O sol estava alto no céu, e os dois caminhavam em silêncio. Há horas haviam deixado o abrigo em que passaram a noite. O desvio que tinham feito por causa do ferimento no pé de Draco os havia feito perder um tempo precioso. Agora, de volta ao caminho original, Harry imprimia um ritmo intenso à caminhada.

Desejava chegar cedo o bastante para não precisar passar outra noite ao lado de Draco. Sentia-se estranho, magoado e enojado ao mesmo tempo, lembrando com vergonha do que acontecera durante a noite. E a conversa com Draco, pela manhã, só serviu para piorar tudo.

Pansy, molestada pelo pai. O estranho acordo feito desde os tempos de escola, o cinismo do loiro, suas insinuações a respeito de Gina e sua família. Nojento, isso é o que ele era.

Harry arrependia-se de ter atendido ao apelo de Narcissa. Devia ter deixado tudo como estava, devia ter deixado o arrogante sonserino morrer entre os lobos.

Suspirou, cansado, ao constatar que na verdade faria tudo outra vez, se fosse preciso. Ou melhor, quase tudo. Eu mataria Malfoy antes que ele pudesse colocar suas mãos nojentas sobre mim outra vez ...

Perdido em seus pensamentos, Harry andava sem tomar conhecimento da presença do seu companheiro de jornada. Quando a fome apertou, ele simplesmente parou, sem uma palavra de explicação. Sentou-se e retirou o que restava da comida, separando metade para si. O que sobrou, ele atirou na direção de Draco. O loiro pegou a mochila e foi procurar um canto para se sentar. Em silêncio, exatamente como Harry.

Comeram, e depois de alguns minutos de descanso, Harry se levantou e começou a andar. Draco o seguiu. Estava sério agora, não parecia o mesmo debochado da manhã, que tanto irritara Harry. O grifinório o olhou disfarçadamente, e viu o loiro caminhando concentrado, olhando para o chão.

Apesar do ritmo intenso imposto por Harry na caminhada, só conseguiram chegar à segunda caverna quando a tarde morria. Entraram. O feitiço protetor colocado por Lupin criara uma parede sólida. Um toque no lugar certo e algumas palavras murmuradas por Harry fizeram com que se revelasse uma passagem que dava acesso à caverna propriamente dita. Ampla, confortável e segura.

Num dos cantos, havia comida, mais roupas e cobertores. Harry apontou a comida para Draco e anunciou que ia se deitar.

—Quanto mais cedo formos dormir, mais depressa amanhecerá o dia e então nos livraremos disso tudo...

Harry notou o rápido olhar que Draco lhe lançou. Estava terminando de preparar sua cama quando o loiro se aproximou.

—Escute, Harry, acho que lhe devo desculpas. Fui grosseiro, ofendi sua namorada, seus amigos...

Ainda de costas, Harry arregalou os olhos. Malfoy, se desculpando por ofender seus amigos? Virou-se e o encarou.

—Esqueça. Foi assim durante toda a nossa vida, então pra que nos preocuparmos? Vamos dormir, amanhã na hora do almoço já teremos nos livrado um do outro...

Draco o olhou fixamente por alguns instantes. Harry achou que ele ia falar alguma coisa, mas o sonserino apenas balançou a cabeça em concordância e se afastou. Levemente desapontado, o moreno se enfiou entre os cobertores. Precisava dormir e esquecer, apenas.

Mas apesar do cansaço, o sono não vinha. Mais uma vez ele se virou para o outro lado, mas não adiantou. Então, levantou-se para tomar um pouco de água. Ao passar pela cama de Draco, viu que o loiro também estava acordado. Bebeu água, e já ia voltar para o seu canto quando ouviu a voz do sonserino, bem ao seu lado.

—Sabe, Harry, pode ser que agora você me deteste mais do que antes, mas tem uma coisa que eu quero deixar clara. É sobre ontem a noite, sobre o que aconteceu entre nós...

Harry desviou o olhar depressa, sentindo o sangue subir de uma só vez ao seu rosto.

—É melhor esquecermos isso, Malfoy...

—Não... eu quero dizer que eu fiz de propósito, para te colocar na mesma situação que eu. Você viu o que Orkney fez comigo, sabe que ele fez muitas outras vezes. Eu imaginei que se te envolvesse numa situação semelhante, você ia pensar duas vezes antes de fazer qualquer comentário sobre o que aconteceu comigo no covil...—Draco olhou-o, sorrindo de uma forma estranhamente amarga. Harry respirava fundo, sem imaginar o que poderia dizer. O loiro continuou.

—Quando eu deixei o esconderijo e vi você me esperando, como Lupin disse que estaria, compreendi que o meu ódio e desprezo por você, durante toda a nossa convivência, serviam apenas para mascarar uma admiração velada, um rancor pela rejeição que você me impôs quando nos conhecemos... —Harry abriu a boca para falar, mas foi impedido pelo loiro.

—Me deixe continuar. Lupin me contou que eu seria abandonado para morrer aqui se você, com a sua inexplicável generosidade , não tivesse sentido pena da minha mãe. Sabe, Harry, eu sempre tive muito poucas pessoas na vida para contar. Ao contrário de você, tão rodeado de amigos, tão aberto, mas tão inacessível para mim. —Fez uma pausa — Quer saber? A verdade é que eu gostei de poder passar esse tempo com você, e gostei muito. Mas especialmente, eu gostei daquilo que aconteceu entre nós na noite passada...

Harry sentiu uma espécie de pancada no estômago, seguida de uma leve dormência. Continuou olhando para Draco, mudo, sentindo que mal respirava.

—Não me veja como um monstro, não fique imaginando que inventei aquelas coisas sobre a Pansy para deixar você chocado. Foi verdade. E me desculpe por não conseguir suportar seus amigos e sua namorada. Acho que o nome certo para isso é ciúme. Agora , é melhor irmos dormir. Se você continuar a me olhar assim, posso não resistir ... —Não completou a frase, apenas se virou e seguiu para sua cama.

Harry o olhou, percebendo com espanto que não queria que ele se afastasse. Respirou fundo, forçando-se a voltar para a sua cama, sabendo que não ia conseguir tirar da cabeça as palavras de Draco, nem as malditas lembranças da véspera. Olhou para o loiro deitado de costas para ele. Sua cama estava distante da dele, e isso era bom. Bom e seguro, apesar de Harry intuir que ele não tentaria nada mesmo que as camas estivessem mais próximas. O orgulho Malfoy não o deixaria cometer o mesmo erro novamente, pensou Harry sentindo um inexplicável pesar. Se você continuar a me olhar assim, posso não resistir...

Harry virou-se na cama, desesperado. Afinal, o que estava acontecendo com ele?

O dia amanheceu finalmente, e depois de recolherem suas coisas, os dois retomaram a caminhada. Iam silenciosos, cada um perdido em seus pensamentos. Harry se perguntava se Draco também teria passado a noite em claro, mas evitava olhar o sonserino. Dentro de poucas horas, tudo aquilo seria passado.

Passava um pouco do meio dia quando aparataram diante do prédio do Ministério. Entraram, e foram de imediato cercados de pessoas. Começou então uma maratona de perguntas, relatórios, entrevistas, exames médicos. Depois, Draco foi levado para uma saleta que na verdade era uma cela especial para prisioneiros que ainda não tinham sido julgados. Harry soube que o loiro teve que passar por longas sessões de interrogatórios, durante dias a fio, e isso o incomodou. Sentia-se estranho desde a chegada, tentava se reintegrar à vida que levava antes da missão , mas não estava sendo fácil. Havia algo nele que não se encaixava mais na simples rotina do trabalho alternado com as visitas à Toca.

Gina também parecia diferente. A relação parecia a Harry insossa, monótona. No entanto, quando Arthur e Molly sugeriram que os dois marcassem o casamento para dali a quatro meses, ele não teve forças, ou mesmo argumentos para se opor. Marcaram a data, embora Harry não sentisse nenhuma empolgação. Ele atribuiu isso à tensão do último mês, ao confronto com Voldemort. Tudo ia passar, era só uma questão de tempo, ele acreditava.

Três semanas depois, Harry ainda não tinha visto Draco. Soube que Lucius deixaria Azkaban na próxima semana, e que Narcissa fora julgada inocente da acusação de colaborar com os comensais O pai de Draco tinha assinado uma longa confissão que relatava minuciosamente tudo o que fizera enquanto estava sob as ordens de Voldemort, e concluía declarando-se arrependido de tudo. Para se redimir, faria doações mensais ao St. Mungus durante um ano. Também declarava que seu filho, na ocasião menor de idade, tinha sido coagido e chantageado por Voldemort para executar pequenas tarefas entre os comensais. Entre delações, doações e multas, foi determinado que a família Malfoy estava apta a se reintegrar à comunidade bruxa.

Assim, Draco partiu sem que Harry voltasse a vê-lo. Melhor assim, pensou o grifinório. A simples presença de Draco , ainda que numa sala isolada do Ministério, era um lembrete constante para o moreno dos acontecimentos daquela noite estranha. Mas mesmo enquanto o pensamento lhe ocorria, uma pequena parcela dele sentia-se entristecida pela ruptura, pelo afastamento. Que ruptura, que afastamento? Era a razão, provando que não se rompia algo que não fora iniciado, e muito menos podia-se afastar de quem jamais havia estado próximo. Tolices, apenas.

Um beijo doce e prolongado selou o fim da celebração. Ao som de vivas e palmas, Lupin e Tonks voltaram-se sorrindo, visivelmente felizes. De braços dados, percorreram o caminho enfeitado por flores e fitas, passando sorridentes por entre os convidados. Gina, empolgada, batia palmas, e Harry sabia que ela pensava no próprio casamento, a realizar-se dentro de três meses. Ele mal pudera assistir à cerimônia, ocupado demais em não olhar para o outro lado do jardim, onde a família Malfoy, dourada e esnobe, se encontrava. A principio, estranhara a presença deles , mas depois lembrou-se que eles estavam ainda em processo de reintegração à sociedade bruxa. Além disso, Narcissa era tia de Nymphadora, e tanto ela quanto o marido tinham uma dívida de gratidão para com Lupin. Nesse ponto, a dormência abdominal atacou Harry novamente, e ele forçou-se a prestar atenção em cada palavra pronunciada no altar improvisado no jardim da mansão de Scrimgeour.

Formara-se uma longa fila para os cumprimentos , e Harry soube por Gina que os Malfoy tinham sido os primeiros dela. Naturalmente, queriam se livrar logo da obrigação chata e voltar para a futilidade de suas vidas, sem participar do almoço que o Ministro fizera questão de oferecer aos convidados dos noivos. Harry estava irritado, mas não compreendia o motivo. Não suportava mais ouvir os comentários de Gina sobre a decoração, sobre o vestido de Tonks, o terno de Lupin, o horário da cerimônia. Nem Rony e Mione, que depois de deixar o altar onde foram padrinhos da noiva vieram se juntar a eles, conseguiam distrair Harry. E então, ouviu a exclamação de Rony.

—Ora, pensei que o Malfoy tivesse ido com os pais dele. O que ainda está fazendo aqui? —O coração de Harry começou a bater mais rápido.

—Não sei, mas acho que vamos descobrir logo. Ele está vindo para cá... —Mione falou, muito tranqüila, sem perceber que suas palavras deixaram Harry em estado de choque.

O moreno olhou e viu Draco, não o magro e pálido Draco do covil, mas o outro, o belo e bem cuidado Draco Malfoy com quem vivera seis anos de escaramuças em Hogwarts. Estava vestido com extremo bom gosto, os belos cabelos platinados brilhando ao sol, os olhos azuis acinzentados fixos nos dele. O coração de Harry bombeava o sangue com tanta força que ele chegou a sentir falta de ar. Parecia que todos à sua volta podiam ouvir o som estrondoso que vinha do seu peito. Passou a língua pelos lábios secos, tentando se controlar, por Merlin, se continuasse assim cairia desmaiado no chão . Então, Draco finalmente chegou até o grupo e dirigiu-se a ele apenas, ignorando ostensivamente os demais.

—Preciso falar com você, Potter. Vamos lá dentro um minuto...

Harry engoliu em seco, sabendo que não adiantaria tentar falar nada, sua voz não conseguiria sair. Viu Gina se adiantar e encarar o loiro, desafiadora.

—E o que você teria a dizer a ele, Malfoy?

—Certamente, nada que lhe diga respeito, Weasel...

—Ei...—Era a voz de Rony, dando um passo à frente para defender a irmã.—O mesmo covarde de sempre, hein Malfoy? Não discuta com minha irmã, fale comigo...

—Como desejar, Weasel...

Harry viu que ambos haviam sacado as varinhas, e resolveu interferir antes que os outros convidados pudessem perceber o incidente. Colocou-se entre eles, enquanto sua mente registrava tolamente que Olivaras deveria ter feito uma nova varinha para substituir a antiga de Draco, que Voldemort destruíra antes de enviar o loiro para o covil.

—Parem, vocês dois. É o casamento de Lupin, esqueceu, Rony?

Harry percebeu que Mione também havia se posicionado diante de Rony, e agora tentava afasta-lo. O ruivo bufou e guardou a varinha, deixando-se guiar pela noiva para longe de Draco. Harry olhou Gina.

—Fique com Rony e Mione, vou ver o que ele quer, e depois disso ele vai embora, não é mesmo, Malfoy?

Olhou para Draco, que concordou com um movimento de cabeça, silenciosamente.

—Está bem, mas não demore...—Gina se adiantou e deu um beijo leve nos lábios de Harry, que, sem entender o motivo, sentiu-se constrangido com o gesto da noiva.

Draco já andava em direção à entrada da casa, e Harry o seguiu. Entraram, e pela desenvoltura com que o loiro caminhava pelos corredores dava a impressão de que conhecia bem a casa do Ministro. Parou diante de uma porta, que abriu e entrou, sem cerimônia. Ficou esperando que Harry entrasse para depois fechar a porta, dando uma volta na chave. Harry notou isso, sentindo o coração recomeçar a bater forte em seu peito.

Draco virou-se e ficou de frente para Harry. Veio caminhando para perto, cada vez mais. O moreno , apesar de tenso, conteve o impulso de recuar um passo. Então, viu Draco parar, muito próximo dele. Olhavam-se em silêncio, e Harry agora era capaz de jurar que Draco podia ouvir as batidas do seu coração. Odiou-se por isso.

De repente, foi envolvido pelo calor dos braços do outro, sentiu-se puxado de encontro ao seu corpo quente. Por instinto espalmou as mãos para conter o abraço , pousando-as no peito do loiro, cujo coração batia tão furiosamente quanto o seu próprio.

O impacto da descoberta o deixou paralisado. Apesar da frieza aparente, o coração de Draco entregava que o loiro estava tão perturbado quanto ele próprio. O moreno ouviu a voz sussurrante, falando com os lábios colados aos seus.

—Eu não consigo parar de pensar em você...

A dormência espalhou-se do abdome até o peito de Harry, que sentiu de novo o sabor daqueles lábios, daquela língua doce que entreabria sua boca. Sentiu um calor delicioso se espalhar pelo seu corpo, enquanto se posicionava melhor para receber o corpo de Draco contra o seu, consciente que também enlaçava o loiro e o puxava contra si, que recebia a língua invasora e a sugava deliciosamente.

Ouvia pequenos gemidos, deixava a mão mergulhar naqueles cabelos de seda, sentia as carícias do loiro em suas costas, enquanto o beijo prosseguia intenso, delicioso.

Ficariam ali por horas, entregues às carícias e beijos deliciosos, à ardente exploração manual do corpo um do outro, à descoberta dos pontos mais sensíveis aos beijos e toques. Quando soaram as batidas na porta, Harry tinha perdido por completo a noção de tempo e espaço.

Afastaram-se, olhando um para o outro, sobressaltados.

—Você está aí, Harry? —Era a voz de Gina, quebrando de vez o encanto do momento. Harry viu Draco suspirar e se afastar, enquanto ajeitava as roupas para tentar disfarçar os sinais claros da sua excitação. Harry fez o mesmo, ajeitando também os cabelos, ainda mais desalinhados. Limpou a garganta , antes de responder.

—Estou, já vamos sair...

Depois de conferir tudo, ele caminhou até a porta, mas foi interceptado por Draco. O loiro retirou um papel do bolso interno da camisa e entregou a Harry.

—Me encontre hoje à noite ...

Harry olhou o papel, depois olhou o loiro.

—Por favor...—Draco falou baixinho, antes de aproximar os lábios e beijar Harry pela última vez. O moreno sentiu de novo o calor espalhar-se pelo seu peito. Quando encerraram o beijo, encarou Draco.

—Está bem. Mas antes tenho que ... preciso ir à Toca, já tinha marcado.

—Vá depois. Eu vou estar esperando. —Sorriu, e Harry teve que se conter para não agarra-lo outra vez.

Então, Draco destrancou a porta e saiu, passando por Gina como se ela fosse uma peça inanimada da decoração da casa de Scrimgeour.

Bom, pessoal, em primeiríssimo lugar, quero agradecer a força que tenho recebido através de reviews, e também dos acessos à minha fic. Obrigada, de coração.

Quero agradecer àqueles que lêem mas não gostam de comentar. Valeu, beijos, beijos, milhões de beijos!

Fabi: Hahahaha... você gostou, né? O Draco pegou o Harry de surpresa, e como pegou! Fiquei muito feliz por você ter gostado, espero que você continue a ler, e se sinta bem-vinda também para o caso de alguma crítica ou sugestão ok?

Muitos, muitos, muitos beijos, e obrigada!

Dany Ceres: Viu só? Achei tão legal sua opinião que coloquei nesse capítulo uma explicaçãozinha (tardia, eu reconheço) sobre a ausência da varinha do Draco... Beijos, e obrigada, do fundo do coração...