Nota da autora: Mais uma parte! Espero que gostem e que possam comentar :D Obrigada a quem comentou no capítulo passado: isabelle36, Jo, Li'Luh, Marilia, Bruna-san e Riloli. Obrigada a Marilia por ter lido esta parte antes pra dar ok :D

Vou trabalhar desde já no capítulo 11 pra ele sair sem atrasos até metade desta semana.

COMENTEM :D


UM CAMINHO PARA DOIS.

CAPÍTULO 10

Os caminhos dos outros

Em um quarto grande do Hospital Central de Nagoya, um casal escutava música dividindo um fone de ouvido. Ele, um jovem de cabelo e olhos castanhos claro, estava deitado na cama. A garota tinha posicionado uma cadeira para visitas para se sentar perto dele, ipod em mãos.

Escute essa agora. – Rin colocou um lado do fone próximo ao ouvido dele.

O rapaz apenas olhou e deu um sorriso enquanto a via colocar o fone e manusear o aparelho de música. Ela havia pedido ao irmão que colocasse mais alguns álbuns de bandas japonesas, indicações que encaixaram no gosto de ambos.

É do novo CD deles. – ela sorriu, baixando o rosto depois para selecionar outra canção – Foi Hakudoushi quem escolheu.

Hakudoushi escolhendo coisas legais. – ele deu outro sorriso forçado – Essa é uma novidade.

O quarto ficou em momentâneo silêncio apenas para se ouvir Rin cantarolando baixinho alguma canção.

Rin... – ele começou num tom mais sério – Meu pai contou que você trancou o curso.

A garota congelou os movimentos por um segundo. Depois, deu de ombros.

Eu faço depois, Aki. Ano que vem.

É seu último ano. – ele insistiu pacientemente.

Não tem problema. Eu faço depois. – ela propositalmente mexia nos botões para escolher outra música, um fone apenas de um lado do rosto. O outro pendia na lateral.

Se for por minha causa, eu...

Ah! – ela o interrompeu irritada, punhos fechados batendo com força nas pernas – Por que você vai se preocupar com isso agora? Sou EU quem precisa se formar e não tô preocupada agora!

Rin... – ele deu um suspiro extremamente cansado, como se reunisse todas as forças para fazer aquilo – Eu já disse que não precisa vir aqui todos os dias. Você trancou um ano por causa disso. Não consegue entender? Ia ser a mais nova a se formar na sua turma.

Não preciso desse título de "A mais nova da turma". – ela teimosamente evitava encará-lo para evitar mostrar que ele tinha razão – Eu quero ficar aqui com você. E por que o seu pai foi contar essas coisas? Nem é da conta dele.

Rin... – ele falou num tom de aviso – É melhor parar por aí.

A garota cruzou os braços e não se deu por vencida. O pai dele não tinha mesmo que ficar tecendo comentários sobre a decisão dela.

Você vai mesmo ficar assim até o final do horário de visita? – a voz dele saiu quase um sussurro, estendendo a mão com um enorme esforço para alcançar a dela.

Rin suavizou a expressão no rosto. Não precisava fazer aquilo. Não era preciso perder tempo com discussões inúteis, ainda mais com ele naquele estado.

Eu não estava me concentrando nas primeiras aulas. Achei melhor trancar. – ela explicou e aceitou a mão dele, apertando-a com força – Mas não quis dizer pra não te deixar preocupado.

Poderia ter dito. Eu podia ajudar.

Rin cobriu a mão dele com dela e deu um enorme sorriso.

Daqui a pouco você melhora e aí eu volto a estudar pra você me ajudar, né?

Não houve uma resposta por parte dele. Ele tentou de alguma forma apertar com mais força os dedos, mas não sentia que era o suficiente. Há algumas semanas, quando se sentiu mal e teve que ser internado, ele ainda conseguia fazer aquilo apenas com um pouco de dificuldade.

Uma batida na porta chamou a atenção deles.

Pode entrar. – ela falou num tom que a pessoa do lado de fora pudesse ouvir. Já sabia quem era. Estava quase na hora de ir embora.

Segundos depois, o irmão de Rin entrava no quarto.

Boa tarde. – ele falou com cuidado, aproximando-se do casal. Aki estava com a cabeça voltada para a janela, na direção da garota.

Ao escutar a voz do outro, lentamente virou o rosto para a visita e encontrou o olhar dele.

Hakudoushi... – Aki falou tão suavemente que se Hakudoushi estivesse a mais de dois passos de distância não teria ouvido e nem visto um brilho diferente nos olhos dele – Veio buscar Rin?

Sim... – ele esfregou a nuca com a mão esquerda, como se estivesse sem jeito – Se já estiver tudo bem.

Tá sim. – a irmã respondeu enquanto arrumava as coisas que trouxera: livros, revistas, um cachecol e o casaco. O ipod ainda estava em mãos e ela colocou ao lado de Aki na cama – Vou deixar isso aqui.

Houve um toque prolongado entre as mãos e parecia que quem não queria soltar era ele, até que eventualmente teve que fazer isso.

Voltando novamente o rosto para Hakudoushi, ele forçou um sorriso:

Obrigado por selecionar os CDs.

Oh... – ele arqueou as sobrancelhas. Havia feito aquilo no dia anterior – A Rin que pediu.

Ela adorou. Eu também. – ele piscou suavemente – Obrigado.

Os dois se encararam por vários segundos. Havia uma coisa na voz dele que incomodou Hakudoushi e ele, pela primeira vez em anos que se conheciam, desviou o olhar.

Vocês querem ficar mais um instante? – ele apontou com o polegar para fora do quarto – Eu fico esperando no corredor.

Oh... – Rin franziu a testa – Mais uns cinco minutos?

O irmão confirmou com a cabeça e a garota o viu trocar mais um olhar com o noivo antes de sair do quarto e fechar a porta atrás de si.

O que quer fazer em cinco minutos? – ele perguntou.

Nada, só ficar aqui com você. – ela sentou disciplinarmente na cadeira, olhos fechados e sorriso no rosto, uma das mãos segurando a dele – Você não se sente sozinho à noite?

Eu tenho a sua foto no ipod. – ele confessou - E minha mãe fica comigo. Não me sinto sozinho.

Rin deu um sorriso tímido. Ela gostava quando ele dizia aquelas coisas.

Desculpe ter me irritado quando me perguntou sobre a faculdade. – ela começou. Não queria sair sem explicar a reação que teve – Eu não estava escondendo de você. Só queria que não ficasse preocupado.

Eu não estou irritado também. Você toma as decisões que achar melhor. – ele apertou a mão dela – Mas me prometa que vai terminar o curso e se formar.

É claro. – ela deu o maior sorriso que tinha – E você estará lá comigo.

Rin sentou na cama sem fôlego e completamente molhada de suor enrolada no lençol de se cobrir. Estava usando o pijama favorito, um laranja e amarelo quadriculado, e não reconhecia onde estava.

–Aqui é a casa de... Ah!

Jogou-se novamente na cama ao lembrar de quem era a casa e por que estava ali. Um dos braços ficou na testa, os olhos fixos no teto.

Quanto tempo fazia que ela não sonhara com o último dia de vida de Aki? Se não estava enganada, nos primeiros meses em Tokyo tivera apenas um sonho com o passado.

Mas o que a fez mudar de cidade, de ambiente e conviver com outras pessoas não tinha sido a enorme vontade de esquecer aquilo tudo? Todo o sofrimento dos últimos meses com Aki doente e depois da morte dele?

Virou-se de lado, dando um suspiro pesado. Um dedo fazia desenhos aleatórios no caríssimo lençol de cama.

Rin notou pelo cortinado que o sol estava alto e que não impedia mais a luminosidade de entrar no quarto. Abriu a boca e levantou-se subitamente, indo até a janela e afastando as cortinas.

–Quanto tempo eu...? – perguntou, olhando para o jardim e vendo que muitos empregados trabalhavam limpando o lugar.

Olhou ao redor e procurou a mochila que arrumara com as roupas para passar o fim de semana fora. Escolheu um vestido de barra longa e rumou ao banheiro do quarto para tomar banho e trocar de roupa.

Enquanto arrumava o cabelo, notou pelo espelho o quanto parecia pálida. Beliscou as bochechas várias vezes para adquirir um aspecto mais rosado e fechou os olhos para circular os dedos de leve ao redor deles.

Depois de arrumada, ela saiu do quarto e olhou de um lado a outro no corredor.

–Acho que é por ali...

Ao encontrar a escada e descer até a sala de visitas que mais parecia um museu, ela encontrou o homem que trabalhava aparentemente há gerações ali e que a tratara como criança no primeiro encontro.

–Que bom que já acordou, sssenhorita Nozomu. Bom dia.

–Ah... ela curvou-se um pouco sem jeito – Bom dia... Jaken, né?

Sssim. Lorde Ssesshoumaru me pediu para atendê-la em tudo que precisssasse.

–Okay. – ela piscou duas vezes e tentou conter a vontade de rir ao escutar o "título" de Sesshoumaru.

–O café essstá pronto, sssenhorita Nozomu. Pode me acompanhar.

Obedientemente ela o seguiu.

–Mestre Jaken... – ela começou – Sesshoumaru está?

– "Mestre"? – ele perguntou, arqueando as sobrancelhas quase invisíveis.

–Eu posso chamar você assim? – ela inclinou a cabeça para o lado como se o estudasse.

–Bem... er... eu acho que sim. – desde que Sesshoumaru não soubesse, é claro. Era costume que empregados não fossem chamados por um tratamento tão alto como aquele.

–Que bom. – ela deu um sorriso – Pode me chamar de Rin. Só Sesshoumaru me chama de Nozomu.

Mass... – ele protestou.

Chegaram os dois a um cômodo da casa onde uma grande mesa estava posta para o café. Ela já conhecia aquela parte. Havia almoçado e jantado ali no fim de semana.

–Você ainda não me disse onde está Sesshoumaru, Mestre Jaken. – ela perguntou, sorrindo ao se sentar à mesa.

–Está treinando desde cedo, sssenhorita... – parou de falar ao ver Rin estreitar os olhos – Rin.

–Ah, é? Treinando o quê? – ela perguntou enquanto ajeitava um guardanapo no colo.

Kendo.

–Ah... – ela deu um sorriso. Realmente já haviam informado para ela que ele treinava kendo, tendo sido inclusive presidente da associação na Universidade – E Inuyasha?

Sssaiu bem cedo com a sssenhorita Higurashi.

–E onde Sesshoumaru está treinando?

–Bem... No dojo. Mas aviso logo que Sssesshoumaru-sssama não gosta de ser interrompido quando está lá.

Rin deu de ombros

–Até parece que ele vai fazer alguma coisa.

–Ah, ele faz sim. – o homenzinho falou apressado. Sentiu até um arrepio ao lembrar das vezes que acontecera de acidentalmente interromper algum treino e o que Sesshoumaru fez a ele por causa disso. – Chame ssse precisar de algo.

–Obrigadinha.

Rin viu Jaken sair para que ela se sentisse mais à vontade para se servir: missô com vegetais, arroz, pão com manteiga, suco, tofu. Era uma mesa bem farta. Não viu outros lugares arrumados à mesa, então concluiu que era a última a ter o desjejum. Também não haviam sinais de outras pessoas na casa.

–Bom apetite pra mim. – ela murmurou para mais ninguém além dela ao pegar o hashi.

Depois de comer, ela deu outro suspiro de satisfação. Estava tudo tão delicioso. E tinha um toque caseiro tão bom. Lembrava um pouco o jeito que a mãe dela cozinhava. Ela tinha jeito para a cozinha, mas nunca tinha o mesmo sabor que quando era preparado pela mãe.

–Obrigada pela refeição. – murmurou para si mesma ao depositar o hashi usado no prato.

Decidiu descobrir sozinha onde Sesshoumaru estava, embora não conhecesse muito bem o lugar. Andou depressa pelos corredores até lembrar-se que a sala de treino podia ser um dojo provisório do lado de fora, assim como era na casa dela em Nagoya.

E foi assim que, após andar pelo jardim e dar uma volta na propriedade, encontrou, quase nos fundos da casa, uma bonita construção de onde podia-se ouvir uma pessoa treinando no interior.

Aqui.

Rin abriu a porta silenciosamente, entrando com o cuidado de não ser notada.

–Sesshoumaru...ela murmurou.

O rapaz treinava sozinho com um shinai o movimento de ataque com os braços quando atacasse primeiramente a cabeça do adversário, um dos movimentos básicos daquela arte.

Rin sentou-se em uma das almofadas sobre os próprios joelhos e ficou em silêncio, observando-o em treinamento. Não acreditava que Sesshoumaru estivesse treinando os golpes básicos até lembrar-se de que seu irmão havia feito algo parecido no dia seguinte à briga que os dois travaram quando ela havia decidido viajar sozinha para Tokyo e ele não ter concordado.

–O que está fazendo aqui? – a voz de Sesshoumaru a fez voltar à realidade.

–Ah... Bom dia. – ela piscou várias vezes para o rapaz, que limpava com um pano o suor que escorria pelo rosto, os olhos dourados fixos nela – Eu vim agradecer por ter me deixado passar a noite aqui.

–De nada. – ele falou num tom como se fosse apenas por educação enquanto prendia os longos cabelos para limpar a região do pescoço.

Não houve troca de palavras nos segundos seguintes e tampouco algum deles desviou o olhar.

–Dormiu bem? – ele finalmente perguntou, depois abaixou-se para pegar uma garrafa de água do chão e tomar um gole do gargalo.

–Ah, s-sim. – ela respondeu depressa, surpresa com a própria inaptidão de continuar a conversa – Parece que dormi demais.

–Acredito que tenha conseguido repor as energias. – ele respondeu impassível – Você quase não conseguia ficar acordada na hora do almoço. Nem apareceu para o jantar.

–Eu me sinto muito melhor agora. – ela falou com um sorriso, observando o rapaz com a roupa de treino limpar o suor dos braços.

Ficaram novamente em silêncio. Ele terminou de limpar o suor do rosto, pescoço e braços e atirou a toalha longe. O pano caiu em cima de um cesto tapado, onde geralmente costumava deixar as toalhas e as roupas de treino sujas.

–Sesshoumaru... – ela começou, numa voz fraca.

O rapaz voltou novamente a atenção para ela, mas nada falou.

–Desculpe pela forma como tratei você naquela noite. Sei que estava preocupado comigo e que tinha razão em pedir pra eu ficar mais alguns dias aqui. Eu prometi e acabei não cumprindo isso.

–Está tudo bem. – ele comentou, a mão elegantemente esticada como se quisesse que ela parasse aquela conversa – Já passou. Não vamos mais falar sobre isso.

–Desculpe. – ela insistiu – Não sei se vai mudar muita coisa, mas fico na cidade até amanhã. Se eu não tivesse dormido tanto, poderíamos ter...

Rin viu o rapaz arquear uma sobrancelha, esperando que ela continuasse.

–Poderíamos ter visitado algum lugar juntos. – ela completou.

Sentada sobre os joelhos, ela esperava algum comentário de Sesshoumaru, mas não houve palavra para seguir a conversa. Rin entendeu que ela precisava continuar:

–Eu tive uma pessoa em Nagoya.

–Você já me falou sobre isso. – ele comentou pacientemente, finalmente sentando-se na frente dela para conversarem – Foi por isso que veio pra cá, não foi?

Houve uma confirmação de cabeça por parte dela.

–O nome dele era Aki.

–Era? – ele franziu a testa.

Rin novamente confirmou com um movimento de cabeça e Sesshoumaru entendeu, mas não expressou reação alguma no rosto.

–Ele era o meu... noivo. – ela desviou o olhar, mão fechada em punho próximo ao coração. Era a primeira vez em muitos meses que tentava mexer nas lembranças para falar com alguém que não conhecia a história. A outra pessoa foi o terapeuta indicado pelo primo Jakotsu para ajudá-la.

O rapaz não perguntou o que havia acontecido, mas ela sabia que ele queria que a continuação.

–Ele ficou muito doente. Muito tempo doente.

Uma rápida lembrança de quando ele contou o que tinha passou pela mente. Ela tinha confiança de que tudo daria certo. Não achava ter sido um erro acreditar em coisas positivas e que ele sairia bem no fim de tudo.

–Depois que tudo passou, eu decidi colocar todas as lembranças em uma caixa preta e esquecer por um tempo lá. Só assim consegui voltar a funcionar depois de meses. Eu parei de estudar. – ela parecia envergonhada e a franja encobrir o olhar – Eu tive que trancar o curso.

–Você ficou um ano sem estudar?

–Quase isso. Eu comecei o semestre de inverno, mas eu não conseguia dar conta da matéria acumulada porque todo dia eu ia pro hospital cuidar dele. Ele ficou... no último dia vivo, ele descobriu que eu tinha trancado o curso. Ele ficou muito chateado comigo.

Sesshoumaru nada comentou.

–Ele faleceu no fim do inverno. Naquele dia que fomos ao café havia completado um ano sem ele. Fiquei sem dormir pensando nele.

–E por quanto tempo vocês estiveram juntos?

–Quase quatro anos. Ele foi meu primeiro namorado. – ela sentiu um rubor passar pelo rosto. Não queria que ele percebesse a inexperiência dela – Meu irmão não gostava dele no começo. E eu era menor de idade.

Houve silêncio novamente. Ela pigarreou como se alguma coisa estivesse presa na garganta.

–O professor Hosokawa...? – ele quis saber para ajudá-la.

Viu-a confirmar novamente com a cabeça.

–Eu cancelei a matrícula no seminário dele porque não seria produtivo. Eu ficaria lembrando toda hora de quem ele era primo.

Rin decidiu não desviar o olhar e encarou o rapaz que a observava impassivelmente. Parecia que ele a estudava.

–E foi assim que eu decidi mudar meu caminho e continuar a faculdade em outro lugar.

Sesshoumaru nada comentou.

–Você não vai falar nada? – ela franziu a testa.

–Você quer que eu fale alguma coisa? – ele continuava calmo – Eu pensei que só queria contar a sua história.

–Bem... não. – ela realmente não queria que ele comentasse sobre o que havia acontecido.

Mordeu o lábio inferior sutilmente como se aquilo a ajudasse a pensar no que deveria falar logo em seguida. Sim, ela deveria falar sobre tocar no assunto que dizia respeito a eles.

–Eu só queria que entendesse o que aconteceu comigo. E-Eu não pensava em conhecer alguém quando decidi mudar para Tokyo. Só pensei em ficar longe de Nagoya porque todos os lugares me lembravam o Aki. – ela falou timidamente, torcendo as mãos numa mania que ele já conhecia bem – E eu ainda não estou bem. Às vezes eu fico sem dormir. Às vezes eu fico muito deprimida. Naquela primeira vez que fiquei sem dormir, eu havia passado a noite chorando.

As mãos caíram no colo e ela forçou um sorriso. Pronto. Havia falado tudo que ele precisava saber. Ela também se sentia estranhamente tranquila, como se um enorme peso saísse dos ombros.

Depois, quem pigarreou foi ele para chamar um pouco de atenção para o que ia falar.

–Você nunca... – ele pausou como escolhesse bem as palavras – Falou sobre isso para ninguém. Geralmente você só muda de assunto.

–Hmm... – ela só podia concordar porque era verdade – Eu percebi que aqui vocês são um pouco fechados, então não quis conversar sobre essas coisas. Nem Sango e Miroku sabem o que aconteceu. E eu falo isso porque os considero também meus amigos.

–Por minha parte, você pode também falar sobre esse tipo de coisa. Posso não falar muito, mas geralmente eu escuto bem.

–Oh. – ela murmurou. Nunca o havia considerado um bom ouvido. Era bom saber aquilo.

Era mais uma coisa que os dois precisavam discutir.

–Bem, eu nunca havia pensado assim porque acho que não nos conhecemos muito bem... – ela torcia novamente as mãos, um pouco sem jeito porque temia ofendê-lo – Que tal se nós... começarmos por aí?

Sesshoumaru ficou um momento em silêncio, testa franzida, e imediatamente ela se arrependeu de ter falado aquilo.

Mas aquele instante não durou muito, pois ele começou a falar:

–Os meus pais morreram há alguns anos. Eu vivo aqui com meu irmão e meu avô. Você deve conhecê-lo algum dia. Ele não está aqui agora porque viajou para Saitama para visitar a família da minha falecida avó. Eu não me dou bem com ele.

–Por quê?

–Problemas de opinião, familiares... Várias coisas. Sinto que é difícil ele concordar com qualquer coisa que eu faça. E Inuyasha muitas vezes concorda com tudo o que ele faz ou faz porque tem medo dele. – ele fechou os olhos para continuar a falar – Aqui praticamente ninguém se fala. Há bastante tempo não troco uma palavra com meu avô. Eu converso mais com Inuyasha na faculdade do que aqui em casa.

Rin tinha a testa franzida. Recordava-se que, nas vezes em que Inuyasha e Kagome estavam com o grupo, quase não via troca de palavras entre os irmãos.

–Deve ser tão ruim isso. – ela comentou, aproximando-se mais dele – Quando Hakudoushi e eu brigamos por causa da minha decisão de vir pra Tokyo, ele ficou dias sem falar comigo e eu me senti mal. Mas foi uma coisa momentânea. Nós conversamos depois.

Evitou falar que, já às vésperas da viagem, novamente discutiram e ficaram mais dias sem se falarem. Tudo porque Hakudoushi achava que a irmã deveria desistir da mudança e continuar na cidade.

–A situação ficou pior com a história de Sara e minha expulsão do clube de kendo . – ele continuou.

–O que aconteceu? – já tinha ouvido sobre aquilo, mas, claro, nunca ocorreu a ela de perguntar. Havia sido bem clara que não iria se intrometer ou opinar sobre aquela história entre os dois, mas se iam tocar nesse assunto depois...

–Uma longa história. – ele fechou os olhos novamente – A família de Sara é patrocinadora de várias associações na Universidade. Eles estão em todos os lugares. No auge da briga entre as famílias por conta daquela história do casamento e da minha recusa, eles pediram a minha saída do clube ou a Universidade perderia o dinheiro do patrocínio. Eu nunca imaginei que chegaria a isso. No fim de tudo, apelei para meu avô. Ele tentou defender a minha permanência conversando com o Asano pai, mas não houve acordo.

–E só por causa desse arranjo entre as famílias? – ela franziu a testa – Não acredito que chegou a isso.

O maxilar de Sesshoumaru travou por um segundo ou dois até ele continuar.

–Eu devo ter feito alguma coisa com o rosto do irmão de Sara quando soube que o Asano pai retiraria o patrocínio. A minha expulsão foi consequência disso.

Uma gota escorregou do rosto de Rin.

–Que pena que isso aconteceu. – ela tocou o braço direito dele quase da mesma forma íntima que tocaria se fosse Hakudoushi – Você deve sentir bastante a falta disso. Meu irmão ficaria maluco se estivesse no seu lugar.

O rapaz olhou intrigado para o braço e a mão que o tocava. Foi só então que ela percebeu o que fazia e desfez o contato rápido.

Sentindo que chegara a vez de falar alguma coisa, Rin começou a falar sobre si mesma:

–Hmm... bem, acho que você já sabe que minha família é de políticos progressistas em Aichi. Sempre há um Nozomu em algum cargo administrativo na província. – ela tocou o queixo pensativa – Eu tenho um irmão mais velho, o nome dele é Hakudoushi. Nossos pais biológicos morreram quando eu tinha menos de dois anos.

–Os seus pais morreram? – ele franziu a testa. Ela vivia falando sobre o pai nos encontros de grupo de estudo.

–Sim. – ela confirmou com a cabeça – Em Kobe. Nós fomos criados pelos nossos avós. Eu os considero meus pais. Eu nunca os tratei de outra forma.

–Eu percebo pela forma como fala sobre eles o quanto vocês são próximos. – e muito diferentes da família dele.

–Ah, sim. Pode não parecer por conta da idade, mas meu pai e minha mãe são extremamente progressistas. Eles não obrigaram Hakudoushi a fazer faculdade de algum curso como Direito ou Relações Internacionais pra entrar na política. Ele sempre gostou de artes marciais e ganha a vida com isso. Ele é bem conhecido na cidade. É um excelente professor.

–E por que quis fazer um curso assim?

Rin ficou pensativa, tentando lembrar-se da ocasião quando decidiu fazer Universidade e escolher um curso.

–Acho que foi por causa de Aki, ele era advogado. A família dele é muito conhecida também na política em Aichi. Eu acho que gostava muito da retórica dele. Eu o achava incrível. – ela deu um sorriso largo que morreu segundos depois.

Houve um momento de silêncio entre os dois. Enquanto Sesshoumaru pensava no quanto a família dela era diferente da dele, Rin pensava no quanto os planos que tinha para o futuro mudaram.

–E você pretende mesmo voltar para Nagoya quando acabar o curso? – ele perguntou de repente.

Novamente ela precisou de um tempo para pensar. Por conta dos problemas que ela tivera no ano anterior, a família havia ficado preocupada com a permanência dela na capital, principalmente porque estaria sozinha. E a constante antipatia dos parentes pelos conservadores da capital, a rivalidade das regiões e questões políticas locais impediam um bom aceite da estadia dela por mais de um ano ali.

–Se não houver alguma boa oportunidade por aqui, eu terei que voltar sim. – ela finalmente falou. Foi a melhor resposta que poderia formular. Claro que se ela arranjasse um bom emprego em Tokyo, ela ficaria sim lá. Mas era improvável que acontecesse. Era mais prático e de maior certeza voltar para Nagoya e trabalhar com alguém da família.

Os dois se encararam.

–Eu nunca planejei ficar. – ela afirmou.

Sesshoumaru por fim levantou-se. Ajeitava as mangas do quimono quando sentiu os dedos de Rin tocarem a peça.

–Você amarrou errado... – ela falou, abrindo a parte de cima e ajeitando-a habilmente. Sesshoumaru olhava-a surpreso por saber que ela sabia arrumar aquilo bem, como se já fosse experiente.

–Como você sabe fazer isso? – ele perguntou.

–Eu já falei que Hakudoushi é mestre em kenjutsu. – ela falou sem olhá-lo ou parar o serviço – Eu o ajudava a se arrumar às vezes, principalmente antes de competições.

–Parece que fez isso muitas vezes, não?

–Sim. – ela parou de mexer as mãos por dois segundos antes de continuar – Quando eu decidi mudar de cidade, ele ficou furioso e não falou comigo por vários dias. Depois de uma semana eu o procurei pra conversar e o encontrei como encontrei você hoje: treinando os golpes mais básicos do kendo... E também ajeitei a roupa dele.

–Então ele não gostou da notícia. – era uma afirmação dele.

–Odiou. – ela terminou o serviço e pousou uma das mãos do peito dele – Mas teve que aceitar depois. Não ia ficar bem continuar em Nagoya.

–Bem, você me parece melhor agora. – ele falou, afastando-se dela para guardar o material que havia utilizado durante o treino. – E você vai voltar pra lá em breve, não?

–Ah, claro... – ele pôde notar o tom alegre que ela tinha quando falou aquilo – Amanhã!

–E hoje tem o seu cinema... mas se estiver com pressa para arrumar as coisas, é bom falar com Kagura e dizer que não pode ir. Acredito que ela não fique aborrecida.

–Ficarei sim, meu querido. – alguém falara na entrada do dojo – E você também vai, né?

Os dois se viraram e perceberam que Kagura estava na entrada, as duas mãos apoiadas na batente da porta.

–Estou atrapalhando alguma coisa? – ela perguntou, sorrindo.

Rin e Sesshoumaru olharam um para o outro, perguntando-se com os olhos se ela teria escutado parte da conversa particular ou se tinha tirado fotos para postar naquele canal de notícias.

A garota podia sentir que parecia uma cena dessas cenas de filme de comédias românticas. Havia um clima agradável antes e de repente foi completamente destruído com a entrada de C na conversa entre A e B. E ela nunca havia sentido aquilo antes por Kagura: um incômodo no peito por ter a conversa com Sesshoumaru interrompida.

–O que faz aqui numa hora como essa? – Sesshoumaru perguntou, olhos estreitados na direção da recém-chegada.

–Ora... – ela entrou na sala – Não posso mais, não? Você não reclamava quando estávamos juntos.

Rin tentou parecer indiferente ao comentário. Havia realmente uma proibição para entrar ali? Kagura parecia não sofrer qualquer restrição, enquanto ela precisou esperar Jaken se ausentar para sair pela propriedade para procurar Sesshoumaru.

Nem percebeu quando Sesshoumaru deu as costas para a outra garota, concentrando-se em ignorar a presença dela e em arrumar as coisas.

–Ah, eu ainda não a cumprimentei hoje, Rin-chan. – Kagura falou com uma alegria exagerada, aproximando-se da garota para pegar as mãos dela – Como você está?

–Eu... hmm... - ela piscou, evidentemente ainda surpresa com a intromissão – Estou bem...

–Cinema confirmado hoje, né? E um mês sem o seu nome no Gossip Cop.

–Droga. – Rin murmurou numa clara derrota. A vantagem era muito melhor – Tudo bem. Um mês.

–Viu? – Kagura virou o rosto e deu um sorriso cínico para Sesshoumaru.

–Eu tenho então que ir. – Rin piscou, os olhos em alerta como se lembrasse de alguma coisa.

Ao ouvir aquilo, Sesshoumaru olhou para Rin com certo... espanto. Sim, ele estava surpreso. Por que ela já tinha que ir embora? A viagem dela não era no outro dia?

–Eu tenho muita coisa pra resolver antes da viagem. – ela parecia ter lido os pensamentos dele e foi até ele para ficaram frente a frente – E com o cinema... Você não vai, não é mesmo?

–Não? Como assim? – Kagura respondeu pelo outro – É claro que ele vai.

–Não vou. – ele respondeu.

–Vai sim. Você sempre vai. – ela insistiu.

Sesshoumaru franziu novamente a testa.

–Olha, acho melhor deixar vocês conversando. – Rin ergueu as mãos como um escudo, impedindo então que os dois se aproximassem dela. Não queria interromper aquela conversa – Se forem ao cinema juntos, eu encontro vocês por lá. Vou pra casa arrumar minhas coisas, tá?

Antes de passar pela porta, voltou-se rapidamente para Sesshoumaru.

–Obrigada pela conversa. – e sorriu de leve.

Como estava habituado a não falar, ele apenas assentiu discretamente e a viu fechar a porta do dojo.

Sozinhos, Kagura sorriu malignamente para si e sentou-se no chão, perto das almofadas. Os cabelos, presos por um enfeite de cabelo em forma de pena, foram soltos para ela brincar com o objeto.

–Sobre o que vocês dois conversavam? – ela perguntou com um sorriso.

–O que veio fazer aqui? – Sesshoumaru nem se preocupou em responder – Há meses não passa por essas bandas.

–Eu? – ela perguntou, ainda sorrindo – Bem, eu lembro de ter convidado você também para nosso passeio hoje. E, como estou com preguiça de fazer comida, resolvi passar para almoçar também.

Houve um segundo de silêncio.

–Ah, não... – ele murmurou, indo até uma mesa pequena do dojo para pegar o celular que carregava.

–O que está fazendo? – ela perguntou curiosamente.

–O que vocês aprontaram? – ele destravou e procurou imediatamente notícias do canal de notícias. Havia alguma coisa estranha no ar.

– "V-Vocês"? – ela tremeu.

Alguma coisa vocês aprontaram ou não estaria aqui só por causa do almoço.

–Ora. – ela cruzou os braços e ergueu o rosto com altivez para mostrar dignidade – Estou aqui porque eu quero. Fiquei preocupada demais com Rin-chan e com a possibilidade de ela não ir ao nosso cinema.

–E como você sabia que ela estava aqui? – ele falou entre os dentes.

Houve um segundo ou dois de silêncio. Kagura não podia dizer sobre a aposta do Gossip Cop ou cabeças rolariam, sendo arrancadas apenas pelas mãos de Sesshoumaru. Para disfarçar começou a olhar as unhas como se fossem coisas interessantíssimas.

–Alguém do Gossip Cop a viu entrar no seu carro ontem e não chegar em casa.

Sesshoumaru apertou a região entre os olhos como se o gesto pudesse controlar a paciência.

–E vocês publicaram isso? – ele perguntou momentos depois.

–Não! – ela respondeu depressa, baixando o tom de voz para um sussurro conspiratório – Eu prometi um mês sem qualquer menção ao nome dela. Mas é claro que a equipe administrativa continuou investigando.

–"Equipe administrativa"? Existe isso também? Vocês não têm o que fazer?

Sssenhor Ssessshoumaru! A sssenhorita... – Jaken entrou na sala repentinamente na sala agitando os braços, mas ficou paralisado ao ver que Sesshoumaru com a visita – Hã... Acho que cheguei tarde...

–Jaken, eu não falei para não interromperem meu treinamento? – Sesshoumaru proferiu e não fez questão de esconder a irritação.

–J-Já, mas...

–Não deveria então ter proibido Kagura de entrar aqui?

Sesshoumaru ignorou a expressão furiosa que a garota tinha ao escutar aquilo.

–Ora... – ela começou, cruzando os braços em desafio – Rin também estava aqui e você não ficou nem um pouco zangado.

–Você deu para atrapalhar agora, Kagura. – Sesshoumaru falou irritado, virando-se depois para o mordomo – Jaken, tem mais uma pessoa pra almoçar aqui.

-S-Sim... – ele saiu de fininho e praticamente correu para não sofrer qualquer tipo de consequência.

–Você é sempre terrivelmente grosso assim com as ex-namoradas ou só quando está gostando de outra?

–Eu sou assim com quem interrompe minhas conversas. – ele abriu a porta para sair, mas parou ao escutar a típica risada alta de Kagura, virando-se para perguntar – O que é engraçado agora?

–Agora fiquei curiosa pra saber o que você planejava fazer com ela aqui neste dojo.

Sesshoumaru balançou a cabeça e deu as costas para ela, saindo dali. Atravessou o jardim seguido de perto pela garota que cantarolava alguma melodia romântica. Ao chegarem na entrada da casa, ele tirou as sandálias no genkan e entrou, Kagura fazendo o mesmo.

Na sala encontrou Rin e Jaken. Fez sinal para que o outro se retirasse para poder conversar com ela, já preparada com a mochila para ir embora.

–O-Oi... – ela começou naquele tom tímido já conhecido por ele – Eu chamei um táxi.

–Não quer que eu leve você? Fico pronto em dez minutos se...

–Ah, eu quero ir também, eu quero ir! – Kagura se intrometeu entre os dois – Sesshoumaru pode levar você e depois voltamos pra almoçar.

–Não precisa. – Rin respondeu depressa – Vai ser mais rápido e prático assim, não se preocupem.

–Mas você não quer mesmo ir com o Sesshoumaru aqui? – ela encostou-se no rapaz e descansou a cabeça do braço dele. Evidentemente que ele precisou de todo o controle do mundo para simplesmente não sair de perto e deixá-la cair no chão.

Uma expressão sombria cobriu os olhos de Rin.

–Qual foi a parte de "não precisa" você não entendeu, Kagura? – ela falou friamente.

Um vento igualmente frio congelou todo mundo depois daquela resposta. Até Kagura ajeitou a pose e se afastou do rapaz, mas se sentindo triunfante. Aquilo era definitivamente ciúmes.

Rin, uma ligação para você. – Jaken anunciou como se Rin já fosse melhor amiga dele, conforme o pedido dela na hora do café, trazendo uma bandeja com o fone – E o táxi já está à espera.

–"Ligação"? – ela repetiu.

–"Táxi"? Mas já? – Kagura piscou.

–"Rin"? – Sesshoumaru ergueu uma sobrancelha. O que diabos aquele mordomo já tinha de tratar Rin sem ser pelo nome de família?

Ignorando tudo e extremamente curiosa, a garota pegou o telefone.

–Nozomu falando.

Rin-chan, sou eu, Miroku. Não fale pra ninguém com quem está falando. – ele falou como se fosse um sequestrador.

–H-Hmm... oi. T-Tudo bem? – ela gaguejou.

Claro que está tudo bem, minha flor nagoiana. – ele não riu, mas era possível até mesmo para ela visualizar um sorriso malandro no outro lado da linha – Você vai mesmo ao cinema hoje? Precisa de uma carona?

–Eu vou... Mas...

Você está agora na casa de Sesshoumaru, né? Vai voltar ao apartamento para arrumar as coisas?

–Como você sabe disso?

-Gossip Cop, minha linda. Alguém te viu quando você entrou no carro dele ontem.

Rin olhava o aparelho como se pudesse fuzilar o rapaz. Sesshoumaru não deixou de observar os movimentos dela nem por um segundo.

Você vai ter uma carona espetacular hoje às quinze horas. Pode ficar pronta nesse horário?

–Nunca te ouvi usando essa palavra antes. – ela esfregou a têmpora e fechou os olhos – Apartamento 3-B. Às quinze horas. Não se atrase.

Obrigado, Rin. Até depois. – ele mandou um sonoro beijo pelo telefone.

Rin não soube se foi falsa impressão, mas pareceu ter escutado ao fundo uma risada maligna. Deu um suspiro e devolveu o aparelho a Jaken, que o levou embora. Ela ajeitou a mochila nas costas e deu um sorriso.

–Bem, está na hora de ir. Vamos nos ver mais tarde, não é? – fez uma reverência e foi em direção da porta.

Sesshoumaru a seguiu para acompanhá-la do pátio até o veículo à espera, passando pelo jardim. Kagura fielmente os acompanhou de perto, até receber um olhar de aviso do rapaz para afastar-se.

Ao se verem sozinhos, ele olhou algum ponto além do carro. Não queria que ela fosse embora, principalmente porque estavam conversando bem antes de serem interrompidos.

–Quer que eu passe para buscá-la? – ele perguntou suavemente, como se pedisse permissão. Não era como essas perguntas educadas que são feitas por educação, mas sim como um desejo dele de ir buscá-la e só precisasse da autorização dela.

–Hmm... – ela se virou e tirou do rosto uma mecha que atrapalhava a visão – Não precisa, tenho uma carona já.

–Já? – Kagura pulou entre os dois. Quem faria algo do tipo além de...?

Estalo para Kagura. A boca se abriu para protestar, mas não teve voz suficiente para tal.

–Kagura... – a voz de Sesshoumaru estava fria e ameaçadora ao mesmo tempo – Eu quero conversar com ela.

Bye-bye. – ela acenou e afastou-se de fininho.

–Um amigo meu vai me buscar. – Rin falou inocentemente – Você já decidiu se vai com a sua... amiga?

–Eu não vou a esse passeio. – ele olhou para trás – Kagura provavelmente vai me arrastar para aprontar alguma coisa. Ela e Miroku são muito próximos.

Rin olhou por cima do ombro dele. A outra garota estava cantarolando enquanto brincava com o prendedor do cabelo em forma de pena.

–Você quer sair depois do cinema? Posso ir buscá-la.

–Você vai levar Kagura e depois voltar pra me buscar? – ela inclinou o rosto franzindo a testa – Por que não fica de uma vez?

–Eu não quero ficar perto desse pessoal do Gossip Cop.

Ambos olharam para Kagura e a viram dançando aleatoriamente pelo jardim, mãos girando no ar como se estivesse em uma aula de zumba brasileira.

–Podemos sair sim. – ela deu um sorriso, depois os olhos arregalaram ao lembrar de algo importante, começando a torcer as mãos em nervosismo – Ah, eu posso passar de novo a noite aqui? Amanhã posso ir de táxi pra estação.

–É claro que pode. – ele franziu a testa – Podemos continuar a conversa hoje à noite. Também posso levá-la à estação amanhã.

Rin confirmou com a cabeça.

–Até mais tarde, então? – ela perguntou.

Sesshoumaru abriu a porta do táxi para ela.

–Até mais tarde.


Rin limpou o suor que escorria da testa com a costa da mão, desabando, logo em seguida, no sofá.

Havia entrado na ponta dos pés no apartamento para finalmente terminar de arrumar as coisas antes da viagem. A mala grande estava no meio da sala, finalmente fechada, depois de colocar roupas e mais roupas em sacolas a vácuo. O primo havia pedido para levar os modelos de volta para Nagoya como parte do plano maligno para renovação do guarda-roupa dela.

Conseguiu também organizar caixas de livros para adiantar a futura mudança, prevista para o retorno dela. De Nagoya planejava pesquisar mais lugares com calma e pedir para Sango e Miroku visitá-los antes de decidir qualquer coisa.

Sentou-se no sofá e bebericou um pouco de chá enquanto tinha uma lista das coisas que precisava levar. Lembranças de Tokyo, presentes para o irmão, os pais e os primos, livros, anotações.

Sorriu ao lembrar da viagem de ida, quando ele apresentou a mala para ela. Eram seis ao todo, e de tanto ela e o pai reclamarem, o número caiu pela metade. Depois de mais uma reclamação, o número reduziu para um volume. Só ela teria as mais novas criações do atelier dele e tinha que usá-las na capital. Criações exclusivas com as quais Rin se sentiria mais confortável. E sim, eram roupas bonitas.

Se ela não tivesse decidido ir a Tokyo, ela não os usaria e não deixaria o primo feliz.

Se não tivesse decidido ir...

O sorriso desapareceu dos lábios. Se não tivesse decidido mudar, provavelmente ainda estaria numa cama chorando o dia inteiro, agarrada às pequenas lembranças do namorado, evitando os olhares de todos que conheciam a história dela.

Deitou-se no sofá e curvou-se até conseguir abraçar os joelhos.

Por que tinha sonhado com aquilo, com o último dia de Aki? Com o hospital, o quarto, Hakudoushi indo buscá-la? Geralmente ela lembrava, e se sonhava, era com os momentos em que estavam felizes, ainda juntos. Ele segurando a mão dela, os livros para ela; acompanhando-a pelo caminho até a casa. O dia em que Hakudoushi e ele se conheceram, quando não eram namorados ainda. O dia do primeiro beijo. O dia da formatura do colegial. As visitas na casa dele, as visitas na casa dela. As brigas com Hakudoushi, o dia do pedido de casamento...

O dia em que ele contou da doença. O hospital, o tratamento, a...

O soluço a deixou sufocada e ela começou a chorar. Abraçou-se com mais força e deixou que o desespero a dominasse, sozinha, naquele apartamento, naquele sofá.

Não avisaram a ela que seria difícil.

Nunca disseram que seria tão difícil.


Quase três da tarde e Rin terminava de se arrumar. Depois de ter se acalmado, tomou um banho e descansou antes de começar a organizar as coisas para a viagem e para a futura mudança. Já tinha a mala pronta, uma lista de tarefas para as férias também preparada, as roupas que Jakotsu pediu para levar. Faltava apenas preparar o bentô com a comida para a viagem.

E era exatamente isso que fazia no momento. Cortava alguns legumes e os cogumelos para uma yakisoba vegetariana, lembrando-se que muito em breve estaria experimentando a comida com sabor preparado-por-mamãe em Nagoya.

Isso foi até escutar a campainha. Olhou o relógio perto da geladeira e arqueou a sobrancelha. Ainda faltavam quinze minutos. Onde estava a pontualidade de Miroku? Talvez tivesse esquecido na casa da namorada dele, mas que pelo menos avisasse que chegaria antes.

Limpou as mãos num guardanapo e mentalmente preparou um longo discurso para criticar a antecedência do amigo. Ao abrir a porta, no entanto, deu de cara com...

–Olá, Rin. – Kohaku sorriu amigavelmente, as mãos dentro do bolso do casaco. Não havia sinal de Miroku – Houshi teve que passar em um lugar antes com a minha irmã e pediu para eu apanhar você.

–Ah... – ela deu um risada. Sim, estava rindo como uma boba. Como ela pôde pensar mal de alguém só porque veio buscá-la mais cedo? – Eu estava xingando Miroku-sama por chegar antes do combinado.

–Sério? – ele olhou o relógio no pulso e balançou a cabeça, exasperado – Desculpe, às vezes esqueço que adianto o relógio pra não me atrasar.

–Tudo bem, Kohaku, pode entrar. – ela deu passagem para ele e fechou a porta. Dentro do apartamento, ele arqueou as sobrancelhas ao ver a mala e as caixas – Cuidado onde pisa, por favor.

–Está de mudança? – ele perguntou, curioso, enquanto tirava os sapatos para entrar – Se eu estiver atrapalhando, eu posso...

–Não se preocupe. As caixas são de mudança mesmo. Mas só vou fazer isso depois de voltar. Vou viajar amanhã.

–Você vai pra onde?

–Pra Nagoya. Minha casa. Meu irmão deve estar me esperando desde agora na estação.

–Que legal. Não conheço Nagoya. E você tem um irmão? – ele continuava em pé na sala, esperando por ela.

–Sim. Um mais velho. – ela fez uma careta e levou a palma das delicadas mãos ao nariz – Odeio esse cheiro.

–Qual? – escutou o rapaz perguntar.

–De pimentão. Adoro comer, mas o cheiro é terrível.

–Minha mãe também reclama. Eu não tenho muito problema. Quer ajuda em alguma coisa? Temos tempo ainda.

–Não precisa. Mas preciso de uns cinco minutos para terminar algumas coisas. Você espera?

–Sem problema.

Rin seguiu para a cozinha e voltou a fazer a tarefa anteriormente interrompida por conta da chegada de Kohaku. Guardou a comida preparada em potes na geladeira, lavou a faca que usou e enxugou novamente as mãos, saindo da cozinha e retornando para a sala. Kohaku estava parado no meio do cômodo, as mãos ainda nos bolsos.

–Vamos? – ele convidou.

–Sim. – ela pegou uma bolsa de marca famosa em cima do amontoado de livros de uma poltrona e a ajeitou transversalmente no corpo. Estava usando um vestido cinza que ia até a altura do joelho, algo que combinava um pouco com o que sentia pelo dia.

Kohaku abriu a porta e deu passagem para ela. Ambos desceram pelo elevador conversando sobre coisas do dia e rapidamente alcançaram o térreo e, em seguida, as ruas.

–Como você conseguiu subir?

–Um cara com uma caixa cheia de gatos abria a porta na hora que eu ia tocar o interfone. – ele deu um sorriso simpático – Bairro legal, mas deve levar um bom tempo para chegar à universidade, não é? Por isso está de mudança?

–Hm... Sim. – Rin resumiu a questão por achar que ele não precisava conhecer a história toda que a levava a sair dali. Depois levou a mão ao rosto e fez uma careta – Esse cheiro tá horrível.

–Às vezes o nosso olfato pode enganar. – ele estendeu a mão para ela – Posso? Vai ver que nem tem cheiro mais e só você que ainda sente.

–Será? – ela perguntou em dúvida, estendendo a mão. Viu-o inalar a palma e alguns dedos, antes de soltar.

–É, está mesmo com cheiro forte ainda.

E ambos ainda riam ao entrar no carro do rapaz. Nem perceberam que, perto deles, em outro carro, alguém usando um moletom com capuz tirou várias fotos com um celular.


–Como você é apressado, Sesshoumaru. – Kagura reclamava sentada numa área reservada de um dos complexos de cinema de Tokyo. O rapaz ao lado dela jogava tétris no iPhone – Aposto que os outros nem saíram ainda de casa. Ninguém chega a um cinema com quase meia hora de antecedência. Todo mundo gosta daquela emoção de última hora.

O rapaz nada comentou, abstendo-se até mesmo de erguer o rosto para tentar responder visualmente. Era como se ela nem estivesse ali com ele.

–E hoje é o último dia de Rin-chan na cidade. Ela precisa se divertir muito.

De novo, não houve comentário. Parecia que Kagura fazia parte de O sexto sentido – falando com espíritos.

–Oi, parede. – ela começou a falar mais forte para chamar a atenção dos outros, voltando-se para uma parede coberta de pôsteres de filmes blockbusters – Não é divertido conversar comigo, amiga?

Desta vez, Sesshoumaru não pôde deixar de ignorar. Considerou que a antiga namorada estivesse sob algum forte estresse, visto que ela estava sempre em conflito com o atual ou possível ex-namorado. Só isso explicaria o fato de ela começar a falar daquela forma.

–Só assim eu consigo chamar a sua atenção. – ela comentou como se tivesse lido os pensamentos dele e cruzou os braços num protesto infantil – Se está com raiva e não quer conversar, melhor ter avisado logo e ficado em casa, eu podia pegar um táxi também. Rin-chan também não vai gostar nem um pouco de ter alguém assim por perto.

Sesshoumaru arqueou uma sobrancelha em desafio e voltou a baixar o rosto para jogar, forçando Kagura a dar um suspiro de irritação.

–Eu sei que você veio só por causa dela. Podia ao menos ficar para se divertir um pouco. Há quanto tempo você não...

Repentinamente o celular da garota tocou com o recebimento de uma mensagem. Animada com o que poderia ser, abriu a bolsa para vasculhá-la e tirou o aparelho do fundo dela triunfantemente.

Gossip Cop de novo. Esse povo não tem férias, não?

Abriu a mensagem e, segundo depois, deu um grito estrangulado de horror.

–O que foi? O que houve? – Sesshoumaru se levantou imediatamente para acudir.

MALDITOOOO! – Kagura berrou de raiva, chamando a atenção de todo mundo no local. Sesshoumaru, preocupado, queria tocá-la para acalmá-la, mas ela parecia totalmente concentrada na mensagem – MALDITO SEJA! DESGRAÇADOOO!

–O que aconteceu? – Sesshoumaru nem conseguia se aproximar por temer alguma reação descontrolada por parte dela.

E, segundos depois, o celular dele também indicava o recebimento de uma mensagem com foto.