Ela bateu na porta, sem resposta.
-Você é injusto, Loki-kun.
Sem resposta.
Ela suspirou, se apoiando na porta. E sussurrou.
-Você nunca diz quem é.
Mayura murmura, sem muito pensar nessas palavras que lhe preenchiam a mente e os sonhos. Como se fosse um mantra gravado em sua língua.
Ela ouve ele se levantar e se encostar à porta, hesitante. Ela fecha os olhos, com força. De repente, um estalo. A porta se abre e ela entra. Mas ele não está lá.
akaku nijimu taiyou wa subete o terashite kita ima
mo mukashi mo kono yuuyami ni egaiteru
souzou wa hatashite kono te ni oenai mono na no ka?
o sol vermelho e petrificado iluminou tudo;
o agora e o passado é isso o que eu imaginei nesse crepúsculo
muito mais que minhas próprias mãos podem alcançar?
Ela olha em volta, o quarto avermelhado pela luz do fim de tarde que vinha da janela. Quando dá por si, sente a respiração forte atrás dela.
-Eu sei que você não quer lembrar de mim, Mayura. Que toda noite eu venho, e quando é manhã você me esquece...
Ela se vira para trás, o rosto maduro e os olhos verdes a encarando, a deixando sem qualquer reação.
Aperta os olhos, não tentando evitar as lágrimas, deixando que uma de suas mãos se levante até seu rosto, sem permissão, o tocando levemente.
Era real.
-Mas eu... eu não esqueci... Loki-kun.
motto ima ijou ni hadaka ni natte
ikite yuku jutsu oshiete yo
honno sukoshi dake watashi o yogoshite
sou yatte hitori kizutsuitari mawari o nakushita to shite mo
shinjitsu no uta wa kono mune ni nagare
por favor, me ensine a viver de uma forma mais nua que eu vivo agora
você não vai me macular nem ao menos um pouco?
desse jeito, se eu me machucar e perder tudo à minha volta
essa canção da verdade fluirá através do meu coração
Loki fechou os olhos, deixando os dedos de Mayura correr pelo seu rosto. Respirava o mais pausadamente possível, tentando controlar todas as sensações que lhe proviam daquele simples toque. O simples toque dos finos dedos da ningen fazia tremer toda a razão do deus caótico e trapaceiro.
Mayura sentia o rosto dele cada vez mais próximo, a respiração se alterando, se acelerando a cada segundo, a boca se entreabrindo próxima à dela, deixando seus lábios tocar um sopro quente que vinha da boca dele.
Ia acontecer de novo, como nos seus sonhos.
De repente, era como se enxergasse em sua mente cada um deles.
Seu corpo se lembrava de cada sensação. Apoiou as mãos em seu peito, os lábios dele tocando os dela num tímido roçar.
Ela abriu os olhos, trêmulos, e logo encontrou com os dele.
Havia milhares de perguntas, sobre ele, sobre seus sonhos, sobre aquele corpo que ela agora mesmo tocava... mas a mais gritante, a pergunta que mais lhe ardia o peito era saber se, sonho ou não, ele iria se lembrar?
-Loki...kun...
Ele sorriu, abaixando a cabeça sobre o ombro dela. Ele empurrou seu corpo contra a porta, suas mãos na parede, seu rosto colado ao pescoço dela, e assim ficou, parado, por instantes em silêncio.
Tudo que podiam ouvir um do outro era um pesado respirar.
-Se eu te desse todas as explicações que quer, Mayura, ainda assim você me deixaria ficar? Você me deixaria entrar?
Ele continuava na mesma posição, quando sentiu Mayura apertar-lhe a nuca, se agarrando com força aos seus cabelos.
-Se você me contar, você vai embora, não vai Loki-kun?
Ele riu, sentindo lágrimas da menina caírem sobre seus cabelos.
-Eu tentei. Mas você me pediu pra ficar.
Ele levantou para encará-la, enxugando as lágrimas de seu rosto.
Ela soluçava, sua boca abrindo e fechando entre perguntas que não conseguia sequer formular. Aperta a camisa dele com força, como se não pudesse deixá-lo escapar.
Não dessa vez.
-Mayura... uma vez eu invadi seu sono. E me encontrei lá. Mas hoje, é você quem me invade. Mas se eu deixar você entrar, como sabe que não vai querer me esquecer, quando amanhecer de novo?
-Você vai?
Ela mordia o lábio inferior, assustada, mas mantinha o olhar firme diante dele.
-Você vai se lembrar, Loki?
arasoi wa mada tsuzukun darou dono
michi ima ga taisetsu na no sa gamushara ni natte miotoshite
kita mono tatoeba dare ka no yasashii hohoemi mo
essa disputa provavelmente vai continuar sobre o que é mais valioso
eu me tornei uma rebelde, eu superestimei coisas
até mesmo o sorriso gentil de estranhos
Ele beijou sua boca suavemente, numa resposta muda e gentil à sua pergunta.
-Eu me lembro de você, no parque. Eu me lembro do deus que me oferecia ajuda. E eu me lembro de ter pedido para você ficar.
O olhar inquisidor de Mayura o fez parar, se indagando o que mais viria. Ele se sentia um fraco, derrotado por aquela voz encharcada e magoada, que quase gritava, com o rosto virado para o chão evitando seu olhar.
-E você nunca me disse.
Loki se sentou na cama, cabisbaixo.
-Você é injusto, porque nunca me diz quem é. - ele repetiu, sem levantar o olhar.
Mas uma voz mais calma e suave o fez se arrepiar, vindo de trás dele. Mayura se sentara na cama, olhando para a parede do outro lado, sem coragem de se fazer encarar.
-Não.
Ele se virou para a dona da voz, sentada e de olhos baixos em sua cama.
-Você é injusto porque não lembra quem a Mayura é.
Ela levanta os olhos, lacrimejados e abertos num sorriso tímido.
-Se você lembrasse, Loki-kun, saberia que eu ia te amar de qualquer jeito.
O deus trapaceiro não tinha palavras.
eien o shireba donna kurayami mo itami mo itsuka kiete
sou yatte ima wa watashi o yogoshite
zutto mukashi mita tenkuu no shiro ni itsuka wa tadoritsukeru
shinjitsu no uta o michishirube ni shite
se a eternidade sabe como se comporta a escuridão e quando a dor se for
então dessa forma, você irá me macular
eu olhei sempre para o ontem, para os castelos no céu quando eu serei capaz de seguí-los?
essa canção da verdade será meu guia
Ela gira, se sentando de frente a ele. Os olhos rosados entreabertos, silenciosos e misteriosos, como em raros momentos. Ela inclinou a cabeça, levemente, o olhar parado sobre ele, numa contemplação muda.
Loki não conseguia desviar o olhar da ningen que lhe devorava a alma. Sem mais perguntas nem respostas. Sem explicações. Nada. Sem o deus da discórdia ou o menino de um velho casarão. Apenas ele. Ela. E aquele olhar mudo dentro dele.
Ele tremia diante dela, infante e indefeso, e sabia que ela o via, o enxergava, como nunca antes. Como nada, nem ninguém, jamais pôde enxergá-lo antes.
Estava estático e nada poderia consertá-lo por dentro.
Ela abriu os braços, a boca se entreabrindo vagarosamente.
Sem hesitação.
Mayura sorri, como apenas deusas e amantes sabem sorrir.
-Vem... Loki-kun.
eien o shireba donna kurayami mo itami mo itsuka kiete
shinjitsu no uta wa kono mune ni nagare
se a eternidade conhece como se comporta a escuridão e quando a dor se for
essa canção da verdade fluirá através do meu coração
Suas mãos se levaram até as delas, numa obediência relutante mas sincera. Hesitava em tocá-la, assim, de olhos tão abertos, enquanto tudo dentro de si ansiava, gritava por tomá-la, tê-la, fazer dela seu reinado.
Loki se aproximou de seu corpo, as mãos ainda presas às dela, os olhos se fechando lentos ao tocar das bocas, rosto, pescoço. Mãos já não se contiveram, se agarrando com força nas suas costas enquanto as dele lhe tomavam a cintura. Com um impulso, a puxou para baixo de si, se deitando com apenas parte do corpo sobre ela. Buscou mais uma vez beijá-la, agora com mais força, mais intimidade, invadindo sua boca, seus sentidos com toda sua vontade. Mas não houve recusa, e ele fora recebido como um rei.
O beijo deixou sua boca, tomando um caminho através de seu pescoço até seu colo, sendo abruptamente interrompido pelo seu encontro com o tecido do uniforme escolar. Sentia suas pernas entrelaçadas às delas, tão provocantemente expostas na saia curta, sua barriga já descoberta por sua outra mão, que lhe acaricia a cintura. Suspirou, o baixo ventre latente, seus dedos pulsando por correr além deles, quando notou novamente aquele par de olhos rosados à sua frente. Tinham medo, sim. Um medo inocente diante do sim que diziam.
Loki fez menção de se levantar, antes que fosse longe demais. Mas ela o segurou, trazendo uma de suas mãos para a pele descoberta da cintura, o conduzindo a subir mais... ela fechou os olhos, ainda conduzindo com os dedos as mãos do deus trapaceiro. Ele continuou, com dedos e lábios, fazendo aquele trilhar pela sua pele. Ouviu a ningen gemer baixinho, se contendo entre os dentes. Olhou para ela mais uma vez. E aquele olhar mudo continuava sobre ele, enquanto os dedos da menina corriam para debaixo de sua roupa.
motto ima ijou ni watashi o yogoshite
agora, por favor, me macule ao menos um pouco
As roupas se atiravam ao chão quase que sozinhas, numa ânsia incontida de serem largadas, esquecidas. Havia muito mais nudez que apenas aquele desprover de pano sobre corpos. Era a indefesa entrega que se davam sem nenhuma explicação.
Loki se deitou sobre ela, suas mãos correndo entre suas coxas, a boca entre os seios que lhe abrigavam com carinho, enquanto as mãos dela se seguravam e corriam com força em suas costas. Era delicioso ouvi-la gemer, e saber que era sua vontade, seu próprio desejo que a fazia exclamar assim. Sentiu o cheiro de seu sexo subir e envolvê-lo, tornando ainda mais forte a pulsante ansiedade de seu membro. Já sentia seus dedos se melhorando dentro dela, a respiração abafada entre seus gemidos, seu corpo se contorcendo debaixo do dele como se o chamasse com urgência.
E foi com essa mesma urgência que ela lhe tomou o sexo entre as mãos, se fazendo dona dele. O massageava entre os dedos numa velocidade controlada, ora lenta, ora acelerada, como se não soubesse qual melhor agradava o seu dono. Mas logo percebeu que as pausas arrancavam longos suspiros, e a volta brusca e acelerada lhe arrancava gemidos altos e brutos. Riu, o fitando da forma mais inocente. Uma menina. Que destruía com suas mãos o controle de um rei. Abafou mais um gemido, a apertando com força com as mãos.
-Mayura.
-É bom de ouvir.
Ele levou a cabeça pra trás, rezando dentro de si que seus séculos a mais lhe trouxessem um controle maior que aquele que demonstrava. Respirou fundo, notando que ela havia parado. Ela tinha o corpo largado na cama, as pernas abertas o abrigando entre elas, uma das mãos perto do rosto, indicando que ela tentava decifrar o cheiro que impregnava seus dedos.
Ele a fitou por alguns instantes, ali, deitada e nua, entregue.
Ela fechou os olhos, estreitando as pernas sobre as dele, os lábios se mordendo num gemido quase rouco. Ela abre os olhos para ele, hesitante.
Ele sorriu, se lançando sobre ela, a penetrando com leveza e força, como um rei invadindo seu reinado.
hon no sukoshi dake watashi o yogoshite
por favor, só me macule, só um pouco
Os corpos se moviam num único compasso lento, entre gemidos de dor e prazer da ningen. Ele a olhava, esperando qualquer anúncio para seu bem estar. Logo sentiu o corpo dela relaxar ainda mais, e um sorriso lhe encher os lábios. Beijou-a mais uma vez, penetrando mais forte e fundo. Sentiu seu gemido ainda em seus lábios, e o som abafado de sua voz lhe chamando tocava seu rosto como uma carícia.
Ela se agarrava a ele, sua boca ainda molhada do beijo pousando sobre seu ombro, lhe apertando com os dentes. Ouvia seus gemidos junto aos dele, como se compactuassem com o mesmo ritmo de seus corpos, cada vez mais fortes, mais rápidos, mais urgentes... Sentiu uma reviravolta de sensações lhe percorrendo o corpo, como numa descarga elétrica. Olhou para Loki, que a fitava da forma mais intensa e mais bela que podia imaginar. Era como se a eletricidade de seus corpos se confundisse, e ela podia sentir dentro dela o corpo dele também pulsar, tremer.
Mayura sussurrou seu nome mais uma vez, o apertando ainda mais contra ela. Uma última estocada, até que Loki sentisse seu membro ser expulso pelo gozo da companheira, que o apertava dentro de si. Afastou-se, sentindo-se derramar dentro e fora dela.
Suspirou, se deitando ao lado dela. Abriu os braços, permitindo que ela se aninhasse em seu peito, o corpo ainda latejando seu desejo exaurido.
A ningen se virou para ele, com as pernas encolhidas e os braços parados sobre seu peito. Ficaram assim, abraçados de frente um para o outro, os olhos se observando enquanto o corpo relaxava.
Mayura entreabriu a boca, ensaiando alguma coisa. Mas Loki a interrompeu, com um beijo suave e um dos dedos logo depois pousado em seus lábios.
-Ai shiteru, Mayura.
Ela ia responder, mas seu dedo continuava a pedir que se calasse.
-E não quero que se esqueça mais disso.
Ela apenas sorriu, se aproximando ainda mais, como se fosse possível, dele.
-Hai. - ela apenas disse, num murmúrio.
-Eu deixei o reino dos deuses por você uma vez, Mayura. E eu faria tudo de novo, todos os dias, se fosse apenas pra ficar do seu lado.
A menina continuou em seus braços, paralisada, por segundos que pareceram uma eternidade para o deus Loki.
Quando ela levantou seus olhos para ele, inquietos e aflitos, um leve tremor correu sua espinha. Se ela não acreditasse? Ele estava lá mas, seria o bastante? Como podia provar que um deus que fora expulso de seu mundo, havia largado tudo apenas por amor a ela?
-Eu sei que não acredita em...
Mas dessa vez, foram os lábios da ningen que calaram o deus trapaceiro.
shinjitsu no uta o michishirube ni shite
essa canção da verdade será meu guia
-Eu não acredito em deuses mas... Loki-kun... eu acredito em você.
Mayura sorriu apenas, e Loki devolveu o sorriso, sem outra reação. Ela fechou os olhos, deitando sua cabeça sobre o braço dele. Ela abaixou a cabeça, como se escondesse seu rosto em seu peito.
-Quando eu acordar, você vai me contar, Loki-kun?
Loki pousou o queixo sobre a cabeça dela, sem fazer peso, a abraçando mais forte. Suspirou, também fechando os olhos.
-Eu vou sim, Mayura. Eu prometo.
O som do corpo dela se apertando contra o dele.
O barulhinho tão pequeno de seus dedos contra a pele dele.
Quase podia ouvir o sorriso da menina, e logo que abriu os olhos para fitá-la uma vez mais, encontrou seu rosto infantil e sereno já adormecido. Pensou em ficar ali, a noite toda a observá-la. Mas tudo era quente e seguro perto dela e, antes que pensasse uma segunda vez, também estava adormecido.
A luz da lua começava a entrar no quarto, indiscreta de tão cheia.
E tudo que se ouvia era o suave respirar dos dois amantes.
Owari
