Apartamento de Armando
Véspera de Natal
7:40 PM
Armando, de calças de moletom e camiseta branca, está encostado na bancada da cozinha, observando o micro-ondas esquentar uma lasanha congelada. Roni passa pelas pernas dele com uma bolinha de tênis na boca, abanando o rabo.
Armando se serve de uma garrafa de vinho branco que já está pela metade. Roni solta a bolinha nos pés de Armando.
ARMANDO: - Agora não.
Armando bebe um gole do vinho. Roni late.
ARMANDO: - (MAU-HUMORADO) Roni, dá um tempo.
O micro-ondas apita. Armando tira a lasanha e pega um garfo da gaveta. Tenta comer. Faz cara de nojo.
ARMANDO: - Meu deus, que coisa deprimente. (PARA RONI) Você quer?
Armando aproxima a bandeja do nariz de Roni. Ele cheira e se afasta.
ARMANDO: - É, imaginei que não.
Armando joga a lasanha no lixo, pega a taça de vinho, a garrafa e sai da cozinha.
[corte]
Na sala, Armando se joga no sofá. À sua frente está a árvore de Natal que montou com Betty. Os pisca-pisca estão ligados e são a única luz do ambiente. Roni sobe no sofá e deita-se ao lado de Armando. Armando larga a taça na mesa de centro e dá um gole no gargalo da garrafa.
ARMANDO: - Somos só nós dois hoje, Roni.
Roni choraminga.
ARMANDO: - É, eu também não estou feliz, meu amigo.
Armando faz carinhos nas orelhas de Roni. Suspira. Roni se ergue nas patas dianteiras, levantando as orelhas, em alerta. Sai correndo de repente, entrando no corredor que dá para a porta de entrada.
ARMANDO: - Que bom, até o cachorro me abandona.
Roni volta correndo e começa a puxar Armando pela calça.
ARMANDO: - Que foi, Roni?
Roni solta Armando e começa a latir.
ARMANDO: - Roni, para com isso!
Roni sai correndo de novo, na direção da porta. A campainha toca.
Armando franze o cenho, estranhando.
ARMANDO: - Mas era só o que me faltava... Eu vou matar esse porteiro! Mania que ele tem de não interfonar mais!
Armando entra no corredor que dá para a porta de entrada do apartamento. Roni está impaciente em frente à porta.
ARMANDO: - (SEM ENTENDER) E a ti que te passa, Roni?!
Armando abre a porta.
Betty, vestindo um casaco de lã com capuz e um cachecol para espantar o frio, olha para Armando. Ela morde o lábio, apreensiva.
ARMANDO: - (SURPRESO) B-Beatriz...
Roni passa por Armando o empurrando e fica saltitando ao redor de Betty. Ela ri e se abaixa para afagar a cabecinha do cachorro.
BETTY: - (RINDO) Oi, Roni...
Roni choraminga e tenta lamber Betty, animado. Armando observa a cena e não consegue evitar o sorriso.
ARMANDO: - Acho que alguém estava sentindo a sua falta.
Betty se levanta, sorrindo. Seu olhar cruza com o de Armando e ela respira fundo, sem graça.
ARMANDO: - Q-quer entrar?
Betty acena afirmativamente com a cabeça e Armando se afasta da porta, abrindo espaço. Ela entra, indo na direção da sala. Armando fecha a porta e a segue.
Betty mostra uma sacola de papel.
BETTY: - Eu trouxe comida.
Betty coloca a sacola sobre a mesinha de centro. Vira-se para Armando.
Os dois se olham profundamente.
Betty respira fundo, tomando coragem.
Armando a observa, ansioso.
Ela tira o capuz que veste.
O anel Claddagh, no dedo de Betty, brilha à luz dos pisca-pisca. Armando percebe.
BETTY: - Armando, eu queria dizer que...
Armando, num ímpeto, dá alguns passos na direção de Betty, a envolvendo num abraço apertado que mistura saudade e alívio. Ele afunda o rosto nos cabelos de Betty e começa a chorar copiosamente.
ARMANDO: - (CHORANDO) Beatriz, meu amor, meu amor...
Betty o abraça com força, soltando o ar que segurava nos pulmões, se deixando afundar nos braços de Armando, que tenta segura-la enquanto seu corpo inteiro treme em soluços. Betty derruba lágrimas silenciosas.
BETTY: - (SUSSURRANDO) Me desculpa, Armando...
ARMANDO: - (CHORANDO) Desculpar o que? Não tem nada pra desculpar, mi vida.
Armando se afasta de Betty o suficiente para olha-la nos olhos.
ARMANDO: - Eu esperaria para sempre, Beatriz. Para sempre.
Betty faz carinhos no rosto de Armando, secando as lágrimas que correm. Ele sorri.
BETTY: - Você não foi o primeiro homem que eu amei, Armando.
Armando franze o cenho, sem entender o que Betty diz. Ela sorri, docemente.
BETTY: - Mas você foi o homem que tornou qualquer outro amor completamente e irremediavelmente... irrelevante.
Armando abre um sorriso de felicidade completa. Os olhos dele ficam marejados. Ele segura o rosto de Betty entre suas mãos.
ARMANDO: - Pois você, Beatriz... você... você sim foi a primeira mulher que eu amei. A única.
Uma lágrima corre pelo rosto de Betty. Armando a puxa para um beijo. Quando os lábios dos dois se tocam, Armando suspira de alívio. O beijo vai se tornando cada vez mais apaixonado e sedento até que os dois se agarram, desesperados.
