não desconfiei... vocês acabam sempre aqui mesmo... Tá, vocês saem da Líbia agora e chegam amanhã sabe-se lá que horas, é isso? ... E o que eu digo pros meninos, que vocês ressuscitaram? Claro que isso é problema meu, né, Shaka, vocês explodem o mundo e o problema é sempre meu!... Calma, loirão, não estou dizendo que a culpa é de vocês... eu sei que o buraco é bem mais embaixo... sim, sim, claro... fiquem bem, vocês dois! Se você morrer eu te mato!... Não ria, estou falando sério... Hei, Mu, você também, se você morrer eu te mato!... O que deu em vocês pra rirem assim? Tá, tá... tá... espero vocês então! Boa sorte! – desligou o Major.

– Problemas? – perguntou Shina com a feição séria, massageando as costas de Saga.

O Major gemeu qualquer coisa incompreensível. – Problemas e sérios, Shina. Bem sérios! – completou e encarou a menina nos olhos. – Me abraça, por favor? – pediu Saga com lágrimas nos olhos, no que foi prontamente atendido por Shina. "Nunca vi o Saga assim tão... vulnerável. O que será que aconteceu dessa vez?", pensou a garota, visivelmente preocupada.

-X-X-X-

Foi acordando devagar. Ainda não abrira os olhos e estava naquele estado de transe entre o sono e o despertar. Mexeu-se um pouco e sentiu um peso sobre si. "Ai que sonho bom que eu tive essa noite!", pensou. Abriu os olhos aos poucos. Olhou para aquele ser deitado por sobre si, com o queixo encostado em seu peito, sorrindo divinamente. Fechou os olhos novamente, naquele estado de torpor gostoso. "Acho que ainda estou sonhando...", tornou a pensar. Acariciou a cabeça do outro, decidido a aproveitar em sonho o que lhe era proibido na realidade. – Bonjour, mon ange, mon rêve! – sussurrou baixinho.

– Bom dia, Camus! – respondeu o sonho em alto e bom som, beijando seu peito por sobre a camiseta regata. – O que quer dizer rêve?

Rêve é sonho... – murmurou Camus. – Exatamente o que você é, um sonho!

– Isso é que é elogio... – sorriu Milo.

O francês estranhou aquilo. "Desde quando os sonhos respondem?", pensou. Abriu os olhos e viu Milo deitado em seu peito. Fechou os olhos novamente. Abriu mais uma vez, e o inglês continuava lá. "Mais ce n'est pas possible, ça!", pensou o ruivo. Esfregou os olhos e os abriu pela última vez, crente que não veria o objeto de seus desejos mais profundos ali.

– Ainda não acordou, Bri? – perguntou o sonho sorrindo.

Camus assustou-se e se levantou de uma só vez, batendo a cabeça com tudo no estrado do beliche que ficava acima de si. – Ai! Merde! – praguejou o francês, passando a mão na testa machucada.

Milo sentou-se na cama gargalhando. – Machucou, Camus? – perguntou, pousando a mão de leve sobre a mão do outro e retirando do local ferido. – Não foi nada mas talvez fique um galo bem bonito! – disse o inglês ainda rindo.

– Milo, pode me explicar o que está acontecendo aqui? – perguntou Camus num sussurro gritado.

– Nós dormimos juntos, ué! – respondeu o inglês dando de ombros.

– Fala baixo, seu loiro dos infernos, antes que alguém ouça. Ou você não sabe que... – parou Camus e olhou para os lados, vendo Milo de peito desnudo. – isso é punido com expulsão? – disse, apontando para si mesmo e para o outro. Milo simplesmente deu de ombros. – Opa, mas peraí, nós... dormimos juntos, foi o que você disse? – perguntou o francês ainda tentando entender o que tinha verdadeiramente se passado.

– Dormir é diferente de transar, Camus! – respondeu Milo.

– Milo! – repreendeu o francês. – Cuidado, estamos no alojamento, se alguém ouve, nós dois ó! – disse fazendo um gesto de degola com a mão.

– Ai, Bri, como você é chato... eu cheguei meio bêbado ontem e deitei com você, o que isso tem de mais? Além do que hoje é o dia seguinte da premiação e o Major deu folga pra todo mundo... não tem ninguém no alojamento não, seu francês in-su-por-tá-vel! – disse Milo, levantando-se.

O inglês espreguiçava-se em gestos quase felinos. Tinha o dorso nu, o que permitia que Camus visse os músculos se esticando e se retesando a cada movimento de Milo. O inglês continuou, levantando os braços por cima da cabeça e esticando-se por completo. Relaxou e passou a movimentar o pescoço em movimentos circulares e lentos. Camus sentiu vontade de morder aquele pescoço, mas não disse nem fez nada. Somente observava, vidrado pelo loiro. "Si beaux...", pensou. "Tão lindo..."

– Estão todos fora, você disse? – perguntou o francês, saindo da espécie de transe em que estivera.

– Sim, sim... Aiolia saiu com Marin logo no início da festa. O Mask mais meu irmão saíram pra beber e o Deba e o Shura não quiseram ir com eles e foram dançar em alguma boate da vida, pra tentar pegar mulher, óbvio... – contou Milo.

– Era o que a gente deveria tentar fazer também... – murmurou Camus.

– O quê? Dançar ou pegar mulher? – tornou o inglês.

– As duas coisas, Milo, as duas coisas... – replicou o ruivo. Milo ia responder alguma coisa ríspida ao comentário do outro, mas viu que o francês tinha os olhos tristes e baixos, e resolveu não falar nada.

– Está com fome? – perguntou Camus levantando os olhos.

– Pra te dizer a verdade, sim. Mas se eu bem conheço esse povo, não tem absolutamente nada pra comer porque a base e o salão de festas ainda devem estar fechados... só se a gente sair daqui e for comer fora... – começou a dizer Milo. Tinha medo do que ia perguntar a seguir e precisou de toda sua coragem. – Quer sair e dar uma volta? Posso te mostrar Atenas...

Camus olhou para o loiro e sorriu. – Não é que às vezes você tem boas idéias, seu lordezinho de meia pataca?

– Ah, pára o mundo que eu quero descer: a Bri fez uma piada! – tornou Milo com um ar brincalhão, jogando-se na cama e fingindo que ia desmaiar.

Camus sorriu e deu um empurrão de leve no braço do outro. – Eu sou tão chato assim, é?

– Na maioria das vezes sim... – respondeu o loiro. – Mas faz parte do seu charme, Bri, não esquenta não.

– Você não toma jeito mesmo... – tornou Camus. – Vou tomar um banho pra sairmos! – disse. Milo levantou e fez menção de ir com ele. – Sozinho, Milo!

– Tá, tá, só queria adiantar... afinal se tomássemos banho juntos seria bem mais rápido, né? – tornou o inglês com uma carinha marota.

– Te conhecendo como te conheço, Milo, iríamos é demorar muito mais pra sair... – sorriu Camus. Pegou suas coisas e entrou no banheiro.

"Ah, Camus, é impressão minha ou parece mesmo que vou conseguir quebrar essa barreira de gelo eterno que você mesmo se impôs?", murmurou Milo para si mesmo logo que o francês saiu do cômodo.

-X-X-X-

Buon giorno, Dite! – exclamou o italiano. Carregava uma bandeja com toda sorte de guloseimas que se pode imaginar. – Acorda, belo adormecido! – completou.

Afrodite espreguiçou-se devagar, sem abrir os olhos. Custava a acreditar que aquilo tinha realmente acontecido. Ou melhor, que aquilo tinha se repetido. Abriu os olhos e sorriu. Estava tudo lá: a cama macia toda revirada, as roupas jogadas por todos os cantos da suíte do hotel, as almofadas espalhadas. E aquele homem lindo vestindo apenas a roupa de baixo a lhe dar bom dia e trazer o café da manhã na cama. Decididamente, era bom demais pra ser verdade. Até mesmo para ele, que estava acostumado a conseguir tudo o que queria.

– Bom dia! – respondeu Afrodite com voz de sono. – O que tem aí?

– Ah, tem de tudo um pouco... não sabia o que você gosta de comer de manhã e pedi de tudo um pouco... – tornou Másquera. O italiano estava bonachão e alegre, e seus olhos não brilhavam daquela forma amedrontadora de sempre. Brilhavam de outra forma, de um jeito mais... terno.

Afrodite sorriu e abriu os braços, convidando o outro para um abraço. Másquera largou a bandeja em um canto e respondeu ao carinho, deixando-se abraçar pelo loiro. Acariciou os cabelos macios e lisos de Afrodite, levando uma ponta ao seu nariz. – Como você é cheiroso, Dite! – murmurou. Deu um beijo de leve nos lábios do sueco.

– Não sabia o que eu gosto de tomar no café, é? Acho que está na hora de aprender... – disse Afrodite, olhando para a bandeja ao lado de si.

O italiano perdeu o ar alegre e baixou os olhos. "Ai falei merda! Tô parecendo o Milo...", pensou o sueco. Arrastou-se na cama e abraçou o moreno por trás, mordendo de leve o ombro do outro. – Desculpa, tá? – disse Afrodite no ouvido de Másquera.

– Desculpar do quê? – perguntou o italiano, acariciando o braço do loiro.

– Por ter dito isso... – respondeu Afrodite meio sem jeito.

– Eu que peço desculpas, Afrodite. Eu queria de verdade saber o que você gosta de comer no café da manhã – começou Másquera. – E no almoço... na janta... onde você gosta de ir no domingo de manhã... se prefere campo ou praia... sua marca de roupa preferida... a pasta de dentes que você usa... quem é seu melhor amigo... quem é seu pior inimigo... Eu queria saber tudo isso, meu loiro! Tudo isso e muito mais... mas... você sabe... eu... – interrompeu sua fala, sem saber mais o que dizer.

Afrodite lutou bravamente contra a emoção, mas perdeu a batalha: duas lágrimas escorriam por sua face alva. – Moreno, eu... eu nem sei o que dizer...

– Então não diz nada. Só me beija, tá? – pediu Másquera.

Os dois trocaram um beijo doce e, pela primeira vez, apaixonado.

-X-X-X-

– Por favor, eu gostaria de uma salada parisiense e uma água com gás. Você tem Perrier? – perguntou Camus ao garçom, que fez que sim com a cabeça. – Ótimo, então que seja Perrier... ah, e por favor pingue umas gotas de limão no copo, sim? – completou o francês e o garçom anotou o pedido.

– Nossa, mas tinha que ser a Brigitte Bardot mesmo pra ser fresco até pra pedir água, credo! – disse Milo e Camus fechou a cara. – Oh, moço, pra mim você trás é um moussaka de entrada, depois um moshári stifado... ah, pode trazer também um pão pita pra acompanhar a saladinha do meu amigo francês aqui, que agora sim vai provar da melhor culinária do mundo... e, claro, pra completar, uma cerveja! – pediu Milo, em grego, e fechou o cardápio, rindo.

– Sim senhor! – respondeu o garçom, satisfeito com o pedido verdadeiramente grego do outro.

– O que você disse pro garçom pra ele sair daqui sorrindo daquele jeito? – perguntou Camus.

– Que você ia conhecer a melhor culinária do mundo, Bri! – tornou Milo de um jeito brincalhão.

– Ora, mas eu já conheço, Milo. É a tradicionelle cuisine, duvido que tenha coisa melhor no mundo inteiro! – respondeu o ruivo cheio de patriotismo.

Milo riu. – Tá bom, Bri, tudo o que eu não quero agora é discutir com você!

– Então pára de me chamar de Bri, Brigitte Bardot, Yves Saint-Laurent e Amelie Poulin! – respondeu Camus contrariado.

– Ih, Bri, aí não dá, prefiro brigar com você! – completou Milo de um jeito debochado.

– Ora, seu... – disse o ruivo fazendo cara de emburrado. Mas não agüentou muito tempo e gargalhou, fazendo o loiro cair na risada também.

O almoço transcorreu normalmente. Os dois conversavam amenidades e não mencionaram em momento nenhum o que verdadeiramente lhes afligia. Terminada a refeição, começaram um pequeno tour por Atenas. Passearam por todos os lugares turísticos, e Milo ia dando uma aula de história grega a Camus, que bebia as palavras do amigo. A caminhada pela Acrópoles foi o momento alto do passeio: visitaram o Pathernon, o templo de Atena e o Teatro de Dionísio. Desceram a montanha e caminharam tranqüilamente por Plaka, um bairro cheio de tendas que vendiam souvenires típicos. Compraram algumas coisas e, quando se deram por si, já era de noitinha.

– Nossa, Milo, tá tarde, acho que devemos voltar pra base... – disse Camus.

– Ah, vai, Bri, vamos pelo menos tomar um vinho grego, vai, pra você ver se gosta... conheço uma taberna de onde dá pra ver o Pathernon iluminado... eles também servem um queijo de cabra delicioso! – respondeu Milo sacudindo o outro.

– Tá, tá, Milo, um vinho grego e queijo de cabra... parece ótimo... mas por pouco tempo, tá? – concordou o ruivo.

– Eeeeeeeeehhhhhhhhhhhhh – comemorou o inglês. Assobiou e chamou um táxi.

Cerca de cinco minutos depois chegaram na tal taberna. Era um lugar simples, um restaurantezinho branco cheio de mesinhas espalhadas pela calçada. Realmente a vista do Pathernon todo iluminado era maravilhosa. Pediram o vinho e o queijo, e em pouco tempo já degustavam de uma das muitas maravilhas que a Grécia tinha a oferecer.

– Por que você topou vir, Camus? – perguntou Milo tomando um gole de vinho.

– Pra experimentar o vinho, ué. Que aliás, admito: é muito bom! – respondeu o francês.

– Perguntei a verdadeira razão, ruivo... – tornou Milo com olhos inquisidores.

O ruivo suspirou. – Pra poder prolongar esse tempo com você, Milo. Pronto, falei, era isso que você queria ouvir, não era?

– Sim, com certeza era! – respondeu o inglês sorrindo. Pousou uma das mãos na mão de Camus. – Sabe, podia ser assim... simplesmente assim... sem neuras, sem nada... – completou, acariciando a mão do outro.

Camus tombou o corpo para frente e encarou o loiro nos olhos. – Você sabe que está me pedindo uma coisa que subverte tudo aquilo que eu sempre achei que fosse certo nessa vida, não sabe?

– Sei, Camus, sei sim. Mas te peço mesmo assim. O que você me diz? – inquiriu Milo.

O francês suspirou profundamente e retirou sua mão da de Milo, deixando-se cair apoiado no encosto da cadeira. – Milo, você é importante pra mim. É sim. Mas eu preciso de um tempo pra pensar... pra tentar te entender, me entender, nos entender... Pode ser? – perguntou o ruivo.

Milo suspirou e sorriu. – Bom, ao menos você não saiu andando dizendo que nunca daria certo... vou tomar isso como um progresso, tá?

– Tá... – respondeu o francês com olhos tristes e baixos.

– A conta, garçom! – pediu Milo. Comemorava internamente, pois sabia que tinha conseguido um enorme progresso com o francês.

Tomaram um táxi até a base e não trocaram mais nenhuma palavra durante o trajeto. Chegaram no alojamento e encontraram os amigos, menos Aiolia. Shura comentava todo prosa que tinha encontrado a garota das fotos na boate que fora com Aldebaran. Deu as fotos que eram de Camus e Milo para os dois. O inglês e o francês trocaram um olhar significativo e guardaram os retratos com carinho, especialmente o dos dois com a Cruz Púrpura nos peitos estufados de orgulho.

-X-X-X-

– Ai, Olia, aí não... ah, ah, aaaahhhh... pára, seu bobo! – dizia Marin.

Estavam os dois na falsa sede da base, onde era a mesa da Sargento D'Aguias. O lugar estava escuro e empoeirado, e Aiolia foi arrastando a garota e derrubando um monte de coisas no chão. Ele desejava a menina mais do que tudo nesse mundo: amava Marin verdadeiramente. Era seu tesouro, seu mais precioso bem. Beijou a garota com sofreguidão.

– Calma, Olia! – sorriu Marin.

– Ah, ruiva, é que você me deixa doidinho... – pontuou o moço, escorregando as mãos pelas coxas firmes da Sargento.

Marin gemeu e acariciou os cabelos aloirados de seu namorado, que agora beijava seu pescoço. – Ah, Olia, eu te amo tanto...

– Eu também, minha linda. Eu também te amo muito! – respondeu o soldado. Levantou a menina e colocou-a sentada em cima da mesa.

Beijavam-se na ânsia do desejo dos apaixonados, quando de repente um barulho estranho se fez ouvir.

– Ué, o que é isso? – perguntou Marin.

– E quem liga? – respondeu Aiolia, continuando a beijar o pescoço da namorada.

– Pára, Olia! É o fax! – disse a moça, afastando o outro e acendendo as luzes.

– E daí que é o fax? – argumentou Aiolia.

– E daí que só os superiores de vocês e mais o Saga têm esse número de fax. É uma base falsa, esqueceu? – pontuou a menina enquanto a máquina cuspia a folha de papel.

– Continuo sem entender... – Aiolia deu de ombros e abraçou a ruiva por trás, distribuindo beijos por sua nuca.

Marin revirou os olhos. – Olha, como vocês homens ficam burros quando estão excitados, é impressionante! Isso pode ser alguma coisa séria, Olia, e com certeza diz respeito a um de vocês!

– Tá, tá, fui trocado por um fax... o que diz aí? – disse Aiolia emburrado, entregando a folha de papel à namorada.

Marin riu do jeito de criança contrariada do namorado. Pegou a folha de papel e sua feição mudou. – Não entendo...

– Nem eu. Mas de uma coisa eu sei. Tá escrito Ministère de France em cima e À Camus L'Aquaire embaixo... – comentou Aiolia, tentando em vão entender o que estava escrito no papel timbrado com a fleur de lis entre duas espadas, conhecido símbolo francês.

– Camus... – sussurraram os dois namorados ao mesmo tempo, segurando o fax nas mãos.

-X-X-X-

Chegaram à enseada de treinamento suados e sorridentes. Haviam sido acordados por Shina e Saga às duas e meia da manhã, mas não davam a mínima. O único que carregava um semblante mais preocupado era Aiolia. Mas hoje era o dia do último exercício, e depois daquilo finalmente se formariam. Era um dia de alegria! Mesmo que o exercício fosse duro, mesmo que fosse praticamente impossível passar por aquela prova, dariam tudo de si. Durante aqueles meses de treinamento desenvolveram uma amizade verdadeira e formavam um grupo coeso e habilidoso, e nada, absolutamente nada, poderia impedi-los de completar o desafio, fosse ele qual fosse.

– Bom, homens... – começou a dizer Saga. – A prova de hoje vai ser só para constar mesmo. Acredito que depois de tudo o que passamos juntos, os Senhores estejam mais que preparados para subirem de posto e seguirem seu caminho. A carreira dos Senhores foi brilhante até aqui, e tenho certeza que depois disso alcançarão as estrelas. O céu é o limite, rapazes!

– Uhá! – responderam os seis recrutas.

Nesse instante, Marin veio descendo o morro num dos veículos da OTAN. Chamou Saga num canto e os dois conversaram por algum tempo. Aiolia, ao lado dos companheiros, parecia verdadeiramente incomodado.

– Calma, Olia, que o Saga não vai dar em cima da Marin não... posso estar enganado, mas acho que o lance do Major é a Shina! – disse Aldebaran, rindo.

Aiolia sorriu preocupado. – É, Deba, deve ser sim... – respondeu automaticamente. Os companheiros deram de ombros, não fazendo a menor idéia do que poderia estar acontecendo.

Saga veio caminhando de encontro aos recrutas. Segurava um papel nas mãos e tinha o semblante sério. – L'Aquaire, acho que isso é pra você! – disse o Major, entregando a folha ao líder do esquadrão.

Camus tomou a folha nas mãos e passou os olhos pelas letras. Sorriu e logo depois fechou a cara. – Major, será que o Senhor pode adiar um pouco o treinamento? Preciso conversar uma coisa com o Milo... – pontuou Camus.

– Por mim tudo bem. Dispensados por meia hora! – disse Saga. Os recrutas permaneceram ali, brincando uns com os outros, enquanto Milo e Camus se distanciavam ao longe.

– O que foi, Camus? Você está com uma cara... – disse Milo assim que os dois chegaram numas pedras que havia no canto da enseada.

– Dessa vez você foi longe demais, seu inglesinho besta! – respondeu o francês com os olhos cheios de raiva e, de uma estranha maneira, desespero.

Milo preocupou-se ao ver a feição transtornada do outro. – Mas o que foi que eu fiz? – perguntou, sem ação.

– Ah, e ainda pergunta! Fez isso, ó! – disse o francês, jogando a folha de papel para Milo.

O inglês passou os olhos pela carta e não entendeu nada. – Camus, desculpa, eu não falo francês... o que é isso?

– Ah, não me venha com essa... você deve falar francês, sim. Só queria saber como é que você achou o selo das armas francesas pra pôr aí! – disse Camus. Andava de um lado para o outro, transtornado.

– Camus, desculpa, mas não sei do que você está falando, querido... – pontuou Milo sem saber o que fazer.

– Isso foi jogo baixo, Milo. Mandar essa carta aí achando que por isso eu ia me jogar aos teus pés. Vai, confessa que foi você, vai! – afirmou o francês. Tomou Milo pelas golas da farda, sacudindo o loiro.

– Não sei do que você está falando, Camus, de verdade! E além do mais você acha mesmo que o mundo gira tanto assim em torno do seu umbigo que eu ia me abalar pra escrever alguma coisa pra você em francês e ainda por cima achar o raio do símbolo que você falou? Tá pensando que é quem, hein? – tornou o inglês já irritado com aquilo.

– Quer dizer que não foi você? – perguntou Camus.

– Não, claro que não. Não faço nem idéia do que seja isso! – continuou Milo.

O francês deixou-se sentar na pedra e encarou o chão. Milo ficou olhando para o outro sem entender absolutamente nada, sem saber o que fazer. Estava totalmente sem ação e, definitivamente, preocupado. Nunca, desde que conhecera o francês, vira-o tão transtornado. Tão amedrontado. Tão... desesperado. Camus levantou a cabeça e encarou Milo. Seus olhos estavam mais azuis do que nunca, e brilhavam.

– É, c'est la vie... – murmurou Camus. Sorriu um sorriso triste e deu a folha de papel para Milo. Levantou-se e foi caminhando, decidido, em direção aos amigos.

– Espera, Camus, o que foi? – ia dizendo Milo atrás dele. – O que aconteceu? Deus do céu, homem, fala comigo!

– Me deixa, Milo! – respondeu Camus. Continuava caminhando resolutamente, de cabeça erguida, embora seus olhos estivessem marejados e um nó teimasse em se formar em sua garganta.

– Camus, pelamordedeus, me diz o que está acontecendo pra te deixar assim tão transtornado! – implorou Milo.

Laissez-moi, Milo! – gritou Camus. Fez um gesto com as mãos indicando que o inglês deveria parar de segui-lo.

"Meu Deus, o que eu faço agora?", pensou Milo desesperado. Resolveu parar de seguir o outro. Ficou parado, segurando a carta nas mãos, tentando em vão desvendar as letras que se embaralhavam à sua frente. "Não é possível...", murmurou ao ver pra onde Camus se dirigia. – NÃO, Camus! – gritou ao longe.

O ruivo estancou por um momento. Olhou para trás e viu Milo correndo para si, no mais puro desespero. – Adieu, mon ange. C'était si bon mais maintenant c'est fini. Totallement fini. Dieu jamais m'a donné une bonne chose dans ça vie qu'à toi, Milo. Mais maintenant c'est fini! Ah, mon Dieu, pour quoi les choses ne peux pas être facilles pour moi? Jamais facilles, jamais. Pardon, Milo. Pardonnes-moi, mon ange! – murmurou o francês, baixinho, para si mesmo. Abaixou os olhos e levantou um braço. – Courage! – disse resolutamente. (1)

– Não, Camus, por favor não! – exclamou Milo ao longe.

Uma batida. Duas batidas. Três batidas. O sino repicava, enchendo a praia com o som do incompreensível. Milo caiu na areia de joelhos: era tarde demais. "Por que, Camus?", murmurou o loiro para si mesmo ao ver o francês correr morro acima. Caso tivesse olhado com atenção, veria que o ruivo secava as lágrimas enquanto corria.

Os soldados mais o Major e as Sargentos ficaram petrificados por uns segundos. Então tinha mesmo Camus L'Aquaire, o mais brilhante dentre eles, tocado o sino? Tinha mesmo Camus L'Aquaire desistido do treinamento agora, na reta final? Era simplesmente incompreensível, mas o barulho do sino ainda ecoava na praia, mostrando a todos que aquele non-sense era verdade.

– Milo, o que aconteceu? – veio correndo Shura. – Diós, que se pasó con ustedes? – completou o espanhol, ajudando o amigo a se levantar. Milo estava com os olhos abertos, esbugalhados encarando o nada, e segurava o papel amassado nas mãos.

– Não sei, Shura... não sei, não sei mesmo... ele achou que tinha sido uma brincadeira minha mas não foi e... – começou a explicar Milo para a platéia atônita. – Mask, você também lê francês ou só fala?

– Leio alguma coisa... por quê? – perguntou o italiano.

– Traduz isso, pelamordedeus. Seja lá o que esteja escrito aqui fez o Camus simplesmente desistir do treinamento! – murmurou Milo entregando o papel amassado ao italiano.

Másquera passeou os olhos pela carta. – Dio mio... – murmurou. – Aqui diz que a França convoca o Camus para voltar ao país. Uma situação de extrema emergência. Diz para deixar o treinamento e não comentar nada disso com ninguém, especialmente com o inglês e o americano. Em linhas gerais, é isso! – explicou um atônito Másquera.

– Quer dizer então que o Camus vai embora? – perguntou Shina.

– É o que parece... – pontuou Aiolia com uma voz triste.

Saga tinha olhos preocupados. "É, começou...Onde estão Shaka e Mu quando precisamos deles? É, parece que a coisa é séria mesmo...", pensou para si mesmo.

Milo saiu correndo dali. Correu o mais rápido que pôde, mas quando chegou ao alojamento não havia mais sinal de Camus. Nada, nenhuma roupa, nenhum sapato, nenhum objeto, nem mesmo o cheiro. O francês desaparecera.

Milo deixou-se deitar na cama que era de Camus e abraçou-se a si mesmo, chorando baixinho. "E eu nem tive tempo de dizer...", pensou para si mesmo. Foi quando sentiu um papel no travesseiro.

Milo, mon ange,

Sinto muito por tudo. De verdade. Você é a única pessoa que me importa nessa vida. Mas a França me chama, e a Ela eu devo lealdade. Espero que me perdoe. Adeus.

Camus

"Sempre frio... ah, francês... o que eu faço agora?", sussurrou, abraçado àquela folha de papel como fosse o próprio Camus.

E nenhum dos dois disse o que realmente queria dizer.

-X-X-X-

1. Adeus, meu anjo. Foi tão bom mas agora acabou. Totalmente acabado. Deus nunca me deu uma coisa boa nessa vida a não ser você, Milo. Mas agora acabou. Ah, Deus, por que as coisas não podem ser fáceis para mim? Nunca fáceis, nunca. Perdão, Milo. Me perdoa, meu anjo. Coragem!

-X-X-X-

A/N: Ok, eu sei, eu escrevo muito rápido. Espero que isso não enjoe vocês... se quiseram que eu atualize mais lentamente, é só dizer! Mesmo.

Sobre o capítulo, tenho dois comentários. O primeiro é que me doeu pra escrever, de verdade. O segundo é que ele ficou pouca coisa menor do que os outros... mas foi melhor interromper aí mesmo.

Próximo capítulo: O Mais Longo dos Dias.

Pedido: Alguém aí sabe desenhar? Queria tanto, tanto mesmo, desenhar os dois de farda juntos... especialmente com a "cruz púrpura" no peito, como se fosse a foto tirada no dia da cerimônia. Mas eu não sei desenhar nem casinha... portanto se alguém souber e estiver a fim, eu seria eternamente grata.

Ah, quem quiser me adicionar no msn, anota aí: r a c h l a m a r i g m a i l . c o m Não é sempre que eu estou online, maaaaaas...

Vamos às respostas aos reviews anônimos.

Nine66: É, realmente a trama se complica. Cada vez mais! Espero que você também tenha gostado desse capítulo. Foi ainda mais sem ação do que o outro, mas vá lá, digamos que foi uma espécie de interlúdio. E o que é bom dura pouco! Valeu pelo review! Bjoks!

Kuroi Yukina: Fiquei lisonjeada com sua review. Te adicionei no msn, quando estivermos online conversamos. Adorei mesmo a review, viu? Bjoks!

Uotani: É, acho que deu pra ter um gostinho de MdM e Afrodite. Agora, sabe-se lá se eles vão ficar realmente juntos, juntos... né? Ação? Com certeza terá mais, hehe. Valeu pelo review! Bjoks!

Allkiedis: Muito obrigada pelo comentário! Pois é, Caserna tá parecendo uma novela mesmo, né? Sugestão anotada, vamos ver no que dá... agora com o Camus longe, vejamos! Sim, assisti muitos filmes de guerra, é um dos meus gêneros preferidos. Aí juntei com outra coisa que eu adoro, que é escrever fics dos cavaleiros, e deu no que deu. Valeu mesmo! Bjoks!

Bia: Ih, Bia, liga não... você não viu, já postei outro capítulo... é que a coisa fica na minha cabeça e eu não sossego enquanto não escrevo! Pelo visto todo mundo amou esse lança-chamas... pena que o Afrodite só estraga o romance dos dois, rs. Deba e Shura... o Shura acho que arrumo um par pra ele, mas não faço idéia de com quem juntar o Deba e eu não sou boa em criar personagens originais. Tenho uma idéia aqui mas só bem lá pra frente, mais pro fim da história mesmo... vamos ver! Valeu pela review! Bjoks!