Capítulo 04 – Despedidas
Ben colocou lentamente o terno preto, sem motivação. O tempo ensolarado era o total oposto do que sentia por dentro. Se a atmosfera pudesse expressar o que seu coração sentia, provavelmente estaria caindo uma chuva gelada e as nuvens cobriram todo o céu, com tons escuros de cinza.
Por mais que desejasse chorar, não havia mais lágrimas para derramar. Estava exausto e não queria pensar muito sobre o que acontecia ao seu redor. Para suportar toda essa situação, ele preferiu se fechar em seu mundo particular.
Nos mundo dos pensamentos, Gwen ainda estava viva e sorridente. Nunca soube de fato o que sentia por ela, se era uma grande amizade ou algo a mais. De qualquer maneira, era uma pessoa importante e que não poderia ser substituída.
"Ninguém é substituível..." Ben disse a si mesmo, corrigindo a linha de raciocínio.
Deixou o quarto e desceu as escadas, chegando na sala. Kevin estava sentado no sofá, parecia pensativo. Os dois se olharam e sem dizer uma palavra, saíram da casa e entraram no Camaro.
Dessa vez não ligaram o rádio, não gargalharam das piadas que faziam e não pararam no Mr. Smoothie. Dessa vez, não havia Gwen. E dali em diante, nunca mais haveria.
—X—
O portão de ferro trabalhado guardava a entrada do cemitério de Bellwood. Eles entraram e rumaram até o túmulo da saudosa amiga. O enterro aconteceu horas atrás, mas preferiram fazer algo separado dos outros familiares.
Os três tinham uma relação mais profunda que a maioria das pessoas podia compreender. E isso não seria interrompido pela morte, pelo contrário. O sentimento que palpitava em seus corações era ainda maior, a chama da amizade ardia com tanta força que chegava a doer.
Ben sentia isso na alma. O amor que nutria por Gwen, não importando a natureza, se remexia no peito e causava falta de ar. Queria tanto colocar para fora, mas não sabia como e tinha medo de acabar destruindo algo tão belo com palavras efêmeras.
-Trouxe rosas amarelas...Gwen. –Kevin disse, sua voz era rouca e profunda.
O moreno depositou o buquê imenso sobre a grama verde, em frente a lapide, de maneira delicada. Seus olhos exibiam contornos vermelhos, indicando que havia chorado muito na noite anterior, mas não desejava conversar sobre isso.
Nunca soube como lidar com essas situações e se achava incomodado com a morte. Era duro pensar que não poderia ver mais aquele sorriso novamente, não poder cheirar o perfume delicado que a pele de Gwen exalava ou então ter sua companhia no banco do carona.
E o que faria agora? Sentiu-se completamente perdido. Era ela que unia o grupo e equilibrava as forças tão opostas que ele e Ben representavam. Não existia nada que pudesse trazê-la de volta. Nenhuma tecnologia alienígena era capaz de realizar seu desejo.
-O que vamos fazer? –ele perguntou, percebendo que a voz saiu grossa demais.
-Não sei. Uma parte de mim quer acabar com o Mike, mas isso não vai trazê-la de volta. –Ben respondeu, olhando para as nuvens que atravessavam o céu lentamente.
-É...Mas não consigo pensar na idéia de que ele está por ai, livre e impune. –Kevin comentou, segurando o amigo pelos ombros. –Eu preciso fazer alguma coisa!
-Eu sei como você se sente...-sua voz era calma e controlada.
-Não Ben, você não sabe o ódio que sinto por ele. -os olharem se encontraram. –Você não sabe.
-Não podemos passar o resto de nossas vidas remoendo isso dentro de nós. –o dono do Omnitrix sentiu que a pressão aumentava nos ombros. –Ela não ia gost...
-FODA-SE! –ele berrou, largando Ben e virando-se de costas. –NÃO ADIANTA FAZER SUPOSIÇÕES! ELA NÃO ESTÁ AQUI!
-Kevin...
-NÃO AGUENTO MAIS ISSO!
-Calma...Vamos conversar. –ele se aproximou, colocando a mão nas costas do amigo. –Calma...
-Ela...Não está aqui...Nunca mais vai...Voltar.
Ben nunca acreditou que poderia ver Kevin chorando. Toda a imagem de dureza e autoconfiança desmoronou, revelando uma pessoa frágil e de certo modo sentimental. Ficou ali, ao lado do amigo, que não conseguia parar de chorar, enquanto sol se deitava no horizonte.
-Eu vou atrás dele sim, Ben. Me desculpe, sei que você não vai me apoiar, mas preciso acabar com a vida dele. –Kevin disse, seu semblante sério. –Ela também não iria concordar, se eu ficar parado, vou enlouquecer.
-Kev...Espere!
-Adeus, Benjy.
Sem espera por uma resposta, o moreno deu um abraço de despedida no amigo e saiu do cemitério.
-KEVIN! –Ben berrou a plenos pulmões, enquanto corria para alcançá-lo. –NÃO, POR FAVOR! VOLTE...NÃO FAÇA ISSO! KEVIN!
Porém era tarde demais, os pneus do Camaro soltaram uma leve fumaça conforme Kevin acelerava o carro e partia. Mais uma vez, Ben estava sozinho. Perdeu seu melhor amigo e a prima em menos de dois dias.
Por que a vida estava sendo tão dura com ele? Será que não foi bom o suficiente?
Caiu de joelhos na grama extremamente verde do cemitério e deixou que as lágrimas escorressem uma vez mais pelo seu rosto. Seu emocional já estava devastado o suficiente e não queria ter que sentir mais nada. Desejou arrancar tudo aquilo do peito e jogar no lixo, se livrar do peso que torturava seus ombros.
"Cheguei ao meu limite, não suporto mais nada..." sussurrou para si mesmo, ao ver que as estrelas começavam a aparecer no céu escuro.
—X—
Kevin não olhou para trás, não havia o que olhar. Não restava nada além de dor e sofrimento em Bellwood. Sair da cidade era garantir que a insanidade não se tornasse sua companheira. Mesmo que estivesse fugindo, não se importava com o que os outros poderiam pensar.
Mike Morningstar não quis saber sua opinião quando tirou a vida de Gwendolyn, de maneira tão brutal. Pelo contrário, ele esmagou e pisou em cima de tudo que Kevin construiu, como um caminhão demolindo uma casa habitada.
O que restava agora eram apenas escombros, do que um dia já foi um coração cheio de sentimentos bons. Demorou tanto tempo, para finalmente perdoar Ben e deixar de lado o passado negro. Mas agora tudo o que rejeitou e escondeu voltou à tona. Como o petróleo contamina o mar, o ódio e rancor manchavam o coração turbulento de Kevin.
"Não existe volta, de agora em diante, estou sozinho." refletiu, conforme se afastava de Bellwood.
