Olho Azul 20 Anos Apresenta:
Cada Vez que nos Encontramos,
Cada Vez que nos Separamos
Capítulo 22
Mamoru acordou com seu despertador natural. Seu estômago reclamava após haver comido apenas tira-gostos no bar de Motoki, indo lá sob um pretexto qualquer para vê-lo, pois aquela história dele com a ex-noiva o preocupava. Ele podia apenas ter passado para cumprimentar, dizer que só havia ido até lá só para acompanhar Usagi até a porta sem entrar em detalhes, ele nem sequer se importava muito se Motoki desconfiaria da relação dos dois, não lhe dizia respeito, mas a presença de sua futura noiva no bar o havia tirado do eixo. Pensando melhor, ele já a havia visto antes, talvez em seu primeiro dia visitando o Drunk Crown; mas nunca ligara as duas pessoas, pois achava improvável que a filha de um empresário tão assoberbado como seu superior pudesse quem diria conhecer o Drunk Crown, muito menos fazer meio-período para Motoki.
Outro motivo que alongara sua permanência na noite anterior fora a reação de Usagi. Até então ela tinha sido bastante fria com relação ao casamento arranjado, talvez porque ela própria estivesse com problemas o bastante para pensar nisso. Contudo, desde o momento que Mamoru havia começado a falar com Rei, Usagi passou a agir como se seu próprio território estivesse em perigo. Motoki comentara sobre a relação agitada que as duas possuíam como se fosse algum programa de comédia que ele acompanhava na televisão, o que levara Mamoru a concluir que o centro daquela tensão não era bem perdê-lo, mas perdê-lo para uma rival. Ainda assim, havia sido curioso que Usagi agisse como uma namorada com ciúmes. Justo no dia em que ela demonstrara querer o fim do caso de ambos. E Mamoru teria que aceitar, claro. Só que agora... não parecia mais ser o que Usagi queria.
Ao menos, isso acabara como assunto pendente. Ele não podia imaginar como Usagi estava em relação a isso, mas não queria perder o ponto alto de seus dias. Estar com a moça realmente lhe fazia bem. Sabia que assim que o caso terminasse, passaria por momentos difíceis, o que seria provavelmente em breve com o casamento arranjado no horizonte e toda a culpa que Usagi sentia pela traição, ou talvez pela situação da amiga que ela mencionara? Qualquer que fosse o motivo, terminarem não era o que Mamoru desejava. Se ao menos pudesse voltar ao tempo e se dizer do erro que cometeria voltando a Tóquio... Seu posto de trabalho é terrível e Usagi já está envolvida demais para largar o atual namorado — para que voltar a Tóquio?
Seu celular tocou. Era Motoki. Sim, ainda havia o fato de seu amigo estar pensando em pedir a ex-noiva em casamento mais uma vez. Agora ele queria que Mamoru a reencontrasse em uma reunião amigável em pleno Drunk Crown.
Uma imagem da barista alta quebrando um copo lhe veio à cabeça. Mamoru perguntou a Motoki se tinha certeza de que seu bar era um bom lugar para levar Reika, mas, como sempre, ele não percebia as paixões que provocava e nem entendeu como o Drunk Crown poderia ser uma opção ruim para qualquer coisa, muito menos trazer sua ex-noiva, atual namorada, futura noiva.
Mamoru deu de ombros e, por fim, concordou em ir desde que fosse no sábado, lembrando-se de como Usagi sempre trabalhava nesse dia, não que ele fosse explicar isso para Motoki. Não por menos, acabou que sábado era movimentado demais e acertou-se para se verem no dia seguinte.
O trem estava cheio naquela sexta-feira. A cada horda que entrava, Usagi começou a se preocupar se ela poderia sair quando sua estação chegasse. Na verdade, nem tinha certeza se conseguia se mexer onde estava e suas pernas estavam cansadas de ficar na mesma posição. Enfim, sua estação foi anunciada e o trem parou. Um fluxo intenso de jovens misturados aos senhores engravatados saiu pela porta, quase arrastando Usagi junto. Ela suspirou já na plataforma, levemente tonta quanto para onde ir. Nesse momento, percebeu um rosto familiar, a amiga de Rei estava parada um pouco distante da multidão, olhando quem passava por ela.
— É a Ami, né? — Usagi acenou, já próxima da mesma.
Pondo a mão para tentar pôr os cabelos curtos atrás da orelha, tendo sucesso apenas em parte, ela olhou confusa para Usagi até mostrar sinais de a reconhecer enfim.
— A amiga da Rei — disse em voz monotônica.
— Acho que não sou bem amiga da Rei, mas, é isso aí. Usagi Tsukino! Está esperando alguém?
— Não, apenas prefiro descer as escadas quando elas estão vazias.
— Oh, entendi! É ruim esse horário, né? Então, vamos? Está indo pro bar, né?
Ami inclinou um pouco a cabeça, quase como se fosse dar um passo atrás.
— Eu moro aqui perto; acabo de voltar da faculdade. Estudo medicina a umas estações daqui.
Usagi não escondeu o espanto:
— Nossa, você deve ser muito inteligente, né? Aquela faculdade é tãaaao difícil pra tudo! Não é tipo, das melhores do mundo?
Ami riu sem graça e começou a caminhar.
— Não estou indo para o bar — ela disse, fazendo sinal com a mão para Usagi se juntar a ela —, mas ainda podemos ir juntas. Minha casa é na mesma direção.
Já descendo as escadas até a catraca, Usagi se recordou dos documentos que Mamoru lhe mostrara na quarta; os de seu casamento arranjado com ninguém menos que Rei. Sem pensar duas vezes, ela decidiu aproveitar a chance:
— A Rei é filha de um grande empresário, né? — perguntou casualmente. Ami não devia saber que Rei não tinha sido quem contou isso a Usagi. — Como você a conheceu? Tenho certeza de que não é medicina que ela estuda.
Ami pareceu surpresa por um momento, mas logo assentiu:
— É, ela está estudando ciências sociais. Mas como soube sobre o pai da Rei? Ela não costuma falar dele. Os dois não moram juntos; ela mora com o avô materno e raramente vê o pai. — Ami suspirou por um instante. — Já nós, nós estudamos juntas no primário. Depois, o pai dela a pôs em um ginásio particular, mas como morávamos próximas ainda nos víamos. Eu sempre fiz cursinho para entrar num bom colegial e, depois na faculdade, por isso não tinha muito tempo para mais amigos. Já a Rei nunca se adaptou muito às escolas particulares em que o pai a colocava ou às pessoas de lá, sempre queria distância das "meninas ricas".
— É sério? Por que essa é a imagem que ela passa.
A moça de cabelos curtos deu uma risada suave.
— Ela é uma ótima amiga, basta você lhe dar uma chance, Usagi. Mas o avô da Rei talvez seja o que mais incentivou nossa amizade. Minha mãe é médica e às vezes nem dorme em casa, por isso ele me chamava para jantar no templo após o cursinho e até dormir lá.
— Templo?
— É um templo xintoísta, fica bem perto daqui.
— Nossa, nunca vi. E sempre achei que a Rei morava num desses prédios chiquerésimos em que tudo é branco ou de vidro, sabe?
Ami riu com mais vontade agora, o que a fazia parecer mais jovem e menos como um ser fora da dimensão em que Usagi vivia.
— Não, ela mora com o avô mesmo e até o ajuda sempre que pode, como nos finais de semana e eventos.
Os olhos de Usagi estavam inconscientemente olhando os arredores da rua, como se procurando o tal templo, quando deram de cara com um relógio indicando que já estava quase meia-hora atrasada.
— Oh, droga, tenho que ir! — disse chateada por ter que parar a conversa ali. Mas antes de disparar, voltou a Ami e a encarou com obstinação. — E você tá melhor?
Não pela primeira vez naquela noite, Ami assustou-se.
— É que — Usagi explicou — você parecia meio mal no dia que nos conhecemos. E, bem, a Rei nunca leva ninguém pro bar, tinha que ter algum motivo, né?
Ami sussurrou um "oh" e assentiu.
— Está tudo bem. — Por fim, sorriu.
Usagi sentiu que não parecia ser verdade, mas realmente tinha que se apressar. Desculpou-se mais uma vez e correu em direção ao Drunk Crown, ainda mais curiosa sobre Rei que antes e quase desejando que hoje fosse seu dia na escala. Quase. Ainda estava em pleno domínio de todas as suas — ainda que poucas — capacidades mentais.
Continuará...
