Capitulo 03 – Dejá vu

Depois de tomar um banho relaxante e quente, Ben sentou-se na cama, observando os presentes que havia ganhado naquele dia. Até mesmo Kevin lhe deu uma lembrança, era uma pequena caixinha preta.

Ao abrir, encontrou uma corrente com um cadeado. Lembrou que aquele era o colar que o moreno costumava usar quando se conheceram. Não fazia tanto tempo, mas parecia pertencer a uma época distante.

A carta de Gwen era longa, mas repleta de sentimentos. Foi bom saber que era tão querido pela sua prima e que amadureceram juntos, se tornaram melhores amigos com o passar do tempo.

O distintivo do vô Max fora guardado com muito carinho no bolso da jaqueta, agora sempre usaria como se fosse seu. Nunca conseguiria esquecer o quanto aquilo representava para ele. O sono veio rápido e em menos de dois minutos, encontrava-se dormindo profundamente, chegando a roncar.

Acordou no meio da noite, com um barulho na janela. Ainda zonzo Ben se levantou e abriu-a, percebendo que Kevin estava lá em baixo, ao lado do carro.

-Ei, desce aqui, preciso falar com você! –o moreno falou o mais baixo que pôde, não queria acordar os vizinhos.

-Espera aí!

Ben transformou-se em Big Chill e voou de encontro ao amigo, que possuía um sorriso malicioso estampado nos lábios.

-Você adora me acordar de madrugada né? –ele voltou à forma humana, vestindo apenas calça de moletom.

-Como você descobriu? –o outro colocou a mão sobre o peito, fingindo estar magoado com as palavras do amigo. –Coloca uma camisa, vamos sair.

-O que? Acho que você não tem relógio...

-Realmente, quando é pra te encher o saco, não tenho hora. –Kevin disse, dando um sorriso sarcástico. –Mas não vim aqui pra isso, coloca uma camisa e vam'bora.

Depois de alguns minutos de espera, Ben voltou ao carro. Usava uma blusa verde, um casaco preto, calça jeans e um par de adidas. Parecia estar com um pouco de sono ainda, porém a empolgação aos poucos acabava com qualquer desejo de dormir.

-Aonde vamos?

-É segredo...-o moreno entrou no Camaro, abrindo a porta do carona. –Senta aí...

Ben percebeu que havia um silencio incomodo no carro e isso o deixava constrangido. Parecia que Kevin gostaria de dizer alguma coisa, mas se mantinha calado, apertado o volante.

-Então...Ham..-o dono do Omnitrix limpou a garganta. –Obrigado pelo presente.

-Ah, de nada. Machucou quando joguei a caixinha na sua cabeça?

-Não, nem um pouco... –ele ainda podia sentir um galo perto da nuca. –Por que você me deu o colar?

-Me deu vontade, ta?! –Kevin comentou, fazendo uma curva fechada.

-Eu só queria saber o motivo! Até parece que perguntei algo tão íntimo assim...

-Apenas me lembrei esses dias, que você comentou na época que achava meu colar legal. –o moreno respondeu a contra gosto, não parando para respirar. –Achei que você ia gostar de ganhar como presente. Satisfeito?

-Ok...Tudo bem.

O Camaro foi estacionado na frente de um pequeno galpão na área industrial de Bellwood. O lugar não era realmente onde Ben achou que poderia estar naquela noite. Pensou até que Kevin ia levá-lo para uma boate ou coisa parecia, entretanto nunca imaginou estar em um galpão.

Mas decidiu não argumentar muito, porque o moreno exibia um olhar homicida, caso fosse perguntado o porquê estarem ali. Sendo assim, entrou no lugar, tentando se acostumar com a escuridão do interior.

Conseguiu apenas distinguir formas estranhas e isso o assustou. Quando menos esperava, as luzes foram acessas e ouviu apenas um berro coletivo:

-FELIZ ANIVERSÁRIO BEN!

-Hã? –ele olhou a sua volta, não acreditando.

Várias pessoas queridas estavam lá: sua prima, filhos de Encanadores, alienígenas que eram seus parceiros...Era maravilhoso ver tantas peças importantes de sua vida ali, todavia, faltava alguém. Por mais que Ben estivesse radiante, sentia saudades imensas de seu avô.

Desde que o idoso foi tragado para o Vácuo Nulo, achou que não suportaria viver naquela angustia por muito tempo. Travou uma batalha interna, para se convencer que de que Max não gostaria de vê-lo sofrer.

Sabia de seus deveres e que deveria ser forte, que não podia fraquejar em momento algum. Mas era difícil, ainda mais para um adolescente que ainda está crescendo. Era muita responsabilidade para um garoto com 18 anos.

-Estava procurando por mim, Ben? –uma voz masculina perguntou.

No momento em que ele se virou para ver quem era, seu coração gelou dentro do peito. Isso era uma brincadeira de mau gosto, uma espécie de alucinação causada pelo excesso de Chilli Fries antes de dormir, só podia ser isso.

Felizmente, era verdade.

-VOVÔ! –ele saiu correndo e se atirou nos braços do senhor de meia idade, que o abraçou longamente.

Por muito tempo, Ben achou que esse momento nunca mais fosse acontecer. Como era bom sentir o cheirinho da camisa havaina do velho, suas mãos sempre quentes fazendo carinho nos cabelos, a voz levemente rouca gargalhando, ao ver a emoção do neto...

-Como...? –não conseguia segurar as lágrimas.

-É uma longa história, mas tive ajuda de Gwen e Kevin. –Max respondeu, sorrindo de orelha a orelha. –Então, vamos comemorar seu aniversário ou ficar chorando?

-É muito bom ver você de novo, vô. –a ruiva comentou, também chorando. –Você fez muita falta...

-Prometo que não vou mais me arriscar daquele jeito. –o senhor colocou a mão sobre o peito, solene. –Foi muito difícil sem vocês por lá...E devo muito a você, Kevin. Ajudou-me a sair...

-Não foi nada...-o moreno sentiu o rosto corar um pouco. –Agora vamos festejar!

A festa seguiu noite adentro, como se não houvesse amanhã. Ben sentiu finalmente que estava completo, não havia mais aquela sensação de vazio dentro do peito. Todos que amava estavam ali, a não ser seus pais, que ainda não sabiam sobre sua "vida dupla".

—X—

Quando estavam deixando o galpão, depois da festa, Ben notou algo brilhando no céu.

-O que será aquilo? –Ben comentou, apontando para o ponto extremamente brilhante. –Será que é uma estrela? Ou será um avião?

-Está muito grande pra ser uma estrela...-Max respondeu, coçando a barba branca.

-Eu...Conheço essa energia... -Gwen disse, não desgrudando os olhos do brilho. –Não pode ser verdade! Acho que pertence ao...

-Mike Morningstar! –Kevin completou a frase, sentindo o corpo tencionar conforme o brilho se aproximava. -Esse rastro purpurinado de traveco não me engana!

Numa velocidade impressionante, o feixe brilhante se chocou contra o solo na frente de grupo, que se protegeu dos estilhaços. Os cabelos loiros de Mike estavam maiores e desalinhados, a face parecia anêmica e o corpo extremamente magro. Nada daquilo lembrava o que ele outrora foi. Era a verdadeira imagem da desolação e sofrimento.

-Ora, ora vejam só... Parece que sua festa está maravilhosa, Ben. –Mike comentou maquiavelicamente, enquanto caminhava na direção do grupo. –Pena que vou ter que estragá-la...

-Não se aproxime dele! –Kevin absorveu o concreto do chão e saiu correndo para acertar o oponente.

-Acho melhor você ficar quieto, Levin!

Morningstar lançou uma onda de energia que grudou na casca de concreto que o moreno criou, sugando seus poderes. Kevin berrava de dor e lentamente se ajoelhava, sentindo seus poderes e a força sendo levados embora. Era diferente da última vez em que encontraram, agora não haviam limites para as maldades que cometia.

-Solte-o agora! –Gwen disse, sem alterar o tom sério da voz. –Ou eu acabo com você.

-Minha querida...Estava morrendo de saudades de você. –Mike largou Kevin no chão, inconsciente.

De uma maneira surpreendente, o adolescente loiro parecia estar rejuvenescendo. A pele ganhava mais cor e parecia menos enrugada, seu corpo ganhava mais peso e massa muscular, contudo a aparência anêmica persistia.

-Venha cá, quero lhe dar um abraço...-ele se aproximava, com os braços estendidos.

-Eu te avisei! –a ruiva ameaçou, lançando bolas de energia na direção dele.

Uma parede brilhante elevou-se do chão, protegendo Mike dos ataques e absorveu sua energia. Isso reanimou ainda mais o corpo dele, que não apresentava mais os sinais de desgaste.

-Obrigado, Gwen. Agora meu poder foi restabelecido. –o loiro sorriu de modo sarcástico. –Pena que você não estará ao meu lado quando eu governar o mundo...

Com essa frase, ela foi lançada no ar para muito longe, por um raio extremamente forte de luz. Max correu para o trailer, tentando achar alguma arma que fosse capaz de mandar Morningstar para o Vácuo Nulo. Nesse meio tempo, os filhos de Encanadores se transformaram em sua metade alienígena para conter os ataques de Mike.

Aproveitando que o inimigo estava ocupado demais combatendo os outros, Ben correu na direção de Kevin e tentou acordá-lo.

-Você se machucou muito?

-Não... –o moreno se sentou, ainda tonto. –E Gwen?

Assim que Kevin fez a pergunta, Ben sentiu o corpo gelar. Toda aquela situação era tão...Familiar. Quando estava a dez passos do corpo de sua prima que jazia no chão, a sensação aumentou ainda mais, quase o sufocando.

O barulho do tênis no concreto enquanto corria na direção do corpo...Suas mãos balançando Gwen, que não respondia a nenhum de seus apelos...O filete de sangue que escorria da têmpora direita e que se misturava com o cabelo ruivo dela...O soco de raiva de Kevin contra o chão e seu berro desesperado de ódio e raiva...

Por que? Por que aquilo tudo estava acontecendo?

Tinha que ser mentira. Não podia ser verdade. Gwen não poderia ter morrido daquela forma...Não mesmo. Sim, é um pesadelo. Claro, só pode ser. É a única explicação plausível.

Ben percebeu que lágrimas quentes escorriam e molhavam o rosto. Ao levantar, seu olhar encontrou o de Kevin.

-Eu vou matar Mike. –o moreno afirmou, seu maxilar duro de raiva. –Não tente me impedir.

Ele pensou em dizer alguma coisa, mas sua boca abriu e fechou, completamente mudo. Não conseguia falar nada, as palavras morriam na garganta. Ficou apenas observando seu melhor amigo correndo de encontro ao inimigo, usando de toda a sua força.

-Isso parece o Dejá vu do meu pior pesadelo...-Ben constatou, ao saber dos movimentos de Kevin, antes mesmo dele aplicá-los.

E o pior de tudo é que o dono do Omnitrix, de alguma maneira conhecia o final daquele encontro com Morningstar. Mesmo assim, queria acreditar que poderia ser diferente. Que o inimigo não iria fugir, que não iria perder sua prima...