Réquiem de Esperança
Capítulo IX – Animus rem sibi habendi(1)
Disclaimer : Yoshiyuki Tomino, Hajime Yatate e Koichi Tokita são os criadores de Shin Kidou Senki Gundam W, e não eu... Infelizmente eu ainda não posso ter os G-boys só pra mim...
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"Quand ils parlent ainsi d'espérances trompées,
(Quando falam assim de esperanças enganadas)
De tristesse et d'oubli, d'amour et de malheur,
(De tristeza e esquecimento, amor e desgraça,)
Ce n'est pas un concert à dilater le coeur.
(Não é um concerto para dilatar-se o coração.)
Leurs déclamations sont comme des épées:
(Suas declamações são como espadas :)
Elles tracent dans l'air un cercle éblouissant,
(Traçam no ar um círculo que deslumbra,)
Mais il y pend toujours quelque goutte de sang.
(Mas sempre carregam alguma gota de sangue.)"
Trecho de Le Pélican, de Alfred de Musset
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Minha mente estava um tanto confusa.
Os acontecimentos mais recentes rodopiavam em minha cabeça como um filme de quinta categoria e não demorou muito até que eu percebesse que estava drogado. Seja lá o que me deram, era forte. E a sensação era desagradável.
Lembro-me vagamente de Duo se despedindo de mim em casa. Ele fora completamente diferente, trocando seu habitual sorriso por uma expressão dura. Às vezes me pergunto se mau humor é contagioso ou se o meu gênio é insuportável. Talvez ambos.
O fato era que ele estava muito esquisito. Sem o falatório tão costumeiro, tomei meu café e segui até a empresa. Acho que estava esperando por alguma coisa, mas não me recordo exatamente o que. Malditos remédios.
Quando conheci o apartamento de Duo, tive vontade de me aprofundar numa inspeção. Logicamente jamais faria aquilo com sua presença; certas coisas só devem ser feitas por você mesmo e sozinho. Foi relativamente fácil convencer a Sra. Noventa a me deixar entrar lá. Nada que algum dinheiro não pudesse resolver.
Fiz uma pequena ronda pelo apartamento, mas achei que fosse melhor não gastar muito tempo por lá ou aquela mulher iria me causar problemas. Rapidamente avancei até o quarto e abri as gavetas de seus móveis, espantando-me com o que vi. Várias contas acumuladas, com o prazo de pagamento esgotado, adornavam o pequeno cubículo móvel. Só então me dei conta de que Duo não trabalhava.
Saí com os papéis na mão e perguntei a Sra. Noventa se o aluguel dele estava atrasado. "Faz três meses que o pequeno não me paga, mas ele é uma pessoa tão boa que eu vou levando do jeito que posso.". Nunca vi um sorriso tão satisfeito quando lhe estendi a quantia que ele devia e ainda um mês adiantado.
Há algum problema em eu resolver praticar boas ações do dia para noite ?
Liguei para Quatre e pedi para ele se encontrar comigo e Trowa no escritório. Explanei a situação de Duo a eles e os dois concordaram em me ajudar a pagar as contas. Uma boa ação coletiva que, no fim das contas, me resultaria prazerosamente caro. Porém não me vem nenhuma lembrança de um retorno prazeroso.
Ah, lembrei-me do que estava aguardando : uma ligação de Duo, ouvindo sua voz agradecida. Mas isso nunca aconteceu. Hn... Ingrato.
Mas essas memórias não são de hoje... Se parar para pensar, tudo que me lembro se resume a uma palavra : dor. Primeiro uma dor irritante perto do umbigo. Depois, uma dor lancinante na pelve. E pensar que uma apendicite me causaria tantos transtornos...
Como eu sabia que estava com apendicite ?
Estava no escritório quando senti náuseas, uma coisa que não me acontecia há anos. Coloquei para fora quase que o meu estômago. Suava frio. Eu realmente estava mal. Saí antes que pudesse cruzar com Trowa e pedi a Sally que lhe dissesse que fora embora. Não tenho idéia como consegui chegar em casa dirigindo, aquela dor estava me matando. Até tentei pensar em algo para cozinhar, mas não tinha idéias.
Para que eu queria cozinhar mesmo ?
Senti minhas pálpebras um pouco mais leves e abri os olhos. A iluminação estava branda e rapidamente me acostumei. Inspecionei vagamente o ambiente, ainda meio zonzo. Quarto de hospital, noite, estava na cama e havia mais uma presença ali. No sofá, Duo estava deitado, com os cabelos soltos cascateando pelos seus ombros e uma mão no peito, segurando algo que deduzi ser sua cruz. Adormecera numa posição bem inconveniente, diga-se de passagem.
O que dizer além de que ele mais parecia um anjinho ? Minhas pálpebras pesaram novamente e eu o acompanhei numa jornada ao mundo dos sonhos.
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Por quanto tempo eu adormecera ?
Acho que meu cérebro estava em melhor estado de funcionamento. Consigo me lembrar perfeitamente de ter tomado analgésicos para a dor e de ter passado a tarde inteira com a mesma me incomodando. Também tenho a imagem de Duo tocando em minha campainha à noite, eu iria cozinhar para ele.
Um estalo. Eu havia pedido ajuda a Duo ?
Desde quando eu era maluco o suficiente para confiar naquele cara ? Eu deveria estar realmente cego de dor, não sei nem se confiaria em Quatre para isso... Mas até que ele fizera um bom trabalho, afinal a dor desaparecera.
Hum... Ele dirigira o meu carro ? Acho que realmente deveria agradecer por ainda estar vivo. Não me lembro com exatidão do que aconteceu, apenas uma frase estava na minha cabeça e, não sei porque, confiei nela quando a ouvi.
"Hee-chan, não se preocupe. Shinigami irá tomar conta de você, tudo vai dar certo."
Shinigami... O que aquilo significava ?
E que barulheira era essa que conseguia ouvir nitidamente dentro dos meus pensamentos ? Vozes... Uma desconheço, mas a outra é de Duo.
- Você foi incrível ! – uma voz feminina falou – Arrependo-me de nunca ter ido olhar uma aula de cirurgia de vocês !
- Dorothy, não faça tanto alarde... Só foi uma apendicectomia.
Hum... Duo conhecia a garota, pelo que pude perceber. Estava completamente curioso para colocar meus olhos nela, mas eles ainda pareciam bastante pesados para abrirem...
- Só ? Teria sido só se você não tivesse se transformado completamente na sala !
- Deixe de exageros.
- Agora entendo a Hilde ! Você parecia um deus decidindo o futuro de um mero mortal.
- Shinigami... Esqueça-o. Ele não vai ressurgir de novo.
Então Shinigami era um alter ego de Duo ? Bem, a lógica aplicada pela garota era coerente com o significado do nome. Se ao menos eu pudesse ter assistido a minha cirurgia... Quem sabe eu não tivesse uma outra impressão dele agora ?
- Você já almoçou ?
- Não.
- Duo, vamos, vá comer alguma coisa !
- Eu não vou deixá-lo aqui sozinho, Dorothy. Ele pode acordar a qualquer instante.
- Vá antes que o professor Quatre chegue. Porque nós sabemos muito bem que, independentemente de você ter virado o Shinigami na sala de cirurgia, você vai ser, no mínimo, xingado quando ele chegar.
- Olhe, eu vou comer, mas tome conta dele. Só assim você para de me encher.
- Eu tenho de dar o meu plantão, mas ninguém vai entrar por aqui agora. Relaxe.
Barulhos de passos e da porta se abrindo e fechando. Estava sozinho de novo.
Minhas memórias estavam completamente claras agora. Eu cheguei em casa com muita dor e lembro-me de ter revirado todos os meus livros de receitas numa vã tentativa de achar algo decente para cozinhar. Mas a dor estava perturbando o meu raciocínio.
Tentei discar o número de Quatre, porém seu celular estava desligado, assim como o de Trowa. Deveriam estar juntos e posso presumir o que estavam fazendo, para ser mais exato. O que não me dizia respeito. E então me deitei no sofá durante um tempo interminável, até que ouvi a campainha tocar e mirei Duo em pé.
Recordo-me dele ter me levado até minha cama e me examinado. E também do baka ter aumentado consideravelmente a minha dor. Foi a voz dele, gritando com alguém, que me revelou a apendicite e o risco de morte que corria. Ele salvara minha vida, afinal de contas.
Sim, fechei meu ciclo de memórias. E minhas pálpebras finalmente resolveram me obedecer.
O quarto estava abundantemente iluminado, evidenciando o horário por volta de uma da tarde. Era muito parecido com o que Duo ficara da outra vez. Na mesinha, havia um pequeno vaso com algumas flores. A janela estava aberta e soprava um vento gostoso.
Notei que estava ligado a um tubo de soro e suspirei. Eu realmente odiava ficar internado em hospitais, a sensação de vulnerabilidade era extrema. Então a porta do quarto se abriu e quase me engasguei sozinho com quem vi.
- Yuy. – falou, se aproximando de minha cama.
- Chang. – respondi.
- Sally me contou que você estava doente, disse-me que um amigo seu havia ligado desesperado atrás de Trowa. Não sabia que tinha outros amigos.
- Veio até aqui apenas para tentar me atingir ?
- Não. Vim para saber se você estava melhor.
Aquilo realmente me deixou surpreso. Então o chinês irritante que sempre fora meu eterno rival – pelo menos na concepção dele – estava preocupado com a minha saúde ? Será que todos estes anos finalmente estavam surtindo um efeito diferente nele ?
- Isso é uma novidade para mim.
- Vamos parar com as infantilidades. Não somos mais adolescentes para nos importarmos em competições idiotas.
- Concordo plenamente.
- Então, como você está, amigo ?
Amigo... A palavra ganhou uma dimensão completamente diferente ao ser pronunciada por Chang daquela maneira. Representava o início de um entendimento, do fim de rivalidades imbecis. Era um novo grande passo que deveria ser tomado por mim também.
- Estou bem, afinal ainda estou vivo... Amigo.
Pude constatar o minúsculo sorriso na boca dele, algo que raramente vi na minha vida. Talvez fora apenas no dia de seu casamento com Sally. Mas não havia motivos para tais recordações. Notei a porta se abrir e vi Duo entrar com uma bandeja que supus ser o meu almoço. Aparentemente, ele não notara Chang.
- Ah, finalmente acordou !
- Maxwell ? – Chang falou um tanto surpreso.
- Fei ! O que está fazendo por aqui, cara ?
Ok, este era um dos raros momentos que minha cabeça rodopiava por excesso de informações estranhas. Duo e Chang se conheciam. Mas como ? De onde ? Duo era o tipo de pessoa que Chang abominava completamente, que se distanciava como uma grande fobia. Os dois me deviam algumas explicações.
- Eu que pergunto o que está fazendo aqui, Maxwell.
- Eu operei o Heero, oras ! – colocou a bandeja em cima da mesa.
- Você ? – deu um olhar incrédulo – Não foi você quem disse que nunca mais faria isso ?
- Isso não vem ao caso, Fei. Mas o que diabos você está fazendo aqui ? – pude perceber um estalo através dos olhos violetas – Não me diga que o tal Yuy que você tanto falava era...?
- Você falava muito de mim, Chang ? Bom saber.
- Esta conversa está tomando um rumo muito diferente. De onde vocês se conhecem, Yuy ?
- Será que vocês poderiam se chamar pelo primeiro nome ? – Duo colocou as mãos nos quadris de forma... Adorável – E é melhor não falar sobre isso, Wu-man. – Chang fez uma careta diante do apelido – E nem sobre como nos conhecemos também.
- E por que não ?
- Salvei a vida dele. Ele tentou se... – a mão de Duo tapou a minha boca, mas o brilho de entendimento se fez presente nos orbes negros.
- De novo, Maxwell ? E por que parou de treinar ?
Treinar ? Do que diabos Chang estava falando ?
Duo olhou para baixo, envergonhado.
- Perdi o estímulo.
- Vocês querem me explicar de onde se conhecem ?
- Calma, Yuy. – Duo fez uma careta quando ouviu meu sobrenome – Nós apenas treinávamos kung-fu na praia.
- Vocês querem respeitar minha vontade uma vez na vida ? – falou irritado.
- Kung-fu ? Ele ? – apontei descrente para Duo.
- Ele sabe lutar muito bem, por mais que não pareça. Treina há uns dois anos, mas faz alguns meses que não tem aparecido.
- Querem parar de falar sobre mim como se eu não estivesse aqui ?
- Eu já vou, Yuy e Maxwell. Só não sei a quem peço para cuidar de quem.
- Mande um olá para Sally, Chang.
- Mande um beijo para a pequena Po por mim, Fei !
Chang acenou rapidamente e saiu.
- Hee-chan, vou inclinar a cama, você precisa comer.
- O que tem aí ? – ele colocou uma bandeja com uma sopa sem graça no meu colo e grunhi irritado.
- Você está num hospital, não espere um banquete. As comidas são tão insossas que já são um bom motivo para as pessoas correrem de hospitais.
A sopa realmente estava sem sal. Mas ele me olhava com olhinhos tão brilhantes que me forcei a tomar uma grande quantia do líquido morno. Desde quando eu andava tão sensível a olhares pidões ?
O fato de ele conhecer Chang ainda não estava muito claro em minha cabeça. É inconcebível que, sem mais nem menos, os dois se encontrem numa praia e comecem a treinar juntos. E ele não queria contar esta história, o que aguçava ainda mais minha curiosidade.
Ele me olhava comer com um sorriso no rosto.
- Como vocês realmente se conheceram ?
Foi o suficiente para murchar seu sorriso. Poderia dizer que um brilho de melancolia também passou pelos seus olhos.
- Heero... Não remexa nesta história...
- Será que você poderia me dizer ao menos uma coisa sobre como isso aconteceu ?
- Foi... No dia do enterro de Hilde e Solo... Mas não quero tocar neste assunto, por favor. – olhou para mim – Não vai mais comer o seu manjar dos deuses ? – sorriu.
- Hn. – empurrei o prato para longe de mim e ele entendeu a negativa, tirando a bandeja da cama.
Por que será que tudo que acontece na vida dele tem a morte destas duas pessoas como marco ? Tudo sempre ocorre antes e depois deste evento para ele. Isso deve ser torturante, mas nunca poderia se pedir para esquecê-los. Afinal, ele deve sentir como se estivessem vivos quando se lembra deles – o que pode ser um calmante ou uma tortura.
Ele puxou uma cadeira de dentro do quarto e se sentou próximo a minha cama, me olhando com um sorriso no rosto. Parecia feliz.
- Hn. O que foi, baka ? – falei num tom pitoresco de irritação, arrancando uma pequena risada.
- Nada. Só estou contente porque consegui salvar sua vida.
- Não pense que é o melhor cirurgião do mundo só porque conseguiu fazer isso.
- Certo, pode deixar, perfect soldier.
Perfect Soldier ? De onde diabos ele conhecia meu antigo e odiado apelido ? Eu simplesmente tinha espasmos de raiva quando alguém me chamava assim na faculdade. Qual o problema de querer elaborar um programa de computador com tanta maestria quanto um soldado de guerra que executa uma missão na qual sua vida depende daquilo ? Essa era a minha receita de sucesso, foi por isso que a White Fang chegou onde está hoje.
O único lugar que ele poderia ter ouvido isso sem que eu me recordasse era a pizzaria, onde Trowa e Quatre também estavam. Maldito Trowa. Devia estar fazendo uma cara muito feia para conseguir arrancar as risadas que ele estava dando.
- Calma, bobinho. – ele passou a mão pelos meus cabelos – Não chamo mais, foi só para provocar. – fiz uma careta – E também não adianta me ameaçar de morte mais uma vez.
- Hn. Se você não tornar a repeti-lo, tudo bem. – dei um meio sorriso e ele beliscou a minha bochecha.
Por que eu não me incomodava com estas demonstrações de carinho da parte dele ? Geralmente o infeliz que fizesse isso já estaria morto antes de sequer piscar. Talvez fosse para ver aquele sorriso infantil de cabide que lhe ficava tão bem. Soltei um pequeno grunhido e ele riu, passando suas mãos pelos meus cabelos e a repousando na cama, perto do meu braço.
- Prometa-me que, da próxima vez que estiver com uma dor, que vai procurar por alguém.
- Eu liguei para Quatre e Trowa, mas não consegui falar com eles.
- E por que não ligou para mim ?
Boa pergunta. Por que eu não havia ligado para ele ? Por julgá-lo inapto a me ajudar ? Talvez. Senti sua mão tocar na minha de uma maneira um tanto hesitante.
- Acho que já lhe provei que sou competente o suficiente para salvar a sua vida. Por favor, procure por alguém se estiver se sentindo mal. Se tivesse demorado um pouco mais de tempo, eu o teria perdido.
Cobri a mão dele com a minha, fazendo um carinho com polegar em seu dorso. Então eu era importante para ele ? De alguma forma aquilo me tocava, era muito bom saber daquilo. Eu queria ajudá-lo e esse carinho dele por mim era um grande passo.
Senti-o se aproximar lentamente de mim. Sua respiração estava em minha orelha e pude aspirar o leve cheiro adocicado que emanava dele. Sua mão se soltou da minha e fazia um leve carinho na minha bochecha.
- Acho que ainda não tinha dito isso, mas... Muito obrigado por tudo.
- Obrigado também, baka.
Senti seu riso na minha orelha e ele virou seu rosto. Seus lábios macios se encontraram com a minha bochecha e ele me deu um beijo demorado e delicado. Depois, ele se separou, ainda mantendo seu rosto próximo ao meu e alisando minha face. Sorria.
Aquele sorriso era o sorriso mais lindo do mundo.
Olhei para seus orbes violetas que tanto queriam me dizer, mas que nada de coerente formulavam. Ele realmente parecia feliz naquele momento. Notei que eu também sorria da mesma forma que ele. Duo se afastou lentamente, tornando a sentar na cadeira. Segurou carinhosamente a minha mão, ainda me olhando como se estivesse encantado. Esse gesto, de uma forma ou de outra, lhe dava apoio.
- Quanto tempo eu vou passar por aqui ?
- Talvez amanhã você tenha alta.
- Eu vou ficar com uma cicatriz ? – falei num tom divertido.
- Bem, Hee-chan, você vai ficar com uma marquinha. Mas eu me arrisquei a fazer uma incisão pequena no local, então não vai ficar muito grande.
- Você se "arriscou" ?
- Err... É que é melhor cortar aqui, sabe ? – ele passou o indicador numa linha vertical pelo meu abdome, em cima do umbigo, parando um pouco abaixo deste e recolhendo a mão – Mas aí eu fiz este corte menor para não te deixar com uma cicatriz feia. Assim você vai poder desfilar para as meninas, nem se preocupe ! – falou num tom divertido e deu uma piscadela.
- E quem disse que eu fico me mostrando para os outros, baka ?
Rimos um pouco, até que fomos interrompidos pelo barulho da porta abrindo de maneira nada delicada. Olhamos para a garota de trancinhas que correu ao meu encontro, me abraçando – e sufocando – pelo pescoço.
- Heero ! Quando fiquei sabendo, quase perdi a cabeça ! O que você tem, você está bem ?
- Relena... – falei sem emoção – Como diabos você soube que eu estava aqui ?
- Eu liguei para a empresa para falar com você e me disseram que estava internado. Vim correndo até aqui. O que foi que você teve ?
- Apendicite. – Duo respondeu – Mas já está tudo bem agora.
Era palpável a tensão que se estabelecera quando os olhares dos dois se cruzaram. Ela estava séria, mas ele sorria. Qual o problema agora que Relena iria criar com Duo ? E quem diabos falou para ela que eu estava internado ? Sally deve ter dito acidentalmente...
- Quem é você ? – falou séria.
- Duo Maxwell. – ele estendeu a mão e Relena hesitou antes de aceitá-la.
- Relena Peacecraft. De onde você conhece o Heero ?
- Não é da sua conta, Relena. – intervim.
- Eu realizei a cirurgia dele.
A face dela se descontraiu.
- Muito obrigada por ajudá-lo, doutor. Depois posso recompensá-lo adequadamente, não é meu amor ? – ela afagou os meus cabelos e lhe dirigi o mais intenso olhar assassino.
- Agora vou deixar vocês a sós, pombinhos.
Antes que eu pudesse protestar para não ficar sozinho com aquela maluca, Duo saiu. Apesar de sorrir, seus olhos sustentavam um brilho... Magoado ? Sim, magoado. Mas por quê ? Tive de sair rapidamente de meus pensamentos porque Relena dava beijos na minha bochecha.
- Pare já com isso, Relena ! – falei rude.
- Mas por que, meu amor ?
- E não me chame de meu amor, eu não sou nada seu ! Saia já daqui ! Você já viu que estou vivo, não precisa mais permanecer aqui. Vá cuidar de suas empresas !
- Você está muito exaltado, acho que são os remédios. Aquele médico não é muito jovem para cuidar de você ? Por que Quatre não fez sua cirurgia ?
- Não me bombardeie com perguntas como se tivesse o direito de saber as respostas.
- Acho melhor lhe visitar em casa, com mais calma.
- Se você aparecer por lá, vou bater a porta na sua cara.
- Não precisa disfarçar, amor, estamos sozinhos. – ela deu uma piscadela que me enojou – Vou indo por hoje, mas tome cuidado com aquele médico. Não gostei da cara dele e nem da intimidade com que falava com você.
Se isso não fosse abrir os meus pontos e eu não fosse ser preso, teria me levantado e batido na cara dela. Dei um suspiro pesado quando ela saiu. Por que diabos ela ficava me perseguindo ? Será que não dava para arranjar outro coitado para fazer isso ?
E por que Duo saíra magoado do quarto ? Também não entendo o motivo que o levou a chamar-nos de pombinhos, ele sabe muito bem que a odeio. Ele e suas teorias malucas. A porta abriu mais uma vez e já ia preparar uma enxurrada de xingamentos quando vi que não era Relena.
- Então quer dizer que logo você ficou doente ? – Trowa entrou e se sentou na cadeira onde Duo esteve.
- Hn. Vocês dois deviam estar bem ocupadinhos para desligarem o celular durante o dia todo.
Poderia jurar que vi Trowa corar. Isso era inédito.
- Está melhor ?
- Sim, Duo deu um jeito nisso. E Quatre ?
- Foi ter uma conversa com Duo a respeito do que ele fez aqui ontem.
Não havia pensado nisso. Duo estava em sérios problemas por minha causa. Mas por que diabos ele não deixou que outra pessoa me operasse ? Não deveria se meter em mais problemas por causa de algo que outra pessoa poderia substituí-lo.
- Eu ainda vou te bater por ter contado a ele sobre o perfect soldier.
Trowa deu uma risada.
- Acho que ele vai preferir te chamar de Hee-chan... – falou num tom um tanto debochado.
- Relena esteve aqui há pouco.
- Sério ? Aconteceu alguma coisa interessante que eu tenha perdido ?
- Ela cismou com Duo. Quem contou a ela sobre mim ?
- Acho que Sally disse acidentalmente.
- Chang também esteve aqui.
O olho visível de Trowa estava arregalado.
- Wufei ? E o que ele disse ?
- Disse que Sally tinha dito a ele e que veio ver como eu estava. Ela já conhecia o Duo.
Os olhos se arregalaram ainda mais e sufoquei um riso. Ele estava realmente engraçado.
- Isso está ficando cada vez mais enrolado...
- Sim, Duo luta kung-fu.
Trowa riu.
- Sério ? Nossa, nunca imaginaria... Mas descanse, cara. Vamos esperar que Quat e Duo cheguem da conversa.
Grunhi afirmativamente. Que rumo esta conversa dos dois iria tomar ?
Continua...
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N/A : Bem, eu gostaria de dedicar este capítulo a uma pequenina pessoa que vem acompanhando minhas fics desde o começo do ano : a Anne. É a minha pequena forma de expressar gratidão por tanto carinho em continuar lendo o que escrevo. Beijinhos, minha querida ! O Heero me fez empacar com o capítulo, estava quase arrancando os cabelos até que ele resolveu colaborar. E, por favor, não me matem a respeito da Relena no final do capítulo ! (foge das pedras).
Gostaria de mandar beijos especiais também para a Koorime Shinigami, Litha, Ana Paula, Ophiuchus no Shaina, usagui no ashi, Kitsune Lina, Tina Chan e Perséfone. As respostas das reviews estão lá no meu blog, chibi ponto weblogger ponto com ponto br. Muito obrigada e mil beijos ! E lembrem-se : reviews são sempre bem vindas !
Nota :
(1) Animus rem sibi habendi, do latim, "com a intenção de ter a coisa para si".
