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O Cavaleiro Celestial
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— Ah! — foi com um certo júbilo que Heero ouviu aquela voz tão familiar — Finalmente você acordou!
Tudo estava muito nebuloso na cabeça de Heero. A batalha perdida contra Chris, o ataque aos Gundams, o primeiro disparo do canhão de íons contra Quatre e Trowa, e...
— Eu já entendi que foi você que me salvou naquela hora... Não fosse por você, eu teria morrido...
Um sorriso reconfortante atravessou a face de Shinigami. Heero agarrou o braço de Duo com todas as forças que possuía no momento (não eram muitas) e tentou deixar que seus olhos explicassem algo, que revelassem todo o sofrimento dos últimos dias.
— Também já entendi isso... Eu tive um bom tempo pra pensar... Você ficou apagado por uns dias...
O olhar inquiridor de Heero começava a incomodar Duo.
— Tem mais alguma coisa que você queira saber?
O piloto do 02 achava incrível como uma pessoa tão monossilábica quanto Heero podia ser tão claro apenas usando os olhos e uma pressão crescente em seu braço.
— Ah, você quer saber sobre os outros não é? Eles estão bem, sofreram alguns arranhões, mas nada grave como você.
Mas ainda não era isso que Heero queria ouvir.
— O Chris... — a voz de Duo subitamente ficou carregada de tristeza misturada com nostalgia — Depois da explosão, parece que ele recolheu as armas dele e foi embora. É, eu sei, também achei meio estranho... — completou quando a pressão em seu braço foi intensificada — Parece que ele, afinal de contas, nunca quis matar ninguém.
Subitamente a pressão no braço de Duo diminuiu e Shinigami, surpreso, viu um sorriso no rosto de Heero.
— Eu sei... Também tou feliz que tudo tenha acabado assim. Podia ter sido bem pior... Mas agora eu vou ter que ir, seu médico tá me olhando com uma cara de quem quer extrair meu fígado...
Heero tentou virar a cabeça para ver o médico mas seu corpo não o obedecia com a costumeira presteza.
— Isso é efeito da eletricidade e do tempo que você ficou apagado... Pelo que o médico disse, tudo volta ao normal em poucos dias. Ah... Heero?
Um consentimento mudo foi dado com os olhos.
— Eu queria pedir desculpas. Devia ter notado como você estava se sentindo há muito tempo. E também tenho que me desculpar por ter que te fazer esperar... Acho que não tou pronto pra... Bom, você sabe...
Duo deu as costas para Heero e saiu daquele quarto de hospital com determinação. A ferida ainda era muito recente para ser remexida e esperava que Heero entendesse isso.
Passou por um outro quarto, onde Quatre estava se recuperando do ataque de Chris, em condições muito semelhantes as de Heero. Ao lado da cama, havia um atencioso Trowa e um surpreso Wufei.
— Eu não acredito! — falava o chinês em voz alta, olhando para a bonita cena entre o semi-adormecido piloto do SandRock e o piloto do HeavyArms — Mas falando sério agora, — Duo notou pela fresta da porta que o 05 não ia dizer nada de sério — pra quando saí o casamento?
Duo não ficou para ouvir a resposta e saiu tentando conter o riso em vão. Um sonoro "O QUÊ?" deixou bem claro que a data já estava marcada.
Duo saiu do hospital e deu de cara com um dia cinzento, um céu carregado e uma ameaça de chuva iminente. Pensou em pegar um táxi para voltar para casa, já que Trowa havia ficado com as chaves do carro, mas resolveu que a caminhada faria bem.
Definitivamente não era tristeza o que sentia agora. Nem mesmo ódio, como quando pensou que Chris havia assassinado Heero. Era...saudade? Não. Nostalgia, essa era a palavra.
Foi com reflexões como essa que Duo ocupou seu tempo durante a caminhada. Parou na frente da casa que ocupava com seus amigos e ficou lá por um instante, o olhar meio perdido e meio vidrado. Tudo seria diferente agora?
Talvez. Pegou uma pilha de cartas que estavam na caixa do correio e na metade do caminho até a porta de casa, a chuva desabou com força total. Ao entrar na casa, meio encharcado pelos poucos instantes que passara na chuva, Duo também desabou no sofá, cansado e querendo dormir.
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Duas, talvez três horas depois, o piloto do 02 se levantou, os olhos ainda pesados de sono. Foi até a cozinha e bebeu um copo de suco enquanto olhava a chuva que cessava de cair, revelando um céu estrelado.
Voltando a sala de estar, não soube dizer o que o levou a olhar a pilha de cartas que estavam sobre o aparador. Algumas contas, um ou dois folhetos de propaganda e um envelope de papel grosseiro, endereçado ao piloto do 02.
Subiu as escadas correndo, as meias chocando-se contra os degraus da escada sem fazer barulho. Mesmo estando sozinho na casa, não queria ler uma carta de Chris na sala de estar.
Deixou-se cair na cama e rasgou o envelope. A letra manuscrita era inconfundível.
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"Antes de tudo, queria te pedir para que não rasgasse essa carta assim que a recebesse. Tenho muita coisa para contar e muitas dúvidas pra esclarecer".
"Eu realmente nasci na colônia L-38 como eu já tinha dito. Daqui saiu o Gundanium para a construção do Musashi e os cristais para a fabricação das minhas espadas. Meu pai e eu éramos meio sozinhos já que minha mãe havia morrido quando eu ainda era um bebê. Então você pode imaginar minha indignação quando, dois anos atrás, um grupo de soldados invadiu minha casa e raptou meu pai".
"Eu fiquei horrorizado no começo, sem saber o que fazer. Ele era uma das pessoas mais poderosas da galáxia e havia sido raptado. Claro que não quis levar o caso as autoridades de imediato, pois eu tinha medo de nunca mais revê-lo. E alguns dias depois, recebi um telefonema".
"A voz não me era de todo desconhecida, mas também não era familiar. Ela me pediu que a encontrasse aqui na Terra, e é claro que eu não hesitei em viajar. No espaçoporto da capital, fui recebido por uma jovem de cabelos longos e loiros bem escuros. O nome dela era Relena".
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Duo sentou-se na cama, meio chocado. Relena? O que ela tinha com Chris?
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"Eu também fiquei chocado assim que ela terminou de se apresentar. E então nasceu o projeto do Cavaleiro Celestial, conforme ela expicava minha situação e me mostrava as plantas e os projetos dos Gundams de vocês".
"- Eu tenho um interesse especial em manter o piloto do 01 vivo. - disse ela - Mas parece que há um traidor entre os cinco pilotos originais, uma pessoa que deverá ser eliminada".
"- E o que eu tenho a ver com isso, senhorita Relena?"
"- Ou você faz o que eu mando, ou nunca mais vai ver o seu pai".
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Os olhos de Duo se arregalaram de surpresa.
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"Eu fiquei pasmo. Não dava pra entender o porquê de usar a mim ao invés de um assassino profissional ou mesmo um soldado qualquer".
"- Me parece que existem grandes depósitos de Gundanium na L-38, não é, senhor Harrison? É o mineral mais resistente do universo, se bem estou lembrada."
"Eu não falei nada. Não conseguia".
"- Vou lhe dar os planos do Gundams originais para que construa uma máquina invencível e com ela, destruirá o piloto do 02 em batalha. Qualquer passo em falso e seu pai morre, entendeu?"
"Eu não tinha escolha. Mesmo não entendendo a idéia louca de Relena, eu precisava arriscar qualquer coisa para resgatar meu pai".
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—Isso é loucura... — disse Duo em voa baixa — A Relena queria me matar...?
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"Com os planos dos Gundams e com a ajuda de Relena, o Musashi ficou pronto em questão de um ano. Não foi nada fácil pra eu ficar esse tempo todo com a idéia do meu pai morrendo se eu não matasse o piloto do 02...".
"Assim que o Musashi foi concluído, eu tive que ser alterado geneticamente para lutar. Diferentemente do soldado perfeito, eu continuei com minhas emoções (eram elas que me fariam lutar) mas recebi a capacidade de ler pensamentos, de usar telecinese, habilidades que são vitais para o funcionamento do Musashi em sua força máxima".
"E quando tudo estava pronto, fui para a Terra salvar o meu pai. O que eu não sabia é que matar não é nada fácil... Ainda mais quando a gente começa a gostar da pessoa...".
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Duo piscou lentamente os olhos antes de recomeçar a leitura.
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"Na Terra, Relena conseguiu me matricular no seu colégio para que eu conseguisse me aproximar de você sem levantar tanta suspeita. A víbora havia planejado tudo nos mínimos detalhes, inclusive a derradeira batalha entre os Gundams onde eu te mataria".
"Mas então ela cometeu o primeiro erro: matou meu pai e ficou com isso na cabeça por tempo suficiente para que eu percebesse. Não entendi o porquê disso, ela estava com a vantagem, eu estava completamente indefeso".
"Eu fiquei quase maluco de tanto ódio. Tanto que cheguei a atacá-la com o Musashi. Eu usei meus poderes para ler a mente dela e descobri o quando ela estava louca".
"De acordo com os planos de Relena, eu venceria os pilotos e mataria o 02, deixando o caminho livre para que o Gundam dela, a Iron Maiden (sim, ela também criou um Gundam para si mesma), pudesse vencer o Musashi, me destruindo e garantindo assim o caminho dela até o prêmio que desejava. Esse prêmio seria o soldado perfeito, o qual (ela notou isso muito antes de você, Duo) só tinha olhos para o piloto do 02".
"Eu não consigo sentir pena da Relena. Ela matou meu pai por uma razão tão egoísta... Se ela tivesse se declarado abertamente para o soldado perfeito, as coisas podiam ter sido bem diferentes... Ela me usou como um vilão cruel e desalmado, me usou para tentar se aproximar de Heero da única maneira que ela achava que ele se aproximaria de alguém: lutando".
"Ela tinha uma inveja enorme de você, Duo... E ela não se importou em matar para tentar obter o que desejava. Acho que você pode ficar aliviado agora que ela está morta. Eu mesmo destruí a Iron Maiden, outro grande alívio para vocês. Para mim... Me resta o infinito".
"Duo... Não vou dizer que foi amor a primeira vista, por que não foi. Não vou dizer que somos almas gêmeas nem nada do tipo. Vou dizer que aprendi a gostar de você. Acho que posso dizer que te amo. Mas saiba que não espero nada em troca: o que eu fiz com você não tem perdão".
"Coloquei um presente junto com a carta, está dentro de um embrulho pequeno. Eu queria que você o tivesse em mãos antes de acabar essa carta".
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Duo desceu as escadas e olhou mais uma vez na pequena pilha de cartas que havia tirado da caixa de correio, mas não foi capaz de encontrar o embrulho mencionado por Chris.
Foi quando notou o pacote meio escondido próximo a uma das pernas da mesa sobre a qual havia posto a correspondência. "Capricho do destino? — pensou".
Subiu as escadas, desembrulhando o pacote, pouco menor que sua mão fechada; era até estranho que não tivesse notado-o de imediato ao pegar as cartas.
Deixou que o conteúdo caísse sobre a cama e não pôde conter uma exclamação de surpresa.
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"Esse é o meu presente final pra você, Duo. Eu mesmo o forjei de Cristal de Gundanium, a única substância absolutamente indestrutível desse universo. Nunca vai se ver livre dele, Duo; mesmo que o jogue numa estrela, ele continuará eterno e imaculado".
"Esse é o meu coração, Duo, para que nunca se esqueças que sempre haverá um Cavaleiro Celestial te guardando no coração".
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O broche, uma enorme ametista em forma de coração e recoberta por cristal de Gundanium, refletiu a luz das estrelas.
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Fim
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Bom, é isso... Cheguei (ou deveria dizer chegamos) ao final da minha primeira fic. Realmente espero que vocês tenham gostado tanto de ler quanto eu gostei de escrevê-la. Deixei algumas coisas em aberto, mas acho que serei perdoado...
Agradecimentos especiais a Mayumi (pelos fanarts e pelo apoio constante), para a Joy (pelos comentários e pelas conversas no MSN) e para a Naru (por me aturar e pelas rewiews que sempre vieram na hora certa).
Continuação? Quem sabe... XDDDD
Adeus, Cavaleiro Celestial.
Emperor Hades
