Capítulo um: A rosa

- Como estou? – perguntou Gina, dando uma volta em torno de si para que Hermione visualizasse todo o seu vestido dourado de dama de honra.
- Para mim, está linda – disse Hermione, calçando as sandálias. – Já para o seu pai, eu diria que está preocupante.
Gina deu risada e pôs-se a olhar para a amiga, sorrindo. Quando Hermione terminou de arrumar o calçado, a outra a ofereceu as mãos para a ajudar a se levantar, enquanto perguntava:
- Então será hoje o grande dia?
- Sim – respondeu Hermione, tranqüilamente, enquanto checava no espelho o penteado com cachos perfeitamente definidos graças, é claro, a uma poção. – Será o grande dia para seu irmão, que vai se casar; o grande dia para a sua mãe, que já está emocionada e principalmente para você, que eu suspeito não estar tão bonita sem a intenção de afetar um certo alguém.
A ruivinha ergueu uma única sobrancelha, com cara de quem não achara a piada engraçada. Hermione sorriu ao perceber que afetara a amiga como queria e aproximou-se do espelho, continuando a ajeitar os cachos.
- Muito engraçadinho, senhorita – disse Gina, irônica. – Mas sabe que eu não tenho interesse algum em correr atrás do Harry.
- Tenho certeza que não. Afinal, eu não citei Harry algum – disse Hermione, absoluta.
- Ora, Hermione, não me amole! – Gina se espremeu ao lado da amiga, para usufruir também do espelho. – E por favor não fuja do assunto inicial, mocinha. Hoje será por acaso o seu grande dia?
- Não.
Hermione olhou de esguelha para a amiga, que a encarava espantada.
- Você não pode estar falando sério, Mione.
- Mais sério impossível!
Então ela encostou a mão no ombro da outra por um breve momento enquanto ia se dirigindo à saída do quarto. Já estava do lado de fora quando enfiou a cabeça porta adentro de volta e acrescentou:
- Talvez hoje seja esse dia sim, Gina. Mas com certeza não será "por acaso"! Boa sorte lá embaixo.
E desceu sorridente as escadas até a sala d'A Toca. Por mais que tentasse esconder, a verdade é que a ansiedade hoje era realmente grande. Quando chegara ali, na noite anterior, Rony já fora dormir. Portanto, o casamento de Gui e Fleur seria a primeira vez em que ela o veria desde Hogwarts.

Sabia que não era recomendável e tampouco saudável alimentar esperanças. Mas isso era o tipo de coisa que não se podia controlar. Ainda mais depois daquele final de ano letivo no qual o clima entre os dois estivera bastante sugestivo.
Ela chegou no último degrau e deu uma espiada. Na sala dos Weasley havia mais pessoas do que ela imaginava que caberiam, a grande maioria com cabelos ruivos. E havia mais gente lá fora, onde seria realizada a cerimônia. Aqui e ali se via parentes de Fleur arriscando um inglês com sotaque forte, embora muitos deles preferissem conversar entre si, no seu próprio idioma.
A pessoa mais próxima era o Sr. Weasley. Trajava belas vestes a rigor pretas de cujo bolso pendia a corrente de um relógio de ouro de aparência muito antiga, que o bruxo verificava com uma freqüência exagerada. Ele tinha um copo de hidromel na mão e conversava com um primo tentando aparentar tranqüilidade, embora não parasse de balançar o pé esquerdo, como se estivesse tendo uma espécie de ataque.
Ao avistar Hermione, o Sr. Weasley disse algo ao seu primo e aproximou-se da garota, sorrindo.
- Hermione! – ele abriu mais ainda o sorriso. – Você está muito bonita.
- Obrigada. Está dando tudo certo?
- Sim, sim. Gui está quase arrancando os cabelos porque Molly disse que Fleur mal começou a se arrumar, mas a verdade é que ele mesmo ainda não está pronto, então acho que a cerimônia ainda vai atrasar um pouco.
- Ah, mas isso já é de praxe – riu a garota. – Sr. Weasley, onde está Rony?
O Sr. Weasley deu um sorrisinho que disse a Hermione que ele sabia de tudo. Ela se sentiu um pouco desconfortável por isso.
- Está no quarto dele, Gui pediu ajuda com a roupa. Mas se quiser eu posso ir chamá-lo para você – e fez menção de subir a escada.
- Não precisa – ela interrompeu, segurando o braço do homem, delicadamente. – Gui deve estar precisando dele, eu o vejo mais tarde. Obrigada.
O Sr. Weasley pareceu um pouco decepcionado, mas deixou, sem protestar, que Hermione seguisse seu caminho.
A garota seguiu em direção ao quintal, feliz. Queria realmente rever Rony, mas entendia que seu irmão precisava dele na atual correria e bagunça. Imaginava se um dia passaria por uma situação parecida. Não lhe parecia nada mal se casar com alguém que a amasse e entendesse. E essa pessoa não estava longe, ela podia sentir isso.
Chegou com alguma dificuldade à porta dos fundos, uma vez que perdeu as contas de quantas pessoas parou para cumprimentar (embora pudesse jurar ter falado com algum dos gêmeos mais de uma vez). Quando finalmente alcançou o jardim da casa, avistou ao longe, perto do buffet, duas pessoas com quem lhe interessava falar.
Uma delas era Harry. Trajava vestes novas, azuis e opacas e seus cabelos pareciam ter recebido uma tentativa frustrada de arrumação. E, conversando com ele, estava alguém que Hermione não via há dois anos. Era alto, com ombros um pouco curvados e o nariz adunco.
- Herm-ôn-nini!
Vítor segurava um copo de poncho cor-de-rosa e acenava para ela. Hermione sorriu de volta e caminhou para junto deles.
- Herm-ôn-nini, há quanto tempo! – exclamou Vítor, abraçando-a. Ela retribuiu o abraço, um tanto quanto sem jeito.
- Como tem passado? – perguntou sorrindo. Em seguida voltou-se para Harry, sem esperar resposta. – E você, Harry? – e se atirou no pescoço do amigo. – Está tudo bem? Como foi seu começo de férias? Como os trouxas te trataram?
- Como se eu fosse um elf... um escravo – respondeu o amigo, com um pequeno sorriso no rosto. – Está tudo normal, sim.
Hermione deu um sorriso constrangido. Não só pelo fato de que se sentia incapaz de dizer algo bom a Harry - que com certeza não vinha passando pela sua melhor fase após a morte de Dumbledore -, mas principalmente porque Vítor não desgrudava o olhar dela.
- E Herm-ôn-nini? – perguntou ele, os olhos brilhando ao olhar para a garota. – Tem estudado muito?
Ela balançou um pouco a cabeça, considerando.

- Não tanto quanto deveria. Estive um pouco ocupada até agora, mas creio que poderei usar o resto das minhas férias para me dedicar aos estudos. Você sabe, é o último ano, não será nada fácil.
Harry pôs a mão no ombro de Hermione.
- Eu vou ver se Gui precisa de ajuda.
A garota pensou em protestar, não queria ficar a sós com Vítor. Mas acabou por deixar o amigo ir, sem reclamar. Ele provavelmente não estava muito a fim de conversar, e o aparecimento dela ali fora uma desculpa para desaparecer sem parecer estúpido.
Então sobrou para Hermione fazer o trabalho de anfitriã para Vítor. Ela se sentia realmente desconfortável em estar ali com ele. Ele agora estava morando na Inglaterra e arranjara uma vaga no time Falmouth Falcons. Mas, mesmo estando tão próximo, fora através de uma carta que o búlgaro a pedira em namoro, há pouco menos de um mês.
Mas, graças a Deus, ele não foi desagradável a ponto de tocar no assunto hoje. Pelo contrário, agiu normalmente. Perguntou da carreira de Hermione, de seus pais, de quadribol. Ótimo, quadribol. Um assunto pelo qual Hermione não se interessava nem um pouquinho, mas que seria forçada a ouvir durante os próximos vinte minutos, no mínimo.
- ... enton na última parrtida contrra os Chudley Cannons, pá! – Vítor encenou socar a própria mão. – Os dois saírram no brraço, foi uma cena memorrável.
Hermione sorriu educadamente. Pobre Vítor. Quadribol, era apenas disso que ele entendia. Não fazia mal para ela, lógico, pois isso não impedia o garoto de ser um ótimo amigo. Mas namorá-lo, isso era outra história. Ela jamais agüentaria passar seus dias ao lado de alguém para quem quatro bolas flutuantes pudessem ser a coisa mais importante.
Já estavam há alguns minutos conversando quando uma jovem alta, com ombros largos e sobrancelhas grossas, aproximou-se deles.
- Ah! Herm-ôn-nini, querro que conheça minha prrima Raíssa, ela está me ajudando um pouco com o inglês e a trrouxe hoje parra conhecerr os meus amigos.
Hermione apertou a mão estendida da moça, sorrindo sem graça. Ela tinha inventado uma desculpa qualquer para negar aulas de inglês a Vítor.
- É um prazer conhecê-la, Hermione – disse Raíssa, sorrindo também. – Vítor me falou bastante sobre você, é tão bonita quanto ele descreveu.
A garota agradeceu e percebeu que Vítor estava lhe dizendo algo, mas não ouviu o que era porque, neste momento, percebeu Rony apoiado no batente da porta de fundos d'A Toca, olhando-a.
Ficou feliz em vê-lo. Ele estava lindo em suas novas vestes a rigor, cujo tecido era brilhante e tinha cor de grafite. Os cabelos estavam mais curtos, provavelmente a mãe os cortara na véspera, as mãos seguravam uma linda rosa vermelha e o olhar, muito sério, fitava algum ponto próximo a ela. Como sentira falta de Rony!
Ela pediu licença a Vítor e Raíssa, aproximou-se dele, um tanto quanto sem jeito, e posicionou-se ao seu lado, com um sorriso radiante.
- Bom dia, Rony!
E fez menção de abraçá-lo, mas parou antes de fazê-lo, pois Rony não respondera ao seu cumprimento. Na verdade, ele nem sequer dera sinal de ter reparado na presença da garota, o que fez com que ela de repente começasse a ser tomada por uma crescente mágoa.
- Rony? – ela voltou a chamar, antes que aquela mágoa infundada tomasse espaço em seu coração. – Essa flor é para mim?
Ele entregou a rosa na mão de Hermione, ainda sem olhar para ela e murmurou um "Pode ficar". Isso fez com que Hermione suspirasse e, ao apanhar a rosa, começasse a aceitar que havia algo errado ali.
- O que há com você?
Rony permaneceu com as sobrancelhas franzidas e esticou o braço direito, apontando para algum lugar.
- O que ele está fazendo aqui?
Hermione olhou na direção que ele mostrava e descobriu para onde o garoto estava olhando. Era Vítor.
- Provavelmente veio presenciar o casamento de Gui e Fleur, como todos aqui – respondeu Hermione, com ar inocente. – Por que a pergunta?
Rony finalmente dirigiu o olhar a ela e parecia muito aborrecido.
- Hermione, se eu não te conhecesse diria que está tentando esconder algo de mim.
Hermione cruzou os braços séria, tentando esconder o nervosismo.
- O que, por exemplo? – perguntou, em tom de desafio.
- Não se faça de idiota! – exclamou Rony, da forma ríspida como ele costumava falar quando estava de mau humor. – Você convidou Krum para vir aqui!
Os olhos da garota começaram a se encher de lágrimas. Aquele não era o Rony que ela pretendia encontrar.
- Não, Rony, Fleur deve tê-lo convidado – e fez uma pausa, antes de perguntar: - E se tivesse sido eu? – Qual seria o problema?
Rony soltou um muxoxo de impaciência e cumprimentou um tio que ia passando, antes de responder.
- Sabe que eu não gosto dele – declarou em tom de bronca, como se Hermione tivesse rompido alguma regra moral importantíssima. – Krum quer me prejudicar, sempre quis.
Hermione ergueu uma sobrancelha, não acreditando no que ouvia.
- Como Vítor quer te prejudicar? – ela tinha medo do que o outro responderia.
- Ele... – as orelhas de Rony de repente ficaram muito vermelhas. – Ele quer roubar você de mim.
- Eu não sou sua, Ronald – disse Hermione com raiva, já começando a chorar. – Pelo menos não enquanto você não parar de agir como criança.
O garoto ia começar a responder, mas ela não deu tempo para isso. Virou as costas e seguiu pisando firme para o jardim, afastando-se do buffet e das pessoas ali presentes. Ia encostando os dedos delicadamente abaixo dos olhos, na tentativa de impedir que a sua maquiagem borrasse. Não chorava de tristeza por Rony, mas de raiva por si mesma. Como podia pensar em gostar de alguém tão estúpido?
Ela encostou-se na parede do barracão de ferramentas do Sr. Weasley, onde ninguém poderia vê-la, e começou a rever as lembranças que tinha de Rony. Lições de casa que ela tivera de terminar. Um animago que eles pensaram ter sido devorado por Bichento. Uma tentativa de defendê-la que lhe fez vomitar lesmas o dia todo. O enterro de Dumbledore. Um trasgo montanhês de dois metros de altura.
Hermione riu com essa última lembrança. Sim, ela gostava de Rony. Gostava até demais, na verdade. Porém, o Rony de que ela gostava era o homem que ele deveria ter se tornado e não o garotinho cabeça-dura de onze anos que ela conhecera e que ele parecia agora estar voltando a ser. Não era com esse Rony infantil e estúpido que ela queria se relacionar.
Ela sentou-se no gramado e ficou refletindo sobre aquilo até que esticou a cabeça para o lado e percebeu, ao longe, as pessoas se acomodando nas muitas cadeiras colocadas no jardim próximo ao altar. Era chegada a hora da cerimônia.
Hermione enxugou os olhos uma última vez, levantou-se e dirigiu-se para as cadeiras, sem antes passar pela cozinha e colocar em um copo com água a triste rosa que ganhara. Procurou então um lugar para si entre os convidados. Rony, para seu alívio, fora agarrado pela Sra. Weasley, que chorava em seu ombro deixando-o sem graça, de modo que Hermione poderia se sentar junto a Harry e ficar à vontade.
- Onde estão os noivos? – perguntou, acomodando-se ao lado do amigo.
Harry deu de ombros.
- A Sra. Weasley disse que estarão prontos daqui a pouco – respondeu, sem encarar a garota.
Hermione suspirou.
- Você não está nada bem, não é?
- Estou okay – disse Harry, desanimado.
- É por causa... – ela relutou em perguntar – do Dumbledore?
Ele não respondeu. Permaneceu olhando vagamente em direção ao altar, onde um representante do Ministério, que não aparentava mais de trinta anos, preparava a cerimônia. Hermione manteve silêncio em respeito ao amigo, até que este se voltou para ela e perguntou, agora olhando em seus olhos:
- E você, está assim por causa do Rony?

Hermione sentiu o rosto corar e direcionou o olhar para o próprio colo, deixando escapar um suspiro sentido.
- É, estava demorando demais para dar errado. Serve para eu aprender a deixar de me iludir.
E contou a Harry o que acontecera há pouco. Esperava que ele demonstrasse perplexidade, ou sensibilidade, ou mesmo uma cara de "eu sabia que isso aconteceria". Qualquer expressão condizente com a situação.
Em vez disso, o rosto do garoto foi tomado de aliviada compreensão.
- Isso explica – disse perante o olhar inquiridor da amiga – por que Rony gritou com as primas quando elas lhe pediram que pegasse um autógrafo do Krum.
Hermione se permitiu um pequeno sorriso. Pensara ter visto as trigêmeas ruivas de dez anos de idade espiando Vítor e cochichando, esfuziantes.
- Pelo menos agora Krum tem, por falta de uma, três novas pretendentes – comentou Harry, também sorrindo.
Hermione já ia preparando um comentário sarcástico, mas não chegou a pronunciá-lo. Isso porque, naquele momento, ouviu-se as primeiras notas da marcha nupcial, tocada ao piano.
Todos os convidados se levantaram imediatamente, a fim de ver a noiva que chegava.
Fleur estava maravilhosa, era inegável. Os cabelos loiros estavam soltos, caindo-lhe até a metade das costas e levando a um dos lados, próximo ao rosto, enfeites de brilhantes. O vestido branco era feito de um tecido simples, porém muito elegante. Era justo até a cintura e a partir daí alargava-se levemente; as costas ficavam à mostra, sobrepostas apenas pela fita que passava trançada ligando as duas laterais de tecido.
Gui também estava bonito na medida do possível, levando em conta que o seu rosto estava coberto de feias cicatrizes. Os cabelos longos estavam presos num rabo de cavalo, como de costume, mas a argola pendurada em sua orelha hoje não levava nenhum penduricalho. As vestes a rigor eram completamente negras, o que dava um grande contraste com a sua pele clara e com o seu sorriso, que se esticava de um lado a outro do rosto.
Foram trocados os votos matrimoniais, as alianças e o beijo. Durante este último, Hermione pensou ter visto Gina, em seu vestido de dama-de-honra, com uma expressão de repugnância no rosto. Mas foi só por um momento.
Ao casamento, seguiu-se a festa, que foi um tanto quanto animada embora Hermione não a pudesse aproveitar por completo, pois passou boa parte de seu tempo ajudando a Sra. Weasley e a tia Muriel na cozinha, como pretexto para não aceitar os incessantes convites de Vítor para que dançasse com ele. Mas o interessante de permanecer na cozinha era que presenciava-se momentos da festa no mínimo curiosos e negados aos olhos dos outros convidados.
Hermione foi, por exemplo, uma das poucas pessoas que pôde ver Harry adentrando dissimuladamente na casa quando Gina aceitou valsar com um primo de Fleur, após ter dançado com o pai e com dois dos próprios primos. Foi também a única que presenciou Jorge vendendo poções do amor para as trigêmeas escondido, para que o pai delas não visse. E foi Hermione quem forneceu para Fred e sua namorada, Mariana, alguns caramelos e docinhos de abóbora antes que esses fossem servidos para os outros convidados.
- Vão acabar com a minha dieta – comentou Mariana, enfiando um caramelo na boca.
- Lembre-me de te dar um desconto na loja por isso, Hermione – disse Fred, dando uma piscadela para a garota.
O final da festa transcorreu sem mais transtornos e já passava da meia-noite quando os noivos partiram para sua lua-de-mel em Paris. Os familiares de Fleur tinham hospedagem, mas ainda assim a Sra. Weasley insistiu que Gabrielle permanecesse n'A Toca até que a irmã voltasse. Apegara-se um pouco à garota, era um doce, ela dizia. Mas, segundo o Sr. Weasley, a esposa precisava voltar a cuidar de uma criança (mesmo que Gabrielle já tivesse doze anos), a fim de superar a recente concretização da passagem de seu primogênito à vida adulta.
Assim, amanheceram na casa no dia seguinte dez pessoas – sete Weasleys, um Potter, uma Delacour e uma Granger. Esta última sentiu-se um tanto desconfortável na mesa à hora do café. Agora que não havia primos, tumulto e bebida, todos ali podiam perceber a estranheza entre ela e Rony. Estranheza, porque não era em nada parecida com as discussões costumeiras entre os dois. Pelo contrário, esta agora não tinha olhares furtivos, nem provocações ou resmungos. Tinha apenas silêncio, o que era muito pior.
Talvez isso fosse porque, as outras brigas não vieram depois de nenhum momento realmente especial entre os dois. Agora, porém, o clima de romance estivera tão evidente que... Bem, é como dizem: quanto mais alto o vôo, maior a queda. O que Hermione ainda não sabia era que quanto maior a queda, maiores as dificuldades em se recuperar dela.
- Quando vai se mudar, Harry querido? – perguntou a Sra. Weasley enquanto colocava café na xícara do marido.
Harry pensou por um momento, enquanto corria os olhos pelos classificados de imóveis d'O Profeta Diário.
- Segundo o corretor, eu poderei retirar as chaves na imobiliária a partir de terça-feira.
- Então já podemos organizar a festança de inauguração? – perguntou Jorge, esfregando as mãos.
- Deixe com os gêmeos, Harry – pediu Fred. – Transformaremos sua nova casa numa danceteria antes que possa dizer "trolls tropeçando trazem traumas terríveis" – e deu uma piscadela.
Mariana, sentada ao lado do namorado, deu risada.
- O menino até fala o trava-línguas, se vocês não explodirem a casa dele primeiro.
- Tivemos uma festa ontem mesmo, meus pés ainda estão doendo – lembrou Gina. – Vocês não cansam?
Harry permanecia em silêncio, sem parecer concordar ou discordar do que os outros diziam. Quando o resto da mesa percebeu isso e todos voltaram-se curiosos para ele, Rony explicou, um tanto sem jeito:
- Harry não quer uma festa.
- Ora, por que não? – perguntou Jorge.
- Não levou a sério a idéia de que explodiríamos a casa, levou? – quis saber Fred.
- Levei – disse Harry, com simplicidade e um sorrisinho maroto. – Mas o problema não é esse. A questão é que eu não creio que estamos numa boa época para festas.
- Ah, cala a boca, Harry - resmungou Rony, pegando mais panquecas. - Já não basta ter dado um fora em Gina você agora vai ficar dando fora coletivo na gente por causa dessa guerra?
Ele não devia ter dito isso. Até o Sr. Weasley lançou ao filho um olhar repressor. Hermione achou aquilo o cúmulo da ignorância e Jorge encenou tacar o pote de geléia no irmão.
- O que foi? – perguntou o garoto, mal humorado.
A Sra. Weasley decidiu ignorar.
- Você terá uma festa sim, querido – declarou, olhando para Harry. – A época pela qual estamos passando pede que festejemos um pouco. Acredite, ajudará a esquecer os problemas.
Harry sorriu agradecido e encerrou-se a discussão. A festa foi marcada para quarta-feira, o dia da mudança, e todos passaram então a combinar como ela seria. Ninguém dirigiu a palavra a Rony, pois estavam todos em concordância sobre o quão rude fora seu comentário.
Mas essa não foi a única grosseria de Rony naquele dia. Pelo contrário, ele passou o domingo todo sendo ranzinza com as pessoas à sua volta. Talvez fosse vingança pela maneira como foi tratado durante o café, ou provavelmente um desconto porque desta vez ele não estava alcançando sua cota de discussões com Hermione.
O fato é que, ao final da tarde, estavam todos tão cansados dele que Gina viu necessidade de tomar uma atitude e convocou uma reunião extraordinária.
Ela entrou no quarto dos gêmeos e trancou a porta, enquanto verificava se estavam todos ali. Gabrielle se esticara pela cama de Jorge, deixando um pequeno espaço para Harry sentar. Na outra cama estavam Jorge, Mariana e Fred. Mariana estava sentada entre as pernas abertas do namorado, que a abraçava por trás.
- Temos certeza de que não seremos ouvidos? Onde está Rony?
- Desgnomizando o jardim – comunicou Harry. – E Hermione?
- No meu quarto, lendo. Não parece muito sociável, então eu não creio que vá sair de lá tão cedo.
Gina puxou então para perto de si um pufe de couro muito velho e sentou-se sobre ele.
- Bom, algum de vocês imagina por que os reuni aqui?
- Para nos dar os doces que sobraram da festa? – perguntou Fred, com um sorrisinho.
- Parra nos convidarr parra un passéie? – sugeriu Gabrielle.
- Para nos lembrar do quão desagradável o nosso irmãozinho vem sendo nas últimas vinte e quatro horas desde que brigou com Hermione e para que juntos possamos bolar um plano para unir os dois?
Gina deu uma breve risada.
- Exato, Jorge.
- Puxa, foi só um palpite – disse o menino, fingindo corar.
- E você já tem um plano, Gina? – quis saber Mariana.
A garota fez que sim com a cabeça.
- Sim, foi por isso que trouxe isto – explicou, indicando a rosa que trazia em mãos, que não por acaso era a mesma que Rony dera a Hermione na véspera.
- Oh, pensei que tinhe trrazide parra enfeitarr o quarte! Está prrecisande.
Gina voltou-se sorrindo para Gabrielle, mas seu sorriso logo desapareceu, quando percebeu que a menina não estava sendo irônica. Ela voltou então os olhos para Harry e, percebendo que ele se segurava para não rir, lhe lançou um olhar do tipo "quem foi que convidou essa menina?".
Harry então sorriu para ela, que por um instante se sentiu...
"Concentre-se, Gina!" pensou, dando um tapa mental em si mesma. Não podia ficar pensando nessas coisas.
- Bom, o meu plano é efetuar a reconciliação por meio de chantagem emocional.
- Sempre um golpe baixo – comentou Fred.
- Creio que Mariana conhece um pouco de magia avançada e poderá nos ajudar nisso – disse Gina. - Enfeitiçaremos esta rosa para que suas pétalas caiam durante quatro dias, contando de hoje até a festa da mudança de Harry. Antes do cair da última pétala, Rony terá de voltar a amar e ser amado por Hermione, ou... – pronunciou esta última palavra em tom de ameaça e fez uma pausa de suspense antes de anunciar: - nunca mais será amado por ninguém.
A garota permaneceu na expectativa, esperando que os outros tivessem gostado de seu plano. Durante vários segundos, porém, tudo o que recebeu foi olhares perplexos.
Quem quebrou o silêncio foi Harry, dizendo, com cautela:
- Gina, não sei se você já ouviu falar em contos de fadas...
- Sim, Hermione me falou sobre – ela confirmou, incentivando-o a prosseguir.
- Não quero que se ofenda, mas... – ele parecia com medo de falar – isso parece um deles.
Gina pensou por um momento e acabou abrindo um sorriso.
- E isso é ruim? Se a definição que eu tenho está correta, nesse tipo de história tudo sempre dá certo no final.
- Sim, mas... – Harry parecia inconformado – não são histórias reais.
- E que parte lhe parece surreal? – quis saber Gina, colocando uma mão na cintura. – A parte em que a princesa é enfeitiçada? Aquela em que o príncipe enfrenta um dragão? – perguntou, ironicamente. – Ou a parte em que o mocinho enfrenta o vilão sem nunca renunciar à sua amada?
Harry pareceu congelar após essa última pergunta, enquanto Gina continuava com a mão na cintura, tentando parecer irredutível, embora seu rosto estivesse adquirindo um tom semelhante ao de seus cabelos.
Fred ergueu uma sobrancelha, Jorge soltou um inaudível "uau" e Mariana mordeu o lábio inferior. A única que aparentemente não percebera a indireta de Gina fora Gabrielle. Ela continuava com o nariz torcido e os braços cruzados quando comentou:
- Patetíque!
- O que é patético? – perguntou Harry que, em alguns segundos, esquecera o assunto de que tratavam.
- Por que meu plano é patético, Gabrielle? – disse Gina, desinteressada.
Gabrielle respondeu como se aquilo fosse óbvio.
- Porr que non vai darr cerrto! – disse, exaltada.
Gina fez pouco caso dela e voltou-se para os outros.
- Mais alguma objeção?
Os gêmeos balançaram a cabeça.
- Se Rony não voltar correndo para Hermione... – começou Jorge.
- ... pelo menos vai parar de nos incomodar por uns dias – Fred completou.
- É uma ótima idéia!
- Surpreendente que não seja nossa.
- É nossa, Fred, esqueceu?
- Verdade, e nós deixamos nossa irmãzinha usá-la.
- Como somos bonzinhos!
Mariana deu uma risadinha e beijou de leve o namorado.
- Também gostei de seu plano, Gina – anunciou, colocando uma mecha de cabelo castanho para trás da orelha. – Pode contar com a minha ajuda.
- Obrigada aos três – disse Gina, em seguida voltando-se para Harry e Gabrielle. – E quanto a vocês?
Harry assentiu com a cabeça, conformado.
- Eu ajudo.
- Se non há outrro jeite... – falou Gabrielle, dando de ombros.
Gina sorriu. Agora tinha o apoio de que precisava para pôr seu plano em prática e resolver as diferenças entre seu irmão e sua amiga. Após uma consulta ao Manual de Feitiços do sétimo ano (que pertencera aos gêmeos e que a Sra. Weasley guardara para Rony), eles encantaram a rosa e a colocaram numa cúpula de vidro para que ficasse protegida.
Foi combinado que Rony saberia de sua condição logo após o jantar, para que começasse a correr atrás do prejuízo. Mas ninguém queria enfrentar a fúria do garoto quando ele descobrisse o que eles estavam tramando. Então os outros decidiram que Gina é quem deveria fazer isso, uma vez que fora tudo idéia dela (nesse momento os gêmeos não tentaram alegar que venderam o plano para a garota).
E eles tinham razão de temer essa tarefa pois, quando Gina contou tudo a Rony ele ficou uma fera.
- Você está brincando comigo, não é? – ele perguntou, com violência.
Gina fez que não com a cabeça, achando graça na raiva do irmão, que caminhava de um lado para o outro, resmungando palavrões.
- E se eu não quiser amar Hermione?
- Mas eu acabei de perguntar, e você confessou que...
- Isso não lhe dá direito algum! – ele sibilou, quase partindo para cima de Gina. – Você não pensou nas conseqüências do que fez? Pode arruinar toda a minha vida amorosa!
Gina ergueu uma sobrancelha e, sentada na cama de Rony, cruzou as pernas e apoiou o queixo no punho.
- Quer dizer então que você pensou nas conseqüências do que fez com Hermione?
- Já disse que isso não vem ao caso! – Rony bateu com força o pé no chão e quase gritou. Isso fez com que Pichitinho começasse a voar em círculos pelo quarto e a piar agitado, e o garoto ficou ainda mais nervoso.
- Claro que faz, Rony! – insistiu Gina, ignorando a coruja. – Você quer ficar com Hermione de qualquer maneira. Você gosta dela, ou não teriam brigado por ciúmes. E foi por ciúmes sim, não discuta! – acrescentou, quando ele ficou ainda mais vermelho e pareceu querer revidar. Ela continuou após uma pausa: - De qualquer forma vocês ficariam juntos. Eu só dei um jeito de acelerar as coisas.
Rony andou e xingou mais um pouco enquanto a irmã aguardava pacientemente por uma palavra final. Após alguns minutos, ele finalmente parou e aproximou-se da rosa na cúpula, que Gina lhe entregara. Perguntou como funcionava e Gina lhe explicou, pela segunda vez. Ao final da explicação, ele assentiu com a cabeça parecendo mais calmo, mas nem por isso menos ressentido.
- E o que acontece se a flor morrer antes dos quatro dias? – ele quis saber, com uma sugestiva curiosidade.
Com ar inocente, Gina respondeu:
- Ah, se isso acontecesse o efeito do feitiço acabaria antes e você teria menos tempo para cumprir a sua tarefa.
Rony engoliu em seco. Aquela flor que ele arrancara do jardim na manhã do dia anterior, com a melhor das intenções, estava agora ali, flutuando dentro de uma cúpula e ameaçando mudar sua vida drasticamente. Não era um pensamento animador.
- Quem te ajudou com isso?
- Ninguém – ela mentiu, conforme combinado. – Acha que eu precisaria de ajuda para saber que tem algo errado na sua vida?
- Não – respondeu Rony, erguendo os olhos para ela. – Acho que você ainda não pode fazer magia fora da escola.
Por essa Gina não esperava. Seu irmão estava sendo mais perspicaz que de costume. Mas ele não iria tapeá-la com tamanha facilidade.
- Eu roubei a varinha do papai e fiz o feitiço – respondeu, dando de ombros. – E é bom você não contar isso a ninguém, ou eu terei de contar a Hermione sobre a aposta que você e Harry fizeram para ver quem consegue beijá-la primeiro.
O garoto piscou os olhos, espantado.
- O quê?! Mas eu não... Harry nunca...
- Eu sei, eu sei, Harry nunca se interessaria – concordou Gina, balançando a mão com impaciência. – Mas Hermione não sabe.
Rony abaixou mais uma vez a cabeça, pensativo. A cada vez que ele fazia isso, parecia ficar mais resignado com a situação em que fora colocado. Desta última vez, finalmente, ele ergueu os olhos para a irmã, quase triste e, com as orelhas vermelhas, perguntou:
- E se ela não me quiser?
Gina deu um sorrisinho e levantou-se da cama.
- Se ela não te quiser nós passaremos para o "plano B" e a executaremos ao pôr do sol, está bem? – sugeriu, em tom de brincadeira.
E, vendo o irmão sorrir, abandonou o quarto. Quando ela alcançou o andar debaixo, Harry e Jorge a esperavam.
- E então, como foi? – quis saber Harry.
- Ele já desistiu?
- Não, eu até diria que ele aceitou bem – considerou Gina. E então, esfregando as mãos: - A partir de amanhã poderemos assistir a transformação da nossa ferinha em príncipe encantado.
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Nota da autora: Espero que estejam gostando da fanfic, que estou escrevendo com muito carinho. O trava-línguas sugerido por Fred não foi invenção minha – ele é citado em um dos meus livros favoritos, "Ártemis Fowl e o Código Eterno", de Eoin Colfer. E a penúltima fala de Gina na conversa com Rony é em homenagem a todos os anti-H², especialmente à minha beta-reader, que vem me ajudando para caramba, a Bety.