Réquiem de Esperança
Capítulo XVIII – Miracles

Disclaimer : Yoshiyuki Tomino, Hajime Yatate e Koichi Tokita são os criadores de Shin Kidou Senki Gundam W, e não eu.

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"Ses longs cheveux épars la couvrent tout entière:
La croix de son collier repose dans as main.
Comme pour témoigner qu'elle a fait as prière,
Et qu'elle va la faire en s'éveillant demain."
Alfred de Musset

"Os seus longos cabelos dispersos cobrem-na inteira :
A cruz do seu colar descansa como um ás na mão.
Como para testemunhar que realmente fez a oração,
E que vai fazê-lo quando despertar pela manhã."

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Acordei de um jeito um tanto inesperado.

O sol entrava pela janela do quarto e um cheiro de café invadia minhas narinas. Além disso, podia ouvir a voz de Duo soando em meus ouvidos.

- Acorda, Hee... Você tem que ir trabalhar !

Pisquei algumas vezes e o vi sorrir, já vestido. Ele me puxou e me entregou uma roupa limpa, das que havia trazido comigo anteriormente.

- Vai, faz a barba e se troca logo, preparei um café da melhor maneira que consegui. Trowa ligou pra você, parece que quer te dar a data de uma reunião importante.

- Deve ser o almoço com a Mireille. – cocei os olhos e me vi refletido no espelho.

- Do Noir ?

- Ela mesma. Quer fazer uma reportagem comemorativa do aniversário da empresa.

- Que bom. – ele sorriu – Agora vai logo. Almoça aqui ?

- Creio que não. Mas durmo aqui, vou cuidar de você enquanto está com o braço engessado.

- Vou passar o dia estudando para a prova. Vê se não chega muito tarde. – ele saiu, me deixando só no banheiro.

O fato de ele ter acordado cedo e preparado o café me deixavam animado. Demonstrava que ele estava ansioso pela prova de residência, que aquilo se tornara um objetivo para ele. Era um bom começo.

Fiz minha barba e tomei um banho, vestindo-me. Trowa iria gostar de me ver pisando na empresa. Segui até a sala e vi Duo com uma torrada na boca, folheando um livro dentre vários que estavam em cima da mesa.

- Quantos livros ! Para que tantos, se não vai terminar nenhum ?

- Na medicina, um assunto puxa o outro, Heero. – ele me olhou com determinação – É sempre bom ver os detalhes de tudo. Um erro pode ser fatal.

- Eu sei disso, Duo. Não só na medicina, como em outras profissões. Um erro de cálculo de um engenheiro pode fazer um prédio inteiro desabar.

Ele me deu um sorriso e enchi uma caneca com café.

- Vai estar bem sem mim ?

- Sim. – ele sorriu, a caneta nos lábios.

- Não se esqueça de almoçar. – esvaziei a caneca de uma vez e lhe dei um selinho – Qualquer coisa, liga.

- Tudo bem, Hee.

Lancei um olhar para aqueles vários livros, alguns com vários desenhos do corpo humano, músculos, vasos e nervos. Medicina deveria ser bastante difícil. Mas a informática também o era.

Desci as escadarias do apartamento de Duo e entrei no meu carro, estacionado na porta. Era maravilhoso ver Duo tão determinado, estudando duro. Era bom vê-lo focar em outra coisa que não fosse as próprias dores. Quatre era realmente um anjo para ele.

Que mal poderia haver em ele fazer a prova daqui a um mês ? Por pior que fosse o resultado, era uma experiência válida. E, se ele disse que era capaz de passar mesmo só tendo um mês, eu acreditava. Duo não voltaria atrás em suas palavras, esse era o jeito dele.

Quatre era muito exagerado às vezes. Duo não era uma boneca de porcelana.

Estacionei e subi o elevador. As pessoas me cumprimentavam à medida que completava meu caminho. Na minha ante-sala, Sally conversava com Chang.

- Bom dia, Sally, Chang.

- Bom dia, Heero. – Sally me deu um sorriso.

- Yuy. Trowa me falou algo sobre Maxwell, o que houve ?

- Entre aqui na minha sala, trocamos algumas palavras lá.

Chang me seguiu e entramos. Sentei em minha cadeira e indiquei que ele fizesse o mesmo em uma das que ficavam a frente da minha escrivaninha. Ele aceitou.

- Duo foi atropelado. – ele fez uma careta – Mas não houve nada demais. Apenas quebrou o braço.

- Yuy, se eu souber que teve dedo seu nesta história...

- E teve.

Os punhos dele se fecharam.

- Yuy, maldito, o que foi que você fez com ele ?

- Joguei-o contra a parede e o beijei.

Os olhos dele se arregalaram e eu sorri divertido. Era bom fazer isto às vezes.

- Vocês estão juntos ?

- Namorando. E ele vai fazer prova de residência daqui a um mês.

- Ele não passa. – foi categórico – Mas isso não importa agora. Pelo menos você fez algo útil.

Dei um meio sorriso.

- Ligue para ele, ele vai gostar. A propósito, mudando de assunto, como vai o desenvolvimento do software para os Manguanacs ? Trowa me disse que fechamos o negócio e você ficou responsável.

- Está em perfeita ordem.

- Ótimo. – ele se levantou – Poderia pedir a Sally para chamar Trowa para mim ?

Ele acenou com a cabeça e saiu.

Por que todos diziam que Duo não passaria ? Deveras o teste deveria ser difícil, mas ele teria chance. Verifiquei meus e-mails e suspirei, vendo a quantidade de lixo que Relena me mandara. Será que aquela garota não desistiria nunca ?

Ouvi duas batidinhas na porta e Trowa entrou.

- Pensei que não viria mais por aqui. – sorriu e se sentou.

- Duo praticamente me expulsou de casa.

- Encheu da sua cara. – falou divertido.

- Acho que queria sossego para estudar. – falei divertido.

- Ele está animado ?

- Muito.

- E Quatre ainda tinha receios sobre ele fazer esta prova... Bem, mas vamos tratar de negócios que estamos em horário de trabalho.

- Marcou o almoço com Mireille ?

- Sim. Daqui a quinze dias, meio dia, no Les Soldats(1).

- Está empolgado com esta idéia dela ?

- Por que não ? É marketing para nós, e gratuito ainda por cima.

- Sempre pensando nos lucros. O que estamos nos tornando ?

Trowa e eu rimos.

- Tem umas papeladas para eu revisar com você, alguns contratos pequenos. Disposto a perder a manhã inteira ?

- O que posso fazer ? – falei divertido – Não tenho opção.

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Entrei em casa oito horas da noite. Apenas a manhã inteira, hein, Trowa ? Belo eufemismo. Foi um massacre de contratos, objetivos e análises dos produtos desenvolvidos. Pelo menos ele pagou o almoço.

Toquei a campainha e Duo me atendeu ainda com a mesma roupa que estava de manhã, os cabelos soltos e bagunçados. A mesa continuava bagunçada, cheia de livros e ele tinha uma cara cansada. Apenas me deu um beijinho e deu meia-volta, sentando de frente para eles de novo.

- Vai continuar a estudar, anjo ? – tranquei a porta, me aproximando.

- Claro, apenas comecei.

- Por isso mesmo, ainda tem um mês inteiro pela frente.

- Se eu pensar assim, não estudo nunca.

- Está bem, está bem. – dei um beijo no topo da cabeça dele – Almoçou ?

- Sim.

- E jantou ?

- Na verdade, não. Esqueci.

- Vou fazer uns sanduíches para nós dois, volto já.

Livrei-me do paletó e da gravata e arregacei as mangas da camisa azul. Lavei as mãos e abri a geladeira, pegando alguns pães que havíamos comprado. Preparei dois sanduíches simples, apenas para não deixá-lo sem comer. Esta empolgação toda deveria ser pelo simples fato de recomeçar. Depois de um tempo, vai amornar. Tudo amorna.

Voltei para a sala e coloquei o prato na sua frente, sentando a seu lado. Ele me lançou um sorriso e pegou o sanduíche, mordendo-o enquanto continuava a ler. Não gosto de ser ignorado desta forma.

- Duo... Pára um pouco de ler enquanto come.

- Ah, Hee... É só um pouquinho.

- Pára. – repeti com firmeza e ele obedeceu.

- Como foi seu dia ? Fei me ligou, disse que tinha lhe contado que estávamos namorando.

- Sim. Conversaram bastante ?

- Mais ou menos, sabe como ele não é muito de falar.

- Mas você compensa. – completei divertido.

- Eu tinha de estudar, então foi rapidinho.

- Duo !

Ele deu um sorriso amarelo.

- Está estudando o que ?

- Estou revisando alguns assuntos do primeiro e segundo ano. – ele terminou e recolhi o prato, colocando-o na pia.

Voltei, ele de novo grudado naqueles livros. Sentei ao seu lado e tomei um, olhando a capa. Tratado de Fisiologia Médica, Guyton & Hall(2) O livro era enorme. Folheei um pouco, lendo alguns trechos.

"A ligação de hormônios ao receptor permite o acoplamento do receptor a uma proteína G. Se a proteína G estimular o sistema da adenilil-ciclase-cAMP, ela é denominada proteína GS, indicando que se trata de proteína G estimuladora. A estimulação da adenilil-ciclase, uma enzima ligada à membrana, pela proteína GS catalisa, então, a conversão de pequena quantidade de trifosfato de adenosina (ATP) do citoplasma em cAMP no interior da célula."

Rolei os olhos pela página e vi que ainda existiam mais nomes esquisitos, todos relacionados a tal proteína G. Medicina era realmente uma coisa complicada. Preferi voltar ao começo do livro e abri no primeiro capítulo. Talvez aqui pudesse haver algo mais simples, dentro da minha pequena compreensão biológica. Surpreendi-me com o que encontrei.

"Na fisiologia humana, estamos voltados para as características específicas do corpo humano que fazem dele um ser vivo. O fato de que permanecemos vivos está quase fora de nosso próprio controle, pois a fome nos faz procurar alimento e o medo faz com que busquemos refúgio. As sensações de frio nos fazem produzir calor. Outras forças fazem com que busquemos amizades e que queiramos nos reproduzir. Assim, o ser humano é, na verdade, um autômato, e o fato de sermos seres com sentimentos e dotados de conhecimento é parte da seqüência automática da vida; esses atributos especiais nos permitem existir sob condições muito variáveis."

Então era isso que a universidade ensinava aos médicos ? Que o ser humano é apenas uma máquina e que os sentimentos, na realidade, são mecanismos de auto-preservação que em nada se relacionam com a nossa própria vontade ? Por mais lógico que isto parecesse, eu não queria aceitar. Não podia ser verdade.

Os sentimentos são justamente aquilo que nos diferem de uma máquina, dos computadores com os quais convivo diariamente. Não somos meros softwares, onde sorrir, fazer amizades ou ter medo está programado. Admitir isso é o mesmo que admitir que não temos controle sobre a nossa própria vida e nossas próprias vontades. Que não importa se vivemos ou morremos, porque, no íntimo, somos todos um conjunto de chips chamados células, formando um todo, uma máquina chamada ser humano.

Talvez seja por trechos como estes nos livros que os médicos são tão frios e impessoais. Que não olham nos rostos de seus pacientes, que não se importam com eles. Somos todos umas máquinas, mesmo. Raras exceções realmente se preocupam com a dor que cada um de seus pacientes carrega e estes são os verdadeiros escolhidos para exercer a medicina.

Porque, por mais lógico que seja a afirmação do livro, não se deve ignorar o que cada um sente. O senso comum. Aquilo que nos cria e nos faz ser quem somos.

Fechei o livro com um baque e Duo se assustou, olhando para mim. Eu não ia deixar uma medicina nojenta como aquela ganhar de mim. Ele já havia estudado demais e agora era hora de descansar. De sentir de verdade o que era ser uma pessoa.

- Heero, o que foi ? – ele tocou em minha bochecha, preocupado.

- Por hoje chega, Duo. – ele fez menção de abrir a boca – E não adianta reclamar, você vai dormir comigo agora. Não aceito um não como resposta.

Levantei-me e o coloquei nos braços.

- Heero ! – ele se agarrou em meu pescoço, um pouco assustado com as minhas reações.

Continuei meu caminho até o quarto e o beijei apaixonadamente. Sorri quando ele retribuiu, exigente, acariciando a minha nuca. Suguei seu lábio inferior e ele me olhou, cheio de carinho.

Isso era o certo. Isso era ser um humano.

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Mireille Bouquet era uma bela mulher. Assim que pôs os pés no Les Soldats, chamou a atenção de todos. Alta, loira, olhos azuis e aquela pose autoritária.

Junto dela, Kirika Yumura(3). Aparência de garota, cabelos curtos e negros, olhos da mesma cor. Diziam as más línguas que eram amantes.

A verdade é que eram imbatíveis juntas.

Trowa assobiou baixinho em meu ouvido, num claro sinal de divertimento pela atenção que elas chamavam. As duas sentaram-se à nossa frente.

- Obrigada por aceitarem o convite, Trowa, Heero. – Mireille falou com um breve sorriso.

- Por nada. Mas vamos ao que interessa ?

- Claro. – ela sorriu e fez um gesto a Kirika, que nos entregou um pequeno encadernado com os planos.

Ela realmente era metódica como eu.

- Como podem ver, dedicaremos uma edição inteira do Noir para contar a história da White Fang. Será vantajoso para vocês, terão publicidade gratuita. Não que precisem depois de terem acabado com a Preventers.

Trowa deu um sorriso e relaxou na cadeira. Ele fora o responsável por aquilo, muito mais do que eu.

- E o que vocês ganhariam com toda esta publicidade gratuita ? – não controlei a pergunta que não queria calar dentro de mim desde que aquela história começou.

- Dinheiro, Heero. Uma edição dedicada exclusivamente a White Fang atrairia um público bastante peculiar. Primeiramente, os acadêmicos. Sonhadores, comprariam a revista por fanatismo e para terem algo em que se espelhar para alcançarem seus objetivos. Segundo, os concorrentes. Saber mais sobre o inimigo é sempre a base de tudo. E terceiro, os populares, admirados com tudo aquilo. Histórias de grandes sucessos, principalmente estreladas por pessoas que vieram do nada, atraem as pessoas.

Ela era realmente boa.

- E o que pretende exatamente colocar nesta edição ? – Trowa tomou um gole de seu Martini.

- Quero contar a história de vocês do zero. Farei entrevistas com vocês e com os mais próximos, pesquisarei tudo o que puder encontrar e farei uma coletânea. Seria bom se vocês me ajudassem com material.

- Tenho algumas revistas e jornais guardados em casa. Quando precisar deles, avise.

- Perfeito. – Mireille deu um sorriso.

O plano dela era bom e interessava a nós. As informações reveladas em nada influenciariam as empresas concorrentes. A competência era o que valia neste caso e eu e Trowa a tínhamos de sobra. Com Chang conosco, praticamente não existiam possibilidades de sermos ultrapassados.

Tomei um gole de meu campari e só então percebi o olhar vago de Kirika. Estava alheia completamente ao rumo que a conversa seguia, perdida num mundo próprio. Esquadrinhava o restaurante com o olhar, mais interessada nisso que na edição do Noir que discutíamos.

- O conteúdo desta edição é estritamente sobre trabalho, correto ?

A pergunta de Trowa não era em vão. Com a sociedade atual, um deslize poderia arruinar Quatre e Duo, além de nós dois.

- Noir é uma revista séria, não de fofocas. Pouco me importa a vida pessoal de vocês dois e jamais ganharia dinheiro em cima disso.

- Confio em vocês. São as melhores no que fazem, por mim, eu aceito. E você, Heero ?

- Por que tanto tempo de antecedência ?

- Fechar uma edição de revista é sempre um problema. Matérias que ficaram faltando, buracos que precisam ser preenchidos. Nós estamos apostando alto nesta edição especial, não pode haver falhas. É precaução.

- Vamos ser informados do andamento da edição ?

- Regularmente. Ela irá depender de vocês tanto quanto de mim ou de Kirika.

- É um projeto audacioso. Posso realmente confiar na capacidade de vocês ?

- Mireille já provou que sim. – Kirika respondeu com um ar aborrecido, ainda esquadrinhando o restaurante.

Então ela estava prestando atenção, apesar de tudo ?

Hn. Gostei.

- Tudo bem, aceito.

Mireille deu um meio sorriso e Kirika finalmente relaxou. Isso ia ser interessante.

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Cheguei no apartamento de Duo ainda com a cabeça cheia de idéias. Aquela edição do Noir prometia ser sensacional, se as duas conseguissem realmente pôr em prática o que planejavam. Ia ser fantástico.

Toquei a campainha e Duo abriu a porta.

Cabelos bagunçados, olheiras, parecia que tinha sido atropelado por um caminhão. Eu me sentia mal com todo aquele esforço e só agora entendia os receios de Quatre sobre ele se esforçar tanto em um mês. Duo estava definhando na frente de uma pilha de livros e eu não parecia ser capaz de fazer algo.

Quando não estava estudando, ia para o hospital dar os plantões como clínico. E sempre voltava com a cara ainda mais cansada do que estava antes. Ele deu um curto sorriso e se virou, voltando para a maldita mesa e para os malditos livros.

- Você precisa de uma cópia da chave, Hee.

- Não seria uma má idéia. – fechei a porta e me aproximei – Você não acha que deveria descansar ?

- Daqui a pouco. Estou encerrando um assunto aqui, assim que acabar, vou dormir.

- Lembre-se de que tem plantão amanhã, logo cedo.

- Não vou me esquecer. – a atenção dele se voltou para o livro.

- Duo... Vai, descansa um pouco, só hoje.

- Hee... Vai assistir ao jogo daquele campeonato, começa daqui a pouco. Antes de terminar eu apareço por lá.

- Se não aparecer, volto e te arrasto pra cama.

- Tá.

Era sempre assim. Minhas tentativas pareciam não surtir efeito diante daqueles livros. Eu precisava era falar com Quatre sobre aquilo tudo, para que ele me aconselhasse. Ele deveria ter algo útil para me dizer.

Passei na cozinha e peguei um pacote de biscoitos que Duo havia comprado, levando para o quarto. Liguei a televisão e vi que o jogo já ia começar. Tirei a roupa, ficando apenas de cueca, e me deitei na cama. Futebol era uma boa distração para mim e simplesmente adorava os campeonatos internacionais. Era quase uma prévia da Copa do Mundo.

Estava muito empolgado para contar sobre o almoço com Mireille, mas ele não parecia se lembrar. Aqueles livros ocupavam todo o tempo dele e, confesso, estava enciumado. A medicina era uma concorrente desleal comigo.

Não sei ao certo quando adormeci, mas abri meus olhos e vi que eram duas da manhã. A televisão permanecia ligada e Duo não estava do meu lado. Merda... Eu não deveria ter caído no sono. Aquele baka ainda deveria estar estudando.

Levantei-me e fui até a sala. Sorri com a cena. Duo estava adormecido, com a cabeça por cima dos livros. O cansaço o estava vencendo, afinal. Talvez agora ele estivesse mais disposto a me ouvir sobre descansar e se distrair, além de ficar com a cara enfiada naquele monte de linhas.

Delicadamente, coloquei-o nos braços e o depositei na cama, deitando-me ao seu lado e velando seu sono, até que adormeci.

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Quatre me recebeu no dia seguinte com uma ruga de preocupação.

Fingi não perceber e me sentei na cadeira, olhando para ele.

- Heero... Pensei que não iria tomar posição sobre este assunto.

- Não vou deixar meu namorado se acabar na frente de uma pilha de livros.

- Eu disse que era melhor ele não fazer estas provas de agora.

- Receio ter de concordar tardiamente. Mas ele agora vai fazer, é fato.

Quatre suspirou.

- A aparência dele não é das melhores e me sinto culpado. Só deveria ter feito o convite depois que estas provas passassem.

- Não se culpe, Quat. Vamos ajudá-lo de alguma forma.

- Heero... Pra ele, tudo isso é normal. Como você acha que ele conseguiu entrar na universidade ? Como você acha que ele conseguiu concluir o curso ? Sem desmerecer as outras profissões, mas medicina é um curso muito puxado !

- Você sempre disse que Duo era inteligente.

- E é ! É brilhante ! Em medicina, fica claro dois tipos de pessoas : os naturalmente inteligentes e os esforçados. Os esforçados são aqueles que não têm muita facilidade em aprender, mas que se acabam nos livros para compensar. Duo faz parte do segundo grupo. Ele tem uma capacidade de aprendizagem incrível e nunca precisou se exceder tanto em estudos. Mas agora é diferente ! Ele precisa revisar tudo para uma prova dificílima ! Residências são provas onde você tem centenas de pessoas concorrendo a uma única vaga !

As bochechas de Quatre estavam afogueadas, ele realmente tinha se exaltado. E a culpa bailava em seus olhos azuis.

Suspirei.

- Quatre, acalme-se. Eu ainda acho que ele pode passar. Ele tem sorte, que é aliada dele. E tem também a nós. Eu só quero que me ajude a fazê-lo descansar algum tempo por dia.

- Não sei se vai conseguir. Faça-o se alimentar corretamente. Ele pode não ceder por bem, mas você vai ter de ser insistente. Tente não brigar. Eu não sei mais o que dizer.

- Vou fazer o meu melhor. E não demonstre a ele esta preocupação, ou ele pode se irritar.

- Tentarei.

Saí daquela sala decidido. Duo iria passar na maldita prova, mas sem se destruir no processo.

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Foi muito difícil, mas eu consegui.

Convenci Duo a voltar com o kung-fu, mesmo com o braço engessado. Eu mesmo o levava até Chang, todas as noites, e ele passava uma hora se exercitando. No começo foi difícil, ele me xingava de todas as formas. Mas depois percebeu o quanto aquilo estava fazendo bem a ele.

Com o tempo, também convenci-o a almoçar fora de vez em quando e a dormir mais cedo quando estava extremamente cansado. Ele melhorava bastante e Quatre agradecia aos céus todos os dias, segundo Trowa me informava. Cheguei até a levá-lo ao cinema uma vez.

Eu havia vencido a batalha, afinal de contas.

E a coisa mais incrível aconteceu : Duo conseguiu passar. Quatre quase foi às lágrimas quando soube do resultado e Duo finalmente relaxou em meus braços. Ele era realmente um anjo e, por mais que não acreditasse, alguém do outro lado o protegia.

Porque Duo era um milagre vivo.

A felicidade durou entre nós por um tempo incontável. Para mim, assim como para ele, durou uma eternidade feliz, onde tudo era possível. Onde tudo ia bem e estava sendo construído um futuro maravilhoso.

Até o dia em que o vi cair pela primeira vez.

Continua...

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N/A : Desculpem, desculpem, desculpem. Eu realmente sinto muito. Mas aconteceu...
Gostaria de esclarecer que o Duo conseguir passar na prova de residência foi licença poética. Porque, sinceramente, não creio que conseguiria. Assim como foi licença poética o Duo não ter morrido no primeiro capítulo desta fic. Qualquer um não conseguiria chegar ao hospital e sobreviver sem, no mínimo, uma seqüela grave.
Beijocas especiais a Perséfone, Litha, Blanxe, Tina-chan, Pipe, MaiMai, Shii-chan, Kitsune Lina, Anne e Ilia. As respostas das reviews "anônimas", assim como alguns comentários, estão no meu blog, o chibiusa-chan ponto blogspot ponto com. E, caso alguém ainda esteja aí, lembrem-se : reviews são sempre bem vindas !

Notas :

(1) Les Soldats é outra referência ao anime Noir.

(2) O livro em questão é verdadeiro. O trecho a respeito da proteína G encontra-se no capítulo 74, página 788 e o trecho introdutório encontra-se no capítulo 01, página 02 (edição brasileira).

(3) Kirika Yumura é outra personagem do anime Noir e, portanto, não me pertence. Aqui também se encontra fora de sua rotina original.