Capítulo 26 - Medo de amar

- Gina, o que aconteceu, afinal?

- Nada, eu já disse!

- Como nada? Você está mal-humorada há semanas! E não tente negar que estava chorando.

- Harry, pare de imaginar coisas e durma!

Ela virou-se com violência e cobriu-se toda, visando que ele a deixasse em paz. Porém, ele não desistiu:

- Gi, eu só quero te ajudar...

- Ajudaria mais se parasse de fazer perguntas!

- Não gosto de ser enganado, e você sabe bem disso.

- O que está insinuando? - ela levantou-se e o encarou.

- Algo está errado com você. E até desconfio o que seja.

- Desconfia de quê? - disfarçar sua aflição era algo difícil.

- De que você quer resolver de vez o problema de Augustus daquele jeito maluco...

- Ele é meu filho, Harry. Óbvio que não quero que ele sofra!

- E eu não quero que você morra. E nem ele.

- Eu não suporto mais vê-lo sofrer e me fazer perguntas... Preciso arriscar!

- Sibila está morta, mas alguém sobrou. Não acho boa idéia ficarmos procurando quem é...

- Você sabe que há outra opção. Mas você não a aceita!

- O problema não sou eu, e sim ele! Acha que ele faria um favor para mim? Ele nem se importa com o Gu!

- Só poderemos saber tentando. Ou você conversa com ele ou eu farei o que é necessário.

- Ok, eu conversarei.

- Conversar! Não sair brigando, como antigamente!

- Gina, confie em mim. Eu amo Augustus, me certifico disto a cada dia. Temo por ele tanto quanto você.

- Desculpe pela irritação, é que hoje ele teve pesadelos enquanto cochilava. Repetia o nome daquele monstro o tempo inteiro! - ela não pronunciava o nome de Voldemort.

- Acalme-se. Isso deve ser influência das histórias horríveis que contam por aí. O importante é que tudo isso vai passar. Pode estar certa. - eles estavam abraçados e Harry fez questão de acrescentar algo ruim para Gina - Amanhã vou ver Sirius, prometi levar a Kim, ela está morrendo de saudades, você sabe. Gu vai também, ok?

Os olhos dela encheram-se d'água e ele compreendeu finalmente o outro motivo que a tirou do sério...

- Gina, o que aconteceu? Sirius está vivo, não está?

Ela não respondia, nem o encarava.

- Hermione disse que havia esperança, ela... não, nada pode ter falhado... diga para mim que o verei amanhã e falaremos muita besteira!

- Eu sinto muito, Harry...

O homem ficou perdido. Olhava a mulher, contudo não a via. Lentamente, seguiu para o quarto de Augustus, o fitou dormindo tranqüilamente, sentou ao seu lado, beijou-o e ficou ajoelhado perante ele, pensando no padrinho que tanto lutara pela sonhada liberdade. Lágrimas o invadiam sem permissão, e ele não as notava nem segurava. Sirius não substituia o lugar que Tiago tinha em seu coração, porém era um segundo pai, com quem ele teve uma boa convivência. A tristeza o tomou e foi inevitável não recordar dos momentos alegres que viveu junto ao grande amigo. Gina não o interpelou: sabia que ele precisava ficar só aquela noite.


- Lupin, reaja!

- Hermione, não tenho fome, vou fazer o quê?

- Você precisa comer, dormir... Vida de zumbi não faz bem!

- Minha saúde está perfeita.

- Francamente! Eu sempre achei que fosse mais corajoso!

- Sirius era praticamente meu irmão, não é fácil aceitar que todos os meus amigos, minha única família, foram-se por causa daquele maldito!

- Mas nem por isto você precisa se destruir! - ela suspirou e disse - Vou trabalhar e quando voltar, não quero ver este prato cheio, ouviu?

Hermione, Neville e Dumbledore faziam o impossível para Lupin não sentir-se muito só, distrair-se e encontrar um sentido para a vida. Porém, tudo parecia inútil.

Ele, contrariando o pedido de Hermione, foi até o lago da lula gigante em jejum. Afundou-se em suas lembranças. Assim, chegou em uma inesperada e que geralmente tentava impedir: pegou-se pensando na mulher que conhecera na viagem que fizera. Tiveram uma espécie de amizade colorida, uma paixão intensa e fugaz. Pelo menos ele achou que era fugaz antes de sentir uma fria mão em seu ombro...

- O que você faz aqui?

- Sinto por seu amigo, Remo.

- Desculpe, estou um tanto nervoso. Mas não entendi o motivo. Você não devia estar naquele congresso...?

- Recusei-o.

- Por quê? Você estava tão empolgada!

- E vazia. Afinal, vivo tanto para os outros que esqueci de mim.

- Vazia, você? Uma mulher tão importante, bem sucedida, bonita, inteligente...

- Não exagere!

- Estou falando sério! Vazio sou eu, um imbecil sem rumo na vida! Não mereço porcaria nenhuma. Nem a minha sobrevivência naquela guerra...

- Se você tivesse morrido, eu terminaria meus dias sem saber o que é realmente o amor, Remo - ela falou baixo por vergonha, porém ele a ouviu bem.

- Eu não sou o homem certo para você.

- Por quê?

- Acredite, é melhor você não saber. Acho razoável esquecermos o que aconteceu.

- Se arrepende?

- Não, mas sei que não podemos levar isto adiante. Somos muito diferentes.

- Diferentes? Diga logo que fui só mais uma na sua vida amorosa, mas não venha com esta desculpa esfarrapada!

- Volte para o seu trabalho, precisam de você.

- Você precisa muito mais de mim.

- Não podemos!

- Podemos sim! Nada é impossível, muito menos quando se está apaixonado!

- Não quero que você sofra! Será que isto é tão difícil de entender?

- Você foi Comensal, algo do tipo? Matou alguém?

- Não...

- Sou eu o problema?

- Nem pense nisso. Você é a pessoa mais maravilhosa que conheci.

- Então prove isto.

Ele deu as costas para ela, suspirou e disse hesitante:

- Você se envolveria com um lobisomem?

- Depende. Se o nome dele for Remo Lupin, eu poderia até virar animaga clandestina!

- Não brinque, eu falo sério.

- Eu também não estou brincando.

- Não é fácil conviver comigo nos dias de lua cheia...

- Sou paciente.

- Acho que nunca poderemos ter filhos.

- Não sei se seria uma boa mãe e isto que você disse é uma hipótese, não um fato.

- Sou um pé-rapado e com complexo de inferioridade.

- Então deixe-me ser pobre e pedir uns trocados em Hogsmeade ou nas ruas de Londres para lhe mostrar que estou contigo em qualquer circunstância.

Ele riu e perguntou:

- Você é sincera ou louca?

- Sou sinceramente louca por você...

O beijo demorou para acontecer, ambos pareciam inseguros e receosos. Aproximaram-se lentamente, parecia um primeiro beijo tamanha era a ansiedade deles. Quando os lábios uniram-se, ela fechou os olhos e ele entregou-se ao sentimento que tanto temera, de maneira total e ardente. Nem notaram os alunos curiosos que os observavam.


Harry ficou muito deprimido com a morte de Sirius e preocupado com Augustus, já que quem podia ajudá-lo estava demorando para agir. Ia aos treinos para não prejudicar o time, o filho quase implorava para que ele o fizesse. E assim ele permanecia, apreensivo e jogado em qualquer canto da casa, preocupando a todos.

- Harry?

- O que veio fazer aqui, Rony?

- Conversar um pouco.

- Não temos muito o que falar.

- Já pedi desculpas, o que você quer mais? - ele não elevou o tom de voz.

- Não consegue entender que quero ficar só?

- Isso não vai trazer o Sirius de volta, e a Gina está ficando cada dia mais preocupada!

- Ela foi se queixar com você e o amigo exemplar veio aconselhar o idiota aqui?

- Ouça, ela não parece bem. Não sei se é somente o estresse, tenho até um pouco de receio de dizer o que realmente acho que ela tem.

- Rony, da minha mulher cuido eu.

- Cara, é sério! Eu estou preocupado mesmo com a Gina e com você!

- Preocupou-se com nossa amizade quando fez aquela acusação absurda?

- Qualquer dia desses pego um vira-tempo e faço ele engolir... - resmungou baixo - Harry, eu estou arrependido e não quero mais ficar nessa com você!

Na verdade, Harry já havia perdoado Rony, porém a confusão que os problemas causavam nele fizeram do amigo a vítima perfeita para se descontar todos os sentimentos ruins acumulados. Tomando consciência disto, sentou-se pesadamente na poltrona e levou as mãos à cabeça.

- Não ligue para meu humor. Estou tão acabado que nem aos treinos vou mais. Já lhe perdoei faz um tempo, mas com aquela confusão toda não falei nada e agora quis descontar tudo em você.

- Tudo bem, esquece. - disse, em tom de alívio nada contido - Vamos sair um pouco?

- Não tenho a mínima vontade.

- Ficar trancado aqui não resolve coisa nenhuma! Olha, a Hilary deixou eu trazer o Logan pra passar uns dias lá em casa, e eu quero te mostrar como ele cresceu!

- Agora ela se chama Hilary, é? Antes era projeto de Malfoy, oxigenada, louca...

- Da última vez que nos encontramos ela só me disse que eu podia pegar meu filho. Mas ela me olha de um jeito estranho, age estranhamente...

- Estranhamente como?

- Sei lá, fala comigo de longe e num tom baixo! Como boa italiana ela sempre falou alto!

- A mulher era sua, então se você não sabe, eu muito menos.

- Mulheres são esquisitas e me convenço disto a cada dia.

- Sim, Kimberly tem quase seis anos e muda de humor como de roupa! E por falar nisso, o que acha que a Gina tem?

- Acho melhor ficar na minha. Conversa com ela direito depois.

- Vou tentar, porque ultimamente ela se irrita com perguntas.

Eles foram para A Toca. Logan estava notavelmente grande, gordinho e lindo, exceto pelos seus olhos branquinhos. Kimberly e Augustus divertiam-se com ele, e os primos ficaram satisfeitos com a reaproximação de seus pais, que não paravam de conversar.


Hermione e Neville passavam horas vendo as plantas na sala de Herbologia, era um ótimo passatempo. Porém, naquele fim de tarde, ele resolveu sair com Ana e ela ficou só.

Aquilo trazia várias lembranças de seus tempos de estudante em Hogwarts, tão bons e ela nem sabia o quanto na época. Então, recordou-se de seu primeiro beijo, que fora perto de uma planta carnívora adormecida. Vítor Krum a beijou e Rony assistiu a cena. Aquilo rendera quase um mês sem eles se encararem. Logo depois das desculpas, ele confessou o motivo óbvio de sua atitude e eles começaram a namorar um tempo após aceitarem a idéia de que juntos ou não, a guerra os atingiria.

Não calculou o tempo que se ocupou nestas recordações. Olhou para trás, sorridente de inebria, e encontrou Rony, rubro como a cor de seus cabelos, contemplando-a. O sorriso dela morrera intencionalmente.

- Mione, eu...

- Para você é Hermione - ela não parecia amigável.

- Ok, Hermione. Vim pra te pedir desculpas. Com o clima pesado daquele dia, nem tive coragem de tocar no assunto.

- Reconheço que às vezes você sabe o que é conveniência.

- Isto quer dizer que você não está brava comigo?

- Francamente, quanta bobagem! Nunca estive brava contigo! Você me magoou e isto é muito pior, acredite! Difícil aceitar que você pensou na possibilidade de eu e o Harry estarmos juntos!

- Eu estava com ciúmes, entenda!

- Não dá pra entender! E me deixe em paz!

- Você quer que eu vá?

- Já devia ter ido faz tempo!

- Tudo bem, eu vou.

Ela ficou perplexa com a atitude dele e nem contestou. Esperou um pouco e saiu na escuridão, a noite chegara e nem percebera. De repente, não conseguiu mais mover-se e caiu num baque surdo.

- Se eu pegar o engraçadinho, não vou pensar duas vezes em tirar mais de 50 pontos da casa! - como ninguém lhe respondeu, ela continuou - Não estou brincando, pode me soltar, quem quer que seja!

Levitando e com grande parte dos músculos inertes, foi conduzida a um local que conhecia bem: a Casa dos Gritos.

- Lumus!

- Rony? O que significa isto?

- Daqui, ninguém pode nos interromper ou ouvir.

- Não estou entendendo...

- Eu não suporto mais viver sem você...

- Já disse minha opinião sobre isso.

- Não disse.

- Dissimulação é uma coisa deplorável. Sabe bem que eu não acredito neste seu amor.

- Eu estou tentando ser paciente, mas do que adianta! Você me rejeita e não me escuta! Eu juro que não queria me apaixonar, não mesmo! Mas agora vou fazer o quê? Mentir não é o meu forte e eu pensei que você realmente me amava como dizia! Quer saber? Pode ir. - ele já havia libertado ela do feitiço do corpo preso - Agora eu não estou brincando, desisti! E pode ficar sossegada que quando chegar o fim de semana, desapareço.

Explodindo, Rony foi batendo pé e a porta. Hermione encolheu-se no chão e ficou pensativa. Na verdade, ela tinha medo de viver aquele amor, de perder seu amado novamente. Por isto, fechava-se, enganava-se, repetia que seus sentimentos eram errados e os dele, pura ilusão.

Uma grande balbúrdia invadiu seus pensamentos: como poderia deixar ele ir sem tentar conhecê-lo mais uma vez, experimentar seus carinhos? Como resistir a tudo por medo, algo que ela acostumou-se a não ter?

Foram estes pensamentos que deram forças para ela correr atrás de Rony, mesmo não sabendo se ainda conseguiria encontrá-lo naquela noite. Confusa e um tanto ofegante, tropeçou e caiu em cima de algo pequeno, mas incômodo. Ao tocar, notou o anel de noivado deles: onde havia gravada a letra "H". Ela então pegou o seu, onde tinha e letra "R".

Por sorte, olhou para a frente e constatou que aquele era o caminho para sair de Hogwarts. Levantou-se, decidida a continuar sua corrida com alguns auxílios mágicos, já que não havia uma vassoura por ali.

Quase meia hora depois, conseguiu ver um pontinho vermelhinho e outro branco, provavelmente vindo da varinha de Rony.

- Rony! Rony!

- Mas o quê...? - sussurrou, confuso.

- Espere!

- Hermione?

Os joelhos dela cederam e ela estava esbaforida de tanto correr. Ele ficou na altura de seus olhos e esperou uma explicação, mesmo querendo enchê-la de perguntas. Os olhos castanhos imensamente brilhantes e esperançosos o responderam e encheram de alegria: ela estava disposta a ficar com ele.

Rony a abraçou forte e disse:

- Sei que você já deve estar enjoada de ouvir, mas... eu te amo.

- Eu também, mais do que tudo...

Ela entregou o anel a ele, que finalmente notou no dela.

- Por que nunca vi este seu anel?

- Usava como pingente e punha debaixo da blusa. Não queria que me vissem com ele para não haver distorções quanto ao meu estado emocional...

- Então agora você vai usá-lo aqui - ele pôs o anel prateado no dedo anelar da mão esquerda.

- Você colocou no lugar errado...

- Tenha a certeza que não.

Hermione intimidou-se e Rony sorriu, seguro de sua decisão. Beijou-a com furor, para ele não importava a terra do chão. Ela o correspondeu como antes, porém não pararia daquela vez. Apresentou-lhe, portanto, sua maior prova de amor e desejo, e ele lisonjeou-se por isso. Em um momento, sussurrou apaixonadamente no ouvido dela: "Agora, só a morte nos separará...".