Nota da autora: Pessoal, eu ia postar isso aqui no dia do meu aniversário e pedir comentários de presente, mas alguns já sabem que uma dor horrível de coluna me atacou e só hoje consegui revisar o capítulo (imagine aqui um emoji de choro porque era exatamente essa a minha cara nos últimos dias).
Obrigada a quem comentou: isabelle36, Jo-Anga, Josy, HelloBraga, ShivaAurora, AyameT, Li'LuH, Haruna Uchiha, Dica-chan e Thaís.
Ainda sinto reações bem divididas, hihihihi. Será que vão gostar do que vai acontecer neste capítulo? O próximo sai em 10 dias (ou menos, dependendo do que vocês disserem nos comentários hehehehe).
(e comentem mesmo porque sofri muitíssimo pra escrever, hahahaa)
UM CAMINHO PARA DOIS
CAPÍTULO 38
O que se põe no meio do caminho – parte II
— Você está grávida, Nozomu-san. – disse uma senhora de meia-idade segurando os resultados dos exames que Rin tanto havia esperado.
Olhos levemente arregalados, sem brilho algum de alegria e aparentemente perdidos, a jovem tinha o rosto voltado para um ponto do chão como se pudesse obter alguma resposta dali.
— De oito semanas. – completou depois de ler mais uma vez os resultados.
Ao notar a forma como a paciente se encontrava e o que poderia significar a notícia, a médica agiu como em várias outras ocasiões com tantas outras jovens como aquela: começou a conversar e tentar deixá-la mais tranquila:
— Vejo que outro médico já pediu os exames secundários e prescreveu remédios para o enjoo... Foi por isso que você desconfiou que estava grávida?
Rin ainda olhava atônita para o chão e não deu resposta. Aparentemente também não havia escutado.
Quantas e quantas vezes já não presenciou uma cena parecida? Pelo menos deu sorte de ela não desmaiar na maca durante os exames, como já havia acontecido com outras pacientes em vezes anteriores.
— Nozomu-san? – tentou novamente em um tom mais gentil.
Piscando várias vezes, a outra voltou a encontrar os olhos da médica.
— Você está melhor dos enjoos? Está sentindo outra coisa além disso?
Rin fechou os olhos e balançou a cabeça lentamente para os lados. A médica notou o quanto ela parecia extremamente triste com a confirmação dos exames.
— Vamos começar o pré-natal. O pai vai poder acompanhar? Seria importante isso.
O pai. A palavra acertou um alerta na mente de Rin. Sesshoumaru precisava saber e ainda não sabia como contar.
Só sabia que precisava ser o quanto antes. Havia uma série de coisas para resolver com mais aquela situação.
A conversa pelo telefone com a corretora passou rápido pela mente, mais especificamente a parte que ela deixava claro a solicitação da propriedade para casal sem filhos.
Talvez ele não pensasse em ter filhos agora. Talvez depois. Ou que nem gostasse de crianças. Ou também não pensasse em algo que o deixasse ligado à Rin pelo resto da vida – como seria aquela criança.
Nem ela havia pensado em ter filhos e já teria que repensar em tantos aspectos da vida, em especial três pontos: onde iria morar, o que faria com os estudos e como conseguiria emprego tendo filho e uma pós-graduação.
— Vou marcar aqui já para a semana que vem. – a médica interrompeu os pensamentos de Rin e conseguiu trazê-la de volta à realidade, só então percebendo que não havia respondido à pergunta anterior.
Limpou a garganta educadamente e ajeitou os ombros, erguendo o rosto para tentar mostrar o mínimo de dignidade:
— Acredito que ele poderá acompanhar fora do horário de trabalho. – ela falou num tom quase resignado ao ter que aceitar a nova realidade.
A outra mulher assentiu lentamente como se avaliasse a resposta.
— Você acha que ele não vai poder acompanhar?
— Ele... – Respire fundo – Ele trabalha muito. Realmente não sei.
Deu um sorriso sincero. Se havia algo que sabia que Sesshoumaru faria era assumir aquela responsabilidade e pensar em uma solução:
— Mas acredito que vai fazer o possível para estar comigo.
— Ah, que bom. – ela continuou digitando os dados no computador, lançando de vez em quando o olhar para Rin. Ela via que a jovem estava com receio de alguma coisa, com o olhar meio perdido para algum ponto no chão, apertando o tecido da saia lápis entre os dedos em evidente nervosismo.
— Hmm... Com licença... – Rin a interrompeu e os dedos pararam de digitar por alguns segundos para vê-la hesitante.
— Sim?
— O outro médico que me atendeu na emergência passou vários exames, mas não fiz alguns porque achava que não estava... não estava... gráv...
Calou-se e sentiu o suor correr frio, levando a mão delicadamente aos lábios como se quisesse impedir a palavra de sair. Era como se ainda não tivesse coragem de falar o atual estado.
Ou talvez esteja apenas muito assustada, pensou a médica.
— É importante que os faça. Marque os horários o quanto antes.
Rin confirmou obedientemente com a cabeça e continuou:
— Esse médico só me fez algumas perguntas e falou o que eu tinha.
A médica ergueu uma elegante sobrancelha e procurou o nome da pessoa que havia atendido no dia anterior, dando um pequeno sorriso antes de comentar:
— Ah, Suikotsu-sensei. Ele é muito bom. Sabe das coisas só de olhar.
Rin sentiu o rosto ficar quente. Ainda havia falado para si mesma que iria esfregar o resultado do exame na cara do homem por achar que estava errado.
— Mas só fez algumas perguntas. – falou para a médica.
— Sim. Ele deve ter visto os principais sintomas.
— Eu só tive enjoos.
A médica continuou olhando a ficha médica pela tela do computador:
— E tontura. Mudança de paladar. Problemas no estômago por ter ficado muito tempo sem comer e ter ingerido álcool. Uma queda provocada pela tontura. Todos os sintomas típicos da gravidez.
— Oh. – Rin calou-se de novo, evidentemente incomodada por ter sido tão bem observada na consulta anterior.
— Mas não se preocupe. – a médica deu um sorriso gentil para tranquilizar aquela jovem tão preocupada com aquela situação, torcendo para que as palavras fizessem todo sentido a partir daquele momento – Tenho certeza de que terá apoio de muita gente e essa criança vai crescer forte e saudável.
Mais tarde, Rin já estava na frente do prédio com mochila amarela às costas à espera de Sesshoumaru. Estava tão ansiosa que não aguentou ficar no apartamento, optando por descer e ensaiar de que forma contaria a notícia.
Estava grávida. Grávida de oito semanas. Grávida de oito semanas de Sesshoumaru. Tinha um bebê dentro dela.
Pelos cálculos, deveria ter acontecido na época que teve aquela grande confusão na faculdade sobre o escândalo entre Sara e o antigo orientador. Tinha ficado tão nervosa e estressada naquela semana que havia esquecido de tomar anticoncepcional e se proteger.
Não era sempre também que mantiveram relações sem proteção, mas em duas ou três ocasiões teve certeza que não se preocuparam de imediato. E mais: a cartela que encontrou na gaveta de medicamentos tinha várias lacunas, indicando que em alguns dias havia tomado a pílula corretamente e esquecido nos outros.
Deu um suspiro cansado, ajeitando a mochila às costas para que não pesasse tanto nos ombros caídos. Sentia-se tão culpada ainda que...
Viu o carro de Sesshoumaru aproximar-se pontualmente no horário combinado, lentamente aproximando-se do perímetro e endireitou o corpo, respirando profundamente como se quisesse tomar coragem.
Ao entrar no veículo, no entanto, sentiu o coração acelerar. Havia ensaiado as falas direitinho, mas vê-lo sempre fazia com que esquecesse o que queria falar, principalmente com algo que a deixou tão abalada.
A terapeuta a ensinou tanto a tentar enfrentar as situações ruins e agora ela sentia-se péssima por não conseguir fazer o mínimo do que haviam discutido nas sessões.
Mas a verdade era que...
— Você está se sentindo melhor, minha Rin? – ele perguntou depois que ela terminou de acomodar-se e prender o cinto de segurança.
... As coisas não iam mudar entre eles, né?
— Sim. – ela virou o rosto para ele e deu um falso sorriso de segurança para esconder o que sentia, o que obviamente não passou despercebido por Sesshoumaru.
— Fez os outros exames?
Rin confirmou com a cabeça.
— Não deu pra fazer todos, mas já marquei o que dava para os próximos dias se não viajarmos pra Nagoya.
Sesshoumaru começou a dirigir, percorrendo alguns metros antes de começar a falar:
— A respeito disso...
Rin arregalou de leve o olhar, tentando disfarçar o nervosismo em antecipação ao que seria dito:
— ... Não poderei este fim de semana. Podemos ver no próximo.
— Oh... – ela murmurou. Queria tanto resolver tudo naquela semana, principalmente conversar com o pai e decidir um rumo para a vida. Sempre tinha bons conselhos para dar e pensava muito no bem-estar dela.
Ficou estranhamente calada pelos minutos seguintes e de vez em quando ele a olhava de soslaio. De novo havia ali uma Rin silenciosa. Ele não gostava de lidar com ela daquele jeito quando sabia que era extremamente conversadora.
— Não creio que ele vai reclamar, minha Rin. Podemos planejar a ida para a semana que vem porque gostaria de ficar alguns dias a mais na cidade.
Rin encontrou o olhar dele e deu um sorriso tímido, não fazendo mais comentários e novamente caindo no silêncio que o deixava incomodado.
Ao chegarem à propriedade Taisho, ele não a deixou sair imediatamente do veículo, demorando alguns minutos para destrancar as portas.
— Meu avô não está aqui, está em outra cidade visitando alguns familiares. Então não precisa se preocupar em jogar go hoje.
Sesshoumaru observou o rosto dela enquanto falava, notando o rosto em dúvida, a testa franzida em preocupação. Parecia completamente perdida em pensamentos.
— Mas Kaede sabe da sua vinda. – ele completou – Ela ficou muito preocupada quando soube que havia ido parar no hospital.
Demorou mais alguns segundos para entender que também precisaria agradecer pela comida e pelo chá que Kaede havia preparado. Um ótimo chá, por sinal. Rin sentiu ter melhorado muito depois de tomar.
Assentiu com um sorriso mais tranquilo e ele curvou-se para tomar os lábios dela num beijo rápido, destravando as portas logo assim que afastou o rosto.
Minutos depois, estavam no genkan da casa sendo recebidos por um Jaken extremamente receptivo com Rin.
— Sssenhorita Nozomu, não pode carregar muito peso, não pode. – ele mesmo começou a tirar a mochila das costas de Rin, colocou-a no chão, e envolveu-a sem que pedissem num enorme xale lilás com estampas de flores amarelas para aquecê-la – Vamos, vamos, já preparamos outro chá.
Depois de praticamente arrastá-la do genkan sob um protesto infantil, Sesshoumaru viu-se sozinho no espaço, franzindo o cenho. Era óbvio que Rin estava preocupada com o que o senhor Nozomu falaria daquele arranjo que fariam para morarem juntos, ainda mais com Rin sem emprego e precisando concentrar-se nos estudos.
Carregou a mochila de Rin até o escritório do avô e sentou-se em uma das cadeiras que costumava ocupar quando os outros dois estavam jogando go. Gostava de observar Rin concentrada e ao mesmo tempo divertindo-se naquelas disputas, mesmo quando perdia uma ou duas partidas.
Voltou os pensamentos para o problema atual: moradia. Tinha que arranjar um lugar para os dois agora que o lugar que Rin mais havia gostado estava fora do alcance. Ele queria deixar tudo pronto para que o senhor Nozomu entendesse que a filha estava segura com ele, que o relacionamento era sério e que jamais precisaria se preocupar com o bem-estar dela enquanto estivesse em outra cidade.
Ligou então para a corretora para saber o que havia realmente acontecido no dia anterior, saber se havia tomado alguma providência e procurado outro lugar para eles.
Na sala de jantar, Rin estava com os olhos fixos no chá e no bolo de nozes que Kaede havia preparado servidos em um elegante conjunto de porcelana com desenhos do mesmo brasão que havia nas mangas de alguns yukata de Sesshoumaru. O xale que Jaken providenciara tinha sido realmente bom – sentia-se agradavelmente aquecida e confortável.
A idosa servia-se de um pouco de chá e estranhou o silêncio à mesa, tão atípico pelo que já conhecia de Rin.
— Não vai tomar nada? Ainda está com problema no estômago? – Kaede a tirou dos pensamentos e a fez erguer os olhos da xícara para encontrar os dela.
— Ah... Eu... Eu melhorei com o chá que mandou ontem. Nem sei como agradecer. – ela falou num tom suave e educado.
Kaede nada falou, continuando a sorver o líquido calmamente enquanto a observava.
— Obrigada pela refeição. – Rin falou ao pegar os talheres e começou a comer pequenas porções do bolo.
Doce, muito doce. A primeira colherada não foi boa e a segunda só piorou. Lembrou-se que haveria mudança no paladar enquanto estivesse grávida, lamentando profundamente que uma das comidas que mais gostava agora estava intragável.
Parou de comer e discretamente empurrou o pequeno prato para indicar que estava satisfeita, muito para o aparente desprazer da madrinha de Sesshoumaru.
— Oh, não está bom? – ela ergueu uma sobrancelha.
— Está ótimo. – a jovem disfarçou o constrangimento com um sorriso – Eu só não queria me arriscar a comer demais por causa do estômago.
— Achei que tinha melhorado. – a outra apontou.
Rin deu um sorriso sem graça ao ser pega na mentira.
— Você parece preocupada. – Kaede observou depois de mais um gole de chá – É por causa do novo lugar que Sesshoumaru precisa encontrar?
A princípio, Rin não soube o que comentar porque não sabia até onde ela sabia sobre a convite dele para morarem juntos. Sesshoumaru dava-se bem com ela, não? Parecia ser a pessoa com quem ele mais conversava em casa.
— Ele me contou, se é isso o que a preocupada. – ela respondeu à silenciosa indagação de Rin enquanto enchia mais uma xícara de chá gengibre com limão – Está procurando um lugar para vocês dois. Inuyasha também está fazendo o mesmo. Teve a ideia antes de Sesshoumaru, achei até que seria o primeiro a fazer.
—Só achei estranho que a casa fique desocupada. Na minha família, ela passa de geração a geração. Meu irmão será o próximo dono.
—Aqui também, mas para ser chefe de família, o Sesshoumaru vai precisar respeitar algumas regras.
Rin baixou o rosto para observar os detalhes da porcelana.
— Ele só não quer fazer isso. Inuyasha também nunca aceitou, mas para ele sempre foi de menos. Nunca precisaria ser o chefe.
— Entendo. – ela falou sem querer aprofundar a conversa e tocar em assuntos como casamento arranjado entre primos e outras coisas muito conservadoras comuns para uma família nobre.
Jaken apareceu na sala com uma bandeja protegida por uma tampa e, com um gesto efusivo, tirou-a para mostrar para Rin:
— Trouxe rabanada e bolinhos de chuva.
Arregalando os olhos, Rin sentiu um nó formar no fundo do estômago e a ânsia tomar conta do corpo. Lembrou-se do quanto adorava comer aquilo tomando o chá da tarde, mas sentiu um incrível nojo apenas com o cheiro daquele monte de fritura.
— Você está se sentindo bem? – Kaede perguntou visivelmente preocupada. A garota estava quase verde.
— Está... – ela mentiu, tomando mais um gole do chá como se fosse a única salvação que tivesse em vida – Eu só estou com o estômago cheio.
— Mas você não comeu nada. – Jaken apontou e novamente ela sentiu-se péssima por ser pega em mais uma mentira – Vou trazer as frutas e mais chá.
E saiu da sala depois de deixar a bandeja de rabanada e bolinhos de chuva bem na frente de Rin.
— Esse Jaken... – Kaede murmurou ao levantar a tampa e fechar a bandeja para esconder as guloseimas – Sempre pensando que as visitas vêm para cá de estômago vazio ou passando fome.
— Está tudo bem... – ela tentou disfarçar o próprio constrangimento por não saber mentir – Eu só estou com medo de ficar doente e incomodá-los de novo.
Só queria também um momento mais tranquilo para falar com Sesshoumaru e parar de inventar histórias, ou a situação ficaria muito pior para ser explicada.
Kaede a olhou com um pequeno sorriso. Aquela jovem parecia não entender ainda o quanto as pessoas gostavam e queriam o bem-estar dela, principalmente Sesshoumaru.
— E você está gostando de continuar morando por aqui? – a idosa perguntou para continuar a conversa.
Rin pensou um pouco. Havia coisas boas na cidade. Não tinha a família, mas tinha Sesshoumaru e os amigos que conheceu na faculdade, apesar de não se verem agora com tanta frequência desde que se formaram.
Definitivamente não era a mesma coisa de mais de um ano antes, quando pensou que seria apenas uma estadia temporária em uma das maiores cidades do mundo. Agora ela nem queria afastar-se dali, ainda mais na atual situação.
— Eu aprendi a gostar daqui. – deu um sorriso – E acredito que será uma boa experiência morar por um tempo com Sesshoumaru.
Jaken apareceu na sala com outra bandeja tampada e atrapalhou novamente a conversa:
— Com licença, trouxe chá verde e um melão bem doce.
Ao ouvir o nome da fruta, a atenção de Rin ficou maior e falou timidamente:
— Ah, eu gosto disso.
— Fique à vontade. – ele habilmente colocou vários pedaços num prato linda e delicadamente ornado com desenhos de flores de cerejeira e posicionou como a etiqueta exigia na frente dela.
Notou o quanto ela pareceu gostar mais do que havia sido oferecido anteriormente, comendo avidamente alguns pedaços quase sem respirar ou mastigar.
— Ei, devagar, garota. – ele murmurou, mas ela não pareceu ouvir.
— Acho que o melão fez bem para ela, Jaken. Pode trazer mais alguns, por favor? – Kaede avisou.
— Tá uma delícia mesmo. – Rin murmurou timidamente com um pedaço de melão preso num garfo a centímetros da boca.
— Claro, vou trazer mais um pouco. – Jaken afastou-se lançando olhares desconfiados por cima do ombro.
Talvez ela não tivesse comida em casa já que passava o dia na universidade. Ou não tivesse tempo de comer. Esses jovens de hoje... Será que teria que mudar para a nova casa de Sesshoumaru e da jovem senhorita Nozomu para cuidar deles?
Quando o homenzinho afastou-se sem conseguir esconder a preocupação, Kaede deu um sorriso e voltou a beber o chá, aproveitando então para comentar:
— Sesshoumaru gostava desta casa e relutou muito para aceitar as condições para herdá-la. Ficamos surpresos quando simplesmente deixou de lado a ideia de continuar aqui.
— Ah... – Rin parou de comer por alguns minutos – Não sabia que não queria sair daqui antes. Ele fala exatamente o contrário agora. Na verdade, eu meio que insisti para ele ficar.
— Oh? – Kaede murmurou – Como assim?
— É que eu achei estranho a casa ficar vazia apenas com vocês dois quando ele e até Inuyasha vão embora... Mas ele nem pareceu se importar.
— Ah. – ela bebeu mais um gole do chá, esvaziando a xícara – Entendi...
As duas ficaram em silêncio por alguns segundos, com Kaede servindo-se de chá verde. Tirou a tampa da chaleira e deixou um pouco de vapor sair, esticando o braço para pegar a xícara de Rin para enchê-la também.
Depois, empurrou delicadamente com a ponta dos dedos o pires com o recipiente cheio até a borda, deslizando suavemente pela mesa de madeira nobre.
Por um novo motivo, o cheiro do chá verde parecia ser o mesmo de um peixe cru, provocando náuseas em Rin assim que alcançou as narinas. Parou de comer, endireitou a coluna e observou Kaede beber completamente imperturbável.
— Aconteceu alguma coisa? – Jaken já estava com a terceira bandeja daquela hora ao lado dela, chegando tão discretamente que ela deu um grito de susto.
— Não faça mais isso! – ela colocou a mão direita no coração e tapou o nariz com a esquerda.
— Fazer o quê? Eu só trouxe mais comida. – ele falou na maior inocência – Está se sentindo mal? Parece que está ficando verde de novo.
— Está tudo bem. – ela forçou um sorriso para continuar com as aparências – É só o meu estômago querendo me pregar uma peça. Pode fazer mais chá de gengibre, por favor?
— Achei que gostasse de chá verde. – ele comentou novamente de uma forma que começou a deixá-la irritada. É claro que ela gostava de chá verde, mas não queria beber algo que tinha cheiro de peixe podre!
— Eu preciso pegar meu remédio para o estômago! Com licença! – ela levantou-se abruptamente e fez com que as duas companhias piscassem atônitos.
Saiu sem dar maiores explicações, refazendo o caminho até a sala e ao genkan, onde tinha certeza que havia deixado a mochila amarela.
Ao chegar ao local, viu o espaço vazio. Ela precisava encontrá-la o quanto antes para tomar os remédios e mostrar os resultados para Sesshoumaru.
— Acho que Sesshoumaru-sama está com sua mochila. – Jaken a assustou de novo ao falar atrás dela.
— EU JÁ FALEI PRA PARAR DE FAZER ISSO! – Rin berrou no momento em que o nervosismo a dominou, fazendo o homenzinho arregalar os olhos.
Era a primeira vez que a via daquele jeito e o deixava sem saber o que fazer, mesmo quando ele já estava acostumado com o destrato de Sesshoumaru na fase mais rebelde do jovem amo.
— Rin? – Sesshoumaru fez-se presente.
A jovem virou o rosto para a direção da voz e o viu parado próximo ao corredor que levava à biblioteca onde geralmente jogava go com Bokuseno. Parecia extremamente surpreso por vê-la gritando com Jaken.
E não soube o que falar. Ficou simplesmente parada, apenas trocando olhares, enquanto Jaken olhava ora para uma, ora para outro.
Depois de limpar de leve a garganta, ela tentou recuperar uma postura mais elegante antes de dar um sorriso fraco:
— Eu estava procurando minha mochila. Preciso tomar meus remédios. – ela explicou.
— Ela está na biblioteca. Você a largou no genkan. – Sesshoumaru explicou num tom calmo e suave.
Jaken interveio educadamente com um pigarro para falar:
— Eu havia avisado para Nozomu-san que já ia procurar pela mochila. Fui eu que deixei no genkan e esqueci de voltar depois para pegá-la.
Outros segundos de silêncio vieram antes de Sesshoumaru continuar:
— Pode retirar-se, Jaken.
Com uma leve reverência, o homenzinho foi embora e deixou o casal sozinho.
— Podemos conversar, Rin? – Sesshoumaru apontou com a cabeça para a direção de onde tinha vindo – Lá na biblioteca?
Engolindo em seco e erguendo o rosto para mostrar um pouco de dignidade depois daquela atitude tão deselegante, ela concordou com a cabeça e saiu do genkan, andando lentamente na direção dele.
Os dois caminharam em silêncio até pararem na frente da biblioteca – ele deslizou a porta para o lado, ela entrou, ele também, porta deslizou para fechar.
Ficaram por alguns segundos em silêncio até ele fazer a primeira ação – sentou-se na cadeira que usualmente ocupava durante os jogos de go e estendeu a mão para que ela aceitasse, o que inevitavelmente aconteceu. Ela sempre aceitava aquela mão elegantemente estendida.
Acomodada no colo dele, sentiu-se um pouco mais calma quando ele a fez colocar a cabeça no vão entre o pescoço e o ombro, e também menos enjoada do que quando estava comendo.
O cheiro dele definitivamente não me faz mal, pensou ao fechar os olhos e inalar a base do pescoço.
— O que aconteceu, minha Rin?
Demorou algum tempo para que viesse uma resposta convincente:
— Não aconteceu nada.
— Você não grita com as pessoas assim. – ele observou, deslizando suavemente os dedos pelos contornos da maçã do rosto. Daquela forma, atraiu o olhar dela para o dele – Acho que foi a primeira vez que isso aconteceu desde que estamos juntos.
Que vergonha, que constrangimento, ela sentiu o rosto queimar de vergonha.
— Eu... Eu vou pedir desculpas a Jaken-sama. – ela forçou um sorriso e voltou a sentir o cheiro que a acalmava tanto.
Acho que o bebê também gosta disso.
— O nome dele é Jaken. – ele novamente a corrigiu ainda num tom suave e calmo, como se fosse exatamente o que ela estivesse precisando no momento – Está preocupada com essa questão de morarmos juntos?
Rin confirmou com a cabeça ainda naquela posição.
— Mas você sabe que vamos resolver isso, não?
Novamente houve uma confirmação por parte dela apenas movendo a cabeça contra o pescoço dele.
— Parece que você está me cheirando, Rin. – ele avisou.
O comentário era para soar um pouco engraçado sob outras circunstâncias, um humor que apenas ela conhecia, mas ela quase não reagiu depois de um momento de tensão. Simplesmente ergueu o rosto e encontrou os olhos serenos dele.
Como era possível que ele não a apoiasse num momento como aquele?
Sesshoumaru era sempre tão gentil com ela, fazia o possível para ajudá-la, mesmo que ela não pedisse e quando nem estavam namorando ainda. Quis que ela fizesse terapia, fazendo questão de acompanhá-la. Ajudou-a a estudar para as provas. Organizou os horários e até os planos que tinha para a vida apenas por causa dela, procurando até um lugar para morarem, quando tudo o que ela tinha planejado por meses foi apenas em estudar na capital e voltar para outra cidade.
A culpa de ter chegado a mais uma mudança de planos era única e exclusivamente dela. Se ele mudava tanta coisa por ela, também tinha que fazer por ele.
Abriu a palma para uni-la à dele – cada ponta de dedo fazia o possível para tocar a outra, sendo a mão dele maior que a dela e obviamente em vantagem naquela ação.
— Eu gostaria de conversar com você... – ela falou sem um pingo de hesitação, mas ainda assim ele notou uma pontada de tristeza na voz – Podemos ir pro seu quarto?
— Meu quarto... – ele repetiu num sussurro, desfazendo o contato entre as palmas para deslizar o polegar pela maçã já em tom rosado sob o toque dele – Vou ter outra surpresa sua?
Se antes o rosto dela estava em tons de rosa claro, naquele momento ficou vermelho. Era óbvio que ela havia entendido que ele, com aquele rosto sério, queria mais do que conversar.
Mas ela conseguiu ler a expressão séria e viu que era apenas mais uma brincadeira por parte dele.
— Eu... Nós... – ela começou um pouco nervosa, mas controlou-se para poder continuar – Queria ficar abraçada hoje como a gente fazia no Jardim das Magnólias. Faz tempo que a gente não fica assim.
Havia alguma coisa triste nela que ele ainda não entendia. Assentiu de leve com a cabeça e os olhos passearem pelo rosto dela até finalmente responder:
— Claro que sim, minha Rin.
Pela primeira vez naquela tarde, ele sentiu que ela esboçou um sorriso totalmente sincero.
— Você quer subir antes? Preciso ligar para meu avô para saber o retorno dele.
— Sim. – ela também concordou com a cabeça e deu um leve beijo no rosto.
Levantou-se do colo dele sem deixar de sorrir com certa emoção e ansiedade, dando passos para trás até chegar à porta. Tudo daria certo. Ela e Sesshoumaru pensariam em uma solução juntos.
— Eu vou ter esperar subir, então. – ela falou enquanto estava parada à porta – Obrigada.
Novamente ele concordou com a cabeça e a viu sair depois de lançar mais um sorriso por cima do ombro.
Depois que a porta deslizou, Sesshoumaru franziu a sobrancelha e balançou a cabeça para os lados. Havia notado o quanto ela havia ficado nervosa com a questão da moradia e de não conseguir emprego, mas tinha já algumas coisas planejadas. Uma delas era conversar com os pais e...
Hakudoushi vai continuar sendo um problema, tinha certeza.
O telefone da casa tocou algumas vezes e soou também no escritório, parando ao ser atendido por alguém da casa. Segundos depois, Kaede abriu uma fresta na porta deslizante e falou:
— Bokuseno quer falar com você. – e fechou de novo.
Sesshoumaru estendeu a mão e atendeu a linha da biblioteca:
— Eu já ia ligar. – ele avisou, num tom entediado, antes que Bokuseno eventualmente dissesse que Sesshoumaru havia esquecido de ligar para saber sobre o horário de chegada dele.
— Eu sei, mas estava ansioso pra contar duas coisas. Uma boa e uma ruim. – Bokuseno falou – Qual você escolhe primeiro?
— A ruim.
— A ruim é que esta cidade é absolutamente monótona demais pro meu gosto. Se não fosse por causa da família da sua avó, nunca mais pisaria aqui.
— E a boa?
— Vou voltar ainda hoje. – o avô respondeu num tom bem-humorado.
Sesshoumaru desligou o telefone e andou até um canto onde estava a mochila de Rin – pesada e preparada para acampar ou sobreviver a uma guerra cheia que estava. Provavelmente tinha livros e mais roupas para passar a noite.
A alça que segurava, no entanto, arrebentou devido ao peso, mas nada aparentemente muito grave. Talvez Jaken ou Kaede pudessem consertar ainda naquela noite.
Abriu o zíper e começou a tirar o conteúdo para poder levar para Kaede avaliar o dano. Livros, roupas, um celular descarregado há horas... Como ela não havia aprendido a necessidade de ter um aparelho ligado e carregador era algo além da compreensão.
O telefone tocou de novo e ele atendeu, já sabendo quem era.
— Por que você desligou?
— Você não me deu a notícia boa. Achei que acabava por aí. – o outro respondeu indiferente enquanto ainda tirava as coisas da mochila.
Ignorando a implicância do neto, Bokuseno continuou:
— Vem me buscar? Chego no último trem.
— Rin vai passar a noite aqui. Vou pedir para Jaken.
— Vou chegar no trem de 23:15... plataforma 36... não, espera... acho que é...
Embora Bokuseno continuasse falando, Sesshoumaru não mais o ouvia. A atenção estava voltada para um resultado de exame que estava entre os pertences tirados da mochila amarela.
Abriu-o com cuidado e os olhos rapidamente passaram pelo papel.
— Escutou? – Bokuseno perguntou na linha.
— Vou falar para Jaken buscá-lo. – ele murmurou quase automaticamente – Preciso desligar.
— Aconteceu alguma coisa? – o avô perguntou num tom preocupado.
Sesshoumaru desligou sem considerar responder.
Rin olhou-se no espelho do closet de Sesshoumaru sentindo-se pela primeira vez envergonhada com a própria aparência. Olheiras profundas, palidez, pele sem brilho... Como havia deixado Sesshoumaru vê-la desse jeito?
Deu um suspiro pesado e olhou-se mais uma vez, desta vez com a atenção no ventre. A mão deslizou de leve pelo local com certa curiosidade.
Estava... ali, certo?
Sesshoumaru também já havia beijado tantas vezes ali... Tinha sido uma sensação muito agradável na hora.
Virou-se ao escutar alguém entrar, arqueando levemente as sobrancelhas ao ver Sesshoumaru parado ali, segurando um papel em mãos.
E ele não parecia nada satisfeito.
— Você está grávida, Rin. – não era uma pergunta dele.
Quando o viu estreitar os olhos, sentiu o coração acelerado e um frio na espinha.
— Quando é que você ia me contar? – ele perguntou.
