Capítulo 7: A vez dos reservas
Martha chegou no quarto de Rony e estranhou a cara de amuado dele.
- Engraçado, hoje a chicletinha não está aqui... brigaram?
- Sim, mas depois passa.
- Deve ter sido uma briga feia, ela é tão apegada a você...
- Martha!
- Luigi, o que foi? Você está muito pálido, senta aqui...
- Não, não dá tempo, vem pra minha sala agora!
- Eu volto depois, ok?
- Tudo bem...
Rony nunca vira Luigi tão atormentado. E estava tão pensativo que se assustou quando Renata chegou.
- O dr. Salk disse que queria você na sala dele.
- Mas ele acabou de vir aqui e chamou a Martha...
- Ah, é? Vá lá assim mesmo. Mas não se esqueça de colocar o hobe que tem aí na gaveta, certo?
- Pode deixar.
Era impressionante como as mulheres eram sarcásticas quanto às suas vestes...
Chegou perto da sala de Luigi e havia um silêncio mortal. Bateu na porta e ela se abriu sozinha. Entrou procurando o médico, e tudo o que encontrou foi uma caixa enferrujada e aberta, que tinha em cima uma fumaça negra que desenhava o número dois no ar. Ele já tinha visto aquilo...
- Como?
- É, srta. Granger, seu artigo sobre a situação dos bruxos aposentados está ótima... acho que já posso confiar uma página principal para você, não?
- Claro, eu farei sim e com muito gosto!
- Ótimo. Mas tem certeza que não vai para a maternidade durante um mês? Posso esperar até a srta. voltar...
- Estarei até lá no sétimo mês, esquece que vou parar no oitavo mês, somente?
- Não acredito que você agüente até lá! Tá na cara que são gêmeos, olha o seu tamanho!
- Vai me dar a matéria ou não?
- Sim. O que você tem de teimosa, tem também de competente.
Rita estava tentada para fazer aquela matéria. Quando soube que fora descartada, ficou possessa. Iria se vingar de qualquer jeito, pois Hermione adorava provocá-la também.
- Hoje eu vou mostrar para vocês outra magia negra executada em objetos. Usa-se uma caixa de ferro do tamanho que preferir, coloca-se os cabelos ou o sangue de alguém dentro dela, faz o ritual necessário. Quando estiver perto da idade que você quer que a pessoa morra, uma fumaça negra surge de dentro da caixa, indicando pouco a pouco a condenação. Geralmente é entregue à quem ama a pessoa e a vítima dificilmente tem ciência disso. Mas, caso queiram fazer essa gentileza com um amigo seu, espere ele ter um filho: isso só pode ser executado em bebês.
Rony se lembrou das palavras de seu professor de DCAT. Percebeu que estava se lembrando de sua vida desconhecida. Primeiro a mulher de olhos castanhos, Mione. Depois, um professor que entende de magia negra. Se ele ao menos se lembrasse seu próprio nome... tudo seria mais fácil.
Perdido em suas reflexões, olhou de novo para a caixa e teve pena de Luigi, medo de presenciar uma tragédia. Certamente a vítima era Dayana ou Hilary. Saiu de lá antes que o médico voltasse. Num dos corredores, encontrou Hilary.
- Precisamos conversar.
- Não há necessidade, está tudo claro pra mim. – disse ela, num tom baixo.
- Não, não está.
Foram para o quarto dele. Ela não tinha coragem de encará-lo.
- Eu sou muito grato por tudo o que você faz por mim, pela nossa amizade... e é por isso que eu não quero mentir pra você, muito menos te machucar.
- Desculpe, eu não devia ter falado nada.
- A verdade sempre aparece, e eu já desconfiava. Mas, eu quero deixar claro que... eu... gosto muito de você, cada dia mais.
- Não brinque assim comigo...
Ele a beijou. Havia tomado uma decisão que teria caras conseqüências...
Neville voltou esperançoso. Não suportou a ansiedade e foi direto para o apartamento de Mione, encontrou-a escrevendo, atolada de fotos e rascunhos.
- Desculpe incomodar, mas...
- Neville! Que saudade! – disse, o abraçando do jeito que podia.
- Vim te visitar...
- Bom, vamos lá pra sala porque este escritório está impossível...
Ele acomodou-se e nem percebia como tremia.
- Quer água?
- Não, eu quero... saber sua resposta. – disse, muito temeroso.
- Eu aceito que more aqui comigo, Neville. Mas você tem certeza do que está fazendo?
- Tenho! Nossa, é a melhor notícia que eu tive nos últimos tempos!
- Agora tenta parar de tremer... francamente, não pensei que estava tão medonha!
Conjurou as malas ali e colocou-as no quarto que Hermione guardava seus livros. Ela ajeitou com a ajuda de Harry.
- Está ótimo aqui, verdade.
- Achei que não seria conveniente dormimos juntos...
- Eu também não me sentiria bem, Mione. Não se preocupe. Como vão os bebês?
- Estão muito bem... e apressados! Soube que minha gestação não passa do mês que vem...
- Então eu cheguei na hora certa?
- Sim, professor Longbottom!
- Ainda não tem motivos pra me chamar assim...
Os dois conversavam bastante, mas quando o assunto iria parar em Rony, tudo se complicava. Já era nítido o jeitinho melancólico dela, as lágrimas se formando rápido... Neville tentava evitar, mas era tão difícil... as noites que ele ouvia ela chorando no quarto não eram poucas. Então ele dava todo o seu amor, daquele jeito generoso e paciente, sendo o anjo da guarda, mesmo querendo assumir outro papel...
- Por que você quer namorar a Hilary? – perguntou Luigi, muito sério.
- Eu gosto dela, dr. Salk.
- Meu jovem, eu tenho uma grande simpatia por você, aliás, você virou o queridinho do pessoal. Porém, é nítido para mim que você gosta da minha filha, mas como amiga. Essa decisão tem a ver com o que você viu na minha sala há quatro dias atrás?
Rony não sabia o que responder.
- Renata se desculpou até não poder mais. E como você está recuperando algumas vagas lembranças...
- Eu sei que magia negra era aquela... mas, tente compreender. Sua filha me ama, eu não quero magoá-la. Minha vida tem que ser refeita, não tem muito jeito pra isso e quem sabe eu não passo a gostar dela da mesma forma?
- Está namorando com ela por pena e falta de opção.
- Eu não posso ficar a vida toda tentando buscar uma memória perdida... e eu gosto da sua filha! Não vou fazê-la infeliz, e aquela história do Silas eu já conheço... não vai se repetir conosco.
- Você não tem como me garantir isso, mas... – os olhos dele se encheram d'água e hesitante inicialmente, continuou – minha filha não vai viver muito, e te ama demais. Não posso negar-lhe um último pedido, talvez.
- Não há meios de anular a magia?
- Você sabe que não.
A mulher esperava impaciente lá fora, nem sonhando os reais sentimentos de Rony por ela. O rapaz saiu da sala com o sogro e sorriu para ela, que atirou-se em seus braços.
Rony decidiu que reconstruiria sua vida ao lado de Hilary. Passou a se chamar Michael e sua aparência melhorara consideravelmente, apesar da cicatriz que parecia uma mancha... porém, quase todas as noites sonhava com uma moça de cabelos cacheados e cheios que ele só podia ver do rosto seus belos olhos castanhos... Mione...
Rita teve um ataque ao ver que Hermione terminara a matéria antes do esperado e começou a insultá-la. As duas brigaram feio, e Neville teve que levá-la para casa. Dormiu mau humorada, e quando de madrugada foi buscar um inocente copo d'água, deu-se a confusão inesperada...
- Neville, calma! Você tá me deixando mais nervosa!
- Eu... eu vou chamar o Harry... eu já volto!
- Não me deixa aqui sozinha!
Sonolento, Harry olhou pelo espelho que agora estava em seu quarto:
- Neville... são três da manhã...
- A Mione, é que... ela...
Um grito de dor foi perfeitamente audível para ambos. Harry então despertou.
- É o que eu estou pensando?
- Eu não sei o que fazer, eu não agüento carregá-la!
- Tudo bem, eu já estou indo... não se desespere... vou chamar a Gina.
Com muita dificuldade e confusão (a única pessoa calma era Gina), eles chegaram na maternidade que Madame Pomfrey lhes indicou. Harry chamou a enfermeira, que cuidou de Hermione durante a gravidez.
- Harry, desculpe a confusão, eu que deveria ter trazido ela para cá, e não te incomodar. Amanhã você tem um jogo, não é?
- Enquanto eu não souber que Mione está bem, eu não saio daqui.
Duas horas depois...
- Tentem se acalmar...
- Quem disse que nós estamos nervosos? – disseram, em uníssono.
- Tudo bem, não está mais aqui quem falou! – disse Gina, que notou como sua mãe estava aérea – Mãe, o que foi?
- Estava pensando como seu irmão estaria agora.
- Arrancando os cabelos igual a aqueles dois, certamente – disse num tom divertido e depois que refletiu - Acho melhor pararmos por aqui... vou acabar chorando e a senhora também... o papai não está ajudando a conter a ansiedade deles, vamos lá...
- Querida, se fazer de forte não ajuda, sabia?
- Eu sinto tanta falta dele... e queria que ele estivesse aqui, nervoso, furando o chão, se descabelando...
Gina e Molly se abraçaram chorando. Os homens se olharam e não fizeram nada, se sentiram impotentes diante daquela situação. Elas conseguiam fazer o que eles não tinham coragem.
Harry abriu os olhos e ao ver a luz do sol, assustou-se. Verificou as horas e percebeu que precisava ir, mas não sairia de lá sem notícias...
- Pode ir, Harry. Eu fico aqui com eles.
Neville, Gina e Molly dormiram sentados e encostados um no outro.
- Sr. Weasley e sr. Potter, desculpe a falta de notícias, mas eu não podia deixá-la só – suspirou, esboçou um sorriso e completou - É uma menina linda e saudável...
- Mas nós pensamos que seriam gêmeos, Mione estava enorme!
- Sr. Potter, vocês não estavam enganados, eram gêmeas. A primeira não demorou muito para vir. A segunda era muito fraquinha, já nasceu morta. Isso aconteceu pelo estresse de Hermione, eu a avisei, mas como ouvia desde a semana passada os corações, não esperava que acontecesse algo de ruim...
- Ela já sabe?
- Sim, foi um parto normal, ela não ouviu a criança chorar e eu não poderia mentir. Se quiserem visitá-la, ela está dormindo no quarto 7. A menina está na incubadora, mesmo nascendo saudável não deixa de ser prematura...
- Obrigado por cuidar delas. – disse cordialmente Arthur.
- Fiz o possível.
Harry, quase que tropeçando, foi ver a criança. Bom, bebê recém-nascido é tudo igual, mas ele ficou pensando depois que gostaria muito de ser pai... e que Rony estaria feliz naquele momento... entrou no quarto de Hermione, mas ela estava dormindo. Foi embora o mais rápido que pôde e chegou a tempo de esquentar o jogo, que já tinha começado há pouco.
Neville, Gina, Molly e Arthur babavam vendo a pequena sobrevivente. Souberam da morte do outro bebê, e o entusiasmo diminuiu. Gina e Molly foram até o quarto de Hermione, que despertou.
- É uma menina linda... acho que é a cara do Roniquinho...
- Eu também acho, olhei para ela e lembrei dele... – sua voz era baixa e ela aparentava serenidade.
- O Harry teve que ir, mas disse que passou aqui.
- Eu vi ele entrar, Gina. Só fingi que estava dormindo para ele não perder o jogo.
O silêncio se instalou cruelmente no olhar de cumplicidade das três mulheres. Não foi preciso dizer o que já sabiam para Hermione. Elas apenas apertaram as mãos e deixaram as lágrimas rolarem. Permaneceram assim por alguns minutos aparentemente longínquos.
Em outro continente, um homem ficou inquieto durante toda a madrugada. Sentia-se ansioso, como se esperasse por algo que não fazia idéia. Andava de um lado para o outro e não se cansava. Por um momento, sentiu-se aliviado e feliz. Depois, parecia que alguém transpassara-lhe uma espada no coração. Amanheceu e ele estava sentado na poltrona que mais gostava, inerte, ausente de espírito e não notando as grossas lágrimas involuntárias. Viu os lindos olhos castanhos fitando-o com ternura, como todas as vezes, mas havia um brilho diferente naquele olhar que refletia algo que ele não pudera distinguir imediatamente.
- Michael... o que você tem? Michael?
Ele apenas balançou devagar a cabeça negativamente.
- Tem certeza que não é nada?
- Hilary, vai dormir, é muito cedo ainda. Preciso ficar sozinho.
Ela se irritou, pois ele não a encarava de maneira alguma.
- Tudo bem, vou te deixar sozinho. Mas não se esqueça que você tem curso hoje.
Para ele, nada mais existia além da sua dor e daqueles belos olhos castanhos...
O dia não foi muito agradável, Rony continuava aéreo e se sentindo estranho. Ele e Hilary viviam na mesma casa, mas ele não queria ter relações com ela, que queria casar-se. Além disso, ele não compreendia a implicância de Dayana com aquele casamento, aliás, ninguém entendia.
