Experiências científicas e a vida
Apartaram-se do beijo rapidamente pela chegada de um intruso. Não puderam impedir, no entanto, a aura de constrangimento que se instaurou na copa. Shun sentia-se realmente culpado por chegar em um momento tão inoportuno. Marin apiedou-se do rapaz, afinal a culpa era deles. Aiolia apenas estava irritado por interromperem sua diversão.
Murmurando desculpas inaudíveis, o estagiário rapidamente se retirou.
- É melhor pararmos por aqui!
- Por quê? Qual o problema? Era só o Shun, um estagiário!
- Ah, Aiolia! Não fale assim! Soa tão arrogante...
- Hun?... É só a verdade!
- Não sabia que tinha esse tipo de pensamentos mesquinhos.
- Lá vem você com essas conversas. Não precisamos esconder nada de ninguém. Todos sabem que a gente se ama! E que tal voltar para onde paramos? – disse sorrindo enquanto tentava capturar a ruiva em seus braços novamente.
- Sim voltaremos... mas não agora! Por enquanto talvez seja melhor conferir a projeção produtiva baseada naqueles estudos de tempos, feito pelo Shaka, não é mesmo, 'senhor engenheiro de automação'? – Falou desvencilhando-se do abraço e saindo rapidamente da cozinha. Contrariado, Aiolia foi obrigado a fazer o mesmo.
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Shun, que voltou à copa após observar discretamente a saída do casal, levava café e biscoitos recheados com chocolate para uma determinada sala. Evidentemente não fazia parte de sua função de estagiário servir café, principalmente seguindo tantas exigências quanto ao seu teor ou a qualidade do biscoito, mas o fazia ainda assim. Percebia que o humor de seu 'chefe' melhorava substancialmente com esses pequenos mimos. Hyoga, atento às gentilezas do estudante, acabou por se sentir curioso quanto aos seus motivos.
- Shun...
- Sim?
- Se fosse outro, que não eu, seu chefe, também serviria biscoitos pra ele? – mais que apenas curiosidade transparecia em sua voz.
- Certamente! – respondeu com simplicidade.
Um rápido laivo de decepção piscou na face do rapaz loiro que recebia o café. Vários papéis, jornais, e um notebook jaziam sobre a mesa aguardando por atenção, enquanto seu olhar perdido fixava a quina do mogno. Afinal tudo era meramente profissional.
- Mas – a pequena palavra, uma simples conjunção adversativa, teve o poder de conquistar totalmente sua atenção – não colocaria o recheio de chocolate no biscoito. – ainda com a bandeja na mão, o olhar baixo, o rosto tímido enrubescido, Shun completou a frase quase sussurrando. No entanto, foi o suficiente para ascender uma expressão de contentamento em Hyoga. Não, nem tudo era só trabalho.
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Afrodite, ao ver o rapaz levando a bandeja com uma jarra e biscoitinhos de côco com recheio de chocolate empilhados certinhos caprichosamente, meneou a cabeça. As pessoas às vezes eram tão óbvias!
Andava em direção à sua própria mesa no escritório, seus cabelos ondulando em cada passo, sua pose impondo a beleza que possuía ao ambiente. Tinha consciência do fascínio que causava, se adaptava a ele e até o alimentava, subitamente teve uma conhecida sensação de estar sendo observado, os olhos instintivamente sabiam pra onde se direcionar e viu que o 'carcamano', sempre sarcástico e mal humorado, desviou rapidamente sua mira. As pessoas às vezes eram muito óbvias, mas isso não as deixava menos estúpidas.
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O italiano fingia ler os papéis que estavam em suas mãos apoiadas sobre sua escrivaninha. Não tinha idéia do que estava escrito, se é que realmente algo fora impresso neles, talvez fosse apenas uma folha de papel em branco. O fato era que Afrodite tinha acabado de passar. E quando isso acontecia o mundo parava. O casal saindo vermelho da copa, o menino com a bandeja, eram apenas sombras no instante que a luz do mundo resolvia se levantar.
Via, todos os dias, o rapaz alto caminhar pelo escritório, a gravata levemente folgada a balançar com os seus movimentos, a camisa branca se alinhando ao peito, as calças pretas ajustadas às pernas, um relógio grosso no punho esquerdo e deslumbrava o olhar do italiano. Um traje simples, banal, mas qualquer coisa que o sueco vestisse o deixaria bonito. Era uma característica, Marco estava convicto disso.
Chegava mais cedo apenas para ter o prazer de vê-lo entrar. Posicionado estrategicamente em uma mesa nas costas de Afrodite, tinha a dupla vantagem de poder admirar seus belos cabelos sem ser visto e ainda, observá-lo todas as vezes que se levantava para tomar água, café, pegar impressões ou qualquer outra coisa. Encontrara a beleza e fora subjugado por ela, o problema era que não sabia o que fazer, muito menos como agir.
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Mu vira quando Milo subiu desatento em direção à sala de Camus. Quando Aiolia e Marin foram até a copa. Shun e seu famoso pratinho de doces, e Marco prendendo a respiração com os passos de Afrodite. A vida acontecia e ele gostava de admirá-la, ver seus desenlaces. Viver era uma arte e uma ciência, e ele era um cientista, a estudava, porém nunca se envolvia. Gostava de pensar que dessa forma passaria por ela incólume, mesmo que perdesse parte dos encantos que proporcionava.
Uma leve trombada interrompeu o curso de seus pensamentos, olhos de um profundo azul o fitaram arrogantemente. Não soube precisar bem o quê, mas algo nesse indiano, definitivamente, o incomodava. Afinal, observá-lo era apenas um de suas experiências, sem envolvimentos, claro...
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Abrir os olhos revelou-se mais difícil que fechá-los. De olhos fechados era possível sonhar com várias dimensões que poderiam substituir a verdadeira realidade. Mas abrir os olhos era necessário, e foi à contra gosto que o fez. E observou os de Milo o observando ternamente. Todas as palavras lhe pareciam absurdas, todo o torvelinho em sua mente era muito recente para que pudesse assimilá-lo. Acostumado com a lógica e a razão comandando durante toda sua vida sentia-se perdido ao ser obrigado a encarar a entrega de parte tão profunda de si para alguém. Como ele conseguira?
- Bem, vou voltar ao trabalho. Volto mais tarde para almoçarmos, você pode?
Palavras banais. Não havia pensado na existência delas como uma possibilidade de diálogo, e Milo sorria ao pronunciá-las, parecia fácil pra ele. Nem sempre o 'agora' era o momento mais adequado e, certamente, aquele não era o mais indicado para discutir por quês e atitudes. Deixar-se levar. Tentaria aprender o significado disso.
- Posso! – e seus olhos brilharam.
Agradecimentos afetuosos a todos que lêem!
Problemas pessoais impediram a postagem da fic, mas aí está de volta!
Um beijo realmente especial à vcs! XD
