1. Decisão

Depois de todo aquele tempo embaixo d'água, minha cabeça finalmente atingiu a superfície. Que desesperador. Não sabia para qual direção nadar e, a todo momento, eu tive certeza de que iria me afogar.

A corrente não me puxou pra cima; ela estava me jogando contra as rochas. Eu batia contra elas sem parar, e os baques em minhas costas expulsavam constantemente o restinho de ar que eu tinha em meus pulmões.

Ao sair, eu cuspi um imenso volume de água; Brotava da minha boca e do meu nariz. O sal queimava, meus pulmões ardiam, minha garganta tinha água demais pra me deixar respirar, e as rochas haviam ralado minhas costas. De alguma forma, consegui ficar parada em um só lugar, apesar das ondas ainda baterem em mim. Eu sentia o movimento da água do mar, mas não conseguia ver nada. Minha visão estava completamente embaçada.

"Respire!", a voz, selvagem com ansiedade, ordenou.

Eu não consegui obedecer. Uma nova cascata de água saiu de minha boca, e o ar não tinha como entrar.

"Respire, Bella! Vamos!", Jacob implorou.

Pontos pretos atravessaram minha visão antes turva, ficando maiores e maiores, bloqueando a luz.

"Bella?" Jacob perguntou. Sua voz ainda estava tensa, mas não tão selvagem quanto antes. "Bells, você consegue me ouvir?"

O conteúdo da minha cabeça estava girando de forma doentia, como se tivesse sendo misturado com a água em um liquidificador. Eu odiei a sensação, desejando ardentemente que tudo apenas parasse.

"Por quanto tempo ela esteve inconsciente?", alguém perguntou. A voz que não era de Jacob me chocou, me fazendo focar mais em ficar consciente.

"Eu não sei", Jacob informou, ainda frenético. A voz dele estava muito próxima. Uma mão - tão quente que tinha de ser dele - tirou o cabelo molhado do meu rosto. "Alguns minutos? Eu não demorei muito pra trazer ela até a praia".

Eu estava viva… e eu estava congelando. Meus dentes batiam uns nos outros sem parar.

"Ela está respirando. Ela vai acordar. Mas ela ainda pode pegar um resfriado. Eu não gosto da cor que ela está ficando..." Eu reconheci a voz de Sam dessa vez.

"Você acha que tudo bem mover ela?"

"Ela machucou as costas, ou alguma outra coisa, quando caiu?"

"Eu não sei".

Eles hesitaram.

Eu tentei abrir os olhos. Me levou um minuto, mas eu consegui ver as nuvens escuras, roxas, jorrando gotas de chuva congelante em cima de mim.

"Jake?", eu resmunguei, minha voz quase não saindo.

O rosto de Jacob bloqueou o céu. "Oh!", ele asfixiou. O alívio lavou sua expressão. Os olhos dele estavam molhados.

"Oh, Bella! Você está bem? Você consegue me ouvir? Você está machucada em algum lugar?"

"S-só a m-minha garganta", eu gaguejei, meus lábios tremendo com o frio.

"Vamos tirar você daqui, então", Jacob disse.

Ele passou os braços por baixo de mim e me levantou sem esforço, como se estivesse pegando uma caixa vazia. Seu peito estava nú e quente, como sempre e eu me encolhi ali, feliz pelo calor; ele curvou os ombros para evitar que a chuva caísse em mim.

Minha cabeça descansou no braço dele. Minhas costas ardiam por conta do contato com minha camiseta encharcada de água salgada. Eu encarei a água de novo, ela estava batendo na areia atrás dele. Um calafrio passou pelo meu corpo e eu tive que desviar o olhar.

"Tudo certo?", eu ouvi Sam perguntar.

"É, eu cuido dela daqui. Volte para o hospital. Eu me junto a vocês mais tarde. Obrigado, Sam".

Minha cabeça ainda estava rolando. Nenhuma das suas palavras fez sentido no começo. Sam não respondeu. Não houve som algum, então imaginei que ele tivesse ido embora.

"Como você me encontrou?", minha voz raspou quando eu falei.

"Eu estava procurando você", ele me disse. Ele estava meio que correndo no meio da chuva, pela praia e à caminho da estrada.

"Eu segui as trilhas de pneu da sua caminhonete, e então eu te ouvi gritar..." Ele tremeu. "Porque você pulou, Bella? Você não percebeu que havia um furacão se formando por aqui? Você não podia ter me esperado?" A raiva encheu o tom dele quando o alívio foi desaparecendo.

Olhei para Jacob, meus olhos o dobro do tamanho, espantada. Um furacão? Eu havia pulado no mar enquanto tinha um furacão? Como eu não tinha visto aquilo?

"Me desculpe", eu murmurei, envergonhada. "Foi estúpido".

"É, foi muito estúpido", ele concordou, gotas de chuva escapando livremente pelo seu cabelo enquanto ele balançava a cabeça. "Olha, você se incomoda de deixar pra fazer as coisas estúpidas apenas quando eu estiver por perto? Eu não vou ser capaz de me concentrar em mais nada, se eu pensar que você pode estar pulando de penhascos pelas minhas costas".

"Claro", eu concordei rapidamente, querendo me esconder debaixo de uma pedra. "Sem problemas", eu soava como uma fumante descontrolada. Eu tentei limpar minha garganta - e então gemi; limpar a garganta foi como enfiar uma faca incandescente na mesma.

Aquilo só me fez pensar o quão ruim havia sido aquela ideia. A dor em minha garganta, o frio que chegava nos meus ossos e a sensação de não conseguir respirar ainda presa em minha memória… Eu tentei pensar em outra coisa.

"O que aconteceu hoje? Você... a encontrou?", eu tremi com o pensamento de ele encontrá-la, apesar de já não estar mais com tanto frio, ao lado de seu corpo ridiculamente quente.

Jacob balançou a cabeça. Ele ainda praticamente corria, enquanto seguia pela estrada a caminho da sua casa.

"Não. Ela escapou pela água - os sanguessuga tem vantagem por lá - Foi por isso que eu voltei pra casa correndo. Eu estava com medo que ela chegasse antes de mim, nadando. Você passa tanto tempo na praia...". Ele parou de falar, um caroço na garganta.

Se eu pudesse, teria corado naquele momento.

"Sam voltou com você... todos os outros estão em casa também?". Eu esperava que eles não estivessem mais procurando por ela. Não naquele momento.

"É. Mais ou menos".

Eu tentei ler a expressão dele. Seu rosto pingando por causa da chuva torrencial.

"Você disse... hospital. Antes, pra Sam. Alguém se machucou? Ela lutou com vocês?" Minha voz pulou um oitavo, soando estranha com a rouquidão.

"Não, Não! Quando nós voltamos, Emy estava esperando com notícias. É Harry Clearwater. Ele teve um ataque do coração essa manhã".

"Harry?", eu balancei minha cabeça, tentando absorver o que ele estava dizendo. "Oh, não! O Charlie já sabe?"

"Sim. Ele está lá também, com meu pai".

Eu tive que parar por um segundo para colocar minha cabeça no lugar. O rosto de Jacob era uma máscara que não transmitia nenhuma emoção.

"Harry vai ficar bem?" perguntei devagar, com medo da resposta.

Os olhos de Jacob se apertaram de novo. "Ele não parece muito bem, no momento".

Abruptamente, eu me senti doente à ponto do meu estomago se revirar com a culpa pelo mergulho idiota e desnecessario do penhasco. Ninguém deveria estar se preocupando comigo naquele momento. Que hora estúpida pra ser irresponsável. E tudo para que? Por alguns segundos com uma imagem falha dele? Por um momento de conforto, onde parecia que ele se importava comigo de novo?

"O que eu posso fazer para ajudar?", eu perguntei, me sentindo a pessoa mais imbecil do mundo.

Nesse momento a chuva parou. Eu não tinha me dado conta de que já estávamos na casa de Jacob, até que passamos pela porta. A tempestade batia no telhado com um barulho ritmado.

"Você pode ficar aqui", Jacob disse enquanto me colocava no pequeno sofá. "Eu falo sério - bem aqui. Eu vou pegar roupas secas pra você".

Deixei meus olhos se ajustarem à escuridão da sala, enquanto Jacob andava até seu quarto. A pequena sala de estar parecia muito vazia sem Billy; quase desolada. Era estranhamente ominoso, provavelmente porque eu sabia onde ele estava no momento. Jacob voltou em poucos segundos, e jogou uma pilha de algodão cinza em cima de mim.

"Isso vai ficar enorme em você, mas é o melhor que consegui arranjar, no momento. Eu, er, vou lá pra fora pra você se trocar".

"Por favor… Não saia. Eu ainda estou muito cansada pra me mexer. Só fique aqui comigo um pouco".

Jacob sentou-se no chão ao meu lado, com as costas apoiadas no sofá. Eu me perguntei quando havia sido a última vez que ele dormira. Parecia tão exausto quanto eu, e isso fez uma onda ainda maior de culpa passar sobre mim. Ele inclinou a cabeça numa almofada próxima a minha e bocejou.

"Eu acho que posso descansar por um minuto..." Os olhos dele se fecharam.

Eu deixei os meus se fecharem também. O sofá de Billy era próximo do aquecedor, me deixando quente, apesar das roupas molhadas que eu ainda vestia.

Meus pulmões doíam, me arrastando mais para a inconsciência, do que me mantendo acordada. Me perguntei vagamente se era errado dormir... Estaria finalmente sucumbindo às concussões?

Jacob começou a roncar levemente, e o som me acalmou como uma canção de ninar. No fundo da minha mente, quase beirando a inconsciência, eu pensei em como Jacob conseguia me ajudar até mesmo enquanto dormia. Eu sorri para o som antes de cair no sono.

Pela primeira vez em muito tempo, meus sonhos foram só isso: sonhos.

Uma vaga passagem borrada por minha lembranças passadas - visões do sol brilhante de Phoenix que me cegavam, o rosto da minha mãe, uma casa na árvore ainda aos pedaços, uma colcha velha, uma sala de espelhos, uma chama em cima da água preta... eu me esquecia de cada uma delas, assim que a imagem era alterada.

A última figura foi a única que grudou em minha mente. Ela era sem importância - só um cenário num palco. Um balcão no meio da noite, uma lua pintada no céu. Eu observei a garota, vestida com uma camisola, se inclinar na grande e falar consigo mesma. Sem importância... mas quando eu lutei para voltar à consciência, Julieta apareceu na minha mente.

Jacob ainda estava adormecido; ele havia caído no chão e a respiração dele era profunda e uniforme. A casa estava mais escura agora do que estava antes. Do lado de fora da janela, o dia já virava noite.

Eu estava rígida, com os músculos doloridos, mas aquecida e quase seca. Minha garganta ardia toda vez que eu respirava. Eu logo teria que me levantar - pelo menos pra pegar uma coisa pra beber. Mas meu corpo só queria ficar ali, deitado, e nunca mais levantar.

Enquanto não reunia coragem para me mover, eu pensei um pouco mais em Julieta. Imaginei o que ela teria feito se Romeu a tivesse abandonado, não por ter sido banido, mas porque ele havia simplesmente perdido o interesse. E se Rosalie o tivesse feito se apaixonar novamente, e ele mudasse de ideia? E se, ao invés de casar-se com Julieta, ele tivesse desaparecido? Como Julieta teria se sentido?

Ela não voltaria para a sua vida antiga, não mesmo. Conseguiria superá-lo? Talvez. Mas ela teria aceitado o seu destino, eventualmente.

Perguntei-me se ela teria se casado com Paris, no final, para agradar seus pais, e para manter a paz. Não, provavelmente não, eu decidi. Mas também, a história não falava muito sobre Paris. Ele era só uma figura de canto - um segurador de vela, uma ameaça, uma última opção.

E se houvesse mais pra Paris?

E se ele e Julieta fossem amigos? Melhores amigos? E se ele fosse o único com quem ela pudesse confidenciar seus verdadeiros sentimentos? E se ele fosse a única pessoa que pudesse realmente entendê-la, e fazê-la sentir-se humana de novo? E se ele fosse paciente e gentil? E se ele a protegesse?

E se Julieta soubesse que não poderia sobreviver sem ele? E se ela tivesse certeza de que ele a amava, e quisesse fazê-la feliz?

E... se ela o amasse de volta? Não como havia amado Romeu, de um jeito diferente e único, mas tão forte quanto. E se ela quisesse que ele fosse feliz também? Que ele fosse feliz com ela?!

A respiração lenta, profunda de Jacob era o único som na sala - como uma canção de ninar cantarolada para uma criança, como o barulho de uma cadeira de balanço, como o tique taque de um velho relógio, quando você não tem outro lugar pra ir, ou outra coisa para fazer... era um som reconfortante.

Se Paris tivesse feito de tudo para salvar a estúpida Julieta, depois de ela ter arriscado sua vida tentando preencher o vazio que ecoava dentro de si, depois da partida de Romeu, teria ela o escolhido? Talvez ela tivesse que aparar as sobras da sua vida que foram deixadas pra trás primeiro, e talvez levasse algum tempo, mas eu não tinha dúvidas quanto a resposta para aquela pergunta.

Suspirei, e depois gemi quando tal ato arranhou minha garganta.

Ah, resmunguei mentalmente, se eu soubesse que iria doer tanto assim, eu teria pensado duas vezes antes de pular daquele penhasco.

Fechei meus olhos e me deixei levar de novo, sentindo minha mente vagar sobre a realidade - sobre pular do penhasco e como havia sido um erro estúpido. E não apenas o penhasco, mas também as motos e aquela coisa toda de ser irresponsável propositalmente. Agora eu me questionava se os momentos de conforto que a imagem dele me traziam valiam o risco.

E se algo realmente tivesse acontecido comigo? O que teria sido de Charlie? O ataque do coração de Harry havia, de repente, posto tudo em uma nova perspectiva pra mim.

Se Jacob não estivesse lá para me salvar, aquela tarde teria sido um grande, grande desastre. Era apenas mais uma que eu estaria devendo a ele.

Imagens da minha tarde como dublê de filmes de ação continuaram a passar pela minha mente, enquanto eu tentava decifrar cada mísero sentimento que surgiu durante aqueles momentos. A sensação do ar enquanto eu caia; a escuridão da água; a força das correntes; o fantasma de Edward; as mãos quentes de Jacob trazendo a vida de volta a mim; a chuva torrencial que caía das nuvens escuras;

Era quase uma metáfora para a minha vida nos últimos tempos.

Exceto quando eu havia visto aquele estranho fogo nas ondas. Havia alguma coisa familiar naquele flash de cor no topo da água. É claro que não podia realmente ser fogo, mas-

Meus pensamentos foram interrompidos pelo barulho de um carro passando pela estrada enlameada, em frente à casa. Eu ouvi o carro parar perto da porta, e as portas abrindo e fechando. A voz de Billy foi fácil de identificar, mas ele a manteve estranhamente baixa, tornando-a apenas um murmúrio grave.

A porta se abriu, trazendo um pouco de luz para a casa escura. Eu pisquei forte, momentaneamente cega. Jake acordou, suspirando e pulando pra ficar em pé rapidamente.

"Desculpa", Billy murmurou. "Nós acordamos vocês?"

Meus olhos lentamente se focaram no rosto dele, e então, quando eu consegui ler sua expressão, eles se encheram de lágrimas que não consegui segurar.

"Oh, não, Billy!", eu gemi. Ele balançou a cabeça lentamente, a expressão dele estava dura de dor. Jake correu para o seu pai e pegou uma das suas mãos. A dor fez o rosto dele ficar repentinamente infantil - parecia estranho no topo do corpo de um homem.

Sam estava bem atrás de Billy, empurrando a cadeira dele pela porta. A compostura que sempre demonstrava, havia desaparecido de seu rosto, agora agoniado.

"Eu lamento muito", eu sussurrei, sentindo as lágrimas escorrerem pelo rosto.

Billy acenou com a cabeça. "Será difícil para todos".

"Onde está Charlie?"

"Seu pai ainda está no hospital com Sue. Têm muitos... arranjos a serem feitos". Eu engoli seco.

"É melhor eu voltar para lá", Sam murmurou, e saiu apressadamente pela porta.

Billy tirou sua mão da de Jacob e levou sua cadeira pelo corredor, em direção ao seu quarto.

Jake olhou para o local onde seu pai desaparecera por alguns minutos, antes de sentar-se no sofá ao meu lado. Ele colocou o rosto nas mãos. Eu esfreguei o ombro dele, desejando poder pensar em alguma coisa pra dizer.

Depois de um longo momento, Jake pegou minha mão e colocou-a em seu rosto.

"Como você está se sentindo? Você está bem? Eu provavelmente deveria ter te levado pra um médico ou algo assim", ele suspirou.

"Não se preocupe comigo", eu grasnei. Ele virou a cabeça pra olhar pra mim. Os olhos dele estavam muito vermelhos. "Eu não importo no momento. Você não parece muito bem".

"Eu não me sinto muito bem, eu acho". Disse ele. "Eu vou pegar a sua caminhonete e depois te levar pra casa - provavelmente é melhor você estar lá quando Charlie chegar".

"Certo."

Eu fiquei sentada no sofá inquieta, enquanto esperava por ele. Billy estava em silêncio no quarto. Eu me sentia uma intrusa, espiando pelas rachaduras de uma tristeza que não era minha.

Jake não demorou muito. O ronco do motor da minha caminhonete quebrou o silêncio antes do que eu esperava. Ele me pegou do sofá sem falar nada, me abraçando mais forte quando o ar gelado me fez tremer.

Ele me colocou no banco do passageiro, foi para o lado do motorista, e depois me puxou para o lado dele para manter o seu braço bem apertado ao meu redor. Eu automaticamente apoiei minha cabeça em seu peito.

Eu ouvi ele suspirar profundamente.

"Como é que você vai voltar pra casa?", eu perguntei.

"Eu não vou pra casa. Nós ainda não pegamos a sanguessuga, lembra?"

Meu próximo arrepio não teve nada a ver com o frio. Eu não gostei da ideia dele ir atrás de Victoria depois de tudo o que passamos naquele dia, ainda me sentia culpada por todo o problema que eu havia causado.

Esse sentimento de proteção que eu tinha com Jacob me fez parar por um segundo. O ar gelado havia me despertado e minha mente estava alerta, e estava trabalhando muito rápido.

E se eu fosse honesta comigo mesma? Aquele sentimento, aquela angústia que eu sentia toda vez que ele estava em perigo, se colocava em perigo por minha causa, com certeza não era normal para apenas uma amizade. Eu não podia mentir para mim mesma daquele jeito. Eu não conseguia imaginar minha vida sem Jacob, não depois de tudo pelo que passamos.

Eu tremi apenas com a ideia de sequer ter que cogitar isso. De alguma forma, ele se tornara essencial para a minha sobrevivência. Mas deixar as coisas do jeito que estavam... Seria cruel, como Mike havia acusado?

Eu me lembrei de ter desejado que Jacob fosse meu irmão, e me dei conta que o que eu queria na época era ter direitos sobre ele. Eu já não me sentia muito fraternal quando ele me abraçava daquela forma. Era tão bom - quente, confortável e familiar. Seguro. Jake era um porto seguro. Eu podia ter ele para mim. Eu tinha esse poder.

O pensamento de fazer Jacob ser meu, fez meu peito se encher de algo quente.

Claro que teria que contar tudo a ele, eu sabia disso. Era a única forma de ser justa. Eu teria que explicar direito, pra que assim ele soubesse que o motivo de eu não ter me apegado antes era porque ele era bom demais pra mim. Que eu não o merecia.

Ele já sabia que eu estava quebrada e machucada, essa parte não o surpreenderia, mas ele teria que saber exatamente a extensão do dano. Eu teria que admitir que estava louca - explicar sobre as vozes que ouvia, e o que eu havia feito para ouvi-las. Ele precisaria saber de tudo antes de tomar a decisão.

Mas… mesmo que eu reconhecesse essa necessidade, eu sabia que ele me aceitaria apesar de tudo. Ele não iria nem parar pra pensar. Por que ele era Jacob, meu porto seguro.

Eu teria que me comprometer. Dar a ele cada um dos pedaços quebrados que restaram, para que ele me ajudasse a consertá-los. Era a única forma de ser justa com ele. Eu faria isso? Eu teria coragem?

Seria assim tão errado fazer Jacob feliz e, por tabela, ser um pouco feliz também? Mesmo que o amor que eu sentia por ele ainda não fosse do tamanho do que ele sentia por mim, mesmo que o meu coração ainda estivesse doente e com hematomas deixados pelas palavras de Edward? Eu poderia ser feliz com o tempo?

Jacob parou a caminhonete em frente à minha casa escura e desligou o motor cedo demais, deixando tudo, repentinamente, muito silencioso.

Como em tantas outras vezes, ele pareceu estar em sintonia com os meus pensamentos. Colocou seu braço ao meu redor, e me apertou contra si. De novo, aquilo foi bom. Eu me sentia como se quase fosse uma pessoa inteira novamente.

Imaginei que ele estivesse pensando em Harry, mas depois ele falou, e o seu tom era pesaroso.

"Me desculpe, Bella. Eu sei que você não sente exatamente o mesmo que eu. Juro que não me importo. Eu apenas estou tão feliz por você estar bem, que eu poderia cantar - e isso é uma coisa que ninguém quer ouvir". Ele deu sua risada gutural no meu ouvido.

Minha respiração deu um pulo, secando as paredes da minha garganta, quando Jake pressionou sua bochecha quente no topo da minha cabeça. Se eu virasse o meu rosto para o lado, poderia pressionar meus lábios em seu ombro nú... e eu sabia, sem dúvida nenhuma, o que viria a seguir. Seria muito fácil. Não seriam necessárias desculpas e explicações. Seríamos apenas nós dois.

Se eu fizesse aquilo, seria sem volta. Se eu tomasse essa decisão e me comprometesse, teria que colocar todas as minhas cartas na mesa à sua frente, teria que me abrir, e teria que entrar naquele compromisso de corpo e alma.

As borboletas voavam pelo meu estômago, nos meros segundos que levou para mim tomar aquela decisão.

Exatamente como eu imaginei que aconteceria, lentamente, me virei em sua direção. Eu pude sentir o coração de Jacob batendo sob meus lábios, embaixo de sua pele quente, quando meus lábios tocaram a pele do seu ombro brevemente. Diferente da minha, a respiração dele estava descompassada, de um jeito intenso e rítmico, como uma canção. Lentamente, quase como se estivesse com medo de me assustar, ele aproximou o seu rosto do meu.

"Hey", sua voz rouca me chamou, um mero sussurro, a poucos centímetros do meu rosto, e eu espiei por baixo das minhas pálpebras que haviam se fechado sozinhas apenas para encontrar seu olhar grudado em mim.

Seus olhos intensos, pareciam querer respostas, olhando profundamente nos meus, e eu senti meu rosto esquentar mais e mais a cada segundo sob seu olhar penetrante.

Finalmente, depois do que pareceu uma eternidade, ele sorriu o meu sorriso favorito, satisfeito com o que quer que fosse que ele tivesse encontrado.

"Assim está melhor." murmurou, acariciando minhas bochechas.

Em um piscar de olhos, seus lábios tomaram os meus. Primeiramente lentos e macios, mas a cada momento que passava provando um ao outro, se tornando mais vivos.

Uma de suas mãos subiu pelo meu pescoço lentamente, fazendo cada pelo do meu corpo arrepiar. Seus dedos se enroscaram em meus cabelos, preguiçosamente, me puxando mais perto. Os lábios quentes e gentis estavam se tornando famintos e eu me sentia como se estivesse sendo engolida por raios de sol.

Meu corpo tomou vida, estimulada com a onda de alegria que eu podia sentir emanando dele. Meus lábios se movendo nos dele de formas estranhas, confusas, de maneira que nunca haviam se movimentado antes - eu não precisava ser cuidadosa com Jacob, eu notei, e ele certamente não estava sendo cuidadoso comigo.

Um milhão de sensações estranhas e novas passavam pelo meu corpo. Eu precisava de ar, mas não tinha forças suficientes, nem vontade, de parar. Tudo o que queria era me entregar, inebriada por cada gesto, cada toque.

Seus lábios trabalhavam copiosamente, tentando mostrar todo o desejo e alegria que vinha guardando para si. Tais lábios, somados à trilha de puro fogo que a pele dele produzia em si, fizeram meu corpo sucumbir, e todo o nervosismo desaparecer. Minhas mãos criaram vida, e se aventuraram, assim como as dele. Seus ombros largos, os músculos apertados das costas, o modo como seu cabelo, mesmo curto, era grande o suficiente para que eu pudesse segurar...

Cada dúvida, cada receio, e todo medo que eu sentia, haviam desaparecido. Meu coração batia forte em meu peito, como se o calor que irradiava do corpo de Jacob, cobrisse cada centímetro dele; como se preenchesse o buraco que havia ali antes. Pela primeira vez, em muito tempo, eu pude respirar sem dificuldades.

Quando minhas mãos se enroscaram em seus cabelos macios, um som profundo subiu pelo peito de Jacob, com um rosnado, antes de uma nova onda de beijos me atingir. Desta vez, não havia receio ou incerteza, apenas puro desejo.

Ele não fez reservas ao explorar cada canto possível da minha boca, de modos que eu nunca tinha provado antes, e me deixando surpresa ao notar o quanto eu estava amando aquilo. Eu queria mais e jamais parar. Pela primeira vez, parecia que éramos a mesma pessoa. A dor dele sempre foi e sempre seria a minha dor - agora a alegria dele era a minha alegria. Era como se uma porta completamente nova, impossível de ser fechada, houvesse se aberto entre nós.

Por um segundo breve, sem fim, um caminho inteiramente diferente se expandiu atrás das pálpebras dos meus olhos. Como se eu estivesse olhando pra algum compartimento dentro dos pensamentos de Jacob. Eu pude ver Charlie e Renée misturados em uma estranha colagem com Billy e Sam e La Push. Eu podia ver os anos se passando, e significando alguma coisa enquanto passavam, me mudando. Eu podia ver o enorme lobo marrom-avermelhado que eu amava, sempre protetor se eu precisasse dele. Pelo menor fragmento desse segundo, eu vi as cabeças saltitantes de duas crianças, de cabelos pretos, correndo pra longe de mim e pra dentro da floresta familiar. Quando eles desapareceram, o resto da visão foi com eles.

Arfando por ar e entre suspiros, nossos beijos se tornaram mais calmos, nossas mãos menos ariscas. Eu sentia meu corpo febril, e minhas bochechas coradas, ainda atordoada com o que havia acabado de acontecer. Jacob selou nossos lábios mais algumas vezes, antes de se afastar. Seus lábios estavam inchados e avermelhados, e seus olhos tinham um brilho que eu nunca havia visto antes.

Sem querer, enquanto nos olhávamos, tentando recuperar nosso ar, eu comparei aquele beijo aos anteriores que eu havia tido.

Ser beijada por Jacob era como abraçar o sol e ser recebida com desejo e paixão. Era como ter o meu corpo todo preenchido por um líquido fervente, que me despertava em um frenesi impossível de controlar. Um frenesi que eu não queria controlar. Enquanto com Edward, os beijos eram cautelosos, sutis e cuidadosos. Os dois não poderiam ser mais diferentes. Fogo e gelo.

Jacob apoiou sua testa na minha, com suas mãos macias segurando meu rosto, e sem desviar o olhar, nem por um segundo. Eu podia sentir sua respiração forte e quente em meus lábios sensíveis, e o seu cheiro amadeirado delicioso em meu nariz. Me concentrei na sensação quente de sua mão, que acariciava a minha bochecha, fechando meus olhos novamente.

"Eu te amo, Bells." ele sussurrou.

Eu estremeci. Então, a voz aveludada de Edward cochichou no meu ouvido.

"Seja feliz".

Eu congelei.

Jacob me sentiu enrijecer em suas mãos e me largou automaticamente. Um nó se formou em minha garganta e eu lutei contra a confusão dos meus pensamentos, ainda escutando o eco da voz de Edward na minha cabeça. Eu havia passado tanto tempo querendo vê-lo, colocando, literalmente, minha vida em risco por isso, e ele quase não aparecia. Por que ele tinha que aparecer naquele momento?

"Espere." eu guinchei, agarrando seu braço, tentando o manter perto. Não queria que ele tivesse uma ideia errada, enquanto eu clareava minha mente. As coisas não poderiam ficar confusas entre nós, não naquele momento em que tudo pareceu se encaixar. Eu podia ser feliz. Eu poderia fazer Jacob feliz.

Eu tentei organizar meus pensamentos e formar uma frase coerente. Mesmo que a minha promessa interna de estar com ele tenha sido selada com aquele beijo, eu ainda não sabia como dizer a ele em quantos pedaços meu coração havia se partido, e quanto tempo demoraria para voltar ao normal.

Um longo momento se passou sem que nenhum de nós dois se mexesse.

"Bells, eu consigo praticamente ouvir as engrenagens girando na sua cabeça." Ele interrompeu meus pensamentos, tocando um lugar no meio da minha testa com a mão livre. Eu observei o seu rosto calmo. "Sério Bells, eu não disse aquilo esperando uma resposta de volta. É só que... eu não posso deixar esse momento passar sem te dizer como eu realmente sinto.".

Sua mão acariciou meu rosto lentamente, fazendo o contorno dos meus lábios por um momento. Um arrepio passou pelo meu corpo.

"Me sinto o homem mais feliz da face da terra." Seus olhos brilharam. "Você é quem eu escolhi, e eu juro que consigo esperar você se sentir confortável para me escolher também."

Queria poder dizer para ele que eu estava pronta, mas eu sabia que aquilo seria mentira. Eu queria estar pronta, seria o mais correto. A voz de Edward à poucos minutos atrás era prova de que eu não estava.

Seu olhar profundo, preso ao meu, me desconcertou ao se juntar com a firmeza de suas palavras. "Como eu disse, você tem todo o tempo do mundo. Não vou a lugar algum."

Eu tive que desviar do seu olhar, me sentindo pequena. Para ele, eu era um livro aberto. Ele sabia tudo o que se passava pela minha mente tão facilmente. Meu corpo inteiro se sentia anormalmente quente, e eu não sabia se era por tudo o que havia acontecido, ou pela vergonha de ser tão óbvia. Provavelmente uma mistura dos dois.

"Olhe para mim", pediu. Jacob acariciou a ruga entre minhas sobrancelhas antes de continuar. "Eu não estou pedindo o seu coração inteiro, não posso me dar ao luxo... ainda. Se você se sente desconfortável, não falaremos mais sobre isso até que você esteja pronta. Prometo usar toda a paciência que jamais tive, apenas para te manter ao meu lado. Eu não quero te perder por algo bobo, Bells"

"Eu também não quero te perder, Jake." minha voz rouca falou, e era a mais pura verdade.

"Você não vai". Ele sorriu de lado. "Agora, vamos te colocar na cama, antes que Charlie apareça, te veja nesse estado, e pense que você tenha pulado de um penhasco no meio da tempestade ou algo parecido."

Eu ri, ainda constrangida, mas aliviada. Ele estava ali. Eu estava quebrada, ele sabia, e ainda assim, me queria.

Jacob não estava errado, apesar das minhas roupas estarem secas, eu com certeza, parecia ter sido arrastada por um tornado. Se minha aparência não despertasse algum interesse em Charlie, minha voz rouca com certeza iria. Era melhor que ele chegasse em casa e me encontrasse na cama, dormindo.

Jake se inclinou, selando nossos lábios uma última vez antes de abrir a porta.

O vento frio da tempestade invadiu a cabine da caminhonete, e eu, imediatamente, estremeci.

"OH!", a respiração saiu de Jacob como se alguém tivesse dado um soco em seu estômago. "Mas que merda!"

Ele bateu a porta e girou as chaves na ignição ao mesmo tempo. As mãos dele tremiam tanto que eu nem sei como foi que ele conseguiu.

"Qual é o problema?"

Ele tirou o pé da embreagem rápido demais; o carro engasgou e morreu.

"Vampiro", ele cuspiu.

O sangue correu para a minha cabeça e eu me senti tonta. "Como é que você sabe?"

"Porque senti o cheiro. Droga!" Os olhos de Jacob estavam selvagens, rastreando a rua escura. Ele mal parecia estar consciente dos tremores que balançavam todo o seu corpo.

"Me transformar ou tirar você daqui?", ele murmurou para si mesmo.

Ele me encarou por um milésimo de segundo, vendo meus olhos arregalados de horror e rosto pálido, e então rastreando a rua de novo. "Certo. Te tirar daqui".

O motor cortou com um ronco. Os pneus cantaram quando ele fez a volta com a caminhonete, virando-a na direção da nossa única saída.

Os faróis passaram por cima das calçadas, iluminaram a frente da floresta escura, e finalmente refletiram num carro parado na calçada do outro lado da minha casa.

"Pare!", eu arfei.

Era um carro preto - um carro que eu conhecia. Eu podia estar muito longe de ser uma apaixonada por carros, mas eu podia muito bem distinguir aquele carro em particular.

Era uma Mercedes S55 AMG. Eu sabia quantos cavalos de força tinha e a cor do seu interior. Eu sabia qual era a sensação do seu poderoso motor ronronando sob o capô. Eu conhecia o rico cheiro dos bancos de couro e sabia o jeito como aqueles vidros extra escuros não deixavam nenhuma luz penetrar.

Era o carro que Carlisle usava.

"Pare!", eu gritei de novo, mais alto dessa vez, porque Jacob estava levando a caminhonete para o fim da rua.

"O quê?!"

"Não é Victória. Pare, pare! Eu quero voltar!"

Ele pisou no freio com tanta força que eu tive que me segurar no painel.

"É o que?!", ele perguntou de novo, agastado. Ele me encarou com horror nos olhos.

"É o carro de Carlisle! São os Cullen. Eu tenho certeza".

Ele observou o meu rosto por um instante, e um violento tremor balançou o seu corpo.

"Ei, se acalme, Jake. Está tudo bem. Não tem perigo, ok? Relaxe".

"É, relaxe", ele ofegou, colocando a cabeça pra baixo e fechando os olhos. Enquanto ele se concentrava em não explodir num lobo, eu olhei pela janela de trás para o carro preto. O que Carlisle estaria fazendo ali?

"Há um vampiro na sua casa", Jacob disse por entre os dentes. "E você quer voltar lá?"

"Sim.", eu disse em um sussurro. Se Carlisle estivesse realmente ali, eu teria a chance de enfrentá-lo, e entender, finalmente, o porquê de tudo que havia se passado. Talvez aquela fosse a minha chance de enfrentar o passado que ainda me torturava e, talvez, apenas talvez, finalmente ser capaz de consertar meu coração .

Uma chama de esperança se acendeu em mim.

O rosto de Jacob endureceu enquanto eu olhava pra ele, se transformando na máscara ácida que eu achei ter desaparecido para sempre. Meu coração se apertou no peito de um jeito diferente. Pouco antes que ele colocasse a máscara no lugar, eu captei o espasmo de traição que resplandeceu nos olhos dele e eu vacilei. As mãos dele ainda estavam tremendo. Ele parecia ser dez anos mais velho que eu.

Ele respirou fundo. "Você tem certeza de que isso não é um truque?", ele perguntou numa voz lenta, pesada.

"Não é um truque. É o Carlisle. Precisamos voltar."

Um tremor escapou pelos seus ombros largos, mas os olhos dele estavam compenetrados e sem emoção. "Não".

"Jake, está tudo bem -"

"Olha, Bella", ele disse com a mesma voz dura. "Eu não posso. Com acordo ou sem acordo, aquele lá é meu inimigo. Eu não posso- não, eu não quero fazer isso."

"Não é bem assim -"

"Eu tenho que contar pra Sam imediatamente. Isso muda tudo e nós não podemos ficar presos no nosso território. Não com a sanguessuga à solta. Você precisa vir comigo".

"Jake, isso não é uma guerra! Pare por um momento e me escute!"

Ele não me ouviu, começando a dirigir novamente.

"Você disse que seria paciente!" Eu gritei o mais alto que pude, finalmente conseguindo sua atenção. Ele parou o carro mais lentamente desta vez, mas não olhou para mim. A mandíbula dele estava se comprimindo e se soltando, como se tentasse se acalmar.

Eu toquei a sua mão que apertava o volante com força. "Você precisa confiar em mim desta vez. Eu te prometo, nada vai acontecer."

Jacob fechou seus olhos fortemente, considerando minhas palavras. Seus braços voltaram a tremer intensamente e ficando cada vez mais forte, ao ponto de que eu não pudesse mais tocá-lo. Ele estava prestes a se transformar.

Ele desengatou a caminhonete, respirou fundo, antes de pular porta afora, deixando-a ligada.

"Me desculpe, Bells." ele murmurou entre dentes, antes de se jogar na escuridão, tremendo tanto que o corpo dele parecia um vulto.

O remorso me deixou colada no banco por um longo segundo. O que eu tinha acabado de fazer?

Relutante, eu escorreguei para o outro banco e coloquei a caminhonete em marcha de novo. Minhas mãos estavam tremendo tanto quanto as mãos de Jake haviam estado, então precisei de um minuto para conseguir me concentrar antes de dirigir. Depois de retornar com a caminhonete, segui em direção a minha casa, parando-a na entrada da garagem.

Tudo ficou muito escuro quando eu desliguei os faróis. Charlie saíra com tanta pressa que havia esquecido de ligar as luzes da varanda.

E agora?

Senti uma pontada de dúvida, olhando para a casa mergulhada nas sombras. E se isso fosse mesmo um truque? Jacob poderia estar certo e eu havia acabado de me condenar.

Olhei novamente para o carro preto, quase invisível à noite. Não. Eu conhecia aquele carro.

Ainda assim, minhas mãos tremiam mais do que antes quando eu peguei a chave de dentro da mochila.

Quando eu peguei a maçaneta da porta para abri-la, ela girou facilmente embaixo da minha mão. Eu deixei a porta abrir sozinha. O corredor estava escuro. Eu queria chamar com uma saudação, mas minha garganta estava seca demais. Eu não conseguia respirar.

Eu dei um passo para a frente e apalpei a parede para acender a luz.

Estava tão escuro quanto a água estivera, mais cedo. Assim como a água, com aquela chama brilhando impossivelmente em cima dela. Aquela chama não podia ser fogo, mas então o que...?

Meus dedos traçaram a parede, ainda procurando, ainda tremendo - De repente, algo que Jacob me disse essa tarde ecoou na minha cabeça, finalmente caindo a ficha...

Ela escapou pela água, ele havia dito. Os sanguessugas têm vantagem por lá. Foi por isso que eu vim correndo pra casa - eu estava com medo de que ela chegasse primeiro, nadando.

Minha mão congelou na procura, meu corpo inteiro congelou no lugar, enquanto eu me dava conta do porque eu reconhecia a estranha cor laranja na água.

Os cabelos de Victoria, voando selvagemente com o vento. A cor do fogo... Ela esteve lá. Na praia, comigo e com Jake. Se Sam não estivesse lá, se fôssemos só nós dois...?

Eu não conseguia respirar ou me mexer.

A luz se acendeu, apesar da minha mão congelada ainda não ter encontrado o interruptor. Meus olhos piscaram com a luz repentina, e viram que havia alguém lá, esperando por mim.