EPISÓDIO 18

TRÊS MESES DEPOIS

Não era a primeira vez que ele vinha até a Federação, embora jamais para um encontro como esse. Antes eram sempre assuntos práticos relacionados às competições, como aferição das medidas corporais, assinatura de contratos, ou recebimento de premiações.

- Você gostou mesmo desse terno, não é?! – Saori parecia descontraída no banco em frente ao seu, seu sorriso de apreciação chegando aos olhos violeta. – Fica bom em você.

Shiryu agradeceu o elogio com um aceno. O terno branco de corte chinês era elegante o suficiente para a reunião convocada pela Federação a pedido do Santuário e da Fundação Graad. De algum modo, ele queria que o dragão vermelho gravado do lado esquerdo estivesse à mostra.

Era o primeiro evento do qual ele participaria depois dos 3 meses desde o atentado na estrada de Kamakura e Shiryu se sentia mais confiante expondo sua constelação protetora como pudesse.

- Será uma reunião breve. – Shion fizera questão de que fosse ele o lutador a acompanhá-los. Sentava-se ao lado de Saori, trajando um terno de corte ocidental completamente preto, com o emblema dourado do Santuário na lapela. – Os detalhes já foram aceitos previamente.

Saori suspirou, alisando a saia do vestido. Escolhera um traje de batalha diferente dessa vez: o vestido simples branco de saia rodada realçava ainda mais o colar com o medalhão de ouro e rubi com os símbolos das 88 constelações em círculos concêntricos.

"Ela suspira bastante." Shiryu e Shion chegaram na noite anterior, jantando com ela na Mansão. "Cada etapa concluída tira um pouco da tensão dos ombros dela." Passaram horas relembrando dos acontecimentos que os levaram até ali, para que nada escapasse.

Depois do ápice das hostilidades com a batalha na estrada de Kamakura, o Cavaleiro de Dragão estivera na frente da rede de comunicação e vigilância. Entretanto, apesar de Dohko e Mayura o manterem informado sobre as jogadas do Santuário e da Fundação, só naquela noite ele conseguira ter uma visão ampla de como eles conseguiram o xeque-mate na Subway Army.

- Após os meses de "negociações agressivas", finalmente será assinado o acordo de paz. – a voz de Saori mudou para o tom da presidente de um grande conglomerado.

"Olhando para ela, tão pequena e frágil, ninguém apostaria na enxadrista implacável que ela demonstrou ser." Essa constatação o fez se lembrar de Shunrei. A imagem da mulher delicada, com os olhos verdes brilhando para ele, fez sua mão buscar o celular no bolso interno.

"Sinto muito. Pode me dar um pouco mais de tempo? Você está bem, certo? Sei que vai me esperar mesmo que eu te proíba. Me desculpe por não voltar, mesmo sabendo disso. Estou te avisando, caso esteja preocupado. Até hoje nunca me perdi, nem uma vez, porque você ficou ao meu lado me guiando para que eu não caísse nem me machucasse. Sou grata por um homem maravilhoso como você fazer meu coração acelerar. O fato de estar apaixonada por alguém tão amoroso quanto você me faz feliz. Eu te amo de todo o meu coração."

Shiryu não precisava ver a mensagem, a mera lembrança o lembrou da manhã em que a leu pela primeira vez. Tivera um pesadelo onde Shunrei sentava-se contente em um trono ao lado de Julian Solo e ele os observava de uma posição mais baixa que o nível do chão. Suspeitara que era uma barata.

- Está finalmente acabando. – ele pronunciou em voz alta, atraindo a atenção dos outros dois. – Agora ela poderá voltar.

- Todos estiveram fazendo o seu melhor. – Saori esticou-se para pousar a mão no joelho dele. – Tenho certeza de que logo a teremos ao nosso lado. – Shiryu assentiu com convicção.

- Há duas semanas do início do campeonato, não temos mais nenhuma movimentação suspeita, nenhuma notícia plantada. – a voz serena e segura de Shion e o dom de acalmá-lo. - Não temos mais espiões vigiando nossos passos, sem falar nas agressões diretas. E, acima de tudo, você está completamente recuperado.

- Chegaremos em dois minutos. – o segurança no banco da frente anunciou.

- Shunrei e Shun fizeram um excelente trabalho. – Shiryu afirmou, não pela primeira vez. – Agora é a minha vez.

Desde que soubera que acompanharia o Grande Mestre e Saori, ele se preparara para encontrar Julian Solo. O playboy grego cumprira o que se propusera.

"- Foi ele quem se ofereceu para cuidar da proteção de Shunrei. – a voz de Mayura soou firme na sua mente. – Nas atuais circunstâncias, optamos por aceitar. Por isso, ele tem se esforçado para aparecer na mídia ao lado dela.

- É a forma dele anunciar suas intenções. – Shiryu confirmara que entendia, apesar do tom de desgosto ser evidente. – Aqui eu sei que ela está segura – ele tocara sua testa. – Mas, aqui me sinto humilhado. – tocara seu peito. Ele se ajoelhara diante da sra. Mayura, seu coração doendo e a vergonha o impedindo de ficar de pé e a encarar nos olhos.

- Você, mais do que ninguém, já deveria saber que não se vence uma guerra sozinho. – ela o obrigara a levantar o rosto. – É muita pretensão acreditar que pode viver sozinho. É por isso que o Santuário existe. Shunrei é uma pessoa importante para todos nós. Ela aceitou desempenhar o papel de embaixadora e negociar com os Solo. Ela é uma mulher muito corajosa. Devia ser Amazona. – a leve mudança no tom da voz grave de Mayura fizera um leve sorriso surgir no rosto machucado de Shiryu. Era o maior elogio que se poderia receber dela."

A reunião se assemelhava a uma assembléia.

Além dos representantes das equipes pequenas, as quatro maiores estavam presentes. Da Atlantis Team vieram Julian Solo, Isaak Kraken e Bian Ippókampos. Dos nórdicos da Northern Lights estavam presentes Hilda Polaris, Zigfried Doube e Hagen Merak. Os primeiros que a Zodiac Team cumprimentou foram Pandora Heinstein, Radamenthys Wyvern e Kagaho Benu. Eles se colocaram no caminho dos três e os olhares furiosos e frustrados de Pandora e Radamanthys fizeram Saori endireitar a postura e Shiryu morder as bochechas para não rir.

O saguão da Federação estava cheio, com um público diferente do evento de meses atrás. Ali estavam lutadores e quem assinava os contratos. Era uma reunião de trabalho. Shiryu reconheceu vários adversários. Conversou com alguns, cumprimentou outros à distância, anotando mentalmente o estado físico de todos.

"Depois verei com quem cada um lutará e repassarei minhas impressões."

Evitou se aproximar da Atlantis o quanto pôde. Seus olhos cruzaram algumas vezes com Isaak, mas eles não trocaram nenhum sinal de reconhecimento. Julian fazia questão de virar as costas assim que eles entravam no campo de visão um do outro, o que era um alívio.

- Quando vocês virão a Tóquio? – Zigfried o cumprimentou com naturalidade. Toda a equipe da Northern Lights chegara há quatro dias ao Japão e fora visitar o Santuário.

- Acredito que só para as competições. – Shiryu gostara da seriedade e honestidade dos nórdicos. Eles passaram uma tarde inteira em disputadas amistosas com os Cavaleiros de Prata e Bronze, o que foi uma mudança bem-vinda no ritmo dos treinos. – Como estão as acomodações?

- Muito boas. Nosso hotel fica ao lado do ginásio. – Hagen apertou sua mão com energia. – Essa ambientação é fundamental.

- Devemos agradecer à srta. Kido. – Zigfried afirmou, observando Hilda e Saori conversando.

Shiryu sabia que a aproximação com a srta. Polaris fora outra das estratégias de Mayura e Saori para trazer a outra grande corporação para o lado do Santuário. A cooperação entre ambas impedira manobras comerciais no Mar do Norte. As duas presidentas descobriram afinidades em suas trajetórias de vida, o que facilitou a comunicação. Se tornaram aliadas.

- Ela acabou de convidá-la para o casamento. – Hagen constatou pelo abraço das duas. A menção fez Zigfried corar.

- Será na próxima semana, antes do Campeonato. – Shiryu confirmou, fazendo os dois erguerem as sobrancelhas.

- Do que está falando? – Hagen olhou confuso para Zigfried e Shiryu.

- Não. O casamento será após o Campeonato. – Zigfried negou com veemência. – Nada mudou.

- Como assim? Anteontem ajudei a escolher as músicas da festa. – Shiryu franziu a testa. – De qual casamento vocês estão falando?

- Do nosso, claro. – Hagen apontou para si próprio e Zigfried. A boca de Shiryu abriu de espanto, fazendo, enfim, Zigfried entender. Ele deu uma risada alta, chamando a atenção de quem estava perto.

- O casamento de que você está falando é da srta. Kido com o Cavaleiro de Pégaso, não é? – Shiryu assentiu. – Nós vamos ter uma festa dupla de casamento quando o Campeonato terminar. Eu e Hilda – apontou para si e a mulher falando animada com Saori. - e Hagen e a srta. Freiya.

Shiryu ficou vermelho, pedindo desculpas pela confusão. Os três riram.

- Espero que você vá a Copenhague, Dragão. – Hagen afirmou. – E leve aquele Pato Manco. – ele lutara contra Hyoga em quatro ocasiões e o reencontrara na visita ao Santuário.

- Enviaremos convites para vocês. – Zigfried disse. – Será daqui há três meses.

- Claro. Shunrei e eu... – Shiryu sentiu a pontada dolorida no estômago ao falar o nome dela. Hesitou pelo tempo de uma respiração. Então se recuperou. – Nós iremos, sim.

Acomodados no pequeno auditório, eles receberam as tabelas da competição, um caderno com as regras e exemplares dos materiais de divulgação que já estavam em todos os países com membros da federação. Tudo em papel de alta qualidade, em pastas de couro. Era um evento de alta classe. Os representantes legais foram chamados para compor a mesa no palco. Assistiram às apresentações com vídeos dos preparativos, as equipes de arbitragem e fotos dos lugares onde as competições ocorreriam. Estavam sendo transmitidas simultaneamente ao redor do mundo para as sedes das Federações Nacionais afiliadas e pelas redes sociais.

Os campeonatos regionais estavam suspensos para focarem esforços na realização do Campeonato Internacional. Várias delegações começaram a chegar ao Japão nos últimos dias. Seria a primeira vez que mais de 100 países participariam. Os números da infraestrutura eram impactantes – alimentação, alojamentos, seguranças, manutenção, deslocamento. Sobre o mapa do país, eles viram como as etapas foram pensadas para iniciarem nas cidades mais distantes e, à medida que passassem, os lutadores se aproximariam de Tóquio, onde ocorreriam as etapas finais.

Próximo ao final da reunião, Bian se sentou ao lado de Shion.

- O sr. Solo pediu para confirmar o encontro logo mais. – o Grande Mestre assentiu.

- Reservamos uma das salas menores do segundo andar. Nos encontramos lá. – Bian sinalizou que entendeu. – Antes precisamos falar com outra pessoa. – Shion continuou quando o grego se afastou. Shiryu acompanhou seu olhar e viu quem esperava.

O homem vestido inteiramente de preto tinha uma expressão compenetrada. Sentara-se atrás de Radamanthys, como se o vigiasse.

- Ele disse que falará conosco imediatamente após a finalização da reunião. – Shiryu se aproximara do homem no saguão. Ele fora educado e objetivo, mal escondendo o enfado de participar de um evento como aquele. – Ele não está na lista de lutadores.

- Benu é bastante próximo de Alone e Perséfone. – Shion disse em tom baixo para não atrapalhar quem estava perto. – Ele é desempenha outros papéis. Não se esqueça que foi ele que...

- Que parou os enviados de Pandora em Singapura. – Shiryu completou. – Sim, eu sei. - fora ele quem avisara sobre o atentado para Mayura, parando os agressores.

Demorou para Saori chegar a eles quando a reunião foi encerrada. O compromisso de todos com o estrito cumprimento das regras, com ênfase na ética desportiva, e o alerta de que a Federação fiscalizaria o comportamento de todos os envolvidos dentro e fora dos tatamis, foi apoiado efusivamente pelos representantes, incluindo Pandora Heinstein. Ela cumprimentou Saori de forma protocolar e saiu rapidamente do palco.

- Srta. Kido. – ela e Kagaho chegaram ao mesmo tempo junto a Shion e Shiryu.

A expressão do homem continuava impassível. Ele era o emissário de Alone Heinstein, que sabia do temperamento rancoroso da irmã e temia que a paz recém-conquistada não fosse o suficiente para refrear o revanchismo de Pandora.

- Sr. Benu. – Saori devolveu a formalidade. – Perséfone me avisou que o senhor viria. Bem-vindo novamente a Tóquio.

- Obrigado. – os olhos duros e escuros de Kagaho percorreram os rostos dos três representantes do Santuário antes de se fixarem na presidenta da Fundação Graad. – O sr. Alone Heinstein me pediu para transmitir os seus cumprimentos e os seus desejos de que o Campeonato corra dentro da normalidade, sem intercorrências. – ela devolveu o olhar neutro. – Ele também afirma estar ansioso para saber suas considerações sobre a oferta feita por ele e os senhores Thanatos e Hypnos Nix.

O episódio do acordo comercial mudou a opinião de Shiryu sobre Saori. A melhor amiga de Shunrei à primeira vista lhe parecera uma princesinha rica tradicional, um pouco imatura e fugaz. Após entender como o acordo com os Othonos fora o trunfo que lhe permitira neutralizar completamente os Heinstein e os Nix, ao mesmo tempo em que sinalizava às Polaris e aos Solo o verdadeiro poder da Fundação Graad, Shiryu adquirira uma admiração por ela. Finalmente conseguira entender o que atraíra Seiya.

"É isso que Benu veio fazer. Confirmar que Alone Heinstein aprendeu seus limites. Ele agora corre para tentar minimizar as perdas financeiras e não comprometer ainda mais a imagem do Subway Army."

- Diga a Perséfone que gostei bastante do presente que ela enviou. – Saori tocou o medalhão das constelações. – Usarei nos eventos do Santuário. – ele assentiu, reconhecendo a jóia que deixara na Mansão há dois dias. – Sobre a oferta, submeti ao Conselho da Fundação. Devem deliberar nas próximas semanas. Se demorará mais ou menos tempo, depende se os esforços da Fundação estiverem dispersos em assuntos mais urgentes ou não.

- O sr. Alone se oferece para auxiliá-la no que for necessário. Pelo que me falou, deseja que as duas corporações que ele e a senhorita lideram voltem aos bons termos e não medirá esforços para que isso ocorra com a maior brevidade. – Shiryu percebeu que o tom de voz do sujeito ficara mais grave e incisivo, como se tivesse gastado toda a sua polidez de embaixador.

- Fico tranquilo em saber que o sr. Heinstein tem pleno controle das operações de suas empresas e que busca um relacionamento saudável com seus parceiros e concorrentes. – Shion comentou com sua voz empostada de Grande Mestre. – O Santuário preza pela competição justa e as práticas nobres, como sei que é a orientação do sr. Heinstein. – Kagaho entendeu a troca de interlocutor.

- Sim, força e justiça são os guias de nossas ações. – ele rastreou os outros membros do Subway Army. – Devo me retirar agora. Retorno hoje para a Alemanha. O sr. Heinstein aguarda seu contato, srta. Kido. – os três se despediram com breves reverências.

Shiryu, no entanto, permaneceu onde estava, esperando ser notado.

- Quero agradecer as suas ações em Singapura. – curvou-se enfaticamente. – Estou em débito com o senhor.

Kagaho virou o corpo inteiro em direção a ele. Shiryu viu sua pulsação na veia saltada do pescoço, embora a expressão permanecesse neutra. Seu olhar treinado notou que ele usava técnicas de respiração para se conter.

"Esse sujeito não é um mero garoto de recados... Mas por que tanta agressividade?"

- Apenas segui as ordens da sra. Perséfone. – Kagaho também se curvou. – Espero que aquele gesto seja visto como o primeiro da nova etapa da relação entre o Subway Army e a Zodiac Team.

Eles drenaram toda a polidez de Kagaho. Shiryu abriu a boca para responder, mas a mão de Shion em seu ombro o alertou.

- Acredito que tenhamos fechado esse capítulo, mas não encerramos nossa história com eles. – o Grande Mestre disse quando o homem se afastou e saiu do auditório a passos largos. – Não poderemos nos descuidar durante o campeonato. – Shiryu concordou.

- Existe mais de uma forma de vencer um adversário no tatami. – lembrou-se de umas das frases que Dohko lhe dizia durante os treinamentos.

- Agora vamos encerrar esse volume da aventura. – Shion apontou para Saori, os aguardando ao lado da porta. – Fizemos tudo para garantir a segurança de Shunrei. Ela finalmente poderá voltar para casa.

Shiryu respirou fundo. Foi para esse momento que ele treinou sem descanso nesses três meses.

"Não. Foi para isso que eu a beijei naquela noite no hospital." Ele se lembrou da sensação dos lábios dela nos seus, do corpo dela dentro do seu abraço, na primeira vez em que se beijaram.

Foi um longo caminho.

- Tem um garotinho ansioso para ver a mãe e eu prometi a ele que voltaria com ela. – Shiryu endireitou a coluna e seguiu os dois para o segundo andar.

- Querida Saori. Estava aqui pensando se não seria melhor irmos a um restaurante. – Julian levantou-se para cumprimentá-la. – Finalizou os assuntos com Kagaho Benu? Fiquei admirado como ele estava paciente hoje. Enquanto esteve com Perséfone em Seul, ele pareceu bastante irritado.

- Como tem passado, Julian? – ela estendeu a mão, evitando o abraço que os braços dele anunciaram. – Não se preocupe, acredito que nossa conversa será breve. – passou por Julian e guiou Shion e Shiryu, deixando que os dois se sentassem um de cada lado seu.

- É claro. – Julian escolheu a mesma posição no sofá oposto. – Minha noiva está num dos shoppings próximos e não planejo deixá-la sozinha mais do que o necessário. Eu costumo cuidar bem de quem está ao meu lado. – a última frase ele disse olhando diretamente para Shiryu.

- Quero agradecer por ter honrado o tempo que vocês estiveram juntos com suas ações nos últimos meses. – Saori puxou a atenção de volta para si. – Sei que podemos falar com franqueza pela nossa amizade de longa data. Devo dizer que o seu comportamento me deixou bastante surpresa e satisfeita. Você amadureceu, Julian. – ele emitiu seu charmoso sorriso, encostando-se folgadamente no sofá.

Isaak e Bian se postavam de pé, dos seus dois lados.

- Era o mínimo que eu podia fazer depois do que aconteceu na Grécia. – seu rosto ficou inesperadamente sério. – Depois da mensagem que ela enviou, precisamos tomar medidas mais rigorosas. – novamente seus luminosos olhos azuis pousaram em Shiryu, que observava a performance do sujeito com um fogo frio brilhando no fundo das pupilas. – Ela foi imprudente e chegamos a interceptar cinco suspeitos rondando o apartamento onde ela estava hospedada. Dois de nossos homens se feriram. Tudo para que ela desse um pouco de conforto para o maridinho. – a ênfase na palavra finalmente fez Shiryu se mexer, incomodado.

- Ainda bem que vocês agiram rápido. – Shion disse. – Não esperava menos da Atlantis Team. Espero que seus lutadores tenham se recuperado. Marin nos contou sobre o empenho de vocês e eu agradeço.

- A sra. Kodama Sollis nos auxiliou na contenção aos suspeitos. – Isaak falou pela primeira vez. – Graças a ela, não houve danos maiores. Mas depois desse incidente elas não poderiam mais ficar na Coréia. Não enquanto as negociações não estivessem concluídas.

"As ações dos Solo permitiram que as hostilidades cessassem em questão de dias. Entretanto, os Heinstein demoraram bastante para anunciar a derrota, por isso os Solo não quiseram arriscar. Marin retornou para Kamakura e Shunrei foi enviada para um local desconhecido." Novamente, a voz de Mayura surgiu na mente de Shiryu.

- O que me decepcionou um pouco foi a postura do marido de Shunrei. – novamente a entonação de tédio. – Se fosse eu, não ficaria quieto durante meses, sem procurar sequer por notícias dela.

Shiryu colocou as mãos nos joelhos e curvou-se para o provocador.

- Soube de tudo que fez pela minha esposa e agradeço por garantir a segurança dela. – sua voz estava serena. – A vida de Shunrei é preciosa para mim e muito mais importante que a minha. Eu jamais a colocaria em risco por uma mera satisfação pessoal. Tenho certeza de que logo estaremos juntos.

- Julian, onde ela está? – Saori esgotara sua cota de diálogos dúbios. Ela tinha plena consciência de que a benevolência dos Solo com sua amiga não era apenas expiação pelo atentado na Grécia. Sorria internamente ao perceber como o acordo com os Othonos fora tão efetivo em neutralizar e angariar cooperação de todos os seus adversários.

- Eu ainda preferiria que ela ficasse onde está por mais algum tempo, mas receio não ser possível. – Julian ergueu as sobrancelhas. – Sorento me alertou que nossos lutadores precisam ser concentrar nos preparativos para o campeonato, então não podemos mais dispor deles para fazerem companhia a ela.

Shiryu olhou de relance para Bian e Isaak em suas posturas de prontidão.

"Eles estiveram com ela. Sabem onde ela está."

- Se nos informar onde ela está, iremos buscá-la e seus homens poderão se preparar como acharem melhor. – Shion afirmou. Ele se sentara com a coluna ereta, na ponta do assento, como se estivesse pronto para intervir fisicamente a qualquer momento.

- A maior parte dos nossos lutadores está na mesma chave que os seus Cavaleiros de Ouro. Soube que houve uma grande cerimônia para readmitir antigos lutadores. – Julian tentou mudar o assunto. – Nós investimos muito nos preparativos e na segurança da dra. Nishi. Sorento não pára de me lembrar diss...

- Esses assuntos já foram resolvidos. – Saori o interrompeu. – Por favor, diga onde está Shunrei.

Eles sabiam que Julian iria se vangloriar e reclamar do fardo, embora Shiryu tivesse certeza de que ele se divertira, pensando ser o responsável por tirá-la dele. Para o egoísta Julian talvez essa fosse a principal motivação. Para Sorento Solo, a ameaça de perderem todo o contrato com a Fundação Graad na Ásia e norte da África o ajudou a colaborar com o Santuário. O entendimento do cenário amplo dessa operação trouxe a serenidade para lidar com Julian Solo.

- Sr. Solo, Marin me contou que o senhor fez questão de aparecer em público com elas para demonstrar que estavam sob sua proteção, o que foi uma atitude nobre. – sua voz continuava sem qualquer traço de animosidade. – Acredito que nós dois desejemos o mesmo: a felicidade de Shunrei. Para isso, estou disposto a superar qualquer obstáculo, até trabalhar junto com meus adversários.

Como ele esperava, a possibilidade de ser menos altruísta que ele não era algo que Julian podia suportar.

Dez minutos depois, eles voltavam para a Mansão.

- Se você quiser, pedirei para prepararem o jatinho. – Saori sinalizou para o segurança transmitir as instruções assim que Shiryu balançou a cabeça em concordância. – É um país com algumas particularidades, mas devemos ter a liberação da viagem em algumas horas. – ela recostou no banco e soltou os ombros. – Só quero tomar um banho e dormir, mas ainda tenho algumas decisões do casamento para tomar.

- Vocês se saíram bem hoje. – o elogio de Shion foi inesperado. – O casamento será um momento bem-vindo de descontração. A comissão de festa do Santuário tem trabalhado bastante. – ele estava feliz por terem conseguido tudo que planejaram para aquele dia.

- Como o Mestre Dohko não teve nenhuma notícia dela? – Shiryu não conseguia tirar essa dúvida da cabeça.

- Quando estiver lá você poderá perguntar diretamente. – a resposta de Shion foi entendida como: não adianta queimar os neurônios com algo assim. - O meu palpite é que a própria Shunrei explicou que precisava do sigilo.

Shiryu enviara imediatamente a informação da localização de Shunrei, mas Dohko não conseguiu contatar ninguém que pudesse confirmar.

- Meu coração se acalmou. Ela está bem! – ele afirmou, sentindo euforia em seu peito e seus pés e mãos. Poderia facilmente correr até onde ela estava.

Na Mansão, encontraram Esmeralda e Pavlin. As duas retornavam do México e do Peru, onde negociaram com algumas das agências de notícias em nome da Fundação Graad. Elas passaram duas semanas nessa missão e tiveram êxito em diminuir a quantidade de fake news nas Américas.

- Que maravilha! – Esmeralda exclamou ao saber sobre Shunrei. – Prepararemos tudo para a volta dela em Kamakura.

- Grande Mestre, quando pretende ir para casa? – Pavlin estava ansiosa para reportar os acontecimentos para a sra. Mayura.

- Assim que vocês estiverem prontas. A não ser que a srta. Saori tenha algo em mente.

- Não. Agora podemos, finalmente, descansar um pouco. – ela sorriu. – Vocês merecem chegar em casa logo, damas. Foi um excelente trabalho. – as duas ficaram encabuladas e Shiryu se lembrou de que elas não eram próximas da presidenta da Fundação patrocinadora do Santuário. – Se não for incomodar, poderiam levar algumas caixas? É o tempo de prepararem um carro para levá-los. – ela sinalizou para Tatsumi. – Shiryu, você me acompanha?

- Obrigado, Saori. – ele se despediu dos três. Ela percebera a sua impaciência. – Saberei os detalhes depois, se for necessário.

- Quero vê-la o quanto antes também. – ela emitiu seu mais longo suspiro. – Nós conseguimos! Eu nem acredito que paramos o ataque de Pandora! – bateu palmas e, pela primeira vez em meses, Shiryu teve um vislumbre da jovem animada que conhecera na Coréia. – Reclamarei com veemência com o dr. Lee Kang. Ele sabia onde ela estava o tempo todo e não disse nada! Como ele ousa ser dissimulado com sua empregadora?

- Todos aceitaram os termos de Julian Solo. – ele repetiu o que dissera no caminho de volta para a Mansão. – Shunrei conseguiu uma forma de ajudar no nosso tratamento. – havia orgulho e admiração na sua voz, com uma pitada de ciúmes. – Shun comentou que o dr. Lee Kang insistira em saber o nosso estado. Nós questionamos, mas ele negou. Fico feliz que pelo menos alguém em quem confio esteve em contato com ela.

As caixas com as roupas de Seiya e Kouga para o casamento estavam sobre a mesa de centro no escritório.

- Pode falar com eles à vontade. – Saori indicou a escrivaninha. – Depois descanse. A viagem deve estar preparada dentro de 6 horas. – ele agradeceu, vendo-a equilibrando os pacotes para fora e fechando a porta.

A chamada de vídeo demorou para entrar em linha. De onde estava, ele via o sofá onde seu Mestre revelara a ligação entre ele e Shunrei, pouco antes de tudo acontecer.

"Parece que foi em outra vida." O tempo passara devagar demais com a ausência dela e escoara rápido demais naquelas horas entre a conversa deles ali naquele cômodo e a partida de Shunrei.

- Sim, haverá representantes da Fundação em todas as etapas do campeonato. – Saori acompanhava os três ao lado do veículo. – Já foram designados. Vou pedir para enviarem as informações. Ficaremos responsáveis pelas entrevistas e acesso da imprensa.

A expressão de Shion transbordava satisfação.

- Enviarei os releases ainda esta semana, srta. Saori. – Esmeralda informou, entregando a mala para o motorista. Ela parecia cansada, com olheiras e o cabelo amarrado num rabo-de-cavalo frouxo. De fato, as duas semanas foram intensas cooperando com a comunicação entre a Fundação e os veículos de imprensa dos países onde tinha contatos. – Teremos uma boa divulgação.

- Graças a vocês, não precisaremos nos preocupar com notícias falaciosas que pudessem acarretar problemas maiores. – Saori agradeceu com entusiasmo. – Um bom trabalho!

Pavlin abriu um sorriso radioso.

- O trabalho de todos em conjunto fez toda a diferença. – fora a primeira missão dela como enviada da sra. Mayura. Mesmo com as inseguranças próprias dessa situação, ela permanecera ao lado de Esmeralda.

Saori acenou para o carro cruzando o portão e subiu para seu quarto com a sensação de ter corrido uma maratona. O cansaço das inúmeras noites mal dormidas e da tensão de precisar defender as vidas de tantas pessoas se aproveitaram da baixa da guarda e se insinuavam de uma vez. Seu corpo pesava e a cabeça estava aérea.

- Assim que estiver tudo pronto, me acorde, por favor, Tatsumi. – instruiu, planejando um banho de ofurô.

- Não estou surpreso. – Dohko negou com a cabeça. – Manter a promessa só prova que eles levam a segurança dela muito a sério. Quando você acha que volta?

- Talvez três dias sejam o suficiente. – Shiryu informou, calculando os períodos de trânsito. – Pelo que Solo disse, há quatro dias ele não consegue contato com ela.

- Não é motivo de alarme. – Dohko conseguia sentir a ansiedade do discípulo pela tela. – Esses deslizamentos realmente isolam a montanha. Não há forma de entrar lá por terra ou pelo ar. – Shiryu emitiu um sorriso nervoso, que sumiu quase instantaneamente ao ver a reação de Ryuho.

Ele estava sentado no colo do Mestre, olhando fixamente o pai. Seus olhinhos verdes bem abertos, ouvindo a notícia em silêncio. Lágrimas desciam pelas bochechas e aumentaram ao saber que logo Shunrei estaria de volta. Ele passara esses meses sem falar da mãe e os adultos respeitaram isso.

- Filho, quero que você seja forte, só mais um pouco. – ele colocara o nome da sua gatinha de Ma e se tornara sua companheira constante em casa. Agora sua Ma humana voltaria, assim esperava o pai. – Você precisa tomar conta da Ma-chan e do Mestre Dohko enquanto eu não estou aí. Consegue fazer isso?

Ryuho enxugou o rostinho magro, acenando sua confirmação. A gatinha tricolor passou desfilando na frente da tela.

- Eu quero apresentar a Ma-chan para a mamãe Shunrei. – falou baixinho. O coração de Shiryu deixou seus pulmões voltarem a respirar.

- Farei o impossível para acontecer. Enquanto isso, ajude com as tarefas da casa e não dê trabalho para o Mestre e a srta. Shaina. – o garotinho concordou, se despedindo.

- Faça o que tem que fazer. Qualquer problema, me avise imediatamente. – Dohko repetiu as mesmas frases da noite anterior, quando ele partira para Tóquio.

"Se eu não tivesse me afobado, tudo poderia ter sido diferente." Shiryu subia lentamente as escadas, relembrando a chegada de Marin com a novidade de que Julian Solo deslocara Shunrei para um local desconhecido. A Amazona de Águia contou sobre os homens com quem precisaram lutar e como Solo propusera que ela ficasse completamente fora do alcance, frustrando de vez os planos de Radamanthys Wyvern. "Ainda bem que as pessoas mudam." O bilionário não se aproveitara da situação, embora ele quisesse desfazer o sorriso presunçoso no soco. "Era o sorriso que dizia 'ela procurou a mim porque você é um fraco'. Pouco me importa o que aquele sujeito pense!"

Abriu a porta com mais força do que o necessário. Em cinco minutos, trocou de roupas e colocou seus pertences na mochila.

"Também não fiquei parado." O corpo dele estava em plena forma novamente. Pela impossibilidade de atuar fisicamente, auxiliou onde precisavam: nos treinos dos mais jovens, na manutenção do Santuário. Fora o intermediador no acordo com a Northern Lights Enterprises, devido à sua relação prévia com Zigfried Doube. "Ela pode retornar para sempre agora." Se deitou vestido, fechando os olhos para ver mentalmente a mensagem de Shunrei.

Sua jornada ainda não terminara.

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E, aos 45 do segundo tempo, retornamos para a inspiração inicial dessa história! A mensagem que Shunrei enviou é a mesma que a protagonista escreve para seu par romântico no episódio final do dorama Chocolate. Ainda é o meu dorama favorito e recomendo muito. :-)

Esse capítulo foi diferente de todos os outros. Quase inteiramente apenas do ponto de vista do Shiryu. Confesso que ele não é um personagem fácil para mim. Está sempre calado, ao contrário da Saori e do Dohko, por exemplo, que falam sem parar... rsrsrs! Muitas explicações precisavam ser fechadas nesse episódio e acho que foram todas. (Sei que já faz um longo tempo, mas se você lembra de algo que não foi explicado, me fala, por favor.) Agora, falta só resolver o principal de tudo: bora encontrar a Shunrei!

Espero vocês no próximo capítulo, que é o penúltimo!