Nota da autora (setembro/2020): Crianças lindas da (ex) Shampoo-chan :)

Reescrevi mais uma vez a história, inserindo alguns trechos nos capítulos. Vou atualizar de dois em dois dias. Infelizmente o trabalho remoto não me deixa fazer isso sempre :(

O motivo de eu reescrever mais uma vez é porque reli uma vez no início da pandemia e achei alguns trechos bem estranhos e fiquei incomodada... sem contar que ainda havia vários "deslizes" de digitação e de concordância... Acho que porque deve ser uma das minhas primeiras histórias e mudei muito a minha escrita de lá pra cá.

A essência é a mesma, só acrescentei mais cenas para desenvolver mais os personagens. Também colocarei os outtakes (cenas extras) na outra parte criada só para isso. Vocês viram que coloquei lá sobre a última noite da Rin em Nagoya? Eu achei que poderia ser o primeiro capítulo daqui, depois decidi deixar lá mesmo. Os capítulos estão maiores (os primeiros tinham no máximo 6 páginas).

Uma coisa que me deixa satisfeita numa história é ler e "esquecer" que quem escreveu. Acho que foi outro motivo para reescrever porque toda hora eu ficava me perguntando "wtf, por que diabos escrevi essa parte?". Penso que agora está do jeito que eu quero hahahah.

Desta vez a história está finalizada. Aproveitem minha animação com SessRin. Hahaha.


Nota de 2010: Poderia simplesmente ter deletado toda a história (era a minha vontade, acreditem), mas minha lindinha Rin-chan comentou em quase todos os capítulos, esteve presente do início até o final, e realmente me deu pena perder os comentários dela...

Se acharem este capítulo digno de comentário, ficarei feliz em receber um.


UM CAMINHO PARA DOIS

CAPÍTULO 1

Ele no caminho dela.

Primeiro dia de aula do último ano da faculdade de Direito da Universidade de Tokyo.

Nozomu Rin andava pela primeira vez naqueles corredores, procurando pela sala onde deveria ter a primeira aula. Tinha sido transferida de outra cidade: Nagoya, capital da província de Aichi, quarta maior cidade do Japão, maior cidade da região de Chūbu.

De gorro de lã em tom bege, vestido e casaco verde até a altura da perna, meia-calça escura de fio mais grosso para se proteger do frio e botas do mesmo tom do gorro, ela deu um suspiro cansado.

Mudou para a capital para ficar apenas os semestres de inverno e de verão, concluindo assim o curso. Por conta dos últimos acontecimentos da vida, a perda de uma pessoa querida, ela decidira sair da cidade natal e ir para qualquer cidade longe do distrito de Aichi.

Com vinte e dois anos, podia passar por uma garota no final da adolescência por conta das roupas coloridas e dos chapéus de diversos modelos que usava para evitar o frio na cabeça. Era sempre confundida com uma menor de idade em bares e restaurantes, tendo que às vezes mostrar a identidade na hora de comprar bebidas para provar que tinha vinte anos. Na faculdade em Nagoya, era sempre uma elegante "garotinha", como alguns gostavam de chamá-la, na falta do adjetivo "moça", porque certamente ela não parecia ter idade suficiente de estar na faculdade.

Rin conseguia contornar a situação chamando a atenção para as maiores médias e trabalhos acadêmicos considerados excelentes, esforçando-se para conseguir os melhores pontos e ser a primeira da turma ou pelo menos uma delas.

Agora ela estava andando pelo corredor procurando o local correto para a primeira aula, sem se perder. "Universidade de Tokyo, nee...", pensou com um pequeno sorriso. Quando imaginava que estaria ali algum dia?

Procurou a sala de aula enquanto escutava algumas músicas que gostava pelo iPod com a tela quebrada.

Entrou no espaço em forma de auditório circular e esperou pela chegada do professor. Ninguém além dela mesma havia chegado ainda, e procurou uma cadeiras na parte mais alta para se sentar, permitindo-se assim ver quase todos de cima.

Deu outro suspiro ao colocar a bolsa em cima da mesa. Estava exausta. Ainda sentia os efeitos da mudança e de ter que arrumar as coisas no apartamento mobiliado. Até o momento estava indo bem, mas não terminara de arrumar o guarda-roupa. Trouxera roupas e mais roupas feitas pelo primo estilista, criadas especialmente para ela.

Depois de alguns minutos notou que um outro aluno chegou.

Analisou-o em silêncio: era um homem atraente. Bem dito – bastante atraente. Cabelos prateados passando os ombros, nariz fino, perfil japonês, alto, roupa social e material à mão. Deveria ter pelo menos a idade dela – se é que acreditavam que ela tinha mais de vinte anos. Ele entrou, não sorriu uma única vez ao encontrar o olhar dela, ignorou-a como é normal entre os que não se conhecem.

Mudou uma das faixas que escutava e começou a cantar baixinho, nem um pouco acima do limite para não chamar a atenção, enquanto olhava o material que tinha trazido. Em qual capítulo será eles já estavam?

Não percebeu, portanto, que o rapaz que entrara estava parado em um degrau próximo a ela.

Mas o que aquela criança fazia numa sala de aula de um dos cursos mais concorridos do universo da Universidade de Tokyo?, pensava Taisho Sesshoumaru. Observou os traços e o modo de vestir dela: eram roupas caras, e podia ver pelos sapatos que ela não era qualquer estudante de classe média bolsista para poder estudar ali.

E o que ela estava cantando?

Cautelosamente aproximou-se dela para ouvir o que ela murmurava. De onde estava era possível ouvir o som do iPod, e provavelmente ela não havia percebido que apenas ela escutaria e que o fone de ouvido não reverberaria.

Mas ele queria descobrir quem era. Estava curioso para saber se era alguma daquelas crianças de altas habilidades que de vez em quando aparecem por ali.

-Olá. – ele tentou.

Sem resposta. Claro, ela estava escutando música, cantarolando baixinho e olhando o material da disciplina, tudo ao mesmo tempo. Faltava pular num pé só, para completar a lista de tarefas que poderiam ser realizadas simultaneamente.

Perto dela, percebera o brilho do cabelo por baixo daquele chapeuzinho, a pele bem cuidada e sem manchas. Não, definitivamente pertencia a uma classe mais alta, mas não era de Tokyo. A família de Sesshoumaru conhecia todos os membros da alta sociedade da capital.

Rin não notara a aproximação dele de imediato. Só sentiu um olhar em cima dela quando sua visão periférica captou um borrão parado ao lado. O rapaz bonito que vira entrar antes. Ele estava em pé, ao lado dela, observando os detalhes das... roupas dela, talvez?

Parecia que ele queria falar com ela, então tirou um dos fones e perguntou:

-S-Sim? – por que aquele rapaz estava olhando para ela daquele jeito?

E por que a voz tremeu ao tentar responder?

Ficaram em um silêncio perturbador, ambos se encarando. Felizmente ainda eram os únicos em sala ou alguém notaria aquele constrangimento.

Não, ela não era de Tokyo. O sotaque dela indicava outra origem.

-Sim? – ela insistiu um pouco mais esperançosa.

-Você sempre treina karaoke em sala de aula? – foi a pergunta inesperada que veio da parte dele.

Os lábios dela abriram, os olhos negros piscaram de surpresa.

Não era realmente a pergunta que ele queria fazer, mas foi a única que veio na hora.

Pergunta ignorante, resposta ignorante, ela aprendera com o irmão.

-Sim, adoro chamar a atenção em Direito Penal. Uso karaoke para trair a defesa. – ela falou num tom extremamente calmo e um pouco carregado de sotaque do sul.

Aquilo foi... choque passando pelos olhos do rapaz? Ou era raiva?

E de que cor eram os olhos dele? Eram dourados mesmo?

Seja como for, era ruim começar um curso novo com brigas, ainda mais de gente que poderia servir de ajuda na hora de se adaptar. Estava começando uma vida nova, longe de casa, longe dos problemas que teve em Nagoya. Suspirou e decidiu se desculpar:

-Sinto muito... Eu não vou escutar. Vou desligar agora. – ela tocou em um botão e a tela do iPod apagou. Depois enrolou-o no próprio fone e o colocou em uma bolsa que o rapaz julgou ser igualmente cara.

Sesshoumaru deixou o brilho de raiva desaparecer assim que a escutou pedir desculpas. O sotaque era de alguém criado na região de Chūbu, tinha certeza disso.

-Você é nova na turma ou entrou na sala errada?

-Desculpe? – ela franziu a testa ao encontrar novamente o olhar dele depois de guardar o iPod. Era uma guerra de mel contra chocolate.

-Você não era desta turma, não? – ele repetiu, colocando as mãos no bolso do casaco.

-Ah... – ela eu um sorriso tímido, enrugando ainda mais a testa como se fosse difícil responder – Eu vim transferida da Universidade em Nagoya. Meu nome é Nozomu Rin. – fez um aceno de cabeça e continuou – Muito prazer.

Nagoya – centro administrativo de Aichi.

-Taisho... Sesshoumaru. – ele pausou para se decidir falar o nome. Ela não precisava ter dito o dela, então era sinal de que queria que ambos se tratassem pelo nome pessoal, e não o de família – Igualmente.

Viu-a piscar ao ouvir o nome. Provavelmente não havia entendido. Não podia culpá-la, já que não havia pior nome no universo para os pais escolherem.

O rapaz pediu licença e escolheu um lugar para sentar mais próximo ao palco do auditório circular, terminando a conversa. Rin teve a impressão que ele poderia ser o exemplo de como seriam as demais pessoas em Tokyo: poucos relacionamentos, poucas conversas. Perguntas e respostas rápidas, sem interesse em manter conversa.

Vários outros estudantes chegaram e Rin teve que aguardar num misto de apreensão e ansiedade pela chegada do professor, pois sentia olhares curiosos em sua direção. Provavelmente percebiam que era nova ali, e ela não queria mais chamar atenção de ninguém.

Enfim o professor chegou: um homem que parecia ser bem enérgico, professor de Direito Penal. Rin não atraiu mais a atenção. Não precisava se apresentar como se estivesse no segundo grau. Mas ainda assim sentia olhares em cima dela, provavelmente de gente curiosa para saber quem era e de onde vinha.

Em um desses intervalos, um outro rapaz, desta vez de aspecto mais simpático, brinco na orelha, olhos e cabelos castanhos e sorriso extremamente brilhante a pegou pela mão e começou a conversar com ela, levando-a pelos ombros sem que percebesse até outra pessoa, uma garota que estava sentada em um dos cantos da sala. Ele falava sobre como era importante conhecer os novos alunos, principalmente se forem mulheres, perguntou pelo nome dela e de onde viera.

-Acho melhor ficar longe dela, Houshi, ou ela vai acabar descobrindo que você não vale nada. – uma garota elegante e de longos cabelos negros sorriu ao vê-la e fez uma carranca ao rapaz.

-Ahh... não fale assim, Sangozinha. Nozomu-san, esta aqui é Kawashima Sango e eu sou – deu o mais lindo sorriso que tinha – Houshi Miroku. Muito prazer.

Rin olhou as mãos nos ombros e ergueu uma sobrancelha para ele. Então era disso que o irmão dela sempre falava.

-Prazer em conhecê-los. – ela falou um pouco sem jeito, disfarçadamente tirando a mão dele de cima do ombro.

-Eu sei que está um pouco tímida por ser novata em nosso último ano, mas nós queremos apenas acostumar você com nossa turma, Nozomu-san. Nada de ficar sentada lá em cima, longe de todos, mexendo a toda a hora o seu lindo chapeuzinho. – falou o rapaz, colocando novamente as mãos no ombro da garota, que foram, logo em seguida, devidamente retiradas por Sango.

A garota afastou Rin do rapaz, fechando os olhos em uma irritação.

-Nem pense em fazer algo com ela, Houshi. – ela avisou.

Do outro lado do auditório, alguém observava a cena. Mal a garota chegou e aquele rapaz da família Houshi já estava aprontando? Claro que a menina dos Kawashima não iria deixar, Sesshoumaru observou mais para si mesmo. De onde estava era possível ouvir a conversa.

-C-Claro, Sangozinha! Eu não ia fazer nada... – deu um sorriso sem graça, coçando a cabeça. Rin apenas observava a cena. Sango viu que a garota ficou mais quieta e tratou de puxar conversa.

-E aí? Quer dizer que você veio de Nagoya?

-Sim, eu... – não havia necessidade de contar o que acontecera, certo? Não era o momento adequado para explicar a ainda desconhecidos o motivo da mudança dela – Eu vou terminar o curso aqui. – terminou a explicação com um sorriso que fez Miroku se derreter.

-Que sorriso bonitinho. – ele observou.

Rin corou e tratou de colocar o gorro na cabeça para disfarçar. Sango a puxou para um canto e falou-lhe:

-Escute, tome cuidado com ele. Só tem aquela carinha de monge, mas é um delinquente muito perigoso.

Rin arregalou os olhos e perguntou:

-É mesmo?

-Ei, Sango! Não queime meu filme com ela! – ele sibilou num tom sem graça.

-Seu filme já é queimado há muito tempo, meu querido Houshi. – ela deu um sorriso muito maligno.

-Ei... – ele ficou totalmente sem jeito – Mas eu não estou mentindo... ela é mesmo uma gracinha quando sorri.

-Vocês vão ficar muito tempo por aqui? – perguntou Sesshoumaru se aproximando do grupo. Ninguém havia percebido quando ele se levantara de um dos assentos nas primeiras fileiras.

Miroku olhou para trás, viu Sesshoumaru, e respondeu:

-Vamos sim. Por quê?

Rin e Sango não ouviram e tampouco quiseram saber qual resposta de Sesshoumaru. Continuaram conversando enquanto Miroku se explicava com o rapaz.

-Ah. – disse Sango batendo as palmas uma única vez como se tivesse uma grande ideia no momento que vira Sesshoumaru perto deles – Que tal tomar um café conosco e com alguns amigos nossos? Kagome e Inuyasha vão se alegrar muito em conhecer você.

-Bem... – Rin coçou a cabeça e deu o sorriso muito sincero – Eu acho uma boa ideia, sabe? Cheguei há dois dias aqui e não conheço mais ninguém além da mulher da secretaria. Ela me deu as direções da sala...


Depois de tomar um café com os novos conhecidos, Rin aceitou a carona de Miroku até a casa dela, apesar de ter entendido que o trajeto era o oposto ao que normalmente fazia. Mas houve uma insistência por parte dele e de Sango: eles queriam continuar a conhecê-la e mostrar também alguns lugares de carro.

-Então é aqui? – Miroku perguntou olhando o prédio residencial em um bairro de classe média um pouco afastado da faculdade.

-Eu nunca vim pra essas bandas. – Sango comentou do banco ao lado do motorista – É grande?

-Sim. – Rin comentou ainda no carro – Com dois quartos, sala, cozinha, banheiro e a varanda.

-Você disse que encontrou pela internet... – Sango comentou – Todo mobiliado, né?

-Eu fico com medo de os anúncios serem uma roubada. – o rapaz olhava desconfiado o prédio – Eu ouvi falar que aqui é bom de viver, mas nunca procuraria na internet.

-Eu fiquei com medo de encontrar uma banheira no meio da sala. – Rin deu um suspiro cansado – E realmente foi difícil. Eu queria algo perto da Toudai, mas não achei nada.

-Às vezes é mais fácil procurar quando já está aqui na cidade. – Sango foi mais otimista – Se por acaso você tiver algum problema aí e quiser mudar, pode nos falar que ajudamos.

-Ah, obrigada. – Rin tinha as duas mãos unidas num agradecimento – Espero não precisar, mas se ficar complicado por causa da distância, vou procurar sim outro lugar.

-Precisa de ajuda com alguma coisa? – Miroku perguntou – Você disse que chegou há dois dias.

Rin balançou a cabeça.

-Não preciso. Só tenho as roupas e os livros que trouxe na mala. Ontem fiz supermercado e enchi a geladeira. O apartamento já está equipado com tudo. Vou esperar meus livros chegarem esta semana.

-Então... – Miroku deu um sorriso e trocou um olhar significativo com Sango, destravando a porta do lado do passageiro de Rin – Está entregue. Você vai aparecer amanhã na Universidade?

-Sim. – Rin confirmou e se preparou para sair do carro, abrindo a porta – Obrigada, Kawashima, Houshi.

-Ah, Rin. – Sango moveu a mão na frente do rosto para desfazer a formalidade – Você pode nos chamar pelos nomes.

Rin deu um sorriso e concordou, saindo do carro. Acenou e esperou o carro partir e sumir na primeira esquina que dobrou.

Lançou um olhar para o terceiro andar, onde estava morando.

Entrou no edifício e subiu até o apartamento. Na porta encontrou uma caixa com o nome dela.

-Hashi já mandou meus livros? – ela piscou surpresa e olhou o remetente.

Sim, o irmão já havia providenciado a entrega dos livros que ela havia separado e precisava com mais urgência. Uma boa notícia.

Puxou a chave da bolsa, presa por uma corrente de liga mais fina e abriu a porta, empurrando a caixa de livros com o pé.

Assim que fechou a porta, deu mais um suspiro. Sim, definitivamente era cansaço ainda da mudança. Encostou a caixa em um canto e tirou as botas na pequena entrada destinada a essa função.

Ao entrar no apartamento, abriu as portas da varanda e deixou o ar frio da cidade entrar no apartamento para evitar o mofo. Logo que chegou de viagem, notou o cheiro desagradável, mas o proprietário afirmou que era porque o apartamento havia ficado fechado por três meses depois do último inquilino.

Ainda na varanda, ela tinha uma vista dos demais prédios e das ruas. Tokyo era tão iluminada... E no inverno anoitecia pelo menos uma hora mais cedo que em Nagoya, pelo que observou.

Olhou o apartamento vazio e levou uma mão ao coração para tentar amenizar a pequena angústia que sentia por estar ali sozinha.

Foi até a mesa da sala e pegou um papel com algumas anotações: arrumar as roupas no guarda-roupa, preparar comida para a semana, ligar para Hashi, ligar para Jakotsu. Não estava com a mínima vontade de fazer comida ou arrumar as várias peças que o primo pessoalmente colocou na mala, fazendo ameaças caso ela não levasse. Mas tinha vontade de ligar para a família depois de tomar banho.

Meia hora depois, de toalha na cabeça e roupão, ela passou pela sala e viu a porta da varanda fechada.

-Eu fechei essa porta? – ela franziu a testa.

Deu de ombros e se dirigiu ao quarto para colocar uma roupa mais confortável e depois ligar para a família.


Seis semanas se passaram desde que Rin mudara para Tokyo. Diferente do que pensava, não teve grandes dificuldades em acompanhar as disciplinas, mas o mesmo não podia dizer dos únicos colegas de turma e amigos que fizera até o momento, Sango e Miroku.

O inverno era mais forte que em Nagoya. Também as suspeitas do primeiro dia de aula de confirmaram ao longo das semanas que passaram: as pessoas na capital não tinham muito tempo para fazer amizades por ali, a julgar pela quantidade de pessoas na turma (pelo menos cinquenta) e o número de pessoas que realmente podia dizer que tinha alguma proximidade.

Era, por um lado, bom ter pouco contato. Ela, até aquele momento, não havia revelado os motivos de estar ali. E tampouco o casal fazia perguntas desse tipo.

Ainda.

Por isso naquele momento estava ali, em um gabinete de estudos em grupo da biblioteca, ajudando os dois amigos a revisarem a matéria para a próxima disciplina. Ele pareciam desesperados. E a prova era naquela semana.

-Pronto. Tudo ok. – ela entregou as últimas anotações que havia feito nas mãos de Sango – Assim não fica difícil.

-Não fica difícil?!– Sango sussurrou meio irritada no ouvido dela. – Essa é a matéria mais pesada do último ano, como pode dizer que não fica difícil?

Rin deu um sorriso sem graça e coçou a cabeça.

-Só Rin-sama acha que não é difícil, Sangozinha. – falou Miroku – É até agora a única pessoa que consegue se equiparar com Sesshoumaru-sama.

-Isso porque Rin-chan é muito inteligente – Sango comentou ao tirar, com um gesto gracioso, a boina azul-marinho que Rin usava naquele dia – E ela não é tão indiferente quanto ele.

Rin revirou os olhos e pegou de volta a boina, colocando-a na cabeça com força, quase como se quisesse grudar ali.

-Rin-chan não gosta muito de Sesshoumaru-sama. – Miroku se arriscou a comentar ao perceber quase as mesmas reações todas as vezes que mencionavam o nome do rapaz perto dela – Podemos saber o motivo?

-Não tenho motivos para gostar de alguém que não responde ao meu bom dia. – disse a garota sem emoção alguma, ainda ajeitando a boina na cabeça que ameaçava embaraçar as madeixas negras – Não sei como vocês ainda conseguem andar com ele.

Sango e Miroku se entreolharam.

-Não andamos com ele. Mas é irmão do nosso amigo InuYasha. Então às vezes podemos encontrá-los juntos.

-Que pena sinto de vocês.

Os dois tentaram conter uma risada.

-Só por que ele reclamou do seu canto naquele primeiro dia de aula? – Miroku perguntou e a garota franziu a testa.

-Como você sabe disso? – ela questionou, franzindo a testa. Tinha quase certeza que não havia ninguém na sala na hora.

-Ah, segredo nosso. – Miroku balançou a mão malandramente como se quisesse disfarçar alguma coisa – Esqueça isso e nos fale logo a verdade.

Sango apenas observava a amiga pelo canto do olho. Claro que não era fácil acompanhar o líder da classe. Por isso que o contato dela e de Miroku com Sesshoumaru se restringia a "ois" e "bom dias" educados por ser irmão mais velho do amigo deles, InuYasha, isso quando acontecia de estarem juntos.

-Não foi por causa disso. – ela balançou a cabeça para os lados – Não simpatizo com ele desde aquele dia que me começou a me chamar de...

Sango e Miroku aproximaram as cabeças para ouvirem melhor. Já haviam escutado a história e rido antes, mas era sempre divertido ver Rin falar.

-"De..."? – falaram para persuadi-la.

-"Menina". – ela repetiu num desprezo.

Não havia nada, nada mesmo, nada pior que as pessoas a tratarem por "menina".

-Ninguém me chama de menina.– enfatizou a garota, fazendo uma cara aborrecida. Segundos depois ergueu um punho e falsas lágrimas escorriam em cascata do rosto – Eu luto tanto para que as pessoas não me peçam os documentos na hora de comprar vinho e que meus colegas me respeitem!

Os dois colegas que a acompanhavam tentaram, em vão, conter uma risada.

-Ai, ai, Rin-chan...- falou Sango – Eu não me canso de imaginar a sua cara nessas horas... Eu nunca fiquei por perto quando ele vem conversar com você.

-É mesmo, né, Sango? – Rin aproveitou para ser mais sarcástica – Lá na minha cidade dizemos que aos olhos dos outros, a pimenta não arde.

-Eu fico imaginando como Rin-chan é a única a não se derreter por Sesshoumaru. – Sango observou séria – Você deveria ver como as garotas agem perto dele. Parecem que estão no segundo grau.

-É mesmo? – ela arregalou os olhos.

Uma enorme gota surgiu no rosto dos dois, e eles tentavam disfarçar o sorriso sem graça.

-Rin-sama... Praticamente todas as garotas são loucas por ele. – Miroku deu uma pigarreada, erguendo o dedo em uma explicação. – Ele foi perseguido por uma ex-colega da nossa turma há algum tempo.

-Eu não sou uma delas, Miroku. – falou Sango corando. Ele também corou ao escutar aquilo e Rin se sentiu extremamente desconfortável. Era óbvio para ela que os dois se gostavam, mas não estavam juntos por algum motivo.

Imaginou depressa alguma coisa para prosseguir a conversa e impedir que o assunto avançasse na parte dos relacionamentos.

-Ah, minha família pediu para tirar fotos no Uta Hiroba. Vocês acham que podemos ir este fim de semana lá?

Uta Hiroba era um dos bares de música mais conhecidos do Japão. E claro que o pedido para passar lá e tirar uma foto tinha sido do irmão.

-Ah, claro. Você não deve ter tido oportunidade de visitar nada, né? – Miroku perguntou.

Rin negou com a cabeça. Não, ela ainda não conhecia a cidade direito.

-Podemos passar lá no sábado com Kagome e InuYasha também. E depois a gente tira a prova no karaoke, Rin-chan.- falou Sango com uma piscadela. Rin deu um sorriso sem graça e coçou a cabeça. Claro que ela não tinha intenção de cantar. O irmão pedira para tirar fotos, não tinha feito planos para cantar.

-Existe karaoke para as crianças no Uta Hiroba? - alguém falara atrás dos três. Eles se viraram para olhar e Rin fez uma discreta careta.

Era Sesshoumaru ali. Altivo, com livros nos braços, expressão séria. Ou quase isso. Ele olhava Rin com um interesse diferente. Parecia que esperava uma reação dela.

-Olá. – ela poderia até ter disfarçado a expressão no rosto, mas a voz era de desprezo – Não se tem para criança, mas os mais velhos estão convidados.

De novo, choque entre os olhares. O chocolate não queria se misturar com o mel. O ambiente ficou escuro, como se uma tempestade estivesse se aproximando e os raios fossem emitidos apenas pelos olhos de Rin, enquanto que os de Sesshoumaru permaneciam indiferentes.

-InuYasha pediu para avisar que vai encontrá-los mais tarde com Kagome. – ele ousadamente desviou os olhos dos de Rin.

-Ah... –Sango e Miroku piscaram, e ela continuou – Muito obrigada por avisar, Sesshoumaru-sama.

Recado dado, ele se afastou, deixando o grupo sozinho.

Rin rangeu os dentes ruidosamente. Os amigos apenas sorriram sem graça.

Para mudar o clima, Sango anunciou unindo as mãos esperançosamente:

-Bem, podemos voltar a estudar, né?

-Ainda? Mas isso aqui é muito fááác... – a fala foi interrompida quando Sango puxou a bochecha dela.

-Pode ser fácil pra você, mas Código Penal é o terror do quinto ano. – pegou as anotações de Rin e segurou uma folha de papel em cada mão – Como você consegue tantas anotações assim?

-Meu pai já foi advogado da área e me ajudou com algumas informações. Eu ligo pra ele nessas horas. – ela deu um sorriso sem graça. Depois os olhos ficaram estreitados na direção de Miroku, afastando uma das mãos dele que meramente se aproximava dela – Tire suas mãos daí.

-Nossa, Rin-chan tem um sexto sentido apurado... Como sabia que Miroku podia tentar alguma coisa com você? – Sango estava espantada.

-Por que ele ficou muito quieto nos últimos minutos. – ela sorriu graciosamente.


Rin voltou para casa com nova carona de Miroku e Sango. Ao entrar no apartamento, fez o ritual que desenvolveu nas últimas semanas: tirou as botas, abriu a porta da varanda para entrar um vento fresco, regou as plantinhas que começara a cuidar para deixar o apartamento mais alegre, olhou a lista de tarefas para o dia, foi tomar banho e se preparou para ligar para os pais.

-Ah... de novo... – ela gemeu ao passar pela sala. A porta da varanda estava novamente fechada e ela tinha certeza de que não havia deixado daquela forma.

Deu um suspiro cansado e, depois de vestir uma roupa confortável, resolveu se jogar na cama e olhar o teto do quarto.

Por vários minutos ficou daquela forma: olhando o teto, um braço em cima da testa, o quarto mergulhado em silêncio.

-Aki... – ela murmurou.

Virou o corpo de lado, o cabelo negro totalmente espalhado no lençol, sentindo os olhos marejados.


Na semana seguinte, os comentários eram diversos nos corredores da faculdade com a divulgação das notas das disciplinas.

-Sesshoumaru-sama tirou uma boa média este semestre... – dissera alguém.

-Nozomu-san também tirou uma boa média. – outro comentava.

-Parece que foi a mesma de Sesshoumaru-sama.

-Os dois devem estudar juntos, né?

-Acho que não... Nozomu-san sempre estuda ao lado de Kawashima e Houshi... – a turma toda comentava.

Os comentários continuavam dentro da sala. As maiores médias eram de Rin e de Sesshoumaru. Ela, Miroku e Sango conversavam na sala enquanto a próxima aula não começava.

-Acho que estão falando de nós... – comentou Rin num sussurro com os dois amigos ao perceber que alguns olhavam para eles.

-Também estão falando de Sesshoumaru-sama. As garotas estavam suspirando. – Sango revirou os olhos – Agora começo a entender o que Rin-chan sente.

-Por que vocês o chamam pelo nome? – quis saber Rin, tirando o chapeuzinho rosa que usava naquele dia.

-Pra não confundir com Inuyasha, caríssima Rin-chan – Miroku já tinha as mãos nos ombros dela e fazia uma massagem – Que tal comemorarmos mais tarde com ele e Kagome, hein? Acho que você precisa conhecer mais lugares aqui na capital.

-Ah... – que massagem boa... – Não sei... – tirou rapidamente as mãos de Miroku dos ombros e deu um suspiro – Na verdade, tenho que sair pra comprar um celular ainda hoje.

-O que houve com o seu? – Sango perguntou.

Rin colocou um dedo próximo aos lábios e ficou com um ar pensativo.

-Eu acho que perdi.

-Você não tinha perdido um na semana passada?

-Pois é, eu perdi o novo. – ela deu um suspiro cansado, ignorando o evidente choque no rosto dos amigos – O próximo vou amarrar no pescoço. Amanhã não tem prova, né?

-Teremos sim. – alguém confirmou atrás deles.

Os três se voltaram para a voz.

-É? – Rin franziu a testa e coçou a lateral do rosto, pensativa – Acho que deixei passar então.

-Bem, então teremos que refazer os planos. – Sango tinha um ar cansado ao respirar pesadamente – Você quer passar em uma loja para comprar um aparelho mais tarde e jantar na minha casa? Meu irmão pode levar você pra casa depois.

-Ah, eu adoraria.

-Nozomu – Sesshoumaru falou, fazendo o grupo se assustar ao notar que ele ainda estava presente. Mais assustada ainda estava Rin ao escutar o nome pronunciado por ele.

Silêncio se fez. Ficaram se observando.

-Oi? – ela se ajeitou na cadeira e tentou se mostrar o mais séria possível.

-Parabéns pelas notas. Parece que estão comentando.

-Ah... verdade? – Rin fingiu surpresa. Claro que estavam comentando. Inclusive comentavam que ela e Sesshoumaru estudavam juntos! Absurdo isso.

-Como praticamente temos as mesmas médias, pensei melhor em me juntar ao grupo de vocês... – Sesshoumaru enfiou as mãos dentro dos bolsos da calça social e tinha uma expressão tranquila. Não iria provocar Nozomu. Resistiria muito bravamente à tentação de irritá-la – Vocês aceitam mais um no grupo ou teria algum problema?

Oh-oh. Era isso então.

Silêncio se fez.

-Francamente, é claro que teria problema sim. – ela falou tão normal quanto dois mais dois são quatro – Um monte de gente poderia nos interromper pra falar com você. Professores, colegas, fãs...

Mais silêncio. Sango e Miroku olhavam tanto para a amiga quanto para o colega.

Sesshoumaru internamente sorriu malignamente enquanto tentava manter a aparência serena. Iria provocá-la para fechar a cota diária.

Isso significava que ele insistiria e não se daria por vencido.

-Essas pessoas não atrapalham tanto assim. E você sabe que podemos trancar a porta e colocar avisos para ninguém atrapalhar.

-As fãs também? – ela quis saber.

-"Fãs"? – ele ergueu uma sobrancelha e olhou os outros dois colegas.

Rin começou a falar e falar e aparentemente estava esquecida do japonês padrão ou quase isso: deixou escapar o sotaque e não fazia pausas. Os três ouvintes tentavam acompanhar o máximo que podiam. Rin quase não tomava fôlego e deixou até mesmo Sesshoumaru surpreso ao perceber que existia alguém assim.

Na primeira pausa que ela fez, ele arriscou.

-Podemos começar então amanhã os estudos?

Um estalo para Rin. Empalideceu e tratou de inventar um "não" bem caprichado, entretanto Miroku e Sango tomaram a palavra.

-Sim, Sesshoumaru-sama. Amanhã estaremos estudando na biblioteca.

-Certo, então até mais. – e foi embora com a mesma tranquilidade que apareceu ao atrapalhar a conversa do grupo.

Um momento de silêncio se fez.

-Com o que foi que vocês concordaram? – saía fogo dos olhos dela.

-Calma, Rin-chan... É melhor nós quatro estudarmos juntos. É bom para o nosso aprendizado. Você não se sobrecarregará ao nos ensinar. – Miroku ergueu uma mão na frente do rosto como um monge.

-Mas tinha que ser justo com ele? Sério? Ele nem dá bom dia pra vocês.

-Rin-chan... Estamos no quinto ano. Não é uma boa época para ficar de briguinhas com outros estudantes como se fôssemos crianças.

-Grrrrr... –Rin rosnou diante da palavra mágica e ajeitou uma boina vermelha com raiva no alto da cabeça. Parecia que queria esconder o rosto com ela.

-Não pense que isso funciona conosco, Rin-chan. – Sango tirou a peça que ela tinha colocado e ficou brincando com o objeto, circulando a borda na ponta dos dedos.

-Sango!ela sussurrou com raiva para a colega, temendo chamar a atenção – Devolve isso.

-Pega, Miroku!

-É pra já! – o rapaz pegou o objeto que Sango arremessou.

-Miroku, Sango, parem com isso! Por favor! – Rin falava numa voz de choro.

-Que bonitinha a Rin-chan falando desse jeito! Manda, Miroku!

Os dois fizeram mais uma jogada, mas, infelizmente para eles, alguém interrompera a brincadeira e pegara no ar o chapéu de Rin.

Os três olharam e viram Sesshoumaru sério, como usual, segurando a peça.

-Está aqui. – ele falou e colocou o chapéu na cabeça da garota.

Tão alto... E tão grande...

-Não faça bagunça, criança. – ele terminou, afastando-se dos três.

Miroku e Sango abafaram a risada ao ver a expressão de surpresa e, em seguida, de raiva que a garota fizera.

-Vocês vão me pagar por isso! – ela fechou os punhos com raiva, mas não parecia nem um pouco ameaçadora.


As ruas do bairro de Rin ficavam mais vazias e mais frias durante o inverno em Tokyo, ela observou enquanto voltava sozinha para o apartamento com uma sacola de compras de tecido nos braços.

Abriu a porta de entrada do prédio com um código, entrou, subiu até o terceiro andar. Tirou a chave amarrada em uma corrente presa no pescoço. Medida de segurança caso perdesse em algum lugar.

Ao entrar no apartamento, colocou as compras em cima da mesa e abriu novamente as janelas da sacada.

Por um momento, apenas respirou fundo e sentiu uma brisa fria passar pelo rosto. O apartamento não tinha mais o cheiro de mofo de antes. Também tinha mais plantas e flores tanto dentro quanto na sacada. Ela gostava de verde em casa. Era uma energia positiva.

Ao voltar para a mesa, viu a nota com a lista de tarefas para aquele dia. Fazer compras. Ligar para a família. Estudar para a prova de amanhã. Regar as plantas.

Ah, então realmente havia uma prova que ela não lembrava. Mas por que havia esquecido? Ela geralmente nunca esquecia.

A testa estava franzida enquanto tirara os produtos de dentro da sacola de pano. Brócolis. Nabo. Tofu. Pasta de amendoim. Feijão japonês. Temperos. Uma garrafa de vinho da região Koshu. A identidade para provar que era maior de idade para comprar a garrafa. Por que ela não lembrava da prova?

Continuou tentando entender o que havia acontecido enquanto tomava um banho quente, o rosto voltado para cima enquanto recebia a água e sentia os vapores subindo pelo box do banheiro.

A lembrança de um antigo aniversário de namoro atingiu uma parte do cérebro e ela arregalou os olhos, suavizando a expressão segundos depois.

Então era por isso que havia esquecido, finalmente compreendeu ao desligar a água quente e pegar uma toalha para enrolar na cabeça. Seria aniversário de namoro dela com Aki.

Enrolou outra toalha no corpo e abriu o box de vidro, dando um suspiro pesado.

Ao sair do banheiro para passar para o quarto, sentiu que a sala estava muito mais fria que o de costume. Estava gelada.

Ao olhar para a sacada, arregalou os olhos por um segundo.

Parecia que tinha visto alguém ali, perto das plantas. A porta estava aberta e isso explicaria o ambiente estar mais frio.

Piscou e depois viu que era apenas uma falsa impressão. Não havia ninguém ali.

Aproximou-se, fechou as portas de vidro e as cortinas.

O estresse da semana de provas estava fazendo com que ela visse coisas que não existiam e esquecesse outras importantes.