RECOMEÇANDO
O dia de sorte de Shaka
Ao telefone...
- E como você está? – Perguntava Milo com um dos braços no espaldar da poltrona.
- Bem. É incrível como o Hyoga coleciona enlatados, congelados e instantâneos. Nem precisei me preocupar com o almoço. – Respondeu Shina sentada no sofá e vendo televisão. – E você e meu primo? Tudo bem?
Milo sentiu o coração pular até a garganta:
- Ah... Lógico que sim. Hum... Escuta, a noite eu e... Quem sabe ele também... Nós passaremos por aí para ver você.
- Seria bom. Está um tédio ficar aqui parada. Tudo por causa daquele pato.
- Deixa só ele saber que você voltou com esse apelido.
- Só se você contar.
Milo riu.
- Certo, Shina. Eu vou desligar porque a conta do celular já deu o que tinha que dar e eu não quero deixar o pato... Quer dizer, o Hyoga no preju.
- Ta. Já tenho o telefone daí então está tudo bem.
- Tchau.
- Tchau.
Milo desligou o celular e jogou no sofá. Camus com certeza reprovaria a atitude.
Lembrar-se de Camus era lembrar-se... Do beijo. O grego jogou a cabeça para trás. Nunca fizera algo tão ousado e tão imbecil na sua vida, mas sentiu que se morresse agora, morreria bem feliz.
Balançou a cabeça para desviar os pensamentos insanos e levantou-se.
- Camus?
Milo olhou para todos os lados, andou até o corredor e em seguida bateu na porta do quarto do amigo:
- Camus, ta aí?
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Camus estava deitado na cama com os braços atrás da cabeça e com um milhão de pensamentos em mente.
O gosto do beijo ainda estava na boca do francês. E pior era lembrar como havia reagido aquele ato. Em nenhum momento deixou dúvidas se gostara ou não do atrevimento. Em nenhum momento teve dúvidas se não havia provocado aquilo.
- Milo... Você é tão importante assim pra mim?
Como resposta o silêncio do quarto.
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Milo encostou-se na porta e baixou a cabeça. Definitivamente havia estragado tudo. Todos os esforços para evitar que descobrissem sua atração por Camus fora por água abaixo.
De repente ouviu o "tlec" da maçaneta girando e desencostou-se rapidamente da porta quandoo amigoa abriu. Pensou se não deveria seriamente ter ficado em seu canto.
- Hum... Camus?
- Gosta de comida francesa?
O grego balançou a cabeça confuso antes de responder:
- Desde que não tenha pimenta...
- Eu conheço um lugar por aqui muito bom. Não fiz comida e não estamos no hotel. Topa?
- Também estou com fome.- Sorriu.
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Falando em almoço, Ikki apresentava certos problemas com Pandora. Algo lhe dizia (E depois teve certeza) que a moça ficara indignada com algum feito de Ikki e fora almoçar só para não furar.
O Amamiya ainda resolveu perguntar o que estava acontecendo.
- Quem é Esmeralda? – Pandora perguntou com azedume.
- Ah... Isso? Uma recém conhecida. – Respondeu Ikki quase naturalmente – Posso saber por que a pergunta?
- Ouvi você falando sobre ela na copa.
- Não sabia que você ouvia as coisas escondida.
Pandora respirou fundo e inclinou-se para frente.
- Ikki... Ela só é uma conhecida?
Ikki pigarreou nervoso:
- Sim. Posso saber por que?
- Não sente nada por ela? Nem atração física?
O pigarro agora foi um pouco mais alto:
- Claro que não. Eu a conheci faz poucos dias.
- E... Posso saber como a conheceu?
Ikki ganhou um inédito corado violento em seu rosto de forma que teve certeza que aquela gravata estava apertada demais. Distraiu-se, entretanto, ao ouvir o celular de Shun, que estava na mesa ao lado almoçando com Hyoga e Thetys, tocar.
- De quem é esse número? – Shun olhou para o visor antes de atender. – Alô?
- Shun Amamiya? – A voz parecia nervosa.
- Ele mesmo. Posso ajudá-la?
- Eu não sei. Minha amiga pediu pra eu ligar pra você... Sorte que encontrei seu cartão no bolso dela...
Shun sentiu o sangue ferver ao prever que a notícia não seria boa.
- Sua amiga... Quem é ela? – Perguntou nervoso.
- June. Você a conhece...
- Onde vocês estão?
- No momento prédio Santuário, apartamento 458. Sabe onde fica?
- Perfeitamente. –respondeu unindo os pontos.- Estou a caminho.
Desligou o telefone e levantou-se rapidamente.
- Algum problema, Shun? – Perguntou Hyoga.
- Sim. Mas não tenho tempo para explicar. Tchau.
Shun deu meia volta e foi barrado por Ikki:
- Irmão, o que aconteceu?
- Não dá pra explicar. Eu tenho que ir.
E antes que fosse embora, Ikki o segurou:
- Nesse estado você não dirige. Eu te levo.
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Enquanto isso, na mansão Kido, o doutor Opulska, homem bonito, de traços leves, arrumado, cabelos longos, azuis e olhos profundos atendia uma paciente que, até então, não aparentava preocupação com seu estado de saúde .
- Saori... Tem certeza que você apresentou os sintomas agora?
- Saga, se eu tivesse apresentado antes já teria procurado por você. – Arqueou as sobrancelhas. - Por que? Não estou bem?
Saga respirou fundo, pensando no melhor modo de dar a notícia.
- Saga... O que aconteceu?
- Bem, Saori... Eu vou solicitar um exame para confirmar, mas... Acho que você já sabe o que é.
Saori abriu a boca assustada, sem emitir nenhum som.
- Eu acredito que você esteja grávida.
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Do lado de fora da casa, Shaka pensava na melhor maneira de iniciar novamente uma conversa de três horas com Saori Kido. Sim, porque a reação da moça foi pior que a de Ikki. Um ceticismo inigualável.
"Há deuses entre nós"
Nem os irmãos Amamiya, nem Milo e Camus, nem mesmo Aldebaran acreditaram nessa história no começo. Se é que acreditam agora. Mas com Saori era diferente. Ela era uma das deusas que estavam entre os mortais. Convencê-la disso é que seria um problema. E, claro, principalmente agora que ela pensava que se tratava de alguém com sérios problemas mentais.
Shaka estava encostado na parede, de fora da casa, segurando o pêndulo aleatoriamente. Sentia-se um homem de sorte por ter encontrado duas pessoas, ou melhor, quatro se contar com Milo e Camus, com aquela energia em um só dia.
Quando o doutor Opulska saiu novamente o pêndulo girou.
- Por Buda... Eu estou iluminado!
- Perdão? – Saga virou-se surpreso - O que disse?
- Ah... Acredite, eu estava mesmo querendo falar com um médico.
- Vai ter que marcar uma consulta, senhor. Eu estou com a agenda cheia.
- Tudo bem. Me dê seu cartão e eu marco uma.
Saga tirou da pasta um cartão e entregou desconfiado para Shaka.
- Obrigado. Marcarei um horário.
- Certo então. Até breve.
- Até.
E quando Saga foi embora, Shaka só tinha uma coisa em mente: "É meu dia de sorte e não vou desperdiçá-lo."
Entrou novamente na casa e antes que Minu o recebesse, o indiano levantou a mão educadamente, pedindo para não se incomodar.
- Só diga a senhorita Kido que...
E parou de falar quando teve a nítida impressão de que ouvia um choro feminino. Minu também olhou preocupada para cima e depois para Shaka. O louro não disse nada, apenas subiu as escadas, seguindo o barulho.
Saori chorava com o rosto escondido no travesseiro e os cabelos derramados pela cama, e emitia tal sofrimento que Shaka sentiu como se sua garganta tivesse fechado. Sentou-se perto dela e tocou levemente seu pulso.
- Senhorita...
- A... Senhor Yehuda!
Saori sentou-se e o abraçou repentinamente.
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Longe dali, June acordava sonolenta e com o corpo dolorido. Estava deitada num sofá e à sua frente se encontrava Sashira e Aldebaran.
- Ai...
- Ela acordou! – Sashira mirou Aldebaran e depois June.
- Onde... Estou?
- No apartamento do senhor Varela. Ele ajudou a lhe salvar.
- Salvar? – June sentava-se sendo ajudada por Aldebaran – Salvar de qu... Ai... Parece até que levei uma surra...
- É normal. – Respondeu Aldebaran – A senhorita caiu no chão quando eu ataquei Alberich.
As palavras de Aldebaran passaram despercebidas pela cabeça latejante de June. Na verdade estava doendo tanto que o som da campainha parecia um gongo.
- Eu atendo. – Falou Aldebaran – Deve ser o Mu.
Errado.
- Quem são vocês? – Perguntou o brasileiro mirando o rapaz de rosto belo e cabelos verdes e o outro mais alto de aparência altiva.
- Com licença, ligaram para o meu celular avisando que June estava aqui...
"Essa voz!" June identificou rapidamente.
- Shun!
- Conhece ele? – Aldebaran inquiriu.
June corou enquanto Aldebaran deixava Ikki e Shun entrarem. O mais novo agachou-se na frente de June tocando em suas mão.
- Oh, meu Deus! O que está fazendo aqui? – As maçãs do rosto de June ficavam cada vez mais coradas.
- Sua amiga me ligou.
- Ela fez o quê!
- Foi você que pediu. – Protestou Sashira.
- Pe... Pedi! Oh... Oh, sim! Aquele... Aquele desgraçado!
- Acho que se lembrou de Alberich. – Aldebaran interveio.
Shun virou a cabeça para fitar o brasileiro.
- Alberich atacou ela? Aquele colega do Mu e do Shaka?
- Vejo que está por dentro.
- Então ela também tem essa tal energia. – Ikki suspirou. – Muita sorte ou muito azar?
- A senhorita Tachikawa agiu a tempo.
Sashira cruzou os braços e girou os olhos, constrangida ao lembrar do grito que deu.
- Suas mãos estão geladas... – Shun cruzava seus dedos nos dedos dela.
- Ah, não se preocupe. Logo vai passar. – June sorriu. – E... Nossa, é muito bom ver você aqui. Acho que pedi para chamá-lo porque eu disse que lhe manteria informado.
- Esqueça isso. Já lhe descobriram e vão atrás de você se não pegarmos o culpado.
- Humpf. Foi um desgraçado do cabelo rosa-chiclete, inegavelmente ridículo.
- É. Está mesmo falando do Alberich. – Aldebaran riu. – Ele entrava em bastante evidência no Brasil. Imagine os comentários...
Ikki levantou uma das sobrancelhas pensativo. Precisava ver Esmeralda de algum jeito e aquele pensamento não parecia tão ruim.
- É melhor eu ir pra casa. – Falou June sorrindo para Shun. – Ainda não sei se devo contar à Shunrey o que aconteceu.
- Eu levo você então. A menos que... – E se virou para o mais velho – Ikki, vai usar o carro?
- Hum? – Ikki olhou como se estivesse acabado de ver Shun ali. – Ah, não... Pode usar. Eu não me importo em voltar de metrô.
- ...
- Qualé, o carro é seu. Até mais.
Ikki acenou para os presentes e deu meia volta, saindo logo em seguida.
- Seu irmão? – Inquiriu June.
- Ele mesmo.
- Tem alguma coisa que diz isso, mas eu não consigo dizer o que é?
Shun balançou a cabeça, em seguida voltou-se para Sashira.
- Você... Obrigado por me ligar. Posso lhe dar uma carona para casa se quiser.
- Ah... Obrigada, mas...
Novamente a campainha tocou.
- Dessa vez eu espero que seja o Mu. – Aldebaran abriu a porta. – Shaka?
- Olá, Alde... Perdi alguma coisa?
- É uma longa história. – E se afastou deixando o louro entrar.
- O que houve aqui? Shun?
- Oi, Shaka. – Shun levantou-se para cumprimenta-lo. – Esta é June, uma das escolhidas.
- Mais uma! Por Buda, hoje estou mesmo iluminado!
- Ele é budista? – June sorriu.
- Oh, prazer, senhorita. Estou mesmo encantado em vê-la. Hum... Aldebaran, onde está Mu?
- Está vindo, eu espero. Depois lhe contarei tudo.
Mais uma vez a campainha tocou.
- Dessa vez eu espero mesmo que seja o Mu. – Aldebaran dirigiu-se já irritado até a porta. – Nossa, Mu, até que enfim!
- Fiquei desesperado quando não o vi lá, meu amigo... Achei que...
- Calma. Respire.
- Qual das duas? – Perguntou o tibetano olhando de June para Sashira. – E o que Shun Amamiya está fazendo aqui?
- Eu liguei para ele. – Respondeu Sashira. – E alguém pode me explicar o que está acontecendo?
Houve um silêncio e todos se entreolharam. Por fim Aldebaran falou:
- É mais do que justo eu explicar à moça.
- Até que enfim.
- Posso lhe dar uma carona para casa?
- Se for me explicar o que está acontecendo eu aceito.
- Ótimo. Vamos.
Antes que June pudesse falar algo para a colega, Sashira pegou logo sua bolsa e acompanhou Aldebaran, antes dando um tchau para a loura.
- Mu, você vai me explicar o que está acontecendo, não vai? – Shaka levantou uma das sobrancelhas e cruzou os braços.
- Ah... Sim. Embora Aldebaran possa explicar melhor. E além do mais você tem que me dizer aonde foi.
Shun e June se entreolharam:
- Ah... Vamos, Shun? – Inquiriu ela.
- Ah, claro. Vamos. Tchau Shaka. Mu.
- Até mais. – Responderam o tibetano e o indiano juntos.
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No corredor...
- Eu gostei deles. – June falava. – Daquele Shaka principalmente.
- Também me parecem legais. – Shun chamou o elevador. – Quando sua amiga ligou quase atravesso a porta do carro.
June ganhou um leve corado e afastou uma mecha loira para trás da orelha. De repente o elevador abriu e Camus e Milo saíram de lá com uma quentinha cada um.
- Hei, Amamiya! – Milo descansou a mão no ombro de Shun e mirou June em seguida. – Olá, senhorita?
- Oi, Milo. Camus? Esta é June.
- Prazer, senhorita. – Camus sempre educado.
Shun e June entraram no elevador.
- Sua namorada é muito bonita! Vê se cuida dela! – Milo praticamente gritou antes do elevador fechar, deixando Shun muito sem graça.
Camus sorriu para si.
- Você não muda, Milo...
- Que foi?
- Eles não são namorados. – Falava Camus enquanto destrancava a porta do apartamento.
- Ah, não? Bem, então vão ser logo-logo. Eu sempre era tido como cupido por causa dessas minhas mancadas na universidade.
- Achei que seu apelido era fura-olho.
O grego girou os olhos e olhou para Camus. O francês estava com os cabelos amarrados para trás e roupas esportivas. Muito belo e tentador. Agora havia uma vontade enorme de puxa-lo para um senhor beijo.
- Não vai abrir isso?
Nem reparou que Camus ainda não tinha aberto porque o mirava com o canto do olho. O perfume de seus cabelos e os braços bem torneados. Agora já sabia da rigidez dos músculos de Milo e do quanto seu corpo era quente.
Ao ouvir a censura de Milo voltou a olhar para a chave e ofegar com o rosto escarlate.
De repente ouviu-se um "Mu, eu não posso acreditar!" de Shaka do outro lado da porta, e o francês e o grego se entreolharam.
- Eu vou bater.
- Milo, espere...
Tarde demais.
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Shaka e Mu estavam no sofá conversando. Mu contando sobre a conversa que teve com Aldebaran e Shaka empolgando-se (Coisa muito rara de acontecer).
- Nossa... Alberich agiu mesmo... Por Buda... Hoje é meu dia de sorte, Mu. Buda realmente me deu este dia de presente. Encontrei uma deusa e três num só dia e... Ainda tem essa agora...
- Shaka... Calma...
- Calma! Mu, eu não posso acreditar!
- Ora, veja só... Parece até uma criança.
"Toc! Toc! Toc!"
- Aldebaran já chegou? – Mu indagou enquanto se levantava para abrir a porta.
Shaka abriu a boca ao ver o amigo grego e Camus entrarem.
- Milo?
- Cara, você ta bem? Eu ouvi uma voz alterada e parecia a sua... E você nunca foi de alterar a voz.
Mu começou a rir. Fechou a porta e voltou para o sofá.
- Foi bom vocês virem, fiquem a vontade. O que é isso?
- Isso? – Milo levantou a quentinha. – comida francesa. Hum... Estão com fome?
- Sentem-se. É bom que mantenham-se informado.
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A noite chegou à francesa, talvez devido ao ritmo da cidade. Ainda mais para Alexei Hyoga Yukida, um aquariano prático até demais.
- Passei no supermercado. – Avisou à prima no momento que entrou com uma sacola de papel cheia até a borda.
- O que trouxe? – Perguntou Shina, que estava sentada no sofá com o controle remoto numa mão e uma almofada em outra.
- O básico. Macarrão instantâneo, biscoito, pão, azeitona em conserva, mini chicken, batatinhas e cervejas. - Jogou uma latinha para Shina – Estão geladas.
- Com esse físico ninguém acredita. Como consegue viver sozinho?
- Faço aula de danças e... No final de semana como na casa da mamãe.
- Ta explicado. Pelo jeito não largou as aulas.
- Ikki me chama de dançarino pop por causa disso.
- Dançarino pop? – riu – Você é pop?
- Eu fotografo aqueles eventos cujas fotos valem uma nota. Uma parte eu uso pra coluna social da revista. Outra eu vendo para as revistas de fofocas. Como acha que eu sobrevivo?
- Eu sempre me perguntei isso.
Shina bebeu um gole da cerveja enquanto Hyoga sentava-se ao seu lado.
- As vezes... – Hyoga também tomou um gole da latinha. – Eu fotografo para o Shun, mas só quando não tem mais nada importante para cobrir.
Ao dizer isso o sorriso de Shina pareceu ficar um pouco menor.
- Ikki... Shun... Quem são eles?
- Ikki é um cara legal. Rabugento e insuportável, mas legal. Já o Shun é o meu melhor amigo. Gente finíssima.
- Ah... Melhor amigo? Tipo... Camus e Milo?
Hyoga levantou uma das sobrancelhas pensativo.
- Hum... É. Acho que posso dizer que sim. – Respondeu.
Shina deu uma curta risada, triste, e deixou a latinha de cerveja abandonada na mão.
- Muita coisa mudou desde que a gente se separou. – Falou a moça com o sorriso cada vez mais desmanchado.
- Você quer dizer quando você foi embora com Camus e Milo.
- Eu perdi meus pais, Hyoga. Não podia ficar sozinha.
Silêncio...
Hyoga tomou um gole da bebida.
- Você não ia ficar sozinha.
- ...
- Poderia ter tentado antes de ir embora com Camus. E, claro, levasse a Jisty junto.
- Você sabe que sempre vimos Camus como um protetor. Você e Isaac principalmente.
- ...
- Se tivessem perdidos seus pais... Teriam feito a mesma coisa. - Falou fria. – Iam tentar seguir o caminho dele. Como se fosse um mestre.
Novamente aquele silêncio...
Hyoga deixou a cabeça cair para trás, deixando os fios louros caírem pelo sofá cor de gelo.
- É. Você tem razão.
De repente o interfone tocou e o russo foi atender.
- Sim? Hum... Claro, pode mandar subir.
E desligou.
- Quem era?
- Nosso primo não morre cedo. Ele e Milo vieram visitar você.
- Milo disse que viria.
- Quando falou com ele?
- Eu liguei pro celular dele...
- VOCÊ O QUÊ?
- Não se preocupe. Eu posso repor.
- É bom mesmo. Caramba... Eu estava economizando no telefone.
- Por que? Conta alta?
Hyoga olhou de canto para Shina.
- Deixa pra lá.
- Não vai falar?
- Não.
- Por que?
- Porque não.
- ...
- Cometi uma idiotice. De tanto procurar um certo telefone minha conta foi lá em cima mês passado.
- ...?
A campainha tocou.
- Chegaram. – falou o louro antes de abrir. – Hum... Oi, pessoal?
- Fale, Hyoga.
- É bom vê-lo novamente, Alexei.
- Oi, primo? Oi, Milo? – Shina os cumprimentou.
- Eu falo e cumpro. – Milo sentou-se perto de Shina. – Cerveja?
- Ops.
- Alexei, está dando cerveja para alguém que acabou de sair de um hospital? – Camus censurou.
- Legal, tem uma pra mim, Hyoga?
- Milo!
- Ah, Camus. Álcool acelera os impulsos nervosos.
- E se tomado demais provoca um retardamento mental. Tal qual ocorre com você quando se excede, mon ami.
Milo riu e remexeu os cabelos. "Como esse desgraçado consegue agir assim depois do que aconteceu?" Pensava Camus, e logo a resposta veio. "Claro, Camus... Você deu de entender que ele DEVERIA agir assim."
- Não vamos exceder. – Hyoga colocou, jogando uma latinha para Milo. – Toma uma pra você também, Camus.
Camus quase não pega a latinha, arrancando risos de Shina e Hyoga.
- Muito engraçado. – Ironizou antes de beber o primeiro gole - É um belo apartamento.
- Se quiser eu mostro a vocês.
- Mostre a Camus. Eu vou ficar aqui com a Shina. – Milo afirmou fazendo Hyoga olhar feio.
- Certo... Venha, Camus...
O russo guiou Camus até um corredor enquanto Milo se ajeitava perto de Shina.
- Você sabe o que Camus quer com Hyoga? – Perguntou a italiana.
- Sei lá. Talvez só conversar. Quem entende seu primo?
- Vocês estão se dando bem, não?
- !
- Achei vocês dois muito estranhos agora.
- Seu primo é estranho. - Cortou o assunto. - E então? Onde tem uma caneta para eu assinar no seu gesso?
- Tem um porta-caneta na estante.
- Hum... – Andou até a estante. – Achei.
- Qual vai usar?
- Uma bem vermelha pra chamar bastante atenção.
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- É. É mesmo um belo apartamento. – Camus contemplava as pinturas na parede do corredor. - Os quadros de Roerich foi idéia sua?
- Eu gosto deles, mas a idéia foi da minha mãe.
- Hum... E essas fotos na parede?
- Tem valor sentimental. São minhas. Eu não vendo, não dou... São aquelas que eu sei que captei alguma coisa além da imagem.
Camus aproximou-se do mural do quarto de Hyoga, envolvendo-se com uma cena de duas crianças juntas. A forma como se olhavam dava vazão aos pensamentos de quem via.
O francês riu para si e voltou a olhar para o primo:
- Você é mesmo um excelente fotógrafo.
- Obrigado. E como está Milo?
- Heim? – A pergunta causou um repentino tremor em Camus.
- No hospital, quando Shun foi embora. Eu lhe contei sobre os tais...
- Ah, sim. Foi por isso que mudamos para um apartamento.
- Se mudaram? Vão ficar por aqui!
- Só por um tempo. Ah... Um amigo de Milo apareceu em nosso hotel, mérito daquele seu amigo Shun, que contou a ele sobre suas suspeitas. O indiano chegou à conclusão que era melhor eu ficar por perto porque ele... Poderia me manter vivo.
- Você?
- Pois é. Milo e eu temos algo em comum afinal de contas.
- Então durante o enterro... Poderia ter sido você no lugar dele?
Camus sentiu um aperto muito grande. Não havia pensado nisso. Também... Nem dera tempo pra isso.
- Primo?
- Hum? – Camus pareceu despertar.
- Diga a verdade. Milo veio para o enterro de Jisty só para ficar perto de Shina, não é?
- ...
- Jisty não gostava dele desde criança. Sei que ela só topou ir para Kyoto por sua causa.
- E você não vai me perdoar por isso, não?
- Milo está dando em cima da minha prima, não é?
O francês respirou fundo e tomou um gole da bebida. Também sempre teve medo disso, mas não por se tratar de Shina. Sempre teve ciúmes do amigo com qualquer mulher.
- Não.
- Não?
- Não. – tomou mais um gole. – E se quer saber a verdade, Milo sempre foi meu amigo e sempre gostou muito de Shina. Jisty pode não ter gostado dele, mas nós gostávamos dela e ele veio nos fazer companhia. E... Essa é a mais pura verdade.
- ...
- Eu ponho minhas mãos no fogo por ele. E você? Põe pela sua prima?
O russo cruzou os braços e virou o rosto:
- Ela sempre preferiu você.
- ...
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Um pouco longe dali...
- Ikki! – Esmeralda abriu a porta animada ao descobrir quem tocara a campainha de sua casa. – Nossa! Que bom ver você!
- Achei meio inconveniente vir sem avisar. Mas esse sorriso me deixou mais a vontade.
Um leve rosado se espalhou pelo rosto da moça:
- Você quer entrar? Posso lhe preparar um café.
- Não... Não é necessário. E... Parabéns. Shun me contou.
- Ah... Obrigada. Nem acredito que quitei todas as minhas dívidas.
Ikki sorriu de maneira descontraída, colocou as mãos nos bolsos e olhou para o céu. Depois voltou a mirar aqueles olhos inocentes.
- Então? Aceita tomar um sorvete comigo?
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-... Quando dei conta a multidão se formou mais rápido que formigas em volta de um doce. Não sabia como explicar então Shun, Seiya e eu saímos imediatamente. – Ikki contava a história da noite anterior tentando não ligar para a expressão incrédula de Esmeralda.
A sorveteria não estava tão cheia, devido ao fato de se tratar de uma segunda-feira talvez.
- Então? O que acha? – Perguntou Ikki antes de comer mais um pedaço de seu sorvete de laranja.
- Nossa, Ikki... Eu não sei...
- Apareceu no jornal segundo Shaka e Mu. E se eu acreditei... Qualquer um acreditaria.
- Você está me dizendo que realmente teve um homem que voou e esse homem era você!
- Nãão. Eu saltei. Mas foi tão alto que todo mundo achou que eu estava voando.
- Alto... Quanto?
- Uns... Cinco metros acima do chão talvez.
- Como!
- Acho que estou sendo eufemista.
Esmeralda entrelaçou os dedos e apoiou seu rosto nele. Um gesto que lembrou (E muito) Shun.
- Nossa, Ikki... Por que está me dizendo uma coisa dessas?
- Hum... Bem... Eu falei sobre Shaka, Mu e a história dos tais maníacos pelo poder.
- Parece história de ficção.
- Pois é. Mas uma conhecida do meu irmão foi atacada. Não se preocupe, ela está bem. – Acrescentou assim que viu um olhar de preocupação descer sobre a face da moça. – Mas ela disse algo como "Desgraçado do cabelo rosa chiclete".
- !
- Se não me engano... Na Ametista... Você estava conversando com um. No dia que... No dia que eu salvei você.
Esmeralda ficou sem jeito:
- Sim... Eu lembro. E acho que você está falando de Alberich, o dono do lugar.
Foi só ouvir aquilo para o Amamiya passar as mãos pelo rosto num misto de vitória e admiração.
- Alberich... Esse é o nome do antigo colega de Mu, Esmeralda.
- ...!
- Eu desconfiei disso, agora tenho certeza. Era por isso que eu queria falar com você.
A expressão de Esmeralda modificou, mostrando um discreto desapontamento.
- Ah, certo... Foi por isso.
- Não. Não foi só por isso. – Adiantou-se ao perceber a besteira que havia dito. – Realmente não foi.
- Não se preocupe. Você me ajudou uma vez então eu vou ajudá-lo. Pergunte o que quiser que eu respondo.
- Não... Eu só queria perguntar isso.
- ...
- Na verdade, nem sei por que eu resolvi falar com você. Poderia ter descoberto de outra forma.
- Eu vou ajudá-lo. Pelo que está me dizendo você também corre perigo.
- Você já me ajudou. Não se preocupe. – Rematou levando mais uma colher de sorvete à boca. – Agora me conte como conseguiu quitar as dívidas.
- Afrodite me ajudou. – Respondeu ela com um pequeno sorriso.
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O dia de Saori passara rápido e com a máxima quantidade de notícias revoltantes que seu limite permitia. Shido ligara para marcar o casamento, a revista alternativa "Óptica" encobriria o acontecimento, um indiano contara uma história difícil de engolir e por final teve que ouvir a afirmação de Saga Opulska no que diz respeito ao seu estado. E ainda teria que encontrar Seiya naquela noite.
A jovem Kido correu até a frente do local marcado ofegante e em lágrimas. Tudo passava muito rápido pela sua cabeça.
De repente uma mão descansou sob seu ombro fazendo a moça dar meia volta assustada.
- AH! S... Seiya!
Seiya estava encharcado e ao ver Saori inchou o peito para desabafar tudo que estava sentindo. Aquela seria a hora de dizer tudo que sentia.
Mas ao ver as lágrimas teimosas da moça esqueceu-se dos próprios problemas.
- S... Seiya! – Sua voz foi sufocada no mesmo momento que ela caiu em seus braços, sendo acolhida com ternura.
- Saori... Saori, o que aconteceu?
- Eu estou grávida! – Ela quase gritava, o abraçando mais.
Seiya perdeu completamente a fala. Ficou abraçado com Saori enquanto sua cabeça digeria a notícia quase a força.
- Eu não sei o que fazer! – Ela gritava e soluçava desesperada. – Shido marcou a data do casamento e eu estou muito confusa! Me ajude! Me ajude por favor!
Aquilo o fez congelar. Então além daquela mulher ter tanta força e sua voz ter o poder de calar a dele, suas emoções também inibiam as dele. Agora entendia por que havia gostado tanto de Saori logo no primeiro dia. E por que Shun fora embora os deixando a sós na boate.
O homem sorriu tristonho e abraçou mais a moça, que desabafava.
- Eu estou grávida e não sei quem é o pai da criança... Eu não sei o que está acontecendo comigo... Tudo estava bem até você parecer... Tudo!
As lágrimas se misturavam com a chuva no rosto gelado da moça. Seiya, então, sem pensar, a afastou segurando firmemente seus ombros enquanto a ouvia chorar.
- Eu estou com você, Saori. Independente de quem seja esse filho eu estou com você!
- ... S... Seiya...
- E Eu juro... Se for melhor pra você eu não abro a boca.
Os soluços eram cada vez mais insistentes.
- Eu não conto nada e deixarei você viver feliz. – Rematou Seiya trincando os dentes e chorando também, voltando a abraçá-la. – Eu deixarei você feliz de verdade!
- Seiya...
- Eu amo você, Saori.
- ...
- Hoje descobri isso.
- Seiya... – Sua voz morria nas lágrimas e soluços.
-
-
-
-
-
Já era tarde da noite e Camus não conseguia dormir. Havia tido um dia cheio e, claro, pensava muito em Milo. Nem parecia que fora naquela manhã que o grego havia lhe roubado um beijo. Aliás,nunca desejara tanto repetir a dose.
Ao perceber que estava viajando demais nos pensamentos balançou a cabeça e massageou a fronte.
- Preciso tomar algo para dormir. – Murmurou para si enquanto se levantava da cama. – Leite quente. Leite beeeem quente.
Descalço, saiu de seu quarto e surpreendeu-se ao ver a porta do quarto de Milo semi-aberta e mais ainda ao perceber o quanto a sua curiosidade o dominava a ponto de querer dar uma olhada lá dentro.
Tentou não fazer barulho ao abrir mais a porta.
Milo dormia tranquilamente, virado para o lado, embrulhado até o pescoço e provavelmente com uma camisa de manga comprida aquecendo-o. Parecia está no sétimo sono, então não teria problema se Camus entrasse.
E entrou.
Adorava vê-lo dormir.
Ajoelhou-se perto da cama e afastou uma mecha de cabelos do grego para trás da orelha, mostrando mais seu rosto. E com os dedos, passou a penteá-los carinhosamente para trás.
Riu para si mesmo.
- Que inveja, mon ami. Você consegue dormir tão bem... Parece até um anjo.
Camus acariciou de leve os cabelos de Milo, deixando depois sua mão escorregar pela face e depois pela nuca.
- Mon ange...
Até que os olhos de Milo se abriram lentamente, encarando Camus como se fosse um sonho.
- Mon dieu.- O francês suspirou nervoso, afastando rapidamente a mão.
- Desculpe... – Milo murmurou fechando os olhos lentamente. – Estou acordado...
- Me perdoe, eu...
- Também não consigo dormir... Embora esteja com sono.
- ...
- Não paro de pensar em você. – Falou num tom choroso.
O coração de Camus deu um salto enquanto Milo virava-se para o outro lado dando a chance para o francês sair de lá.
Houve um silêncio, cortado pelo som da porta sendo fechada com cuidado. Milo riu como se soluçasse e fechou os olhos achando que Camus fora embora. Mas logo sentiu um peso sobre sua cama.
Assustou-se e virou a cabeça, vendo Camus sentado ao seu lado.
- Está embrulhado até o pescoço. – Comentou o francês.
- Ah, é que eu... Estou com frio.
- Imaginei.
- Depois eu me acostumo.
- Enquanto não se acostuma... Tudo bem se eu aquecer você?
- Você sabe que pode.
Camus pensava algo quase parecido. Também se perguntava se a falta de sono fazia seu bom senso sumir. Ao ouvir a colocação de Milo só fez deitar na cama e abraçar o amigo por trás. A camisa de manga comprida mais o abraço o aconchegaram.
- Está mais quente?
- Sim... – Respondeu fechando os olhos. – Poderíamos ficar assim pra sempre. Eu não ia querer mais nada.
- Nem eu...
- ...
- Acho que perdi o juízo. Talvez não saiba o quanto eu gosto de você.
Milo abriu de uma vez os olhos, e virou-se de frente para Camus.
- Camus, eu nem sei como reparar a besteira...
- Nem eu.
-...
- Eu já queria isso faz tempo. Você viu como eu reagi ao beijo.
- Mas agora eu não sei o que vou fazer.
- Como se eu soubesse.
Camus apoiou um dos cotovelos na cama e com a outra mão acariciou a face de Milo, mergulhando-o num beijo suave, mas capaz de fazer os pêlos de sua nuca eriçar levemente. Milo sentiu um calor fulminante em seu peito de modo que a única reação que teve foi corresponder aquele beijo no mesmo ritmo.
Camus afastou os lábios e encarou a face escarlate do amigo:
- Na verdade... Na verdade eu não tenho idéia de como vai ser daqui pra frente, mas... A vida é presente e neste momento eu... Eu...
Milo sorriu nervoso com o desconserto de Camus.
- Bem, eu... Só quero ficar aqui com você. Amanhã... Quem sabe.
- Camus... Eu sempre vou querer ficar com você. – Murmurou.
Camus juntou-se mais ao amigo e o aninhou, sentindo o perfume dos cabelos cacheados do mesmo. Agora sim conseguiria dormir.
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O doutor Opulska não conseguira dormir. Levantou-se e dirigiu-se até a cozinha sonolento.
Nem reparou alguém pronto para ataca-lo.
Continua...
