OS MAROTOS: O LIVRO DAS SOMBRAS
CAPÍTULO 3
REBANHO
(...) Will you take the pain
I will give to you?
Again and again
And will you return it?
(Strangelove – Friendly Fires and Bat for Lashes)
1975
No quarto ano, Remus amava Sirius e James como se ama quando muito jovem.
Amava-os como se ama o céu azul e claro, após dias infinitos de nuvens cinzentas passivo-agressivas. Como se ama a gordura vegetal do chocolate derretendo na boca. O próprio quarto. Os pensamentos. Os cheiros. Amava-os como amigos se amam, sem a obrigação de fazê-lo e por isso mesmo, fazendo-o perdidamente.
Mas, acima de tudo, Remus amava Black e Potter tais quais meninas ou meninos apaixonados amam e era aí que as coisas se complicavam.
Remus não estava sozinho em sua complicação juvenil e contraditória. Afinal, era comum em Hogwarts, os colegas olharem Black e Potter disfarçadamente por detrás de seus livros na Sala Comunal e permanecerem apaixonados por estações inteiras.
Sirius possuía aquela ferocidade em cada traço de seu rosto e uma elegância que o acompanhava tal qual a sua sombra aonde quer que fosse, alternando esse estado com a aristocracia comedida assimilada e a rebeldia aprendida.
E quanto a James... Bem, James exibia uma beleza mais enigmática. Esta não se apresentava arrebatadora, tal qual a de Sirius, mas sim, exibia-se silenciosa e contida, encantando a todos com uma serenidade adorável ou apenas fingindo ser passiva para no fim de tudo, conquistar também aqueles que cedessem aos seus sigilosos apelos, engolindo-os.
Pensando bem, James possuía um jeito de olhar que parecia sempre ter um passo adiante e, estando à frente, ele tinha a todos na palma de sua mão.
Potter e Black eram os espíritos de Hogwarts no início de 1975 e por vários alunos eram bajulados. Eles eram os garotos populares que seus colegas haviam se acostumado a admirar, criar expectativas sobre e até mesmo, imitá-los a fim de se aproximarem de suas vidas incondicionalmente atraentes.
Remus, como amigo, estava muito próximo das duas forças da natureza Black e Potter. O fato de Sirius e de James se desenvolverem naquele ecossistema escolar como ídolos enquanto ele e Pettigrew se mantinham sendo extremamente comuns e invisíveis para muitos, era só um detalhe.
No final do dia, como bons companheiros, eles tomavam uma cerveja amanteigada juntos na Sala Comunal da Grifinória, balanceando rótulos que, na verdade, eram detalhes. Meros detalhes! Besteira adolescente e cliché!
No entanto, por que da metade do quarto ano para cá Remus vinha se sentindo deixado um pouco de lado, como se sentira na vez em que achara que os amigos haviam partido do Expresso para o Castelo sem ele?
Não que Remus achasse que tinha o direito de interferir naquela popularidade que se construía ao redor de Sirius e de James e, tampouco, alimentava esperanças de que Black sentisse correspondência por seu amor secreto e, tampouco, que Potter exprimisse também uma atração camuflada por ele. Nada disso.
Mas já fazia um tempo que Lupin vinha perdendo os seus amigos. E como sempre, de tempos em tempos, quando essa sensação o assolava, ele se esforçava um pouco mais nos estudos, mergulhando em seu mundo intelectual de fórmulas e lógica para não pensar tanto no universo de popularidade e valores.
Não que não doesse para Lupin se sentir como o amigo não tão bonito ou brilhante que é abandonado um pouco. Doía pra cacete. Mas a fama de Sirius e de James não nascera do dia para a noite. Ela vinha se consolidando desde o primeiro ano e Remus desenvolvera os seus mecanismos de fuga como um lobo batendo em retirada.
De qualquer forma, o garoto de cabelos castanhos apreciava ainda os momentos em que os Marotos eram só eles quatro e a microssociedade Hogwarts os dava alguma privacidade. Quando eles pertenciam uns aos outros.
Remus acordou naquela manhã antes de seus três companheiros de dormitório e, como a temperatura estava elevada naquela semana por conta do início da primavera, o grifinório tomou um banho antes de vestir o seu uniforme.
Ele enxugava os seus cabelos com o ar quente produzido pela varinha quando deixou o banheiro completamente vestido e viu James sair da outra toalete com a toalha enrolada em sua cintura.
"Bom dia, Remus!"
"Bom dia, James!" — respondeu o rapaz, arregalando um pouco os olhos e se virando de costas quando viu que Potter atirava a toalha sobre a cama.
Pettigrew, com o cabelo despenteado e o pijama amarrotado, entrava no banheiro, pulando enquanto segurava a sua vontade de fazer xixi.
"Vocês demoraram pra cacete! Não se esqueçam que temos só dois banheiros no dormitório! E verifiquem se o Black não morreu!"
Sirius permanecia dormindo, trajando uma calça de pijama xadrez e uma camiseta preta. Ele tinha o braço sobre a vista e a franja mal cortada caía por seu rosto. Um emaranhado de lençóis envolvia o seu corpo alongado.
"Acorda, Sirius!" — falou James, sem muito entusiasmo com a cueca boxer vestida, atraindo um olhar rápido de Remus que, por sua vez, se fixava no nó que dava na própria gravata para não ceder à tentação de mirar Potter mais uma vez.
Sirius resmungou algo no seu sono que parecia uma música sobre a ponte de Londres indo ao chão, antes de virar para o outro lado e voltar a dormir.
"Cacete, mas dorme que nem um cão mesmo! BLACK!" — impacientou-se James, vestindo o seu uniforme — "Remus, a sua paciência do caralho, por Merlin!"
Remus colocou os óculos de grau em sua vista, antes de se sentar na beirada da cama, tocando o ombro do outro rapaz e sacudindo-o.
"Sirius, acorda! Temos prova de Transfiguração hoje no primeiro tempo... Já passa das sete!"
O rapaz de cabelos compridos abriu os seus olhos cinzentos por breves segundos, antes de voltar a fechá-los. Depois, puxou o travesseiro para cobrir o rosto, murmurando:
"Lobinho, me deixa dormir! Hoje é sábado!"
Remus mexeu no aro dos seus óculos, contestando o outro rapaz.
"Não, hoje é quarta-feira! E temos aula, Sirius!"
Black tirou, finalmente, o travesseiro do seu rosto e pestanejou, mirando Remus por um instante, antes de abraçá-lo e puxá-lo para perto com os olhos fechados novamente.
"Remus, como você tá cheirando bem! Deita aqui comigo! Vamos matar aula!"
O menino de cabelos castanhos ruborizou ao tentar se desvencilhar de Sirius. Aquele tipo de intimidade era algo também desenvolvido naqueles anos e, se nos dois primeiros anos, Black tocava com ressalvas em algumas pessoas, agora, mais velho, ele era um bolinador inconsciente e carente quando sonolento ou bêbado, o que era, tipo, catastrófico para Remus.
"Me solta, Sirius!"
"Shhh... Vamos dormir..." — respondeu Black, colocando a sua perna ao redor de Remus e caindo no sono novamente.
Pettigrew deixou o banheiro para buscar a sua toalha esquecida no espaldar da cama e franziu o cenho, vendo Lupin imobilizado por Black.
"Era pra você acordar ele, Remus! Não pra oferecer sexo matinal para o desgraçado do Black!"
Remus ruborizou com mais força e se desvencilhou a muito custo, explicando-se:
"Não é nada disso! Black, acorda aí!" — sacudiu-o com mais força Remus, obtendo um olhar confuso em troca. Sirius erguia a cabeça, espreitando o dormitório ao redor como se tivesse vindo ao mundo naquele exato momento.
"Se eu tiver que me envolver nisso, vou te acordar à base de feitiços, Black! Anda, caralho!" — declarou James, colocando a sua blusa para dentro da calça do uniforme.
O olhar cinzento de Sirius ainda percorria o dormitório, quando ele indagou, apesar de ter um relógio em seu pulso:
"Que horas são?"
Remus consultou o relógio sobre a cômoda e declarou:
"7:15!"
"Merda!" — explodiu o rapaz, pulando da cama com pressa e correndo para o banheiro vazio enquanto os seus lençóis se dobravam e a colcha de cama era esticada por magia. Os vincos das cobertas foram repuxados e os travesseiros, afofados.
Segundos depois, Sirius colocou a cara alarmada para fora da porta aberta do banheiro enquanto escovava os dentes.
"Por que não me chamaram mais cedo?"
"Estamos te chamando há um tempo!" — declarou Remus, acomodando o seu livro de Transfiguração dentro da mochila.
"Você dorme feito um morto, Black!" — riu-se James, tirando a franja dos olhos diante do espelho — "Se não ficasse na farra até tarde, teria disposição pra despertar na hora!"
"Se nós não estivéssemos na farra, Potter! Você tava lá comigo!"
Remus moveu o rosto, relendo as suas anotações de aula com um olhar concentrado e se distraindo momentaneamente.
"Aonde vocês dois foram ontem afinal?"
"Encontrar com Aileen Marratt e uns amigos dela da Lufa-Lufa na torre norte. Tinha um pessoal da Corvinal também..." — falou James, ajeitando o nó da sua gravata — "E eu não tava a fim de ir, Sirius, mas tive a droga da paralisia do sono ontem e preferi sair com você do que ficar sem conseguir dormir, rolando na cama..."
Remus mexeu no aro dos seus óculos, um pouco sem jeito. Vindo do banheiro com a porta escancarada, os rapazes ouviram o barulho de água corrente do chuveiro e um vapor se espalhou pelo recinto.
"Você tá falando da Marratt que tá a fim do Black...?" — fez-se ouvir a voz de Pettigrew, destrancado a porta do outro banheiro.
"Bingo!" — decretou James.
Pettigrew retornava para o dormitório, agora, aparecendo com a blusa meio abotoada e as calças vestidas. Aparentemente, ele vinha entreouvindo a conversa.
"Não me diz que o Black ficou com aquela gata!" — admirou-se Peter, um pouco boquiaberto.
James deu uma risada, abotoando os punhos da sua blusa.
"O desgraçado beijou Aileen Marratt a noite toda como se não houvesse amanhã..."
Remus engoliu em seco, fingindo ter a sua atenção ainda em suas anotações.
"Sério?! Que filho da mãe sortudo! Mas quero saber dos detalhes sórdidos, Potter. Mãos, línguas, dedos e sei lá mais o que..." — comentou Pettigrew, calçando as meias.
"Isso, você vai ter que perguntar pro próprio Black porque não fiquei vigiando os dois feito um maníaco. Afinal, eu também tava ocupado..."
Pettigrew ergueu o seu rosto no mesmo instante em que Remus lançava um olhar discreto para os amigos e dobrava os pergaminhos com as suas anotações para a prova de Transfiguração. Havia uma ruga muito discreta sobre as sobrancelhas do rapaz de cabelos castanhos.
"Nome, Potter! Ou nomes!"
"Mia Estivalet!"
"A intercambista de Beauxbatons?! Cara, eu te odeio! Você treinou a língua francesa com ela...?"
"Oui, bien sûr..."
"Vocês tão namorando?!"
"Ela vai voltar pra França na semana que vem, Pettigrew! Não tô a fim de namorar à distância e a gente só se pegou..."
"Que inveja, Potter!" — redarguiu Pettigrew, tendo os cadarços dos seus sapatos amarrados com um feitiço enquanto ele colocava o suéter por sobre a camisa, sem muito cuidado com a gravata.
Remus se manteve recostado à sua escrivaninha em silêncio e espreitou Sirius deixar o banheiro com o uniforme meio úmido por sobre o seu corpo ainda encharcado do banho.
"Se eu perder a prova de Transfiguração, a Professora McGonagall não vai aliviar pro meu lado!" — queixou-se Sirius, amarrando os longos cabelos em um rabo de cavalo.
"Se você levar bomba por ter virado a noite beijando Aileen Marratt, a diretora da nossa Casa deveria te dar um dez..." — provocou-lhe Pettigrew.
Sirius se deteve, fitando Pettigrew brevemente.
"Os boatos correm..."
"A nossa rede de corujas é eficiente porque, afinal, Marotos não mentem uns para os outros..."
Sirius assentiu, abafando uma risada e o seu olhar pousou em Remus, que, com uma expressão séria, aguardava os amigos se aprontarem, estando já completamente vestido. A mochila estava sobre um ombro e o uniforme impecável trajava o seu corpo. Seus cabelos estavam muito alinhados.
"Aliás, podia ter ido com a gente ontem, Remus. O Pettigrew precisava ficar estudando até tarde porque ele tem que recuperar a nota, mas você já havia estudado mais do que o suficiente pra Transfiguração e foi dormir cedo..."
Remus moveu a sua cabeça para trás, como se tomasse distância para poder enquadrar os três amigos no mesmo cenário e, segundo os seus três amigos ainda, esse gesto sutil, algumas vezes, o fazia parecer arrogante pra cacete. Fazia ele parecer um velho que espreitava algumas crianças malcriadas invadirem o sossego de um trem enquanto tomava fôlego pra cuspir um frio: Fodam-se, seus patifes filhos de uma...
"Passo..."
Um silêncio tenso se fez e Sirius, um pouco sem graça, pôs-se a vestir as suas meias.
"Não é um pecado mortal se divertir às vezes, sabia?"
"Eu me divirto do meu jeito."
"Sendo o melhor aluno do quarto ano nas matérias; o representante de turma; o aluno favorito do Flitwick e zerando os livros da biblioteca... Ok. Mas ainda assim, podia vir com a gente..."
Remus mordeu os lábios e meneou a cabeça, parecendo, além de arrogante, um tanto amargo.
"Devia se preocupar com você mesmo, Black. Vamos fazer uma prova no primeiro tempo e você deve ter dormido no máximo, umas duas horas...?"
"Eu posso virar a noite acordado e tirar onze, lobinho! E sei que você também, ainda que virasse a noite dando uns beijinhos e uns amassos em alguém..."
Remus não respondeu. Ao invés disso, o garoto de cabelos castanhos cruzou os braços e se manteve em silêncio, procurando não deixar nem o seu ciúme e nem a sua zero vontade de beijar Aileen Marratt, Mia Estivalet ou qualquer outra menina transparecerem em seu rosto.
No entanto, quando Pettigrew retornou para o banheiro para escovar os dentes, Sirius voltou a espreitar o rosto de Lupin, após trocar um rápido olhar com James.
"Eu acho que você já deve saber beijar bem o suficiente..."
Remus, que deslizava para um de seus pensamentos, lembrando-se que Sirius e James ficaram com outras garotas na semana anterior e que a rotatividade de conquistas não era mais acompanhada por suas contas, alarmou-se com a colocação do grifinório.
"O que?"
"É, você já treinou bastante quando era criança e devia partir pra prática..."
Lupin engoliu em seco, ruborizando um pouco ao fitar os seus sapatos.
"Modéstia à parte, a gente te instruiu bem..." — declarou James, colocando a sua mochila também sobre os ombros com um sorriso discreto.
Aquele era outro fato vivenciado no que se referia ao aprofundamento de laços do primeiro ano. Black e Potter deram o seu primeiro beijo em Hogwarts no ano em que entraram na Escola e isso evidenciava o quão precoces os dois amigos eram. A curiosidade desse fato era que, em algum momento, em uma brincadeira pueril, os dois grifinórios acharam que podiam sanar a curiosidade de Lupin e ensiná-lo como se beijava. Para o caso de o amigo querer beijar uma namoradinha futura e tal.
É certo que sempre eles colocavam a mão na frente para os seus lábios não se encostarem de verdade e tal, porque isso seria um beijo de verdade e tal, mas, numa das últimas vezes, a brincadeira deixara Sirius tão desconfortável com o rumo que tomara que ele praticamente arrancou Remus de cima de James, parecendo um pouco transtornado.
Depois desse dia, os amigos meio que declararam entre si que estavam grandes demais para brincarem daquele jeito e que era descabida aquela prática, sendo colocada de lado. Pelo menos, fora o que Sirius determinara.
De modo que, era estranho Black tocar naquele tópico do primeiro ano sobre o qual, no quarto, eles não falavam. Principalmente porque Remus não lidava bem ainda com o fato de gostar demasiadamente daquelas "brincadeiras" quando tinha onze e se sentir magoado por Sirius cessar com elas, sem maiores explicações, fazendo-o se sentir deixado de lado mais uma vez e inadequado pra cacete por se interessar por meninos e não meninas.
"Como pode ter certeza, Black...? A gente colocava a mão na frente pra brincar de beijo..." — declarou Remus, fingindo rodar o seu chaveiro da mochila com algum desinteresse.
Black terminava de se vestir e ainda tinha a blusa branca molhada.
"Se não praticar, nunca vamos saber..."
Remus respirou fundo com alguma impaciência.
"Você tá mais preocupado com o meu primeiro beijo do que eu..."
Sirius arqueou as sobrancelhas, mostrando-se um pouco na defensiva. Depois, falou, ajeitando os livros dentro da mochila.
"Se é que você já não beijou e não conta pra gente só pra continuar nos olhando com essa cara de julgamento, Remus..."
Lupin redarguiu com azedume, deixando transparecer a rispidez, fruto do seu ciúme:
"Certo! Eu não te diria mesmo se beijei de qualquer forma porque não é da sua conta, Sirius. Nem todo mundo quer ser pego ou pegar alguém numa festa pra depois, poder falar sobre... Às vezes, a pessoa quer ser valorizada. E enxergada. E quer que as coisas aconteçam só entre ela e a pessoa de quem gosta de um modo tranquilo."
Sirius ergueu o seu olhar bruscamente com aquela expressão selvagem. Ele parecia um cachorro que ouvira um invasor pulando o muro de sua residência, que, na verdade, era a porra da residência do seu dono.
"Você tá gostando de alguém?!"
Remus respirou fundo e ajustou os óculos sobre o nariz, mantendo-se em silêncio.
"... Você se pegou com alguém?!"
O menino de cabelos castanhos girou os olhos nas órbitas e se voltou para um dos livros sobre a sua escrivaninha, mais para não dar atenção a Black do que para ler algo em específico.
"... Ou tá se pegando com alguém?!"
Remus ergueu brevemente o seu olhar cor de âmbar impaciente e não respondeu às perguntas do amigo.
"Deixa o Lupin, Black! Se ele ficar à vontade, ele fala!" — decretou James ao ver que Sirius entreabria a boca para formular mais uma pergunta.
O rapaz de cabelos castanhos sorriu para Potter, parecendo agradecido e Sirius os espreitou com alguma desconfiança, antes que Pettigrew retornasse para o dormitório, batendo a porta atrás de si.
No caminho até o Salão Principal, Remus se manteve calado, ouvindo Sirius e James narraram sobre bocas, mãos e dedos em Aileen Marratt e Mia Estivalet e de Aileen Marratt e Mia Estivalet neles, que pareciam determinadas em deitarem e rolarem sobre os garotos populares da Grifinória. Pettigrew ouvia tudo de boca aberta, interagindo com expressões de surpresa e interesse.
"Sério que elas fizeram isso? Nossa..." — murmurou Peter, pestanejando.
Remus sustentava a sua expressão azeda porque aquele era um dos hábitos de Black e Potter que os transformava em dois babacas e contribuía para um impasse entre os amigos.
Black e Potter comentavam sobre as suas experiências com as garotas, sendo detalhistas e analíticos ao extremo e isso era algo difícil de se fazer com elegância ou mesmo, com boas intenções. Havia, claro, o ciúme indizível de Lupin, mas havia também um desencantamento natural que o fazia pensar com aquela voz lupina de seu íntimo: "Se fosse comigo, eu matava os dois. Cuzões!"
Sirius checou, rapidamente, o rosto de Lupin e murmurou, um pouco cabisbaixo:
"Tá se sentindo mal, Remus?"
"Não. Por quê? Você tá?"
"Você tá com aquela cara de quem julga..."
Remus contraiu as sobrancelhas, ajeitando a mochila sobre o ombro.
"Porque eu tô julgando! Não se sentem mal por nos contarem o que fizeram e deixaram de fazer com a lufana e a intercambista de Beauxbatons?"
James baixou o seu olhar e permaneceu pensativo, antes de dizer:
"A gente não tá, tipo, contando pra Escola toda. A gente tá contando pra vocês. Não existem segredos entre os Marotos!"
Remus encarou Potter, transparecendo a sua decepção.
"Gostariam que falassem de vocês?"
James deu de ombros, respondendo:
"Só teriam bem pra falar de mim..."
Remus retrucou com algum mau-humor:
"Privacidade, ok? Não é legal expor as pessoas..."
Sirius olhou por sobre o seu ombro enquanto descia os degraus da escada. Tinha Remus novamente sob o ângulo da sua mira.
"Remus, o seu mau-humor é terrível, mas tem andado pior do que nunca! Seu ciclo lunar tá perto?"
Lupin revirou os olhos como o fizera duzentas e trinta e oito vezes naquela manhã. Desde o primeiro ano, os seus amigos descobriram sobre a sua licantropia, apesar de seus esforços para manter a sua condição em sigilo. Mas atribuir o seu aborrecimento sempre ao lobo era desonesto.
"Não tem nada a ver com a minha licantropia! Se eu falei que acho escrota a atitude de vocês, é porque acho, de fato, escrota..."
Sirius ia contra-argumentar, mas se deteve quando a Professora McGonagall se materializou na entrada do Salão Principal, esfregando as suas mãos com alguma pressa. Seu olhar imponente passou, rapidamente, pelos rostos dos quatro alunos, antes de pairar em Remus.
"Senhor Lupin, estava procurando pelo senhor mesmo!"
Remus se empertigou, ajeitando a mochila em seu ombro.
"Professora..."
"Preciso resolver algo em meu escritório. Posso pedir ao senhor para abrir a sala de aula, distribuir as provas e assumir a turma no início da aula? Não devo me atrasar mais do que quinze minutos."
"Claro!" — assentiu Remus, recebendo uma chave dourada da professora e o seu agradecimento, antes de ela deixar o Salão Principal e seguir pelo corredor. O menino guardou o objeto dentro da sua mochila.
Pettigrew murmurou com um sorriso enviesado:
"Remus sempre com as costas quentes com os professores."
O rapaz respondeu, sem muito entusiasmo:
"Não se trata de costas quentes. Trata-se de eu ter sido escolhido o representante de turma do quarto ano..."
"Por unanimidade, diga-se de passagem!" — relembrou James— "E tem, tipo, um trilhão de chances de ser promovido a monitor no quinto ano."
"Foi uma votação unânime mesmo. Tirando os sonserinos que nunca escolheriam um grifinório para os representar..." — retrucou Sirius, passando o braço por volta do ombro de Lupin, um pouco sem jeito.
Remus retorquiu, dizendo:
"Snape votou em mim..."
Foi a vez de Black lançar um olhar azedo para o rapaz de cabelos castanhos, mas ele se limitou a se manter calado por temer um novo desentendimento durante a manhã. E isso era parte do distanciamento que ocorria entre o trio Remus, Sirius e James no quarto ano.
Pululavam nessa época, farpas verbalizadas e não verbalizadas entre os amigos porque a adolescência não estava sendo um processo tranquilo, apesar de os três quererem ficar, tipo, tranquilos.
Em silêncio, então, o quarteto seguiu para o Salão Principal, que não estava mais tão cheio. E, enquanto alcançavam a mesa da Grifinória, alguns colegas cumprimentaram Sirius e James, ignorando um pouco Remus e Pettigrew. O menino de cabelos castanhos não se importou tanto porque aquilo vinha acontecendo mais constantemente do que ele se lembrava. E tipo, Black e Potter eram populares. Ele, não.
Enquanto alguns alunos do sexto ano se aproximaram para conversar com os seus amigos, Remus se serviu de torradas francesas e mirtilos. Seu olhar se estendeu até uma mesa preparada na outra extremidade do Salão Principal em que um cardápio de bebidas havia sido disposto como cortesia.
De vez em quando, os elfos domésticos que trabalhavam na cozinha de Hogwarts proporcionavam um mimo para os alunos, sobretudo quando eles estavam em semana de provas.
Quando os sextanistas se afastaram de James e de Sirius, Remus se servia de outra torrada, sentindo-se um pouco mais revigorado.
"Tá sujo o canto da sua boca, Remus." — anunciou James, erguendo a vista brevemente, antes de se servir de leite de dragão.
Lupin levou imediatamente o guardanapo à boca, esfregando os lábios de leve.
"Saiu?"
"Não, sujou mais ainda. Vem aqui..." — sorriu Potter.
E, chupando o seu dedão, James o esfregou em seguida no canto da boca de Lupin, retirando o resto de geleia de damasco como o fazia desde que haviam se conhecido e atraindo a atenção dos outros grifinórios como sempre atraía.
Porque aquela proximidade era concebida de uma forma natural por Lupin e por Potter, mas para Black e Pettigrew, aquilo parecia e sempre pareceria íntimo de um modo que não sabiam explicar. E Sirius pareceu retornar para a sua expressão azeda.
"Não pode usar um guardanapo, Potter? Tipo, precisa enfiar saliva na boca do Remus? É nojento..."
James ergueu as sobrancelhas, dizendo:
"Eu não tenho nojo do Remus. E só pra constar..." — acrescentou o rapaz de cabelos rebeldes, levando o pouco de geleia que permanecia em seu dedão à boca, chupando-o de novo.
Remus sorriu, dizendo enquanto passava a língua pelo local em que James espalhara a sua saliva.
"E só pra constar..."
Pettigrew soltou um gemido desagradável de nojo, mas Sirius flutuou do estado azedo para o estado amargo, largando ruidosamente os seus talheres sobre o prato para beber o seu suco de abóbora. E Remus e James riram com cumplicidade porque atormentar um pouco Black era uma das coisas que os unia.
Os rapazes comeram um tempo em silêncio, antes de Pettigrew indagar:
"Black, Potter, o que o pessoal do sexto ano queria falar com vocês dois?"
"Sobre a festa de despedida dos intercambistas no final de semana. Fomos todos convidados..."
Remus se recostou no espaldar de sua cadeira, indagando um pouco sem ânimo:
"Não tivemos nenhum intercambista na Grifinória neste ano. Precisamos comparecer mesmo assim?"
Em 1970, o Ministro Johnson, visando ampliar as políticas e boas relações entre Hogwarts e as outras Escolas de Magia, implantou um sistema de intercâmbio em que alguns alunos que se destacassem no seu desempenho estudantil e estivessem dispostos a desembolsar um valor em galeões, poderiam passar alguns meses numa instituição de ensino estrangeira, complementando a sua educação.
Hogwarts também abria as suas portas para bruxos em idade escolar e nos meses em que permaneciam na Escola, os estudantes precisavam passar pela Seleção de Casas, assim como os outros alunos e frequentarem as aulas. Naquele período, vieram alunos de Beauxbatons, Durmstrang e Ilvermorny. No entanto, nenhum dos estudantes foi selecionado pela Grifinória.
"Precisamos, Remus. É de bom tom os estudantes a partir do terceiro ano se despedirem dos alunos..." — respondeu Sirius, erguendo brevemente o seu olhar amargo das rabanadas em seu prato— "E vamos usar as nossas camisetas escritas *Marauders idênticas porque somos do tipo de amigos que se vestem iguais nos eventos sociais, ainda que seja cafona ou estejamos mais velhos a cada ano..."
A ideia de os quatro amigos adquirirem camisetas com a palavra *Marauders escrita nelas surgira há alguns dias, após o aniversário de Remus e de James, por uma intenção boba de todos renovarem os votos de amizade, usando uma roupa que só eles entenderiam o que significaria e só eles teriam. James ergueu a vista para Pettigrew.
"A propósito, quando vão ficar prontos os nossos uniformes de *Marauders, Pettigrew?" — indagou James.
Pettigrew, que comia as suas panquecas, absorto um pouco pelo sabor do alimento, falou, limpando a boca com o dorso da mão.
"O Bob Gotobed disse que ele ia entregar as camisetas até o fim de semana."
Remus trocou um olhar tácito com Sirius e James, antes de perguntar com alguma hesitação:
"Pettigrew, eu não quero ser repetitivo, mas você acha que é válido confiar o nosso uniforme de *Marauders a um vizinho seu que passou uma temporada em Azkaban por fraude, chamado de Bob Gotobed?"
Peter ergueu as mãos no ar, antes de abocanhar as suas salsichas e falar com a boca cheia:
"É a única pessoa que conheço que produz camisetas e já pagamos por elas... Vai dar tudo certo, Lupin! Pode confiar!"
Remus assentiu, não confiando. Sirius, por sua vez, girando o suco de abóbora dentro do seu copo antes de bebê-lo, apontou para Pettigrew com uma sobrancelha arqueada.
"Tem mel no canto da boca de Pettigrew. Potter, vai lá limpar..."
O modo como Black fez questão de estalar o dedo, apressando James não provocou nenhuma reação no grifinório, além de um riso de escárnio.
"Não, é a sua vez, Black! Eu cuido do Remus, você cuida do Peter..."
Sirius alterou a sua voz:
"Por que é ok pra você com o Remus e com o Pettigrew não?"
Pettigrew se antecipou, pegando o seu guardanapo, levando-o à boca e declarando com uma voz esganiçada:
"Fiquem longe de mim, seus esquisitos!"
James sorriu e olhou distraidamente o Salão, mas se deparou com Sirius, diante de si, ainda o encarando de uma forma questionadora, quase um minuto depois.
"Você não respondeu à minha pergunta, Potter..."
"Perdão?"
"Por que você sempre encosta no Remus?"
Lupin, que terminava o seu chá, ergueu a vista, falando:
"Oi, eu ainda estou aqui! Sirius, por que você hoje tá caindo em cima de mim e do James?"
Black bebeu o restante de seu suco de abóbora e falou:
"Fiz uma pergunta simples pra você mais cedo e estou fazendo uma pergunta simples para o Potter agora. Qual é o problema? Se não vai responder à sua pergunta, isso é entre mim e o James."
Outra farpa trocada. Uma das grandes! Os olhos de Remus tremeluziram o seu tom amarelado brilhante e pareceram muito agressivos, antes de Remus se levantar do seu assento, atirando o guardanapo sobre a mesa:
"Ah, quer saber?! Vai se foder, Sirius Black! Vou pegar um chocolate quente..."
Então, Remus atravessou o Salão, indo pegar um chocolate quente na mesa de bebidas e Sirius ficou se fodendo na mesa da Grifinória. James comentou, degustando as suas torradas:
"Isso não foi legal, Black! Você e o Remus parecem que tão sempre se bicando ultimamente, mas se não fosse por ele, você ainda taria morto no dormitório porque ninguém consegue te acordar, exceto ele..."
Sirius, um pouco carrancudo, observou o rapaz de cabelos castanhos, ao lado de outros alunos, inspecionando a mesa de mimos élficos a alguma distância.
"O que quer que eu faça, Potter?" — indagou Black, se perguntando intimamente se não fora longe demais, visto que Remus não costumava xingar, exceto quando estava muito aborrecido ou um pouco altinho com whisky de fogo, o que não era o caso, exceto se um elfo doméstico liberto quisesse se vingar de Hogwarts, embebedando os alunos ao servir chá misturado com xerez no café da manhã.
James estalou os seus dedos, parecendo apressar Sirius, que, por sua vez, o olhou como se quisesse estuporá-lo:
"Vai atrás dele pedir desculpas... Anda!"
Diante da mesa com variedades de bebidas expostas, Remus inspecionou os sucos de frutas exóticas do mundo bruxo; chás importados feitos a partir de plantas medicinais estudadas em Herbologia; misturas de mel de fadas com leite de dragão e o grifinório se interessou, principalmente, pelo chocolate quente com sanguinária doce e amendoim explosivo.
Servindo-se de uma xícara, Remus esbarrou por acidente no cotovelo de um aluno do sexto ano da Corvinal, que se servia de um suco azul borbulhante. O líquido derramou um pouco no uniforme do rapaz.
"Me desculpa!" — antecipou-se Remus, depositando a sua xícara na mesa e, com um guardanapo, tentando ajudar o rapaz.
Na verdade, Remus estava bastante chateado ainda com Sirius, que vinha lhe fazendo perguntas desconfortáveis desde que acordara naquela manhã e, agora, implicava com os gestos carinhosos trocados entre ele e James. Ah, vai se foder, Sirius Black!
Intimamente, Remus não digerira também a informação de que Sirius virara a noite, beijando uma das suas colegas lufanas, mas isso Lupin sabia que era problema seu, pois, tipo, Black vinha fazendo isso há anos e o garoto de cabelos castanhos se via obrigado a não dar tanta importância para esse fato em prol da amizade.
Sendo que, Lupin permanecia de boa quando conseguia ficar tranquilo com isso e a coisa toda não doía. Exceto, quando ela doía pra cacete e o menino de cabelos castanhos, não conseguindo ficar de boa, se tornava ríspido e esquivo com Black. Um pouco agressivo também.
Caramba, ele mandara Sirius Black se foder, enchendo a boca com um palavrão na primeira hora do dia?!
No Salão Principal, o aluno da Corvinal diante de Remus sorriu um pouco sem jeito, tentando tranquilizar o outro aluno enquanto retirava a sua varinha de dentro das vestes, passando-a sobre a mancha do seu uniforme.
"Não se preocupa. Tá tudo bem... Evanesco!"
Imediatamente, as roupas do aluno corvinense se tornaram muito limpas e Remus se lembrou de que a raiva obscurecia também o seu raciocínio lógico, pois é claro que um bom feitiço seria mais eficaz para secar as roupas do que ele tentar enxugar um oceano com um paninho de algodão ensopado e meio transparente.
"Ótimo feitiço! Desculpa, eu, às vezes, sou estabanado pra cacete..."
"Perdão...?" — falou o aluno do sexto ano, arqueando as sobrancelhas sobre o olhar azul-porcelana e com o distintivo de monitor em suas vestes.
Remus fechou os olhos, percebendo que usava um linguajar impróprio com um dos seus veteranos que era, inclusive, monitor da Corvinal. No fim, ruborizando um pouco, o menino de cabelos castanhos se antecipou em servir o aluno do sexto ano com outro copo do líquido azul borbulhante.
"Desculpa!" — tentou Lupin pela última vez, entregando a bebida para o corvinense em um gesto de paz.
O rapaz mordia os lábios, parecendo engolir uma risada e se demorou um tempo, vendo Remus se servir de chocolate quente. No fim, ele falou enquanto pingava três gotas de limão-brabo em sua bebida que, imediatamente, tornou-se cor de rosa.
"Os caramelos explosivos ficam bons pra cacete com o chocolate." — falou o corvinense, lançando um olhar breve na direção de Lupin — "Só uma sugestão... e obrigado!" — complementou o monitor, erguendo a sua taça no ar num gesto simpático, antes de ir embora.
Remus se voltou para o corvinense que finalizara o preparo de sua bebida e, enquanto ele ia embora, o grifinório gritou um pouco sem jeito:
"Obrigado! E desculpa de novo!"
O monitor se distanciou, sem se voltar para trás, mas levantou a sua taça novamente no ar enquanto passava por Sirius, que se aproximava da mesa de cortesia para falar com Remus. O rapaz de cabelos compridos se deteve um instante e ainda observava o corvinense quando se colocou ao lado de Lupin.
"O que o monitor do sexto ano queria com você?"
"Nada... Eu derrubei uma dessas bebidas nele e ele me sugeriu alguns caramelos..." — retorquiu Remus com a cabeça baixa, destampando uma lata com caramelos explosivos e o jogando em seu chocolate quente com uma colher. Imediatamente, a bebida fumegante se tornou efervescente e soltou um estalo.
Sirius se manteve um tempo em silêncio, vendo Remus derramar baunilha espumante em seu chocolate que parecia mais doce do que uma refinaria de açúcar.
"Remus, o que tá acontecendo com a gente?"
"Perdão..." — falou o rapaz de cabelos castanhos, pestanejando um pouco, antes de olhar para Sirius.
"A gente sempre se deu bem. Por que a gente tá, tipo, se estranhando e se provocando toda hora?"
Remus mexeu no aro dos seus óculos, falando:
"Nada... A gente só tá com a cabeça muito quente. Vamos nos acalmar..."
Fora os sentimentos de Lupin em relação a Black, havia entre os amigos aquela intimidade conquistada e consolidada em quatro anos. Se Remus fora, na vez em que se sentara com Sirius pela primeira vez no Expresso, cuidadoso e delicado, com o convívio, os dois amigos passaram a se conhecer bem a ponto de Remus mandar o grifinório de cabelos compridos se foder. Black, por outro lado, era o contrário. No King's Cross, na primeira vez que se viram, por pouco não estendera o dedo médio levantado para os Blacks até Remus, mas, após consolidarem a amizade, nunca mais tentara mandar o amigo para nenhum lugar inóspito. A intimidade era uma bênção. Ou uma merda?
"... Desculpa por ter falado aquilo na mesa pra você, Sirius. Eu errei..."
Remus se dava por vencido. Não queria discutir com Sirius antes da prova de Transfiguração e nem que os dois tivessem um péssimo dia. Ele reconhecia que estava errado por ter sido reativo com o amigo. Na verdade, ele estava errado desde o momento que se apaixonou por Black e chafurdou em seus próprios sentimentos, achando todos aqueles hormônios e adrenalina gostosinhos em um primeiro instante, até deixarem de ser gostosinhos e ele ser o primeiro de todos a se foder. O feitiço Evanesco funcionava para paixões não correspondidas? Socorro.
"Ok." — assentiu Sirius, entrelaçando o seu mindinho no dedo de Remus por alguns segundos, antes de soltá-lo— "Desculpa também por ter sido estúpido com você."
O rapaz de cabelos castanhos ruborizou um pouco e voltou a sua atenção para a lata de confetes comestíveis, antes de mexer no aro dos seus óculos. Sirius ergueu uma sobrancelha, vendo uma fumaça acetinada e rosada deixar a xícara do amigo.
"Isso é ainda próprio para o consumo, Remus?"
Lupin sorriu e experimentou um gole do líquido em sua xícara com arabescos, arregalando um pouco os seus olhos amarelos em seguida.
"É bom!"
"Não tenho certeza disso!" — redarguiu Sirius, franzindo o cenho.
"Os caramelos realmente fazem toda a diferença! Prova, Sirius! Por Merlin!"
"É muito doce, lobinho!"
"Prova e depois me diz..." — riu-se Remus, aproximando a xícara dos lábios de Sirius que parecia se render.
"Tá. Eu vou provar..."
Black bebeu um gole do chocolate quente e arregalou os seus olhos cinzentos quase que imediatamente.
"É bom!"
"Eu não falei?!"
"É bom mesmo!" — repetiu o grifinório, bebericando mais um gole do chocolate de Remus— "Preciso preparar um desses pra mim!"
O rosto de Remus se iluminou com uma genuína empolgação.
"Eu te ajudo a preparar! Será que o James e o Pettigrew vão gostar de experimentar também?"
"Vamos levar pra eles!" — determinou Black, adiantando-se em pegar três xícaras que flutuavam com magia sobre a mesa, ansiosas para serem utilizadas.
"Certo!" — sorriu Remus, tomando em suas mãos a leiteira com chocolate fumegante — "Sirius, você prefere o chocolate assim ou um pouco mais morno?"
Sirius sorriu e ia responder à pergunta do amigo, mas se deteve quando sentiu uma mão em seu ombro. Remus, por sua vez, sentiu uma fisgada em seu coração quando percebeu Aileen Marratt se materializando ao lado de Black.
A lufana de cachos castanhos, sem conseguir parar de sorrir com os seus dentes muito brancos, abraçou Sirius por trás.
"Oi!"
"Oi!" — respondeu Black, um pouco surpreso, voltando-se para Aileen.
Remus se reteve, depositando a leiteira sobre a toalha de linho da bancada. E, em sua defesa, ele esperou algum tempo, fechando os seus olhos quando ouviu a menina dizendo baixinho:
"Precisei usar pó de ditamno nos meus lábios... Pena que precisamos voltar para as nossas Casas... Foi ótimo... Quando vamos nos ver de novo?... Estou livre hoje à noite... Você vai à festa de despedida dos intercambistas?" — e, por último, em um cochicho mortal— "Não consegui nem dormir, pensando no que fizemos..."
Remus respirou fundo e tomou a sua xícara, deixando Black lá pensando no que fizera com Aileen Marratt na noite passada enquanto ele ia se foder com os seus próprios sentimentos, voltando para a mesa da Grifinória.
Sem deixar transparecer a sua mágoa, Lupin disse aos amigos que ia dar uma passada na biblioteca para revisar o conteúdo, antes do exame de Transfiguração. Ao se afastar da mesa, ele quase esbarrou em Alejandra González, uma das intercambistas de Ilvermorny que estudava na Casa da Lufa-Lufa. A menina se deteve, olhando para trás.
Quando Sirius, finalmente, se despediu de Aileen Marratt, ele se voltou para o lado e se descobriu sozinho. Completamente sozinho. A leiteira com chocolate quente permanecia esquecida sobre a bancada e as três xícaras que ele tomara flutuavam no ar novamente, sem serem utilizadas.
"Você viu o Remus?" — indagou Black a Peter, retornando para a mesa da Grifinória.
"Ele disse que ia para a biblioteca dar uma última estudada antes do exame. Ei, Black, você tava conversando com a Aileen Marratt!" — falou Pettigrew ainda comendo e se servindo de ovos e salsichas.
Sirius, parecendo um pouco desconcertado, olhou em direção à entrada do Salão Principal e consultou o seu relógio de pulso.
"É, tava... Mas o exame é daqui a pouco... Tem certeza de que o Remus disse que ia para a biblioteca?"
"Tenho!" — confirmou Pettigrew com a boca cheia.
James, que conversava algo com Frank Longbottom próximo à saída, retornou para a mesa, dirigindo-se a Sirius.
"E aí? Tá tudo bem entre você e o Remus?"
Black passou a mão por seu pescoço, tomando o seu lugar na mesa da Grifinória e vendo a xícara de chocolate pela metade de Lupin largada sobre a mesa.
"É, acho que sim..."
(cut)
Quando Sirius, James e Pettigrew chegaram à sala de Transfiguração, a porta do lugar já estava aberta e Remus, ao lado de uma aluna muito alta da Grifinória chamada Raven Fraser e de uma aluna muito miudinha da mesma Casa chamada Winona Rivers, organizava as fileiras de carteiras para a aplicação da prova.
"Podemos ajudar?" — indagou James, antecipando-se em utilizar a sua varinha para abrir as janelas.
"Claro. Temos cinco minutos ainda e toda a ajuda é bem-vinda..." — respondeu Remus, guardando alguns livros no armário da Professora McGonagall.
Black se posicionou ao lado de Lupin, transportando alguns exemplares manualmente, como Remus vinha fazendo, em vez de utilizar um feitiço.
"Oi, você foi embora mais cedo... Acho que ficamos sem os nossos chocolates..." — tentou contemporizar Sirius, observando o rosto sério do amigo e se forçando a sorrir, sem vontade.
"Desculpa, eu lembrei que tinha um assunto pra resolver na biblioteca e não pude esperar." — respondeu Remus, mentindo porque aquilo era o que se esperava como uma razão aceitável vinda de um amigo, em vez de ele dizer que fugir era o seu mecanismo de defesa para lidar com os próprios sentimentos.
"Certo..." — murmurou Sirius, depositando os livros na prateleira por ordem alfabética, conforme Remus fazia — "E tá tudo bem entre nós dois?"
Remus mexeu no aro dos seus óculos, desviando o seu olhar cor de âmbar do olhar cinzento de Black. As coisas pareciam piores do que antes.
"Claro..."
Os alunos quartanistas foram chegando aos poucos e Remus, ao se colocar diante da turma, avisou a todos que a Professora McGonagall precisava resolver um assunto e ele aplicaria a prova até ela retornar.
O rapaz usou a sua varinha para distribuir os documentos tirados de dentro da gaveta da escrivaninha da diretora da Grifinória e, com a varinha ainda, foi deixando-os sobre as respectivas carteiras. O menino de cabelos castanhos sentou-se, então, em uma carteira virada para a turma.
Sirius, James e Pettigrew não costumavam se sentar na frente, pois, amiúde, a Professora McGonagall chamava a atenção dos grifinórios por conversarem durante a aula, mas, estando Remus cumprindo o seu dever de representante de turma, eles se sentaram na primeira fileira, após ajudarem o amigo a organizar a sala.
Severus Snape chegou ao recinto e crispou os lábios com azedume ao ver Black e Potter na fileira em que ele costumava ocupar e, com alguma reatividade, atirou a sua mochila em uma das últimas carteiras, acomodando-se nela.
Remus fez a ronda pela sala, checando, superficialmente, as mesas dos colegas e quando passou por Snape, o sonserino lhe murmurou um rouco Bom dia, recebendo a resposta acompanhada de um sorriso gentil do representante de turma.
Sirius, que tinha o rosto virado para trás, observou um pouco a dinâmica de Severus e o percebeu seguindo Lupin com o olhar, mesmo quando o garoto de cabelos castanhos se encontrava longe.
As sobrancelhas de Black se tornaram um pouco contraídas ao ver Snape movendo o seu rosto, espreitando Remus como uma serpente faminta observa um adorável e distraído pufoso. O rapaz de cabelos compridos se manteve com a mão no espaldar da cadeira e, quando o seu olhar se encontrou com o do sonserino, Sirius semicerrou os olhos enquanto o garoto de cabelos muito lisos se voltava para a sua prova, retornando para o estado de azedume anterior.
"Qual é o problema do Ranhoso?" — resmungou Black, desvirando a sua prova sob o comando de Remus.
"Que?" — indagou James, sentado ao lado de Sirius e assinando o seu nome no pergaminho.
"Nada..." — respondeu Sirius, puxando o capuz do seu uniforme até a cabeça para poder se concentrar no exame.
A porta da sala de aula se abriu e Lily Evans chegou atrasada, ao lado de sua amiga Julian Parker. As meninas davam risinhos e antes da porta voltar a se fechar, fez-se ouvir duas vozes masculinas de alunos do sexto ano no corredor, despedindo-se das garotas.
As alunas atraíram a atenção dos colegas quartanistas, que tiveram a sua concentração interrompida. Contudo, rapidamente, as duas jovens se aprumaram e pediram desculpas a Lupin e aos outros alunos, indo se sentar em duas carteiras do meio.
O olhar de Severus se deteve na nuca da jovem de cabelos cor de cobre por alguns segundos, antes de ele revirar os olhos nas órbitas como um velho muito enfastiado e austero faria, e se voltar para o seu exame. Um pouco de amargura também o corroía.
Raven Fraser e Winona Rivers, sentadas em uma das carteiras duplas da frente, olharam brevemente sobre os seus ombros para as suas amigas de dormitório e se voltaram para a frente, após um tempo.
James Potter, espreguiçando-se na sua cadeira e girando a cabeça para a fileira do meio em que a comoção já cessara, olhou também para trás, voltando-se para a frente, após alguns segundos, parecendo alguém um tanto curioso ou alguém um pouco desinteressado. Aliás, se existia uma dualidade, o grifinório sempre achava uma forma de se colocar na linha que as certezas se dividiam. Ou que se encontravam.
Remus, diante do seu exame, pôs-se a ler todas as questões, verificando se encontraria dificuldade em alguma delas. A última pergunta era uma formulação capciosa sobre a Transfiguração a partir de metais, mas nada com que o rapaz de cabelos castanhos precisasse se preocupar. Molhando a ponta da sua pena no tinteiro, Lupin se pôs a escrever com a sua caligrafia inclinada. E a turma seguiu silenciosa até que dois garotos sonserinos, Rian Carter e Darci Tyrone, entraram na sala, atrasados.
Os rapazes fizeram menção de se desculparem pelo atraso com a professora, mas se detiveram ao constatarem que a prova era aplicada por Remus.
"Ah, é só o Lupin..." — cochichou um deles, rindo e indo se sentar ao lado de Emily Davies enquanto o outro ia se sentar numa carteira solitária.
Lupin já havia tido a sua autoestima um pouco alvejada no café da manhã e refletiu intimamente se seria o caso de tomar distância para trás com o seu rosto, a fim de parecer arrogante ou superior, tentando salvar a sua dignidade. No entanto, espreitando os sonserinos com desagrado, o grifinório deixou a questão para lá. Eram só o Carter e o Tyrone no fim das contas. Só.
Remus se limitou a erguer o seu olhar brevemente, antes de se voltar para a sua prova. Fingiu também que não escutou o comentário jocoso de Tyrone quando ele disse que não teria se apressado tanto se soubesse que a professora não estava em sala. Se o melhor tempo que o sonserino conseguia fazer era chegar dez minutos atrasado e usar mais oitocentos milhões e quinhentos e trinta e sete minutos para resmungar, a sua pressa era uma piada.
Consultando o relógio na parede da sala de aula, Remus voltou a escrever em seu pergaminho, inspirado pelo seu estudo prévio que facilitava a vinda das respostas à sua mente como se elas pulassem de um banco de reservas, esperando serem chamadas. Sirius e James também trabalhavam em suas formulações porque inteligência fazia parte do combo de popularidade dos grifinórios. Como Black mesmo afirmara, era possível os dois festejarem durante a madrugada, escondidos da vigilância de Filch e dos monitores das Casas, e cravarem um onze em suas notas.
Isso era uma parte também do fascínio que Black e Potter exerciam. Porque quando eles não estavam falando de suas conquistas de garotas e expondo cada detalhe sórdido da privacidade deles e delas como se fossem repórteres sensacionalistas do Profeta Diário, os dois podiam ser dois rapazes realmente interessantes que conversavam sobre diversos assuntos. Remus apreciava muito os momentos em que eles podiam virar noites diante da lareira da Grifinória, falando sobre tudo e sobre nada, sem perceberem a hora passar. Se fossem estúpidos ou desinteressantes, talvez fosse mais fácil para Lupin não ter se entregado tanto àquela amizade.
Remus gostava também de papear com Sirius no pátio do Castelo, sob o freixo da Escola, mas naquele quarto ano, essas ocasiões foram ficando cada vez mais raras. Fora por meio dessas trocas que o garoto de cabelos castanhos descobrira sobre a família disfuncional e abusiva de Black e que Black, por outro lado, ouvira Remus narrar sobre os lugares que visitara quando criança ao redor do mundo, buscando uma cura milagrosa para a licantropia junto aos pais.
Na sala de Transfiguração, Remus ergueu o rosto e franziu o cenho quando viu Carter, sem tentar ao menos disfarçar, colocar o livro da matéria aberto sobre a sua carteira para poder copiar as respostas. O sonserino levantou o seu olhar divertido e murmurou, desafiadoramente, atraindo a atenção dos outros alunos:
"Ouch! Acho que fui pego! O que você vai fazer, representante de turma?"
O olhar de Remus se encontrou com os de seus amigos, sentados muito próximos porque Carter e Tyrone nunca engoliram a escolha de Lupin como representante de turma e, apesar de seus sangues se manterem incógnitos, os dois alunos demonstravam antipatia por colegas nascidos-trouxa ou mestiços.
James apertou os olhos sob os óculos com alguma impaciência, antes de se voltar para trás e Sirius, retirando o seu capuz da cabeça para retornar para a sociedade, estendeu o seu olhar de "que diabos?"para os sonserinos. Pettigrew tinha a sua boca entreaberta, revelando os seus dentes grandes.
"Ah, caralho, não fode, Carter!" — pensou Remus com uma pontada de exasperação, não a verbalizando.
"Carter, guarde o livro sob a mesa!" — falou Remus com uma voz gentil e sonsa, se levantando.
"Senão o que?" — provocou o sonserino.
"Senão eu vou aí te fazer engolir essa merda de livro!" — declarou Sirius, arrancando alguns risinhos dos colegas.
Rian Carter pareceu por um momento incerto se guardava a merda do livro ou se arriscava engoli-lo. Darci Tyrone veio ao auxílio do amigo, colocando-se de pé descaradamente para copiar as respostas do livro de Transfiguração aberto do outro sonserino sobre a carteira. Ah, a solidariedade sonserina era tocante! Com um risinho de escárnio, Tyrone falou:
"Isso é entre a gente e o Lupin, Black! Fica fora disso..."
"Ele é meu amigo, seu imbecil!" — declarou Sirius, batendo na mesa com a mão espalmada, parecendo querer esmagar um inseto, mas, talvez, querendo, na verdade, esmagar Tyrone.
"Qual é, Black?!"
"Qual é o que, Tyrone?!" — empertigou-se Sirius, se levantando para encarar o sonserino.
Remus arregalou os seus olhos e, mexendo com nervosismo no aro dos seus óculos, colocou-se entre os garotos, dizendo:
"Por favor, não briguem!"
"Você sempre defende ele, Black! Ele é o seu namorado por acaso?" — declarou Carter.
Sirius pareceu se deter por um segundo, contraindo as suas sobrancelhas, antes de arrancar para cima do colega, sendo seguro por Pettigrew e um outro aluno.
Carter se manteve parado com uma expressão irritada e demorou para ele perceber que James Potter utilizava a sua varinha, conjurando o livro de Transfiguração para a sua mão e o entregando, em seguida, para Remus.
"Problema resolvido! Agora, Carter e Tyrone, a gente agradeceria se parassem de criar confusão..." — declarou James Potter de um modo bem maduro — "Seus fodidos!" — acrescentou ele, não contendo a sua selvageria adolescente no último segundo.
"O QUE?!" — indignou-se Carter, vendo o seu livro nas mãos do representante de turma.
Os sonserinos pareciam que iam prolongar a discussão e ela seria, de fato, entendida se a Professora McGonagall não entrasse pela porta da sala de aula naquele instante com a sua postura severa, intimidadora e respeitável. Carter e Tyrone se detiveram no momento em que a diretora da Grifinória se pôs a olhar para os alunos de pé com um ar de desconfiança.
"Senhor Lupin, está tudo bem aqui?"
Erguendo o seu olhar cor de âmbar, o rapaz respondeu de um modo seco, gesticulando discretamente para Sirius e James se sentarem.
"Está sim, Professora McGonagall..."
"E esse livro em suas mãos?"
Carter e Tyrone respiraram fundo, tomados por expressões ansiosas, diante da possibilidade de serem delatados. Com a professora, eles se borravam.
Remus, no entanto, ajustando os óculos sobre o nariz com o indicador, declarou:
"Eu encontrei este livro mais cedo sob uma carteira e estava verificando se pertencia a alguém da turma. O Carter estava falando que era dele..."
Sirius sacudiu a cabeça com inconformidade e foi a vez de James respirar fundo. Uma parte dentro de Remus também sacudia a cabeça e puxava o ar para os pulmões com inconformidade. Se ele pudesse ser um pouquinho mais mau-caráter, reativo, vingativo e explosivo como o lobo sussurrava, vez ou outra, em seu ouvido, dizendo que tudo bem não prestar sempre, Carter e Tyrone estariam, realmente, fodidos.
Os olhos de Carter faiscaram quando Remus caminhou até ele, jogando o livro de Transfiguração sobre a mesa e ocupando, em seguida, a sua carteira de aluno exemplar na primeira fileira.
Tyrone também conjurou com a sua expressão irascível alguns feitiços imaginários em direção a Lupin. O restante da turma se manteve em silêncio, acreditando que Remus era digno demais para criar uma confusão e, naquele momento, o acharam realmente superior, ainda que o rapaz não movesse o seu rosto para trás, parecendo arrogante ao criar alguma tensão.
No término da aula, James colocou o braço ao redor do pescoço de Remus, perguntando enquanto os quatro amigos caminhavam pelo corredor em direção à sala de História da Magia:
"Se você quiser, a gente vai atrás do Carter e do Tyrone..."
Remus sacudiu o rosto.
"Ah, deixa pra lá! Desde o primeiro ano, eles são assim! Nunca foram com a minha cara por eu ser mestiço e tal..."
"E desde o primeiro ano, não me importo em dar umas porradas em puristas pra te defender, lobinho! Carter e Tyrone nunca foram com a sua cara por eles serem dois babacas, isso sim..." — declarou Sirius, passando por um grupo de meninas, que, imediatamente, pareceu magnetizado por sua presença, ainda que o grifinório não lhe desse atenção.
"Por que não delatou os dois pra McGonagall?" — indagou Pettigrew, mascando bolas de chicle bruxo.
Lupin deu de ombros e não respondeu. Contudo, James puxou o rapaz para perto de si com o seu braço e encostou a cabeça na dele, dizendo:
"Porque o Remmy é bom demais pra esses merdas puristas..."
Remus respondeu com um sorriso enviesado. A luz solar projetada pela vidraça de uma das janelas do corredor tremeluziu em sua retina circundada de amarelo.
"Nem tanto assim. Houve vezes em que não interferi... E deixei vocês fazerem o que bem entenderam com os imbecis puristas..."
"Quando você tá perto do seu ciclo, fica mais rebelde, mais Maroto, mais lobo... Que tal dar o aval pra gente agora, representante de turma?" — insistiu James.
Remus sorriu, revelando o seu canino torto e evidente enquanto apertava o queixo do amigo, aproximando o seu rosto.
"Fica quietinho, James Potter. E faz só o que eu te mandar fazer, ouviu?"
Sirius se deteve, fitando os dois grifinórios que sorriam um para o outro. Aquelas brincadeiras entre Lupin e Potter pareciam não ter fim.
"Vou fumar um cigarro no banheiro antes da aula. Vem comigo, Potter?"
"Claro!" — concordou James, soltando Remus— "Vou precisar de um estímulo antes da aula do Professor Binns..."
Remus entortou a boca para o lado, indagando:
"Ainda tão nessa de fumar cigarros bruxos escondidos?"
"Tô, já que não posso fumar na frente de todo mundo. Pode vir junto também se quiser, Remus..."
"Minha mãe me mata! Nos vemos daqui a pouco!" — despediu-se Lupin, dobrando num corredor ao lado de Pettigrew e rumando para a sala de História da Magia. González, uma intercambista de Ilvermorny, fez menção de ir falar com Remus, mas a jovem se refreou ao ver o quartanista cumprimentar o Professor Flitwick, que deixava uma sala.
Minutos depois, em um outro andar, Black e Potter se encontravam numa cabine do banheiro masculino, expelindo fumaça por suas bocas enquanto batiam a guimba numa das claraboias do recinto.
Sirius deu uma tragada forte, antes de comentar um pouco sem jeito:
"Nada a ver o que o Carter falou mais cedo!"
James concordou:
"Fico com muita raiva quando enchem o saco do Remus também... Principalmente porque o Carter e o Tyrone são dois puristas que perseguem nascidos-trouxa e mestiços e só por isso, não gostam do Remus."
Black passou a mão por seu pescoço, dizendo:
"Er... eu também fico muito puto com isso. Você sabe, mas, na verdade, tava me referindo a outra coisa que o Carter disse..."
James deu uma outra tragada, antes de mover os olhos com confusão:
"Que coisa?"
Sirius remanchou, tragando lentamente o cigarro e dizendo, após um considerável tempo em que Potter chegou a acreditar que o amigo se esquecera do que ia falar.
"... Aquilo que o Carter disse... Perguntando se o Remus era o meu namorado e tal. Quer dizer, nada a ver... Não imaginei que iam maldar a nossa amizade... Somos dois garotos! Que ideia!"
Havia um rubor leve nas faces de Black e o rapaz de cabelos compridos pigarreou por nervoso ou pela fumaça.
James não respondeu também de imediato e, mantendo-se calado por um prolongado minuto, ele lançou um de seus olhares enigmáticos em direção ao amigo. Quando o grifinório fez menção de finalmente falar, houve o barulho da porta externa do banheiro sendo empurrada e os garotos se mantiveram quietos, a princípio para não serem descobertos e depois, ao distinguirem duas vozes conhecidas.
"...Se não fosse por McGonagall, eu enfiava a mão na cara do Black, do Potter e principalmente do Lupin! Quem aquele sangue de merda acha que é, querendo fazer média e posar de bonzinho?!" — declarou Tyrone.
"Se o pessoal da Lufa-Lufa e da Corvinal não tivesse votado nele, a Davies ou o Harington podiam ser nossos representantes de turma. É ridículo aquele sangue-ruim nos representar!"
Sirius, dentro da cabine, sacudiu a cabeça, antes de jogar a guimba de cigarro dentro do vaso sanitário e dar a descarga. Potter imitou o seu gesto, destrancando a porta em seguida. Os sonserinos, que papeavam próximo aos mictórios, permaneceram muito pálidos quando se depararam com os grifinórios.
"Além de maus perdedores ainda são idiotas! Querem tentar enfiar a mão na minha cara agora?" — indagou James, tirando a sua varinha de dentro das vestes.
Carter olhou um pouco apreensivo para o artefato mágico enquanto Tyrone se manteve com uma expressão desafiadora.
"Por que vocês defendem tanto o Lupin? O representante de turma do quarto ano é um mestiço! Vocês, sendo sangue-puros, não se importam com isso?"
Sirius contraiu as sobrancelhas sobre os seus olhos cinzentos.
"Não só não nos importamos, como votamos nele pra ser o representante de turma!"
"... Sério? Escolheram uma bicha pra ser o representante de turma do quarto ano?" — vociferou Carter.
Os grifinórios se detiveram com as suas varinhas em punho.
"Que?!" — indagou Sirius, tremendo um pouco os seus lábios.
"É! Os outros alunos comentam! Remus é uma bicha, uma mulherzinha, um chupador de pau! Não vão me dizer que não sabiam!" — provocou-os Tyrone.
James parecia menos abalado do que Sirius, que empalidecia um pouco e digeria as palavras com dificuldade. Ao falar, o rapaz de cabelos rebeldes endireitou os óculos sobre o nariz com o dedo anelar e, em seguida, apontando a sua varinha, tinha uma voz muito ríspida:
"Querem saber? Eu tô de saco cheio de vocês dois!"
Carter se antecipou, mostrando as mãos vazias diante de si:
"Ei, a gente deixou as nossas varinhas na sala de aula! Vão nos enfeitiçar sem podermos nos defender, Grifinória? É assim que demonstram a sua coragem?"
Sirius, que ainda parecia um pouco abalado, recuperou-se, dizendo enquanto abaixava o pulso de Potter. Dirigiu-se aos sonserinos então:
"A gente não precisa de varinha pra quebrar a cara de vocês, seus cuzões puristas!"
E, fechando os seus punhos, os grifinórios avançaram em direção a Carter e a Tyrone, acertando-os tantas vezes quanto tivessem oportunidade, antes que algum aluno ou monitor, vendo a confusão, chamasse Filch para apartá-los.
NOTAS DA AUTORA
Assim como na fic original escrita por mim, a narrativa pula da entrada dos Marotos em Hogwarts para o quarto ano. Há um propósito para isso na história.
O que mais gostei de modificar nesta versão a partir da fanfic original foi a postura do Remus. Eu gosto como o Remus reage aqui e como há algo de debochado nele. De como ele é orgulhoso e comete erros como um autêntico grifinório, apesar de não se perceber.
Afinal, ele tem um lobo dentro dele, que é uma criatura das trevas. E isso o torna um tanto manipulador também. Melhor eu parar de falar para não cair na armadilha dos auto spoilers rsrs.
Por último, gosto de pensar no Sirius e James (Tiago) como garotos precoces de narizes em pé e com uma aparente autoconfiança. E também gosto de pensar no que pode tê-los amadurecido até o sétimo ano?
