Nota da autora: Cheguei com um pouco de atraso, mas aqui está o capítulo de domingo :) Obrigada pelos comentários. Quem recebeu a prévia pode notar uma pequena mudança em alguns diálogos.

Este é um capítulo mais adulto... Vocês vão perceber uma outra Rin aqui, sendo tratada como adulta, ganhando presentes como jantar em restaurantes, vinho ou um passeio à vinícola. Também há uma parte muito importante em que ela reflete sobre o passado com a leitura dos diários.

No próximo capítulo, teremos uma parte dos dias de Sesshoumaru enquanto Rin esteve fora até chegar a esse encontro na estação e o que acontece depois :)

Sobre o acidente da Rin: vocês querem um outtake sobre isso agora? Posso escrever e mandar pra vocês. Só deixem um recadinho porque ele vai ser bem sensível sobre questões de perda de pessoas e de luto, o que está acontecendo com muita gente agora, alguns podem não querer ler. É parte importante da história porque explica o que acontece depois que ela perde o Aki, fica de luto, tem um acidente e começa a se recuperar com terapia e ajuda dos outros.

Enfim, espero que gostem do capítulo e que possam comentar. Se gostarem, deixe um aviso e se quer ler o outtake do acidente (ou mande mensagem privada aqui). Vou responder aos comentários do capítulo anterior com carinho durante a semana.

(Ah, escrevi dois one-shots SessRin em menos de uma semana: "Acima das nuvens" e "Quando fala o Coração". Estão no meu perfil. Quem puder ler e comentar, eu agradeço. Incentiva a continuar escrevendo)


UM CAMINHO PARA DOIS

CAPÍTULO 19

O caminho definido por ela

–EU NÃO ACREDITO NISSO!

A voz de Jakotsu ecoou pelo segundo andar da casa da família Nozomu e provavelmente alcançou os ouvidos de quem estava longe do quarto de Rin naquele momento.

A família estava se preparando para sair para o restaurante favorito da família, o Ningyocho Imahan de Nagoya, para comemorar o aniversário de Rin. A reserva havia sido feita com semanas de antecedência pelo pai de Rin e não poderiam perder o horário de forma alguma. Jakotsu e Hakudoushi buscaram a aniversariante na estação e o primo ajudava a escolher a roupa e prepará-la para sair.

Mas, entre tirar a roupa com que chegara da viagem e trocar pela do jantar, ele fazia perguntas sobre as primeiras semanas de relacionamento com Sesshoumaru. Ao falar que a presilha tinha ficado em Tokyo, a reação do primo foi, como sempre, exagerada.

–Desculpe. – ela estava sentada em seiza sobre a cama, as mãos dobradas em punho sobre os joelhos, tentando conter as risadas.

–Como assim, desculpe? – ele ainda parecia indignado – Esse seu namorado pegou a sua presilha, um presente meu, e não devolveu?

Rin olhou timidamente para os lados.

–O que ele vai fazer depois? Mandar você ficar o tempo todo de cabelo solto? Qual é o memorando que passam na capital sobre o que uma mulher deve ou não fazer no cabelo?

–Eu já disse que fiz uma brincadeira e ele pegou a minha presilha pra me punir. Ele vai devolver depois. – esperava ela firmemente que sim só para não ter que ouvir aqueles comentários exagerados de Jakotsu. Era só uma presilha, afinal de contas.

–Já não gosto mais dele. – ele cruzou os braços e sentou-se na beirada da cama – É bom que ele devolva sim sua presilha ou eu vou lá pessoalmente tirar de onde quer que ele tenha guardado.

Rin continuava a olhar timidamente para ele.

–Vamos, vamos. – ele bateu palmas – Vamos trocar de roupa.

Enquanto Rin mudava para um vestido que ele havia escolhido, o primo a observava pelo canto dos olhos, notando como ela tentava conter o riso, caindo ele mesmo na risada. Era claro que era divertido fazer uma briguinha daquelas por causa de uma presilha que certamente ela iria reaver.

–E como foi pra falar com ele? – ele quis saber, olhando para o lado para dar liberdade para ela se trocar na frente dele – Espero que ele tenha beijado bastante.

Rin deu uma gargalhada.

–Eu falei uma bobagem e acabei dizendo que gosto dele. – ela explicou, o sorriso ficou mais amplo ao terminar de colocar o vestido e virar-se para ele avaliar o resultado – Nós conversamos muito. Jantamos juntos. Mas eu estava acabada nesse dia, com tanta dor nos pés... aqueles sapatos que você escolheu são horríveis. Eu nunca mais vou usá-los.

–Eles estavam apertados e você não conseguiu mais andar? – ele perguntou.

–Foi bem vergonhoso. Andei descalça até chegar em casa.

–Ele nem te carregou nos braços? – ele arqueou as sobrancelhas – Meu plano não deu tão certo.

Rin franziu a testa. Estava em silêncio, tentando digerir as palavras do primo.

–Como assim?

Jakotsu arqueou mais ainda uma sobrancelha.

–Os meus pés ficaram sangrando de propósito? – ela ficou boquiaberta.

Tchiiii... – ele zombou, os lábios formando um biquinho de desprezo – Os homens da capital não são mesmo nada românticos. Se fosse alguém daqui, teria te carregado nos braços sem pensar duas vezes pra não ter que andar descalça e machucar ainda mais os pés.

A prima continuava boquiaberta, o rosto ligeiramente azul ao se dar conta do que o primo havia planejado fazer.

–Hakudoushi já sabe? – ele quis saber, ajudando a subir o zíper do vestido e observando o tamanho da barra.

–Ainda não. Vou contar pra ele hoje. – ela sentiu o rosto ficar vermelho – Acha que ele vai ficar irritado?

–Querida... – Jakotsu pegou na mão dela, uma expressão compreensiva e irônica no rosto – Irritado fiquei eu quando tive que parar de frequentar meu salão favorito por causa do Aya...

–Até isso vocês tiveram que dividir? – ela franziu a testa. O final do relacionamento do irmão com o companheiro foi pesado demais e ela esperava nunca passar por uma situação parecida.

– "Dividir" seria eu frequentar em tais dias, em tais horários e em tais momentos para não ter que encontrar aquela cara sórdida do Aya. Mas como o dono é muitíssimo amigo dele, fui proibido de pisar lá.

–Oh. – foi tudo o que ela conseguiu murmurar.

–Hakudoushi não vai ficar irritado, ele vai virar um material altamente radioativo. – ele balançava a cabeça em desalento para os lados – Acho melhor você colocar uma roupa de proteção e viseira porque ele vai explodir.

–Mas ele não tem por que reagir assim... – ela parecia confusa – Ele não pode ficar bravo comigo. Eu sou adulta, posso escolher meus namorados.

–Oh, querida, todo mundo sabe disso. Mas todo mundo também sabe que Hakudoushi pode ser um poço de ciúmes quando se trata de você. Coisas de irmão protetor.

Rin franziu a testa em irritação.

–É, mas ele vai ter que aceitar. Ele não pode ficar com raiva por eu gostar de alguém agora.

A prima dele era tão ingênua. Realmente ela esquecia como o irmão podia ser depois de algumas semanas longe dele.

–E essa corrente aí no seu pescoço? – ele quis saber – Foi presente dele também?

–Ah... – ela pegou o pingente para admirá-lo – Ganhei de aniversário. Fiquei bem surpresa.

–Podia ter me avisado antes. Deu sorte de eu trazer algo que combinasse. – ele a fez rodar no vestido florido com fundo vermelho e mangas curtas de renda – A aniversariante está charmosa e com namorado.

E está muito bem agora, ele pensou enquanto a via se admirar no espelho e limpar uma poeira imaginária da manga. Na época que Rin sofreu o acidente dentro do banheiro do quarto, ele chegou a acreditar que não havia cuidado bem dela... Por isso havia o exagero em dar-lhe roupas e acessórios para deixá-la mais feliz, presentes que poderiam deixa-lo se sentir menos culpado durante o período de recuperação.

–Vamos, vamos logo. – ele terminou de ajustar o tecido ao corpo dela – Vamos comemorar o seu aniversário.


No restaurante Ningyocho Imahan, os pais de Rin, o irmão, os primos Jakotsu e as gêmeas Botan e Momiji discutiam os casos da família enquanto esperavam a refeição chegar e o atendente aparecer para colher os pedidos das bebidas.

Sentada ao lado de Hakudoushi, Rin estava sorridente e atenta aos relatos de Momiji e Jakotsu, ambos em uma disputa familiar para ver quem contava mais histórias, de vez em quando comentando alguma coisa quando falaram sobre o irmão ou sobre os pais.

–Com licença... Gostariam de beber alguma coisa? – o atendente, sorridente, apareceu cautelosamente ao lado da mesa, desculpando-se por acreditar que tiraria a descontração do grupo – Vocês podem continuar as histórias, finjam que eu não estou ouvindo aqui.

O grupo riu e cada um pediu uma bebida diferente, sendo devidamente registrado no tablet do atendente.

Tudo corria bem até chegar a vez de Rin:

–Uma taça de Nanabotsushi Aka, por favor.

O rapaz registrou o pedido e automaticamente estendeu a mão para ela. Rin, também em modo automático, abriu a bolsa para pegar a identidade.

Ao ver aquilo, a mão de Hakudoushi imediatamente a parou e ele olhou para o atendente.

–Ela é maior de idade.

–Mas...

–É aniversário dela. Ela é maior de idade. – ele insistiu, falando ainda mais sério.

O rapaz deu um passo para trás, curvou-se em uma reverência e retirou-se.

–Hashi... – ela sussurrou numa irritação – Ele só tá fazendo o trabalho dele.

–Toda vez é esse constrangimento, podiam pelo menos respeitar o seu aniversário. – ele falou meio impaciente/irritado, o olhar ainda a direção tomada pelo atendente.

Rin deu um beijo no rosto dele.

–Ah, você vai embora mesmo depois de amanhã? – ele franziu a testa.

–Sim. – Rin deu um suspiro cansado – Minhas provas começam na semana que vem.

–Por que não fica aqui pelo fim de semana? O papai deve ter todos os livros na biblioteca dele. Pode estudar aqui e voltar no início da semana que vem.

–Hm... – ela não queria ficar. Já tinha tão pouco tempo ao lado de Sesshoumaru... – Eu acho melhor voltar. Não acho que vou conseguir me concentrar com Jakotsu tentando me fazer provar uma roupa diferente por dia.

O irmão balançou a cabeça em sinal de concordância. Jakotsu apareceria para atrapalhar e ela acabaria interrompendo a visita para voltar mais cedo para poder estudar mais sossegada na capital.

–Bem, você faz o que achar melhor. – ele deu um sorriso e viu Rin concordar.


O tabuleiro de go da casa dos Nozomu ficava num canto especial da sala de estar, com duas poltronas confortáveis à disposição de quem quisesse jogar. Normalmente as duas eram ocupadas pelo senhor Nozomu e por Rin, uma parte do tratamento que começaram depois que ela sofreu um acidente no ano anterior.

–É, parece que eu perdi. – o pai olhou o tabuleiro com interesse – Você fica semanas sem jogar e consegue me vencer ainda? Estou começando a achar que você tem outra pessoa para jogar lá.

Rin mostrou um sorriso vitorioso.

–O vencedor tem direito de guardar segredo sobre as estratégias usadas no jogo. – ela falou, alongando os braços – Só posso dizer que ainda não encontrei ninguém pra jogar go e mahjong na capital.

–Bem, bem... a vencedora da noite tem direito também de receber o presente dela amanhã de manhã. – ele levantou-se e limpou uma poeira imaginária da roupa – Você está convidada para ir comigo à vinícola de Komaki. Só você e eu.

–Komaki? – ela repetiu, inclinando o rosto para analisá-lo – Você está falando da loja da montanha?

–Sim. Vamos subir a montanha. – ele curvou-se como se quisesse fazer uma reverência, mantendo o tom formal do convite – Esteja pronta às oito. Comprarei quantas garrafas quiser.

O senhor Nozomu se afastou a passos lentos em direção às escadas, subindo para os aposentos em poucos minutos. Rin ficou sozinha na sala, pensando no quanto ela teria que andar amanhã ao subir a montanha até a vinícola.

Arrumou o tabuleiro de go, pensativa. Tentaria conversar sobre o novo relacionamento com o irmão agora. Não sabia quanto tempo levaria em Komaki no dia seguinte.

Encontrou Hakudoushi deitado no jardim da casa, lugar onde ele sempre se refugiava quando queria ficar sozinho. Parecia concentrado em responder mensagens pelo celular. Timidamente aproximou-se dele, mãos às costas, cuidadosa ao interromper os pensamentos dele.

–Hashi? – ela tentou.

Imediatamente ele baixou o aparelho para piscar curiosamente.

–Achei que ainda estivesse jogando go com o papai.

–Ah, já terminamos. Eu ganhei dele hoje.

Hakudoushi forçou um sorriso e voltou a olhar o celular. Ele parecia inquieto.

–Aconteceu alguma coisa? – ela tomou um lugar ao lado dele, sentando-se em seiza.

–Uma competição em Nagasaki. Preciso negociar um substituto por alguns dias.

–Você parece preocupado. – ela comentou.

Hakudoushi sentou-se e ergueu um joelho para apoiar um dos braços nele.

–Não deve ser nada demais, mas vai ser a primeira vez que os dois vão ficar sozinhos por vários dias. Não sei se vai ser um problema.

–Oh... – Rin murmurou. O irmão tinha razão. Os pais eram já idosos, mas eles nunca ficaram sozinhos. Sempre alguém ficava na casa para cuidar deles – Amanhã posso falar com ele sobre isso. Vamos pra Komaki comprar vinho bem cedo.

–Será que ele dá conta de subir aquela montanha? – ele franziu a testa – Há tempos que ele não vai lá. Pelo menos uns cinco anos.

–Se quiser, eu falo com ele sobre isso.

–Não vai adiantar. Ele é teimoso e vai dizer que vai ficar bem com ela. – o irmão coçou a nuca – E você vai conseguir subir aquilo?

Rin deu um suspiro cansado. Ela odiava subir montanhas. E quando eram crianças, os dois sempre tinham que subir com o pai.

–Ele me prometeu comprar quantas garrafas eu quisesse.

Tchi... – ele zombou – Vocês dois...

Ficaram em silêncio confortável por alguns segundos, com Hakudoushi de vez em quando olhando a tela, talvez esperando que alguém respondesse alguma mensagem.

–Hmm... Hashi... – ela começou, as mãos fechadas em punho nas pernas.

–Hm? – ele murmurou sem realmente parar o que fazia para dar atenção a ela.

–Eu... conheci uma pessoa em Tokyo. – ela falou de uma vez, olhos voltados para o chão, rosto corado.

Hakudoushi imediatamente voltou o rosto para ela.

Ficaram naquela pose por alguns segundos: a figura dela meio tímida, meio corajosa, com as maçãs do rosto vermelhas e um meio sorriso; ele com a testa franzida e olhar levemente estreitado, como se estivesse duvidando do que ela dizia.

–Nós decidimos tentar. Ele gosta de mim e eu gosto dele... Está bem no começo, sabe? Não sabemos ainda se vai dar certo.

Hakudoushi continuava mudo.

Diante do silêncio dele, ela ergueu o rosto para encontrar o olhar ainda mais confuso dele.

–Uma pessoa... Um namorado? – a voz dele saiu meio estridente, como se ele tentasse controlar as oitavas – Um namorado tipo... um namorado?

–Hmm... é. – ela franziu a testa. O que será que ele entendia por "namorado" para ter que perguntar várias vezes daquela forma? – O nome dele é...

–Ele sabe o que aconteceu com você? – ele a interrompeu.

–Sim... – ela foi cuidadosa na hora de responder – Foi uma das primeiras coisas que contei pra ele.

Ficaram novamente calados, o silêncio sendo interrompido pelo celular dele acusando o recebimento de várias mensagens, sem que aquilo o incomodasse.

–Hmm... Hashi... – ela torcia as mãos. Aquele Hakudoushi era difícil de lidar. Ela conseguia lidar com um irmão ciumento, mas não com um atônito – Ele está me ajudando muito na capital. Mas isso não influencia ou atrapalha nos meus estudos. Eu estou lá só pra fazer a faculdade.

Aquela informação pareceu fazer com que ele reagisse. Hakudoushi olhou para o chão, pensativo, a testa franzindo como se processasse a informação.

–Eu adoraria que vocês o conhecesse. Ele me trata bem, foi uma das primeiras pessoas que conheci na capital. Acho que vocês dois iriam se dar bem, sabe?

–E o que vai acontecer quando voltar pra cá? – ele perguntou, olhos virados na direção dela.

–Bem... Mesmo que não dê certo... acho que vamos continuar nos falando, eu acho. É difícil saber o que vai acontecer... Ainda faltam meses pra formatura.

Ficaram novamente calados.

–Eu... eu tenho que resolver isso. – ele murmurou, mostrando o celular com a tela apagada – Precisa dormir agora se vai subir aquela montanha amanhã.

Rin franziu a testa diante da falta de reação do irmão. Mas interpretou aquilo como um bom sinal. Ele não virou uma arma de destruição em massa, como o primo Jakotsu havia previsto.

Aproximou-se do rosto dele e beijou-lhe suavemente na têmpora.

–Boa noite, Hashi. – ela falou ao levantar-se e voltar para o interior da casa.

Ao se ver sozinho, Hakudoushi permitiu que uma expressão sombria assumisse o rosto.


Na manhã seguinte, Rin e o pai foram para Komaki, uma cidade a 16 quilômetros de Nagoya, uma região conhecida pela produção de vinho na província de Aichi. O senhor Nozomu dirigia enquanto ouvia as novidades da filha sobre o curso e a vida na capital.

Estacionando aos pés da montanha, ele deixou o carro no estacionamento local e a ajudou a subir com cuidado a encosta que levava ao produtor local.

Era um presente de aniversário para Rin – uma forma pensada por ele para se conectar com ela, por mais que soubesse o quanto ela e o Hakudoushi tinham aversão pela atividade desde a infância.

–Ahhh... – ela choramingava – O senhor sabe que eu não acho isso divertido...

–Vamos, vamos... – ele, na frente dela, segurava uma das mãos dela e andavam com cuidado para não encostar na cerca elétrica – Vou deixar levar duas ou três garrafas pra capital.

–Eu só preferia que não fosse tão longe assim. – ela lamentou – Espero que a produção daqui seja boa mesmo.

–É excelente. Mas não venho aqui há dez anos.

–Não vão cobrar minha identidade, né? – ela perguntou desconfiada.

–Aqui a clientela é muito bem selecionada. Você só entra se tiver o passe deles. Quem for menor de idade não pode entrar.

–Mesmo que eu esteja com o senhor?

–Sim. – ele continuava segurando a mão dela, a outra batendo de leve alguma coisa no bolso frontal de um casaco jeans de verão – Estou aqui com o seu passe.

–Então o meu presente é o um passe pro vale de Komaki? – ela deu uma risada divertida – Falta conseguirmos o de alguma vinícola em Furano.

–Bem, você não tem o passe para Furano. Eu, por outro lado...

–Não acredito! – ela exclamou – Por que nunca me contou isso? Eu também quero um!

–O vinho de lá não é tão bom quanto o nosso. Você nem vai querer o passe de lá depois de provar o daqui.

–Tomara que isso seja verdade, viu?

Ao chegarem às instalações da loja, depósito e restaurante, eles pararam para olhar para trás e admirar a caminhada. Estavam no topo da pequena montanha e mal conseguiam ver a parte urbana de Komaki.

Rin deu um suspiro cansado ao limpar o suor da testa.

–Bem... Não vamos ter que nos preocupar com vocês sozinhos por alguns dias, presumo.

O pai zombou.

–Hashi e eu estamos preocupados, só isso. Vou falar pra ele que você consegue subir essa montanha sem perder o fôlego.

–Sua mãe e eu sabemos nos cuidar. – ele parecia ligeiramente aborrecido com a intromissão dos filhos já adultos – Hakudoushi fica preocupado demais. Eu acho que ele deveria arranjar uma namorada, assim como você arranjou esse na capital.

O rosto de Rin ficou com dez tons diferentes de vermelho.

–Como vocês já sabem disso?

–Foi a primeira coisa que Hakudoushi nos disse hoje de manhã quando desceu pra tomar café. – o pai explicou – Ele estava ainda digerindo a informação.

–Ah... – ela sentia ainda o rosto queimar de vergonha – Ele contou, foi?

–Depois conversamos a respeito desse... rapaz da capital – eles se apresentaram ao atendente à porta da loja, estendendo os passes para ele – Boa tarde. Minha filha e eu agendamos um horário.

–Boa tarde, senhor Nozomu, senhorita Nozomu. – ele deu passagem – Fiquem à vontade.

Surpreendentemente, nada foi cobrado de Rin depois que o pai apresentou a carteira de sócio local. Parecia até que era um cliente frequente, apesar de ele ter dito que há anos não pisava ali.

Agarrando-o pelo braço, ela começou a caminhar com ele pela adega. O pai apontava um e outro que ela deveria experimentar ou pensar em levar para Tokyo na mala, incluindo os licores produzidos ali.

–Senhor Nozomu... Há quanto tempo. – um atendente de meia idade trouxe uma bandeja com taças vazias e uma garrafa de um vinho rosé e de um branco – Gostaria de degustar o nosso Nanabotsushi rosé de 1998?

–Eu prefiro o Nanatsuboshi tinto... Mas tenho certeza de que minha filha vai querer.

Rin inalou o copo de olhos fechados, depois deu um gole.

–E então?

–Bom. – ela apontou para o branco com a taça do rosé – Posso experimentar o branco?

–Claro.

O atendente habilmente encheu uma taça com Nanatsuboshi Shiro e entregou para Rin.

Um minuto depois, ela dava o veredito:

–Gostei mais do branco. – ela indicou com a própria taça o outro frasco – Mais encorpado.

–Não quer tentar o vinho tinto? – o pai perguntou.

–Eu prefiro o branco. Eu achei o tinto de ontem do restaurante mais amargo.

-Uma pena. Ou não. Mas se você não vai tomar, sobra mais pra mim.

Continuaram a degustar um e outro vinho, até começarem a escolher o que levar. O senhor Nozomu fez questão de levar uma caixa com seis garrafas de um Nanabotsushi Aka.

–Vai levar esse? – a filha perguntou.

–Esse e o que mais você quiser.

Rin bateu palmas e deu pulos de alegria. Foi correndo até uma estante de uma safra de vinho branco e escolheu duas garrafas, além de levar um licor de ameixa.

–Acho que nós somos as ovelhas negras da família por sermos os únicos a cultivar esse hábito. A maioria prefere sake ou cerveja. – o pai comentou ao segurar a mão dela, a outra carregando uma caixa bem segura com as seis garrafas de vinho tinto. Ela tinha uma sacola com as duas de vinho branco e o licor de ameixa na outra mão.

–Eu gosto disso... – ela tinha os olhos fechados e um ar sonhador no rosto – É uma coisa só nossa.

–O seu namorado não bebe também?

–Er... sobre isso... – ela franziu a testa. O pai tinha uma maneira estranha de entrar nos assuntos sobre as quais tinha interesse.

O senhor Nozomu parou de andar e apontou para um banco que tinha vista para a cidade, perto da barreira de proteção.

–Vamos sentar aqui. Eu não posso sair dirigindo ainda ou vamos ter o carro apreendido.

Os dois sentaram lado a lado, deixando os vinhos no chão enquanto observavam a cidade.

–Então... – ele contornou a filha com um braço e a puxou para si, passando a mão nos cabelos dela – Quem é esse rapaz?

–Hmm... O nome dele é Sesshoumaru e ele faz parte de uma família ligada à do imperador. Parece que a mãe dele era prima da Imperatriz. – ela deu um sorriso – Nós estudamos algumas matérias juntos.

–E agora estão namorando. – não era uma pergunta que ele fazia.

–Nós decidimos tentar. – ela alargou o sorriso – Não sabemos ainda se vai dar certo. Oficialmente eu só fico lá até minha formatura. E também fizemos um acordo de que o que nós temos não atrapalharia nossos estudos.

–E o que vai fazer depois de acabar a faculdade e ainda estiverem juntos?

–Hm... – ela franzia o cenho como se estivesse diante do tabuleiro de go – Nós decidimos esperar pra decidir sobre isso... Pensei em tentar arranjar um trabalho aqui ou lá... Se for aqui, eu posso ir e voltar, não? Mas é algo que não dá pra saber ainda...

-Aqui você já tem algo garantido, não?

-Sim. Não tenho nada concreto na capital. – ela deu um suspiro – Por isso vamos discutir mais pra frente. Ainda temos alguns meses.

O senhor Nozomu olhava o perfil da filha com um interesse especial:

–Sabe... – ele começou – Você sempre foi muito mais independente de todos, até mais do que Hakudoushi. Eu lembro quando você era bem pequena, um ano ou menos, e já queria andar sozinha e subir na estante do seu pai e pegar os livros dele...

–Na sua estante? – ela franziu a testa.

–Eu estou falando do seu outro pai. – ele tinha uma expressão mais séria – Meu filho também era muito independente. Tomava as próprias decisões. Ele sabia desde criança que todos nós decidimos o nosso próprio caminho. E você é muito parecida com ele.

–Não decidi muita coisa.

–Ah, decidiu sim. – ele continuou olhando o horizonte – Vai ver em alguns meses que, lá no fundo, algumas coisas já foram definidas...


Depois de voltar de Komaki com o pai, descendo a montanha sofrendo bem menos do que no momento que subiu, Rin passou a tarde arrumando as coisas no quarto. Jogou fora cartas, bilhetes, caderno de anotações, separou livros para doação... até se deparar com os diários escritos em anos anteriores.

Eram textos da época que estava com Aki, com relatos sobre o tratamento, do período da primeira recuperação e também sobre a morte dele.

Como um passo importante da terapia, ela decidiu começar a ler.

Foram longas horas de leitura dos próprios escritos, quase não se reconhecendo ali. Havia uma Rin sonhadora e uma outra que se negava a aceitar a doença do falecido noivo. Era como se estivesse lendo sobre outra pessoa. Ela era ali, obviamente, muito mais jovem, mas mesmo assim reconhecia-se ou recordava-se pouco do que era na atualidade.

No diário mais recente, do último ano, com páginas em branco depois da morte de Aki, ela viu uma pessoa que havia projetado um futuro que não se concretizaria.

Deitando o rosto no travesseiro, ela sentiu o cansaço pesar-lhe no corpo. Havia sido um dia cansativo. E ler aquilo parecia cansá-la também.

Adormeceu em cima dos diários. Como não desceu para jantar com a família, Hakudoushi subiu para ver se ela estava bem.

–Rin...? – ele colocou a cabeça pela porta.

Viu a irmã ainda adormecida entre os diários, alguns abertos, outros caídos no chão.

–Rin, acorde... – ele murmurou.

Hmmm... – ela virou o rosto para o outro lado e abraçou a almofada. Ela devia estar exausta da caminhada em Komaki e da subida nas montanhas e não acordaria agora nem para comer.

Um dos diários caídos no chão estava com a página aberta. Ele passou o olho rapidamente, e apenas por extrema curiosidade, em um parágrafo sobre o falecido noivo.

"... mas os médicos garantiram que ele iria se recuperar. Aki prometeu que depois do tratamento seria o nosso casamento..."

Fechou ali mesmo e pegou todos os volumes da cama e do chão para colocá-los em cima da mesinha dela.

Voltou depois para perto da cama e fez menção de acordar a irmã. A mão, porém, acabou se aproximando da têmpora dela, onde havia a cicatriz, disfarçada pelo cabelo, de um acidente que ela havia sofrido no ano anterior.

Decidiu pegar o lençol e cobri-la, apagando as luzes ao sair do quarto.

Do lado de fora, Hakudoushi sentiu a presença de alguém pela visão periférica. Virou apenas os olhos para o lado e viu Jakotsu encostado na parede, braços cruzados, olhos fechados e um sorriso meio cínico/meio de satisfação no rosto. Ele havia aparecido para jantar e aproveitar as últimas horas de Rin ali antes de voltar para a outra cidade, trazendo também dois modelos assinados para que ela levasse de presente para uma amiga que ela tinha na faculdade.

–Você lidou bem com essa notícia do namorado da capital.

Hakudoushi voltou a olhar a porta como se pudesse ver Rin dormindo através dela.

–Ou talvez você ache que não é tão sério.

–Rin sabe onde é o lugar dela. – o irmão sussurrou – Ela mesma escolheu há tempos isso. Ela ficará onde os Nozomu ficam.

O primo deu uma risada.

–Você é hipócrita, Hakudoushi. – abriu os olhos, o sorriso ainda mais malicioso – Tá se remoendo por dentro porque queria que ela ainda estivesse chorando por Aki e não conhecesse ninguém por lá. Tem medo que ela não volte pra cá depois da formatura, né?

Hakudoushi soltou um "tchi" de desprezo e começou a andar até a porta do quarto dele.

No meio do corredor, porém, ele parou e olhou para o primo por cima do ombro:

–E você?

Jakotsu franziu a testa enquanto Hakudoushi virava-se para continuar falando:

–Você a enche de presentes e roupas pra tirar a culpa por achar que não a ajudou na época do luto. Aposto que chegou a pensar em alguma bobagem antes de perceber que foi só um acidente.

O sorriso malicioso sumiu e uma expressão sombria cobriu o rosto de Jakotsu.

–Se eu sou hipócrita... – o rosto de Hakudoushi inclinou levemente para o lado para completar a frase – Você é o quê, mesmo?

Como o primo não respondeu, ele deu as costas de vez, erguendo a mão numa despedida.

–Boa noite, Jakko.


Na manhã seguinte, Rin desceu sem grande esforço do trem carregando uma pequena mala com as garrafas de vinho e de licor e dois modelos assinados por Jakotsu, presente para Sango, a mochila com poucos pertences às costas. Estava com um pouco de cansaço por causa da ida à montanha no dia anterior, mas provavelmente conseguiria descansar bem à noite.

Não precisou ficar muito tempo parada na plataforma para ver uma pessoa: Sesshoumaru já estava ali, perto do leitor de código de barras do cartão. Ele havia ligado na tarde anterior para conversar muito rapidamente sobre o retorno dela, confirmando que poderia ir buscá-la sem que isso causasse qualquer tipo de transtorno.

–Bom dia... – ela murmurou ao ficar na ponta dos pés para dar um beijo no rosto dele – Não está aí há muito tempo, né?

Sesshoumaru franziu a testa de leve antes de discretamente fazê-la tirar a mochila às costas para jogá-la por cima dos ombros e segurá-la com uma mão, mantendo a outra livre para poder contornar a cintura da namorada.

–O que foi? – ela estranhou a atitude dele.

–Você estava falando comigo no seu dialeto. – ele respondeu calmamente.

Rin levou a mão aos lábios. Impossível aquilo ter acontecido. Ela se controlava bem para não falar nada em outra língua.

–Não tem problema. Eu entendi. – ele a guiou para fora da estação – Não fiquei muito tempo esperando.

Os dois não demoraram a alcançar o carro dele em um estacionamento. Ele colocou a pequena mala no banco de trás do carro e abriu a porta para ela.

Quando eles já estavam nas ruas, já em direção ao apartamento dela, ele interrompeu alguma cantiga que ela estava cantarolando para perguntar:

–Trouxe vinho e roupas?

–Vinho pra mim de uma safra especial de Aichi. – ela deu um largo sorriso, a cabeça balançando ao som da cantiga – Dois conjuntos pra Sango-chan.

–Oh. – ele murmurou – Parece que seu primo encontrou outra modelo.

–Sim. – ela riu – Incrível, né?

Ficaram os dois em silêncio.

–E o seu irmão? – ele rapidamente lançava um olhar na direção dela, como se quisesse avaliar a reação à pergunta feita.

Viu Rin cruzar os braços e franzir a testa como se estivesse em dúvida ou preocupada.

–Hm... Ele vai viajar e ficou preocupado com nossos pais ficarem sozinhos... mas vai dar tudo certo. Meu pai estava em boa forma ontem subindo aquela montanha.

–Entendo. – ele murmurou.

Mais um momento de silêncio se seguiu.

–E como ele recebeu a notícia?

A namorada ficou mais alguns segundos em silêncio.

–Ele ficou... bem? – ela testou a palavra – Acho que pode ser interpretado assim.

–"Bem"? – ele repetiu.

–É... Bem. Não brigou e nem teve um ataque de ciúmes ou quis pegar o trem pra Tokyo. – ela ainda franzia a testa – Ele não falou nada, na verdade. Só me escutou. Perguntou se você sabe o que aconteceu comigo.

Sesshoumaru novamente a olhou de soslaio.

–Acho que Hashi está bem diferente... eu não esperava essa atitude dele. Acho que criei uma imagem errada dele agora... Tinha ainda na minha cabeça o Hakudoushi de uns cinco anos atrás. Todo ciumento e protetor.

Rin deu um enorme sorriso e continuou falando sobre as coisas que haviam acontecido nos últimos dois dias que passou com a família, mas a mente dele estava concentrada em outra coisa.

Hakudoushi vai ser um problema.

–...Né? – ela perguntou para ele.

–Sim. – ele replicou apenas para não deixá-la sem resposta. Ele realmente não estava conseguindo acompanhar o que ela contava.

A dúvida agora era: o que Hakudoushi ia fazer?