J~L


1981

"Durante interrogatórios no Ministério, apenas os Aurores responsáveis pela captura, o Chefe dos Aurores e a Ministra poderiam participar.

Nem todos sempre participavam, mas eram os únicos que podiam. Por mais rigoroso que tudo aquilo era, naquele domingo frio e chuvoso, naquela pequena sala no segundo nível do Ministério da Magia, não era o que ocorria.

James não era um Auror, ou não ainda. Ao seu lado, Sirius, que também não era um Auror. Remus logo ao lado do amigo. No resto da sala, você podia encontrar Alastor Moody e Albus Dumbledore.

Era um interrogatório oficial, com toda a pompa que merecia, mas no pergaminho anotava-se:

'INTERROGATÓRIO 13 DE DEZEMBRO DE 1981

REALIZADO POR: Alastor Moody

INTERROGADO: Lucius Malfoy

TESTEMUNHAS DO INTERROGATÓRIO: nenhuma'

— Desembucha, Malfoy. Se você quis se apresentar, dizendo que tem informações, então abre logo essa boca.

Dumbledore estava desconfortável com o método de Moody, mas não o resto da sala. Se tudo isso estivesse nas mãos de James, Lucius já teria falado há muito tempo.

— Eu sei sobre...artefatos com magia negra. — Lucius começou. — E pelo o que soube, pelo o que andam falando, há considerações nas penas para quem tem informações.

Sirius riu sem emoção ao seu lado, reagindo ao que todos pensavam: aquele idiota só se apresentou para salvar sua bunda, após a Ministra Millicent Bagnold dizer que qualquer um que entregasse qualquer informação — e dependendo do peso e importância dessa —, teria uma consideração enorme em sua pena.

— Já entendemos que você quer saber o que vai ganhar disso antes de abrir a boca, mas asseguro que é melhor começar a falar antes que alguns dessa sala se irritem. Mais — respondeu Moody.

— Acho uma infelicidade toda essa acusação. — Lucius riu cinicamente. — Como eu já disse, não sou um Comensal. Estive esse tempo todo sob Imperius, o que é bem diferente. Ainda que isso seja verdade, essa infeliz verdade de viver sob Imperius por tantos anos, eu gostaria sim que as minhas informações sejam consideradas quando ocorrer alguma acusação errônea.

— Eu vou mostrar a "acusação errônea" no meio da cara dele — Sirius resmungou.

James tentava manter sua calma. Dumbledore avisou que eles gostariam de presenciar o interrogatório e ele estava curioso, nervoso...ansioso. O que Lucius Malfoy poderia ter de importante?

— O meu discurso não tem escolhidos, Sr. Malfoy — disse a Ministra — então eu garanto que o que quer que tenha para nos dizer, valerá para o futuro.

Aquilo pareceu assegurar Lucius, pois ele logo abriu seu casaco e tirou uma caixa. Provavelmente havia um bolso com feitiço de extensão ali.

Não parecia uma caixa qualquer, mas uma que Malfoy escolheu a dedo para que ele ficasse protegido do que tinha ali dentro. Aquilo acendeu uma desconfiança em todos.

Antes de qualquer um tocar na dita cuja depositada na mesa, Moody se adiantou e fez uma rápida checagem. James não tirava os olhos de Lucius. Aquele infeliz tinha a total atenção na caixa, com um semblante preocupado, o que acabou deixando James preocupado.

— Um caderno?! — Moody pegou o objeto de dentro.

— Acredito que tenha sentido a magia negra. Ela não está na caixa, mas sim nesse diário.

— Diário? — todos perguntaram.

— Sim. Diário de Voldemort.

A horcrux. Com toda a certeza era a horcrux.

James se adiantou, mas foi parado por Dumbledore.

— Não se aproxime, filho. Para nós, não acostumados com tal magia, pode ser perigoso.

Ele estava pouco se importando. Queria destruir aquilo. Foi graças àquilo que Voldemort não morreu em sua sala meses atrás. O motivo da sua família ainda estar em perigo.

— Muito bem, Malfoy. Essa delação será considerada — anunciou Bagnold.

— Tem mais.

Aquilo pegou a todos de surpresa.

— Mais? — Dumbledore questionou.

Lucius endireitou a coluna, sentindo-se confiante. Para James, ele mais parecia um covarde do que confiante. Ou, no caso, era um bundão medroso, que estava entregando o seu chefe por medo das consequências, agora que Voldemort estava perdido em algum lugar, a beira da morte.

— Talvez, eu tenha escutado uma conversa... — Aquele idiota adorava fazer pausas dramáticas. Ele não poderia simplesmente falar logo? Esperava que alguém suplicasse pela informação e, mesmo que qualquer um ali estivesse pronto para segurar Lucius Malfoy naquela cadeira até ele falar, ninguém queria chegar nesse ponto. — Há grandes chances de encontrar um outro objeto como esse.

Uma outra horcrux?, pensou James. Voldemort tinha mais?

Sentiu mais do que viu que os outros dois marotos na sala pareciam tão surpresos quanto ele. Dumbledore pareceu incomodado, mas não tão surpreso.

— Onde? — Dumbledore perguntou.

Gringotes!

— Gringotes? Voldemort não possui um cofre lá — disse Moody.

— Mas os Lestrange sim — Lucius respondeu. Sirius se remexeu em seu lugar, pronto para sair dali e aparatar no banco dos bruxos. — Até onde eu sei, vocês encontrarão uma taça!


1991

Não podia dizer o quanto estava nervoso. Era primeiro de setembro e seu filho embarcaria para Hogwarts, assim como ele fez.

Sentia que era ele mesmo quem embarcaria, mesmo não sentindo-se daquele jeito quando foi a sua vez. Aquele trem representava um começo e, em 1971, James apenas estava ansioso para aquilo como nunca esteve para qualquer outra coisa na vida.

Com Harry, agora, era nervosismo. Ele gostaria de Hogwarts? Faria amigos que levaria para a vida, como ele?

Seria sorteado na Sonserina?

— Não precisávamos vir tão cedo — disse Remus ao seu lado, bocejando.

O grande relógio da plataforma 9 3⁄4 marcava um pouco depois das 10h e o lugar estava vazio, a não ser por eles. Nem o trem estava ali ainda.

— Precisávamos! — James respondeu.

Seus olhos cruzaram com os de Sirius do outro lado da via. O maroto fazia uma varredura pelo local, enquanto James havia feito daquele lado dos trilhos.

— Você recebeu alguma pista de que ocorreria algo hoje? — Remus voltou a falar enquanto terminava o seu café.

— Não, mas esse dia é marcado em vermelho nos calendários dos Aurores. Bastou ter tido um louco querendo sequestrar o trem alguns anos atrás para colocar a todos em alerta.

— Eu só vejo você e Padfoot em alerta aqui, ou temos outros Aurores ao redor e eu não vejo?

Recebeu uma confirmação de Sirius sobre tudo estar tranquilo e sem ameaças, e assentiu.

— Muitos do Departamento deixaram um pouco de lado esse perigo. Moody não estava no Departamento essa semana e parece que o substituto não se interessou muito na segurança das crianças.

Mas James nunca deixava de ir até a plataforma nos inícios das aulas desde o ataque de alguns anos, sem nunca precisar de alguma ordem ou tarefa para tal.

Bastava lembrar que havia crianças em um suposto perigo. Que logo poderia ter Harry em um potencial perigo.

— E ali vem a minha carona. — A voz de Remus chamou sua atenção para o trem que se aproximava.

Olhou para Sirius novamente e o amigo entendeu o recado: deveria fazer uma varredura dentro dos vagões agora, enquanto James e Remus continuariam a guardar a plataforma.

Não demorou muito para algumas famílias começarem a dar algum movimento por ali, fazendo James ficar ainda mais precavido.

— Acho que não conseguirei ver Harry, já que professores que pegam o Expresso devem se apresentar antes dos alunos embarcarem, mas ele sabe que eu o verei na plataforma de Hogsmeade.

— Obrigado, Moony.

— Vai ficar tudo ok. Só tente não chorar ou algo assim. Mas caso chore, garanta que alguém registre isso.

As brincadeiras de Remus e Sirius sobre a ida de Harry já estavam ficando chatas. Eles não perdiam oportunidades para importunar com aquilo e já fazia um ano que tudo havia começado.

Como se eles mesmos não estivessem sentido o peso daquilo também.

— Só entre nesse bendito trem e desapareça, professor Lupin. — James tirou a sua capa de invisibilidade e entregou para o amigo. — Cuide dela. A gente se vê logo.

Remus deu um tapa em seu ombro.

— Até mais, Prongs.

Sirius saiu do trem quando Remus estava prestes a embarcar. Eles se despediram, com alguma piada de Sirius que fez o amigo lupino balançar a cabeça e o xingar, antes de embarcar.

— Embarcar as duas crianças hoje é mais difícil do que uma. Não é estranho que não veremos Harry e Moony o tanto que os víamos esses anos todos? — Sirius perguntou.

— Moony ainda pode sair e nos encontrar, pelo menos, além de já conhecer o castelo como a palma da mão dele.

Já estava esperando alguma piada vinda de Sirius sobre ele estar dividido entre a empolgação da ida de Harry e pela chateação de não vê-lo sempre como antes. Mas ela não veio.

— Sabe, Moony vai tomar conta dele. Apesar de eu ter certeza que não terá razão para isso. Harry estará seguro lá.

— Eu não duvido disso.

Não era aquele tipo de preocupação que tinha, apesar de se preocupar com a segurança do filho. Mas naquele momento era tudo sobre como ele se sentiria. Queria que Harry tivesse uma boa experiência naquele lugar como ele tivera. O castelo seria sua casa por vários meses do ano e muitos anos da sua vida, então só desejava que ele abraçasse aquele lugar como o castelo deveria abraçá-lo.

Algumas conversas aqui e ali o tiraram dos seus pensamentos. Alguns alunos passavam por eles e cochichavam. Alguns pais, mais ao longe, também pareciam notar suas presenças.

— James Potter, o cara que derrotou Voldemort — Sirius comentou, se balançando para frente e para trás.

— Eu não derrotei Voldemort, não sozinho, pelo menos.

— Você segurou uma boa parte da luta antes de chegarmos. Se não fosse por você, talvez o perderíamos por mais alguns anos.

— Ou eu perderia a minha família.

Engoliu o medo que se instalou em sua garganta apenas ao pensar nisso. Por muitos anos, aquele era o seu maior medo. Os pesadelos com Voldemort levando Harry, levando Lily...

Às vezes, alguns daqueles pesadelos voltavam e ficavam por dias a fio. Via Voldemort entrando na sua casa e James sem conseguir se mexer, assistindo-o subir as escadas atrás de Lily. Via a luz verde iluminar escadas abaixo, depois ouvia o choro de Harry antes de uma outra luz verde. E ele sem conseguir se mexer.

— Isso acabou, Prongs. Passado, bem longe de nós.

— Sim, você tem razão.

Tudo era passado hoje em dia, inclusive a sua família.

— Ah, olha quem vem ali. — Sirius apontou para um extremo da plataforma.

Harry corria até eles. Os cabelos voavam, suas bochechas estavam rosadas e o sorriso tão típico se aproximava agora.

Soltou todo o ar quando o filho o abraçou.

— Você está aqui. — Harry comemorou.

— Claro que estou — James respondeu abraçando-o — Você achava que eu não estaria?

— Pensei que talvez se atrasaria — Harry o respondeu enquanto abraçava Sirius.

— Nunca, Campeão.

Já esteve atrasado muitas vezes na vida do filho, mas nunca mais estaria.

Levantou o rosto e seu sorriso foi se fechando enquanto seu coração disparava.

Não a via por anos. Na última vez, ele mal a olhou, porque doía olha-la. Doía ver os bonitos olhos verdes de Lily Evans olhá-lo de volta com tanta angústia. Diria que foi até um pouco ríspido naquela vez, querendo acabar com aquela reunião o mais rápido possível, enquanto Lily tinha sido amável e gentil, como ela sempre era.

Agora, após anos tendo memórias ruins das últimas vezes que a viu, seu cérebro parecia feliz em vê-la e criar outro tipo de lembrança.

Lily estava linda. Seus cabelos estavam mais curtos do que ela costumava usar, seu rosto mais fino e maduro. Ela até parecia levemente mais alta, mas talvez fosse sua postura que dava aquela impressão. Os olhos cintilavam de longe, o rosto parecia sereno. Havia mais sardas em seu rosto indicando que ela aproveitava os verões nos jardins — algo que ela sempre gostava de fazer — e agora tinha o rosto avermelhado.

Muitos poderiam dizer que Harry era quase uma cópia dele, com os olhos de Lily, mas não era verdade. Apesar de não ver Lily quando olhava para Harry — o que era bem diferente no caso dela, que devia ver James o tempo todo ao olhar para o filho —, Harry também tinha uma mancha na perna como a mãe, os pés eram mais parecidos com os dela e ele tinha uma mania de fazer alguns bicos e bocas quando pensava, assim como ela.

James podia ver muito de Lily em seu filho além dos olhos, mas depois de tanto tempo sem vê-la, parecia que muito mais se destacava agora. Como se visse muito de Harry nela.

Lily o avistou agora e James percebeu uma leve mudança em sua expressão. Ela não fechou o rosto, não parecia irritada e nem perturbada. Apenas pareceu sentir a surpresa ao vê-lo, como foi para James ao vê-la. Lily poderia não amá-lo mais, mas eles viveram muitas coisas juntos e aquilo tinha um peso em suas histórias.

Uma risadinha de Sirius ao seu lado o fez desconectar o olhar com Lily e se virar para o amigo.

— Se divertindo com algo? — perguntou James. Sirius meneou a cabeça.

— Nem um pouco. Eu não ousaria.

Revirou os olhos e se virou no momento em que Lily parou em sua frente. Ele engoliu em seco.

— James. — Ela o cumprimentou.

— Lily.

Não ouvia sua voz por tantos anos, mas assim que ouviu, parecia que havia falado com ela há poucos minutos, mesmo estando um pouco mais grave. Aquela voz costumava ser um calmante para ele desde a época de Hogwarts durante dias difíceis, quando ele pensava que tudo estava perdido. Ao ouvi-la agora, lhe lançava para tão longe, para tantas lembranças.

Eles se encararam por alguns segundos. Com apenas alguns metros os distanciando agora, seu peito se apertava ainda mais.

Tudo bem, dizia para si mesmo. Era normal. Ali estava a mulher que ele amou por muito tempo, que faria qualquer coisa por, mesmo não estando mais juntos. Tinha um carinho enorme por Lily e isso não mudaria nunca.

Então tudo bem, normal sentir aquele aperto no peito. Não era nada demais.

— Lils. — Sirius beijou a ruiva. — Também surtando em enviar Harry para Hogwarts?

— Um pouco. Conversamos bastante por dias, e bastante ontem à noite. — Ela sorriu para Harry, que não prestava atenção neles, interessado mais em olhar ao redor e em tudo o que ocorria.

— Então está lidando melhor do que nosso Prongs aqui. — Sirius abraçou James pelos ombros. — Eu sinto que ele vai vomitar a qualquer momento.

— Não vou — respondeu com a cara fechada. — Estou apenas nostálgico e querendo que Harry aproveite Hogwarts tanto quanto nós.

Enquanto falava, sentia-se um pouco nervoso com Lily prestando atenção em suas palavras. Aquilo estava ficando ridículo. Nem quando era adolescente reagia assim, o que diabos aconteceu?

— Tenho certeza que irá — Lily respondeu e sorriu educadamente.

— Neville! — Harry gritou e saiu correndo pela plataforma, fazendo os três adultos o seguirem com o olhar.

— Alice e Frank não devem estar longe — Sirius comentou. — Vou ver se os encontro, eu já volto.

Sirius se afastou, indo na direção do afilhado e de Neville, que conversavam empolgados.

James sabia que deveria se virar e dar atenção para Lily, mas seu pescoço parecia travado. A cena de Sirius com os garotos era totalmente entediante de se olhar e ninguém em sua normal consciência ficaria ali, assistindo, então ficaria óbvio que ele estava evitando-a.

Se forçou a destravar o pescoço e voltou para ela.

— Como está, James? — ela perguntou no segundo seguinte. Os olhos verdes não o deixavam, deixando-o mais nervoso.

— Bem. Como você está?

— Mais nervosa do que Sirius poderia saber. — Ela riu, arrancando uma risada leve dele. — E o trabalho?

— Cansativo e monótono ao mesmo tempo, mas não posso reclamar. Monotonia quer dizer que as coisas estão do jeito que deveriam ser.

— Sim, claro.

Eles se olharam por um momento e desviaram logo depois.

Ter a primeira conversa com a sua ex-mulher poderia ser bem estranho. Não sabia o que era interessante para ela mais, sobre o que gostava de falar, seus novos hobbies...ou mesmo se ela queria falar com ele. Não sabia se poderia ofender ao dizer qualquer coisa, ou irritá-la. A última coisa que precisavam, era uma cena no meio de todas aquelas pessoas, e de Harry, fazendo o filho partir para Hogwarts chateado ao ver os pais brigando após se reencontrarem.

Talvez, então, fosse mais seguro manter a conversa o mais tedioso possível.

— E o seu? — Resolveu perguntar. Falar sobre trabalho era seguro, certo? Ela acabou de perguntar sobre o dele.

— Ahm, bem.

Ah! Ou talvez não. Anos poderiam passar, mas Lily nunca aprenderia a mentir.

Deveria perguntar? Não, deveria continuar com a conversa tediosa. Fingiria que não a conhecia bem, que não sabia detectar quando ela mentia.

Melhor deixar para lá. Não era da sua conta.

— O que está acontecendo? — Ouviu-se perguntando automaticamente, como se fosse tão natural como piscar os olhos, ainda que tivesse acabado de decidir de que não entraria no assunto.

— Nada. Tudo está bem.

— OLHEM! — Um afobado Harry se aproximou deles. Em sua mão, tinha um sapo enorme e gosmento. Ótimo, aquilo era um ótimo desvio da conversa anterior. — Esse é o Trevor.

Só havia um porém naquela interrupção: James não tinha problemas com animais em geral, mas sapos era um dos que admirava de longe. Principalmente daquele tamanho e com olhos esbugalhados.

— Uh, prazer, Trevor. — Lily falou diretamente com o sapo, mas não o tocou. Harry virou o sapo na direção do pai, que deu uma leve desviada.

— Prazer, Trevor — disse rapidamente, desejando que o filho virasse aquele sapo para o outro lado. — Que tal você devolver Trevor para Neville?

Antes que o sapo pulasse de suas mãos e James tivesse que correr atrás dele pela plataforma.

— Deveríamos ter comprado um sapo também — Harry disse enquanto admirava Trevor.

— Não, não deveríamos. Edwige é ótima e suficiente. — Lily deu dois tapinhas nas costas do filho. — Aliás, obrigada, James. Pela coruja.

Ah, ele não era o único a se opor contra o sapo. Ou uma cobra.

— Era o mínimo que eu poderia fazer. — O sapo começou a se contorcer nas mãos de Harry, alertando James e Lily. — Trevor deve estar sentindo falta do dono, Campeão. Talvez você devesse devolvê-lo.

Não parecendo empolgado, Harry se dirigiu até Neville mesmo assim. James sentiu um alívio ao vê-lo entregar o sapo.

— Edwige é linda. Harry a adora, vive conversando com ela. Tive que esconder os petiscos, ou ele daria uma caixa por dia.

James sorriu ao ouvir aquilo.

— Então a coruja foi uma boa ideia.

— Com certeza. Confesso que fiquei com receio sobre o que vocês escolheriam, ainda mais com Harry falando sobre o sapo sem parar.

Não poderia julgá-la. Harry tinha tudo para voltar com um sapo ou algo pior. Honestamente, ele não sabia o que o impediu.

Talvez o asco. Talvez o fato de Harry ter dito cobra e aquilo assustá-lo um pouco.

Quem diabos quer tal animal para levar para Hogwarts?

— Ele deu ideias piores, então fomos pelo mais seguro.

Lily assentiu. Ficaram em silêncio enquanto a plataforma enchia cada vez mais e mais.

James sentia-se tão esquisito. Nunca ficou tão sem graça na frente de alguém antes, aquilo não era ele. Era extrovertido, sem vergonha, relaxado com conversas. Mas o nervosismo que sentia agora era de outro mundo.

Decidiu que deixaria Lily guiar a conversa. Se ela quisesse falar com ele, ali estaria, pronto para isso. Caso não...bem... esperariam Harry entrar no trem e partir, então iriam cada um para um lado.

Provavelmente seria a segunda opção. Lily não forçaria uma conversa com ele, mesmo ela sendo sempre gentil e educada com as pessoas. Ali, não era qualquer um. Era ele, James Potter, o cara que a irritou muito nos primeiros anos, o qual ela se apaixonou em outros, e depois a entristeceu nos restantes.

— Ahm...— Lily chamou sua atenção, deixando-o levemente surpreso em tê-la puxando assunto. — Queria te perguntar algo. Sirius me disse que a vassoura de Quadribol de Harry está com problema. Você está sabendo?

Deveria estar surpreso? Não, não deveria, mas ainda assim não estava crendo que Sirius estava mesmo jogando aquela conversa para cima de Lily. E tão rápido.

— Ele disse isso?

— Sim. Algo sobre uma cera errada que Harry usou e que danificou a madeira. Parece que Harry precisa de uma vassoura nova.

James soltou um bufo.

— A vassoura está ótima. Sirius quer comprar a Nimbus 2000 para ele e está arranjando desculpas para isso, porque eu disse que a que temos está perfeita.

— Ah! — O alívio dela era claro.

— Não se preocupe, está tudo bem.

— Certo. Eu não estava duvidando do seu julgamento, mas pensei que talvez você não estivesse informado. Sabe que eu não entendo nada sobre isso e quando Sirius começou esse papo da madeira enfraquecer, Harry cair de 15 metros e tudo mais, eu achei melhor falar com você.

— Ele está apenas usando a sua falta de informação para que você o deixe comprar a bendita vassoura. — James revirou os olhos.

Hey, espera aí! Aquela frase o acordou.

Lily, aparentemente, estava saindo com Sam McGuillen, mas estava perguntando sobre vassouras para ele? Aquele cara sabia mais sobre qualquer coisa de Quadribol, mesmo James sabendo bastante.

— Certo. Sem Nimbus 2000 para Harry — disse ela.

— Por enquanto. — Ele adicionou, voltando para ela. — Mas fico feliz que você ainda confie em mim para os assuntos de Quadribol.

— Por que eu deixaria de confiar? — Ela o encarou bem curiosa.

— Bem...talvez você tenha uma fonte mais próxima do assunto ao seu lado.

Lily abriu levemente os olhos. Ah, ela pensava que James não sabia sobre o seu batedor irlandês?

Pois sim, Lily Evans, eu estou bem ciente do seu batedor, capitão do time irlandês. Bem ciente.

A expressão de choque ainda não havia partido do rosto dela e James já estava se xingando por ter dito aquilo. Não deveria ter comentado nada, mesmo sabendo que o seu ego quem tomou conta e quis deixar claro para ela que o relacionamento dos dois pombinhos era de conhecimento dele.

Ou talvez tenha sido uma boa ideia. Talvez não soar jocoso, mas dar a informação que sabia de Sam McGuillen deixaria claro para todos que o seu filho era torcedor dos Magpies e nada mudaria isso! Além de que Harry continuaria a jogar Quadribol com os marotos nas horas vagas.

— Você é o pai do Harry e o cara que eu confio e sempre confiei sobre tudo relacionado a Quadribol. Você me levava para passeios de vassoura, me ensinou a voar depois de anos das minhas primeiras aulas. Eu não confiaria as informações do meu filho sobre Quadribol para mais ninguém, James. Talvez Sirius, mas você em primeiro lugar, sempre.

Nem McGuillen em seu melhor dia de jogo e com o melhor balaço que poderia lançar conseguiria desnorteá-lo mais do que Lily com aquela frase. Tinha certeza que aquela felicidade estava estampada em sua cara, pois Lily sorriu um pouco.

Toma essa, McGuillen!

O apito do trem os fizeram pular. Ele tinha a desculpa de estar distraído, mas não tinha percebido que ela também estava.

Aliás, apenas agora percebia o quão barulhenta aquela plataforma estava. Tinha que confessar que, a partir do momento que ela apareceu, prestou atenção apenas nela. Mas por ela ser a mãe de seu filho e estarem conversando sobre ele. Nada demais.

— Está na hora, está na hora. — Harry voltou até eles, quase pulando. — Tio Pads já colocou minha mala e Edwige no trem.

— Ótimo. — James colocou uma mão no ombro do filho...

...na mesma hora que Lily colocou a sua no outro ombro de Harry. Eles se olharam, apenas para desviarem o olhar no segundo seguinte.

James se concentrou em Harry, tinha que focar nele, tentar fazer o seu coração acelerar pela saudade que sentiria dele e não qualquer outra coisa.

— Eu vou sentir tanto a sua falta. — A voz de Lily estava embargada. Apesar de não olhar para ela, James sabia que ela teria o nariz enrugado enquanto tentava segurar as lágrimas.

— Eu também vou.

Lily se abaixou e abraçou o filho. James deixou a cabeça cair, engolindo aquele bolo na sua garganta. Uma parte do seu cérebro começou a enviar lembranças de quando eles conversavam sobre levar Harry para a plataforma no seu primeiro dia: iriam tomar café com tudo o que Harry gostava de comer. Sairiam cedo de casa para apreciarem uma caminhada pela plataforma juntos. James e Lily o levariam até uma altura dela, onde ficavam os melhores assentos do trem.

De novo, ele teve que forçar aquele bolo na garganta.

Harry soltou da mãe e se virou para ele. James se abaixou na sua frente.

— Você tem Edwige, que vai adorar entregar cartas para todos nós... então não esqueça de enviá-las.

— Vou enviar um monte de cartas.

— E eu vou responder cada uma delas.

Puxou Harry e o abraçou forte. O tanto que sentiria a falta dele não era possível descrever. Seus dias ficariam mais vazios, mais tristes com aquela lacuna que o filho deixaria.

Quando levantou, bagunçou o cabelo dele, mais do que o normal.

— Eu amo vocês!

Harry se jogou nos pais, abraçando os dois ao mesmo tempo e pegando-os de surpresa com a proximidade.

Lily olhou para ele, os olhos arregalados — assim como os seus, com certeza—, antes de apenas olhar para o filho e o abraçar também. James não pôde fazer nada além de abraçar Harry de volta e juntar os três naquele abraço.

Os braços de ambos circundavam o filho, mas também se tocavam. Aquele foi o toque mais "íntimo" com Lily há anos e fazia seu corpo arrepiar.

— Vamos, Harry. — Sirius o chamou, um sorriso leve brincando em seu rosto. — Você tem que embarcar.

O garoto assim o fez, indo até o padrinho e o agarrando também. Os dois se apertaram na porta do trem, mostrando toda a saudade que já sentiam um do outro.

— Até mais, Tio Pads.

— Até mais, garoto. A gente se vê logo. Bem logo!

Harry correu para a porta do trem e quase trombou com um garoto de cabelos ruivos, que também corria.

— Desculpa — o garoto ruivo disse.

— Não tem problema. Pode ir na frente.

— Não, não. Você quem veio primeiro, você entra.

O impasse da educação faria aqueles dois perderem o trem.

— Por Merlin, apenas entrem juntos, crianças. — Uma mulher ruiva acompanhada de uma garota empurrou os dois para dentro do trem. — Não ouse perder esse trem, Ronald.

James riu quando Harry e o tal Ronald se espremeram na porta para entrarem juntos. Pela janela, os viu no corredor conversando. Aquilo o lembrou quando conheceu Sirius no trem.

E Lily.

E Severus Snape.

Sentia que aquele momento era especial, podendo te apresentar as melhores pessoas da sua vida...assim como as piores.

Para o seu filho, esperava que Ronald fosse um dos melhores.

— Como se sentem? — Sirius perguntou ao parar na frente dos dois pais após Harry entrar em uma cabine.

— Estranho — James respondeu.

— Um pouco vazia.

Harry se jogou na janela, acenando para eles. Os três acenaram de volta, e James começava a sentir a partida do filho como um trasgo em seu estômago.

Não tinha ideia de como as coisas seriam agora. Estava acostumado com uma rotina com o trabalho e Harry, mas agora tinha um vácuo grande na sua vida, sem saber como preenchê-lo até as férias de final de ano.

Poderia até dizer que Sirius enlouqueceria com ele, tendo James em cima de si, mas achava que seria um pouco o contrário. O amigo estava tão acostumado com o afilhado, visitando-o tanto em seu apartamento quanto na casa de Lily. Arriscava dizer que Harry via mais o padrinho do que ele mesmo, já que Sirius tinha a liberdade de usufruir de ambos os lados.

Remus teria a sorte de vê-lo todos os dias.

— Agora só nos basta brincar de viver, como se metade de nós não estivesse em um castelo na Escócia. — A voz de Lily tremeu um pouco.

O trem começou a partir e lá estava Harry acenando com mais entusiasmo, recebendo os sorrisos e acenos dos três adultos na plataforma. Aquilo estava sendo muito mais fácil para o garoto do que para qualquer um deles naquela estação de trem que ficava para trás.

Agora James só precisava se recuperar dessa manhã como podia e se preparar para o começo da noite, que seria tão interessante e, talvez arriscaria dizer estressante também, que teria.

Mal podia esperar.


O cervo corria do Salgueiro Lutador em direção ao castelo. O cachorro preto ao seu lado tentava seguir o seu ritmo, mas ficava para trás em muitos momentos.

Era bom correr por aqueles terrenos novamente. As memórias eram boas — poucas ruins — , e a sensação ainda era a mesma.

Era diferente ser um animago durante missões ou em outros terrenos. Não havia aquela sensação de liberdade que havia ali, em Hogwarts. Talvez faltava a nostalgia, a juventude descontraída, a falta de preocupações da época, a inocência até.

Estando ali, sentia-se aos 15 anos novamente, quando correu em formato de cervo naquelas terras pela primeira vez. Tinha sido libertador, gratificante após tanto tempo de preparação e execução.

Ao se aproximarem do castelo, viram a sombra os esperando.

— Estão atrasados. Eu preciso estar naquela mesa em cinco minutos.

Remus reclamou enquanto os dois amigos voltavam à sua forma humana.

— Pequeno problema no Ministério. — Sirius respondeu. — Eles já chegaram?

— Sim, estão subindo das docas. Aqui. — Remus entregou a capa de invisibilidade que trouxe com ele, já que James não queria levá-la em forma de animago. — Não se intrometam na seleção, ouviram? Deixem o Chapéu se encarregar de Harry, ele vai saber o que fazer.

— Não estou aqui para me intrometer, apenas para assistir...

— Ótimo. — Remus disse.

— ...Meu filho ir para a Grifinória. — Terminou James.

Remus lançou um palavrão.

— Eu preciso ir. Comportem-se.

Assim, o professor de DCAT, Remus John Lupin, deu as costas e entrou rapidamente no castelo.

James e Sirius deram a volta pelo terreno, indo até o salão principal pelo lado de fora, de onde assistiriam da janela a seleção de Harry.

As grandes janelas atrás da mesa dos professores eram perfeitas. Teriam vista privilegiada para toda a cerimônia, apesar de não poderem ver o rosto de Harry quando ele se sentasse e fosse escolhido. Mas não tinha problema, o importante era ouvir e estar ali, assistindo tudo em primeira mão.

Lançou um feitiço de escuta na janela, cobriram-se com a capa e se posicionaram. Por um momento, James sentia que estava de novo na Ordem, espionando Comensais com Sirius. Ou melhor: ambos em algum daqueles corredores, espionando alguns alunos, ou até mesmo professores.

Estando cobertos por aquela capa ajudou o grupo a descobrir tanta coisa do castelo, lhes dando a ideia de criar o Mapa mais tarde. Horas a fio perambulando de madrugada que trouxeram tanto conhecimento, que duvidavam que qualquer outra pessoa tivesse tanta informação quanto eles.

— Vai demorar alguns minutos ainda. — Comentou Sirius. James concordou com um aceno. — O que nos dá tempo de conversar, já que você parecia correr de mim o dia todo.

James franziu o cenho.

— Correr?! Eu não corri de você em momento algum — respondeu pouco convincente.

Sabia sobre o quê ele queria falar e vinha evitando o máximo que podia por horas, desde que foram embora de King's Cross. Desde o momento que se despediram de Lily e que James ficou parado no meio da calçada e dos londrinos, assistindo-a se fundir com a multidão.

Aquele reencontro havia sido algo à se discutir, para dizer o mínimo, mas não sabia se queria dar a devida atenção àquilo.

Pensava que depois de anos, veria Lily e tudo estaria ok. Bem, as coisas não estavam ruins, mas foi diferente do que imaginava. Ficou mais empolgado do que deveria, com o coração mais acelerado do que deveria.

Talvez fosse uma reação normal. Lily sempre foi diferente, sempre tinha significado algo a mais, mais do que qualquer outra mulher. E havia sido a sua esposa, era mãe do seu filho, venceu um dos piores bruxos ao seu lado, sobreviveram à guerra juntos.

Não era pouco para se passar com alguém. A conhecia desde os 11 anos, apesar de se aproximar apenas aos 16, mas ainda assim eram muitos anos juntos.

Levou um cutucão na costela, fazendo-o reclamar de dor.

— Conversa comigo, não com você mesmo — pediu Sirius.

— O que você quer que eu diga?

— Não sei, qualquer coisa. Não é possível que você fique sem falar nada depois de hoje.

Respirou fundo enquanto balançava a cabeça.

— Você já está cansado de me ouvir dizer sobre o quanto vou sentir saudades de Harry. Então por qual motivo vou continuar a falar sobre isso?

— Prongs, deixa de ser idiota. Você sabe que não é sobre Harry que estou falando.

Fez uma careta e deu de ombros, tentando demonstrar desinteresse.

— Não há nada para dizer, Sirius.

— Prongs, você ficou anos...— Sirius parou para contar nos dedos por um momento. — Oito anos sem ver Lily. Oito!

— Sim, eu sei.

Sirius cruzou os braços. James conhecia aquele homem na sua frente tão bem, que sabia que ele maquinava uma maneira de arrancar algo dele.

— Ela está linda, não está? — disse o maroto de cabelos mais longos.

— Ela sempre foi linda.

— Sim, mas ainda mais agora.

Desviou o olhar para o salão. Os professores se posicionavam. Viu quando Remus deu uma singela olhada para onde estavam, apesar de não conseguir vê-los.

A qualquer momento, Harry entraria naquele salão pela primeira vez e James sentiu uma pontada de inveja, querendo estar ao seu lado, voltar para Hogwarts e tudo o que aquele lugar representava. Muita coisa da sua vida deu início ali. Era difícil não pensar o que teria acontecido se não ficasse amigo de Sirius, Remus e Pettigrew. Se ele não tivesse se apaixonado igual um maluco por Lily, se não tivesse salvado Snape no Salgueiro Lutador...

Sua vida seria tão diferente hoje em dia. Talvez Voldemort estivesse no poder, talvez ele mesmo estivesse morto, talvez Harry não existisse...

Aquele era um dos piores pensamentos que poderia ter.

— Se quer saber, Padfoot: sim. Lily está maravilhosa, tão madura, tão diferente, mas tão igual também.

Continuou com os olhos no salão. Viu Dumbledore levantar para dar o seu discurso para os veteranos antes de receberem os calouros. Seu estômago dava voltas, como se fosse ele ali de novo.

Na sua época, estava tão empolgado e feliz, mas tinha que dizer que nervoso também.

Aquele salão te engolia quando você entrava pela primeira vez. Aos 11 anos, você tem a impressão de ser um grão de areia no meio de toda aquela magia e pessoas. Os olhos estão em você, então se você gosta de atenção — que sempre foi o seu caso —, era um prato cheio...

...mas quando você sabe que um chapéu será colocado na sua cabeça para ver o que tem ali dentro, era algo que não o deixava muito feliz. Não que duvidasse para onde iria, pois seu sangue corria com o nome da Grifinória desde sempre. Mas ter algo invadir seus pensamentos lhe incomodava muito. Tanto que, assim que se viu forte o suficiente e maduro o bastante, aprendeu Oclumência, o que o ajudou muito na época da Ordem e agora como Auror.

Porém, não havia Oclumência suficiente para esconder algo de Sirius e Remus.

— Você está tão abalado, Prongs. — Sirius riu, se virando para o salão também e assistindo Dumbledore. — Mal consegue manter uma conversa.

— Estou apenas nostálgico. Hoje é um dia muito especial para Harry.

— E foi para você também.

— Claro, porque é meu filho começando Hogwarts.

— De novo: não é sobre isso que estou falando.

Resistiu mandar o amigo a qualquer lugar, porque as grandes portas do salão se abriram e seu coração disparou. Aquilo, pelo menos, faria Sirius calar a boca.

Os alunos, tão pequenos, começaram a entrar. As bocas estavam escancaradas, os olhos correndo por todo o lugar, absorvendo a magnitude do salão principal.

— À esquerda, quase ao meio — disse Sirius.

Ali estava Harry. Vinha ao lado de Neville e o tal garoto Ronald. Teria que descobrir quem era, aliás. Estudar a família, saber um pouco sobre o background.

Uma cabeleira loira chamou sua atenção. O garoto andava quase colado a Harry, o rosto um pouco caído, perdido.

— Malfoy.

— O pequeno Draco Malfoy. — Sirius completou.

— Muito perto de Harry.

Lucius Malfoy tinha sido um dos poucos Comensais que conseguiu escapar de ir a Azkaban e James tinha aquele fato entalado até hoje. Era difícil ver aquele pedaço de merda andando nos mesmos corredores que ele, enquanto lutavam de lados opostos.

Claro, Lucius Malfoy não tinha pelo o que lutar hoje em dia, mas continuava sendo um Comensal. Sua maldita marca negra ainda estava em seu braço.

— Vou ficar de olho em Lucius — comentou Sirius. — Vamos pedir para Remus ficar de olho no filho.

Às vezes, James achava que era superprotetor. Sua cabeça funcionava, muitas vezes, como um Auror. Mas como podia fazer diferente? Seu filho já foi alvo de um bruxo das trevas. Foi Harry quem derrotou Voldemort, por assim dizer, e havia ainda muita gente vivendo em rancor e não duvidaria que um desses era Lucius Malfoy.

E se o filho dele encostasse em Harry ou qualquer outro, outra guerra começaria.

Com um longo pergaminho, McGonagall se postou ao lado do banco de três pernas, segurando o Chapéu Seletor. James nunca imaginou o quão excitante poderia ser assistir o próprio filho sendo sorteado. Quantos pais poderiam dizer o mesmo?

— Hannah Abbot. — Sirius comentou quando a pequena garota loira foi a primeira chamada.

— Você a conhece?

— Não exatamente. Eu consegui a lista dos novos alunos há alguns dias e estudei um pouco cada um deles, tentando saber se deveríamos nos preocupar com algo.

Nem James havia pensado nisso, mas Sirius podia ser muito superprotetor em relação a Harry também.

— Certo, continue — pediu. Se o amigo tinha as informações, então melhor saber de tudo.

— Os Abbots. Pai bruxo, mãe trouxa. O pai trabalha como vendedor. Aparentemente é uma desonra, já que o nome Abbot era bem conhecido antes.

— Giffard Abbot? O grande bruxo, antigo diretor de Hogwarts?

— Sim.

— Já estou imaginando Giffard enviando o seu cachorro seguir a garota pelas dezenas de quadros que tem nesses corredores.

A garota foi enviada para a Lufa-Lufa.

Susan Bones, uma pequena ruiva, foi chamada por McGonagall agora.

Aquilo o fez lembrar de quando viu Lily ser chamada. Seus cabelos se destacavam de todos eles, seus olhos eram dois faróis verdes. Ele estava abismado com aquela garota do trem, ainda que não entendia o que acontecia em sua cabeça na época.

Era deslumbre pela beleza dela, pela grande boca que o respondeu, as caras feias que fazia para ele ao ouvir sua conversa com Sirius. Quando o Chapéu gritou "Grifinória", ele quase jogou o punho no ar em comemoração. Diferente de Snape, que parecia ter comido dez feijõezinhos de sabor vômito de uma vez.

Ah, a vitória cantava desde cedo.

— A pequena Susan Bones. Dispensa apresentações. — Sirius apontou para a sobrinha de Amélia Bones. Viram quando a garota foi sorteada para a Lufa-Lufa. — Estamos surpresos?

— Não, não estamos. — James sorriu.

Outra garota foi chamada.

— Granger. Não conheço, é nascida trouxa, pais trouxas.

— Como Lily. — disse sem pensar.

Não viu, mas sabia que Sirius sorria.

— Como Lily — confirmou o amigo. — Os Grangers são doutores de dente, ou algo assim. Vida normal e pacata, nada de espetacular.

A garota Granger levou quatro minutos para ser sorteada! Aquilo havia sido a segunda vez que James esperou tanto por uma decisão.

A primeira, foi com Pettigrew. O primeiro e único Empata-Chapéu que James viu em todo o seu tempo em Hogwarts. Foram mais de cinco minutos para decidir. E ele se lembrava bem, pois era o próximo e ficou ferrado da vida ao ter o cara antes dele levando semanas para ser enviado para uma casa.

Não culpava o Chapéu hoje em dia, apesar de uma parte sua achar que tivesse sido melhor se o lado traidor daquele desgraçado fosse levado mais em conta na época.

A garota Granger foi mandada, finalmente, para a Grifinória.

— Como Lily — James repetiu ao ver mais uma nascida trouxa e pais trouxas sendo enviada pelo Chapéu com tamanha felicidade.

— Ah, sim? — Sirius perguntou com um tom debochado. — Você se lembra bem.

— O Chapéu não deliberou, mas gritou quase tanto quanto agora.

— Hum, que boa memória.

James revirou os olhos.

— Também lembro do Chapéu gritando na sua vez, com um certo orgulho. Ele parecia bem feliz em te mandar para lá.

— Claro, só faltou que eu implorasse de joelhos para isso.

Neville foi chamado agora. O garoto andou calmamente até a professora e sentou.

Segundos se passaram. Um minuto. Dois minutos.

— Neville um Empata-Chapéu, será? — Sirius parecia pensar em voz alta.

— Só se passaram dois minutos. Para ser um, tem que passar de cinco.

— Empata-Chapéu é tão raro e estamos vendo muitos "quase" deles hoje. E admito que não esperava uma deliberação tão grande do Chapéu com o nosso Neville.

— Podemos passar fins de semana com ele, com os pais deles, mas não podemos saber o que o garoto pensa, deseja ou teme.

Três minutos depois, Grifinória para Neville.

— Frank vai ficar feliz. — Sirius riu.

Os dois pararam de falar ou sorrir quando Malfoy foi chamado.

A arrogância estava ali, tão típica. Porém, havia algo a mais nos olhos daquela amostra da família. Quase como um receio, uma insegurança que apenas olhos bem treinados poderiam capturar.

A casa da Sonserina aplaudiu quando Malfoy foi anunciado para a casa. Outro que não era surpresa.

Tinha que ficar de olho naquele garoto.

— Potter, Harry!

A voz de McGonagall ecoava na mente de James agora. Os dois marotos se aproximaram do vidro, quase esmagando seus narizes.

Harry foi até o banco de três pernas. Parecia confiante, mas James viu de relance um receio no filho. Foi nessa hora que se xingou por falar tanto sobre a Grifinória para ele, dando a entender que era a casa que esperava que ele fosse.

Era verdade, esperava isso, mas não deveria ter colocado essa pressão nele. Harry devia ir para a casa que melhor se encaixasse.

Mais segundos do que deveria se passaram.

— Diabos. Um Empata-Chapéu aparece a cada 50 anos e agora temos quase uma leva deles? — Sirius murmurou.

Para James, Harry era um grifinório puro, de A a Z. Bem, na maioria das vezes. Era esperto também, muito inteligente, então havia alguma porcentagem de Corvinal. Tinha um coração enorme, sempre ao seu lado, aconselhando com as palavras de uma criança...o que fazia James pensar em Lufa-Lufa às vezes. Seu filho também era muito decidido, sempre pronto para lutar pelo o que queria, não se importando com as pedras no caminho, pronto para passar por elas para conseguir...o que lhe dava uma parte da Sonserina.

O Chapéu Seletor teria uma dor de cabeça agora.

Um minuto e meio. James e Sirius não falavam, apenas esperando pela decisão. James percebeu que o filho apertou a borda do banco com as duas mãos, parecendo lutar contra o Chapéu. Queria poder ir até lá e dizer que não importava a casa, ele seria ótimo em qualquer uma delas.

— Grifinória!

Os dois marotos gritaram de felicidade ao mesmo tempo, jogando as mãos para cima.

Que se danasse tudo, Harry era Grifinória!

Remus e alguns professores olharam na direção da janela, provavelmente ouvindo a comemoração de ambos. Querendo evitar uma inspeção nos jardins, eles se calaram no mesmo momento e arrumaram a capa em suas cabeças.

— É claro que o meu afilhado seria grifinório.

— Ele tem muito mais sangue grifinório do que do resto, com certeza.

A felicidade o dominava, tendo que se impedir de entrar naquele salão e jogar o seu filho para cima. Queria poder enviar uma carta para Lily naquele momento e dizer que Harry havia caído em sua casa, que ele continuaria a saga dos Potter na Grifinória.

Talvez ela estranharia uma carta sua hoje, principalmente após se verem mais cedo depois de anos. Ela devia estar, agora, com o seu batedor irlandês, jantando e contando as emoções de enviar o seu filho para Hogwarts e que foi obrigada a ver o seu ex marido na plataforma.

A única coisa que o acalentava agora era saber que, com toda a certeza, ela não estava pedindo ajuda para Sam com o Quadribol de Harry. Aquilo seria apenas ele, sempre.

— O penúltimo dos Weasley. — Sirius chamou sua atenção. James viu o tal Ronald, o ruivo do trem, se dirigindo até o banco.

— Ah, eu deveria ter adivinhado. Filho de Arthur, da Seção de Controle do Mau Uso dos Artefatos dos Trouxas, certo?

— Sim. Penúltimo filho de Arthur Weasley e da sua mulher, Molly. Ela era uma Prewett...irmã de Gideon e Fabian.

Os gêmeos que morreram tão precipitadamente na época da Ordem. A batalha que eles travaram contra Comensais virou um marco. Lembrava vagamente dos irmãos comentando sobre os sobrinhos e a irmã, que era um pouco demais para eles, apesar de amá-la.

— Os Prewett não estão ligados com os Black? Duas famílias da Sagradas 28 e tudo mais. — James perguntou.

— Sim, somos ligados por Ignatius Prewett que casou com a minha tia Lucretia Black. Molly é uma prima, apesar de eu não ter contato. Os Weasley também, já que a mãe de Arthur, Cedrella, era uma Black. Foi queimada da árvore da família, assim como eu. — Sirius fez um som de desgosto. — Enfim, se eu ficar aqui contando o quão ridículo todos esses casamentos com primos, tios distantes e tudo mais são, vamos começar a vomitar.

Ronald Weasley foi enviado para Grifinória, sentando-se com Harry e Neville. Os três pareciam felizes ao serem sorteados para a mesma casa.

— Então me parece que não devemos ter algo contra o tal Ronald.

— Uma boa família, os Weasley. Mas sempre podemos achar uma maçã podre no cesto, certo? Minha adorável mãe adorava me lembrar disso.

— A sua adorável mãe estava certa. Pettigrew foi uma. — Rangeu os dentes, mas tentou relaxar a mandíbula, não querendo pensar no amigo traidor. — O problema de Walburga Black é que ela não gostava de saber que também pode ter uma maçã boa no meio das estragadas. É só a gente conseguir tirá-la de lá a tempo e tudo fica bem.

A mão de Sirius pousou em seu ombro, como forma de agradecimento.

— E tudo fica bem — repetiu Sirius.

Assistiram os alunos atacarem o jantar assim que ele apareceu nas mesas das casas. Aquilo lhe deu fome, além de vontade de estar sentado naquele banco grifinório.

— Professores, vamos a eles. — Sirius limpou a garganta. — Tem um bobão que está ocupando a vaga de DCAT esse ano. Não conheço muito, mas me parece um pouco...aluado. Não acha?

James voltou seus olhos para a nuca de Remus. O amigo parecia concentrado em seu jantar, mas lançando olhares de tempos em tempos para Harry.

— Um pouco lunático — concordou.

— Que sorte de ter conseguido a vaga. Esse deve ter nascido com a bunda virada para a lua — Sirius continuou.

— Além do mais, tem que ser um pouco maluco e um pouco são para ensinar isso, não? Talvez ele seja um pouco de lua.

— Ou viver no mundo da lua.

James assentiu, como se levasse aquela conversa seriamente.

— Deve ter colocado Dumbledore nos cornos da lua para conseguir o emprego.

Como sentindo que era o assunto dos amigos, Remus virou-se levemente em direção à eles.

— A lua cheia foi dia 25 de Agosto e a próxima só será no dia 23 de Setembro. Ele não está com a audição aguçada hoje, certo? — Sirius perguntou.

— Nah — James confirmou. — Ou já teríamos sido azarados.

— Ótimo. Voltando então...professores. Minnie permanece como professora de Transfiguração, para a sorte do Harry e o azar dela. — Sirius apontou para o outro lado da mesa dos professores. — Flitwick ainda como professor de Feitiços. Não imagino o quão velho ele seja já.

— Me surpreende que ele não tenha falecido com algumas explosões que causamos nas aulas durante os primeiros anos.

— Éramos irresponsáveis, mas tentávamos não matar as pessoas. Digo...bom, não vamos comentar sobre o sexto ano e o Seboso, mas no geral, era assim.

Balançou a cabeça, concordando com o amigo. Tanto por como eram irresponsáveis, mas tentando assegurar a vida das pessoas, como não querer falar sobre o episódio do sexto ano.

Aquilo foi resolvido e não queria reviver.

— Quem é aquele ali?

James apontou para uma nuca desconhecida.

— Quirino Quirrell. Professor do Estudo dos Trouxas. Quando Olivia Green deixou a vaga de DCAT no fim do ano 1990, ele se candidatou como professor, mas como Remus era mais qualificado, perdeu a chance. Aparentemente, essa derrota foi bem amarga para ele, fazendo o cara partir em uma viagem longa, desaparecendo por meses. Voltou a tempo para o dia de hoje.

James observou o homem por um momento. Ele usava roupas um pouco diferentes, quase um pouco caras demais para um simples professor. Um turbante em sua cabeça, bem preso...

— Sabe mais sobre ele?

— Não muito, apenas que ele sofreria um pouco com a gente caso estudasse na nossa época.

— Alguém para ficarmos de olho? — perguntou James.

Sirius pareceu pensar por um momento, deixando o seu lado Auror tomar conta daquela decisão.

— Não custa nada manter um olho nele — finalmente disse.

Fazia anotações mentais sobre todas as informações que Sirius soltava.

— Obrigado por ter feito toda essa pesquisa.

Sirius desdenhou, como sempre fazia, quando ficava sem graça.

— Estava entediado. Além do mais, você estava ocupado em passar o máximo de tempo com Harry. Muito melhor isso do que focar no que pessoas podem fazer pelo nome de um cara mal encarado que ficou acreditando em contos de uma mulher meio doida dentro de um pub. Cara esse que não será mais um problema, aliás. Voldemort está caído e acabado em alguma poça de lama...então você foca em Harry e eu penso em algumas outras coisas em que posso ajudar.

Sirius tinha razão. Por mais que quisesse ter se preparado melhor, não poderia fazer tudo. Tinha que aceitar que teriam coisas que ele não seria o responsável, como estudar quem estaria entrando em Hogwarts com Harry.

Já estava bem feliz por continuar a ser o responsável por cuidar de tudo que envolvia Quadribol na vida dele, apesar de Lily namorar o maior batedor da história recente.

Não se cansaria nunca de dizer aquilo.

Há, toma essa de novo, McGuillen.

— Você quer entregar a capa e o espelho para o Harry hoje? — Sirius voltou a dizer.

Sirius poderia entrar furtivamente no castelo e encontrar Harry, chamando-o para algum canto dos terrenos para que entregassem a capa e um espelho que Sirius conseguiu conectar com os espelhos dos dois marotos.

Quando o amigo apareceu com aquilo, depois de tanto estudar como conectá-los com os deles, percebeu a ótima ideia que era. Harry poderia tê-los rapidamente caso precisasse de algo e poderia deixar Hedwige para os assuntos mais longos, as cartas semanais, etc.

— Ou podemos deixar para outro dia. Melhor deixar a mente dele absorver tudo o que é Hogwarts primeiro, antes de darmos munição para a destruição do lugar.

Ouviu um murmúrio de concordância de Sirius do seu lado enquanto continuava a assistir a animação do salão principal. Sabia que não era o único ali a querer voltar no tempo por algumas horas e passar por tudo aquilo de novo, aquela felicidade que apenas Hogwarts poderia te dar. Como as coisas pareciam melhores, fáceis...

A imagem de Lily na plataforma voltou com força, assim como as lembranças da criança e adolescente que ela foi. Inclusive a da mulher forte que teve ao seu lado.

Ah, por Morgana. Não queria pensar nela, mas aquele lugar mexia demais com a sua alma, levando-o para o passado mais do que deveria. Apenas ao ver aqueles alunos com o uniforme da Grifinória, sentados na mesma mesa que ele passou tanto tempo, tantas refeições com os seus amigos, às vezes sozinho quando acordava muito cedo, outras com Lily...

Inferno!

Afastou-se da janela abruptamente, deixando Sirius confuso.

— O que foi, Prongs?

— Nada.

Seus olhos se perderam no terreno escuro, na Floresta Proibida. O seu presente estava tão instável, tão como ele não queria que fosse, que era catapultado para o passado facilmente.

Não se importava em como era levado para seu tempo em Hogwarts. Era prazeroso, na verdade. O único problema foi o começo daquele dia, naquela estação de trem, naquela plataforma. Isso sim era um problema, pois além de ser doloroso de alguma forma, sua cabeça queria se afundar mais ainda nas lembranças.

— Não parece "nada". Por que não vamos ao Três Vassouras para beber um bom firewhisky e conversar?

Era uma boa ideia. Remus até poderia juntar-se à eles após o jantar e todos os alunos partirem para os seus dormitórios. Mas aquela loucura de dia estava querendo lhe guiar para outro lugar.

Nunca teve aquele ímpeto antes, mas sua cabeça não parecia querer lhe dar trégua sobre isso.

— Tem algo que eu preciso fazer. Deixamos para outro dia?

E assim, ele entregou a capa para o amigo e voltou em sua forma animaga, correndo para o Salgueiro.

-J-

Aquilo não era algo que precisava fazer. Por que estava ali? Não sabia, mas sentiu que precisava, de alguma forma, voltar naquele lugar.

Então por isso aparatou em frente ao que, um dia, chamou de lar.

A Potter Cottage permanece semi destruída, abandonada por completo, após o dia 31 de Outubro de 1981. Sirius tentou convencê-lo a reformar, a mudar tudo, talvez até vender, mas James não teve coragem, alma ou tempo.

Após a batalha, sua vida deveria ter seguido em frente, mas deixou-se ser pego pelo medo da volta de Voldemort, pela vida do seu filho, de Lily, que deixou tudo aquilo para trás. Tanto é que era a sua primeira visita ali depois do ocorrido.

Abriu o pequeno portão de madeira. As ervas daninhas o consumiam, dando aquela vontade de querer acabar com elas, dar mais vida para aquele simples portão, mas apenas seguiu em frente. A porta da frente também estava em um estado horrível, forçando-o lembrar todas as vezes que entrou ali com um sorriso.

O cheiro de mofo foi a primeira coisa que sentiu quando passou pelo batente, após brigar um pouco com a porta emperrada. O corredor de entrada estava tão sombrio com o abandono, tão escuro.

Os quadros que Lily adorava ainda estavam ali, assim como porta-retratos vazios que, antes, continham fotos deles e muitas outras de Harry. Sirius se prontificou a vir e recuperar tudo para o casal e James tinha algumas das fotos do filho, mas era estranho ver seus lugares originais vazios.

Continuou até chegar à sala. Ali, o baque foi ainda maior.

" — Lily, pegue Harry e vá! É ele! Vá! Corra! Eu o atraso...

Lily, com Harry no colo, saiu da sala.

Não queria que a última visão da sua família fosse essa: os cabelos vermelhos ao vento pela corrida, os olhos assustados de Harry entre os braços da mãe. Mas não importava o que ele sentia, pois precisava mantê-los a salvo e se isso significava ter aquela última memória, teria que aceitar."

Não tinha sido a última memória, mas era a primeira que vinha na sua mente ao observar sua antiga sala, tão destruída pela batalha que ocorreu ali.

Não era Voldemort lançando Avada Kedavra nele, não eram os olhos vermelhos bizarros do homem. Era a sua família correndo para longe, tentando se salvar, que era a lembrança mais forte.

"Colocou a mão no bolso e não encontrou a varinha. Droga, onde havia colocado?

No sofá. Estava no sofá, escondida de Harry, após brincarem por longos minutos depois do jantar.

Accio varinha.

Sua mogno pousou em sua mão no exato momento que Voldemort adentrou a sala.

Seu coração acelerou. Sua intenção não era viver, era ganhar tempo para Lily e Harry, mas tentaria. Se conseguisse sobreviver e voltar para eles, seria o seu presente da vida. Nunca havia tirado a vida de alguém, mas nesta noite, estava disposto a tal. Se Voldemort lhe desse a oportunidade, ele o faria.

Se Voldemort não morresse, e se ele mesmo não morresse, iria até o fim do mundo para garantir que aquele pedaço de homem nunca mais fosse uma ameaça para eles."

A promessa que fez foi a segunda pior memória.

Deu alguns passos e parou onde lembrava de estar vendo Voldemort entrar naquele mesmo cômodo, vindo dos fundos da casa. No mesmo lugar onde havia feito a promessa que ajudou a manter sua família a salvo, mas a mesma promessa que o embarcou em uma aventura solitária, que o fez se afastar de quem ele estava querendo salvar.

Era um sentimento agridoce. Odiava aquela promessa, tinha um certo arrependimento, mas quando via seu filho bem, saber que Lily estava bem, acreditava que havia feito uma boa escolha, apesar do sofrimento.

Mas poderia ter parado. Houve um momento que poderia ter parado e voltado para eles. Lily pediu. Não, Lily quase implorou para ele voltar, mas James não conseguiu. Só pensava em ir atrás de todas as horcruxes, destruí-las uma a uma, até não existir meios para que Voldemort fosse uma ameaça para eles.

Caminhou até uma janela à esquerda. Lembrou dos barulhos de aparatação naquela noite.

"Os feitiços começaram a ser lançados e com os flashes verdes vindo em sua direção com tanto afinco, James começou a perder aquela coragem imensa que sentiu alguns segundos atrás. Porque apesar de estar pronto para matar Voldemort, não o atacava com o feitiço da morte ainda, querendo desnorteá-lo primeiro. O seu modo operandi nunca foi a morte em um duelo, mas via que precisava usar outra tática caso quisesse vencer.

Teve a impressão de ouvir um "pop" do lado de fora da casa. Mais um, dois mais. Quatro até. A explosão que o feitiço lançado por Voldemort causou o distraiu dos barulhos, sem conseguir saber o que eram.

Se fossem Comensais chegando, ele estaria perdido."

Mas era a Ordem.

Lily correu para fora da casa com Harry em seus braços naquela noite e aparatou na sede da Ordem, onde estavam Sirius, Remus, Moody e alguns outros membros. Deixando Harry com Alice Longbottom, ela voltou com todos eles para enfrentar Voldemort. James só podia dizer que todos eles chegaram a tempo, pois o empenho em um matar o outro naquele duelo estava intenso.

E a intensidade havia aumentado tanto com a chegada da Ordem, com alguns deles sendo atingidos e ficando fora da briga, que não sabia o quanto aquilo durou. No final, ficaram ele, Lily, Sirius, Remus e Moody. Cinco pessoas contra um, mas um bem poderoso.

Nunca saberia quem lançou o feitiço que matou — ou quase matou — Voldemort naquela noite, apesar de ter uma vaga ideia. Aquilo não era importante, mas sim o que ocorreu depois:

"Foi a coisa mais estranha que já vira em toda a sua vida: Voldemort estava se desfazendo em sua frente, virando uma névoa escura bizarra, que saiu pela janela quebrada da sala.

O que, Morgana, foi aquilo?

Seu corpo caiu no chão, mas não como deveria ter sido. Aquela névoa escura parecia ser a única coisa que o mantinha em pé e, quando ela se foi, o corpo desfaleceu na frente de todos. Como se Voldemort estivesse apenas adormecido.

O desespero começou a falar mais alto, tão alto, que não conseguia ouvir as vozes ao seu redor. Apenas olhava para frente, para aquele corpo estranho no tapete da sua sala, parecendo morto, mas não muito.

Levantou os olhos e viu o medo, o receio nos olhos dos outros ocupantes do cômodo. Era nítido o que todos pensavam, mas alguém tinha que falar em voz alta para tornar tudo oficial.

E essa voz veio de Alastor Moody:

Voldemort ainda está vivo."

Virou para as escadas, subindo.

Cada degrau, era uma viagem no tempo: a primeira gargalhada de Harry na casa; o primeiro Natal como uma família; o cheiro do bolo de chocolate que Lily adorava fazer; os voos do filho na vassoura que ganhou de presente em seu primeiro ano; as madrugadas que James passou acordado com o filho no colo; os momentos que tinha com Lily...

Chegou no topo da escada e foi direto para onde, uma vez, foi o quarto do casal. Estava vazio, apesar de ainda ter as marcas dos móveis no antigo carpete. Tantas coisas boas se passaram ali, tantos momentos entre eles. Mesmo se escondendo de Voldemort, queriam tentar levar uma vida normal, ou a mais normal que poderiam ter.

Lembrava o quanto falavam sobre terem outros filhos logo, apesar da idade. Após Harry, sentiam que era tudo o que queriam: uma família grande, mais risadas em casa. Não era fácil, nunca seria fácil, mas no final do dia, sempre compensava.

James percebeu que sorria apenas quando sentiu o sorriso morrer ao pensar que aquilo não era mais a realidade. Não pensava nesses planos há um tempo, e agora doía saber que nunca estiveram tão longe daquilo quanto agora.

Nunca esteve tão longe de ter a família que imaginava, a família que sempre desejava, que sempre imaginou ter desde o último ano de Hogwarts...desde o momento que decidiu que pediria Lily em casamento e que faria de tudo para fazê-los felizes.

Perdeu contra ele mesmo. Apenas em pensar que ele poderia ter evitado aquilo...

Balançou a cabeça, querendo se livrar daqueles pensamentos, e saiu do quarto, indo na direção da última porta do corredor.

Assim como na do casal, aquele cômodo também estava vazio, mas também com as marcas dos antigos móveis no chão, da cômoda e do pequeno berço.

James riu ao pensar que seu filho tinha sido tão pequeno daquele jeito um dia, cabendo naquele pequeno espaço, naquele pequeno móvel. Ele estava tão grande agora, dormindo na sua cama em Hogwarts, na torre da Grifinória, tão eloquente e sagaz. Lembrava de entrar por aquela mesma porta às vezes e se deparar com o filho em pé no berço, sorrindo para ele, como se dissesse "bom dia" em sua própria língua de bebê. Eram manhãs boas, onde tomavam café da manhã juntos com um Harry bem tagarela, mesmo boa parte das frases não fazendo sentido nenhum, mas os pais sempre conversavam de volta como se entendessem cada palavra.

Sirius e Remus também entravam na brincadeira, até mesmo Pettigrew, quando visitavam. Talvez por isso Harry fosse tão falante hoje em dia.

Voltou para o corredor com a cabeça baixa e os ombros caídos. Estar ali despertava muitas coisas, muitos sentimentos, e nem todos eram bons. As lembranças eram doces, mas o choque do que era a vida agora mais parecia com um feijãozinho com gosto bem nojento.

Com pesar e respirando fundo, como se quisesse deixar todo aquele peso de seus ombros naquele corredor, James desaparatou.


Tinha acordado muitas vezes com ressaca em sua vida, mas aquela ressaca moral? Foram poucas.

Enquanto balançava a xícara do café nas mãos e encarava o vazio da sua sala, James pensou que Harry devia estar se preparando para o seu primeiro café da manhã no castelo.

Dependendo da hora que descesse ao salão, teria uma visão magnífica das quatro mesas banhadas pelo sol, fazendo o lugar parecer pegar fogo. Lembrava de quando acordava bem cedo para os jogos de Quadribol e encontrava-se com poucos alunos matutinos ali, comendo seus ovos e bacons enquanto assistia as partículas de poeiras voando pelos raios solares vindos da janela em suas costas. Valia cada minuto acordado, pois o acalmava e ajudava a focar no jogo que viria.

Também tinha esses vislumbres do sol na cozinha em Godric's Hollow. Quantas noites passou acordado e assistiu o nascer do sol pelas janelas da cozinha?

Limpou a garganta e enviou a xícara vazia para a cozinha. Precisava ir trabalhar e colocar a cabeça em algo.

Não demorou para aparatar em frente da entrada para os Aurores. Nenhum outro Departamento do Ministério tinha conhecimento, tendo os trabalhadores do Departamento de Execução das Leis da Magia como únicos a usarem.

Era uma porta mal cuidada e quase caindo aos pedaços, não causando interesse algum para quem quer que fosse. E ainda assim, tomavam o máximo de cuidado, sempre olhando para os lados e se desiludindo antes de passarem pela madeira assim como passavam para a Plataforma ¾. Chegavam em um canto escuro e mais vazio do saguão. Não era um problema serem vistos chegando, contanto que ninguém soubesse como entravam, já que não era possível voltar para as ruas de Londres pela mesma porta.

Assim que se viu no átrio do Ministério, só conseguiu pensar em uma coisa: como aquele lugar parecia prestes a explodir toda segunda-feira? Tinha a impressão que via todos os trabalhadores de todos os Departamentos em apenas um dia da semana e na mesma hora, entulhando cada pedaço do lugar. E, claro, ele se misturou na massa de gente, virando mais um trabalhador indo em direção ao seu escritório.

Cumprimentou um ou outro no seu caminho e pegou uma cópia do Profeta Diário, como de costume.

"TIMES DO REINO UNIDO PRONTOS PARA A TEMPORADA"

— Sim, eu sei — disse para o vento e abrindo o jornal, querendo tirar aquela foto de vários jogadores britânicos sorrindo da sua frente.

Encontrou uma matéria sobre botânica e começou a ler enquanto esperava na fila do elevador. Interessante, muito interessante aquela matéria sobre a irrigação de certas plantas carnívoras. Como não poderia ser, não é mesmo? Muito mais interessante do que qualquer notícia sensacionalista sobre Quadribol.

Sua vez chegou. A porta do elevador vazio abriu e duas pessoas entraram antes dele. Dois segundos depois, encontrava-se no fundo, quase espremido e impossibilitando a sua leitura sobre botânica.

Ah, que pena.

Como seu Departamento era no segundo nível, não demoraria para sair. Porém, o elevador não parou em nenhum nível.

— Hey, o que está acontecendo? — Alguém que queria parar no nível três reclamou, mas o elevador continuou descendo.

Até parar em um nível que ninguém ali dentro tinha pedido, aparentemente, considerando a surpresa de todos.

Nível sete, Departamento de Jogos e Esportes Mágicos, que inclui a Sede das Ligas Britânica e Irlandesa de Quadribol, o Clube de Bexiga Oficial e a Seção de Patentes Absurdas.

Que diabos, aquela porcaria estava quebrada?

Não precisou esperar por tanto tempo para descobrir o problema.

Assim que se aproximaram do saguão do nível, as grades se abriram e o silêncio do elevador foi quebrado por uma falação horrível, flashes, até gritos. Antes mesmo de refletir, James já tinha sua varinha em mãos.

— Algum Auror dentro? — Uma voz veio daquela bagunça.

Olhos viraram para ele automaticamente.

Claro, era James Potter. O Auror-Investigador. Não era uma pessoa que passava despercebido, normalmente, mesmo querendo muito.

— Sim — ele confirmou.

— O Auror fica, os outros saem — a voz anunciou.

Ainda não sabia o que estava acontecendo, sua varinha continuava empunhada enquanto os outros saiam. Logo depois, duas pessoas entraram e as portas começaram a se fechar, apesar da dificuldade por conta da multidão.

Enquanto segurava o jornal em uma mão e a varinha em outra, James assistiu Sam McGuillen entrar no bendito elevador, acompanhado por um cara baixo e atarracado.

Sério? Aquilo era sério? A vida estava tentando ser engraçada ou o quê?

Porque não era engraçado.

— Obrigado. Estava um inferno esse lugar — disse o cara atarracado sem nem olhar para ele.

Sam se virou, provavelmente para comentar algo ou agradecer, mas então ele engasgou ao encontrar os olhos de James.

Os dois homens se encararam por uns bons cinco segundos, antes de James levantar uma sobrancelha inquisidora e parecer acordar o outro dos pensamentos.

— Potter! — Sam limpou a garganta. — Auror Potter.

— Sim, sou eu.

Poderia entregar a mesma cortesia, porque Sam sabia que dificilmente alguém não o reconheceria. Até queria, na verdade, porque era um jogador inigualável em sua frente, alguém que não era tão acessível...

Mas não estava sentindo que seria o dia.

— Se puder nos acompanhar até o átrio, Auror Potter, agradeceremos. — O homem que acompanhava McGuillen — e que devia ser o seu agente — tinha um sotaque forte, parecendo vir de algum país do Leste. Provavelmente não fazia ideia de que estava dividindo o elevador com o cara que ajudou a derrotar Voldemort.

E o ex-marido da namorada do seu jogador.

— O senhor me conhece? — perguntou para Sam.

— Ahn, sim. Quem não conhece James Potter, o cara que derrotou Voldemort?

E ex-marido da sua namorada, James completou em sua cabeça.

— Eu não derrotei Voldemort. Não sozinho. — Era chato ter que repetir isso.

— Não é isso o que as pessoas dizem.

— As pessoas estão erradas.

O agente finalmente levantou os olhos e pareceu reconhecer sua presença ali.

— Quem? Você é o... — O agente se virou para Sam, chocado. — ...ele é o...?

— Sim, é ele — Sam o interrompeu em um piscar de olhos. — Quem derrotou Voldemort. Sabe? James Potter, o Auror que derrotou Voldemort. Todos falam dele, todos mesmo. Por isso o conhecemos: por ele ter derrotado Voldemort!

Hm. Aquilo estava soando como se Sam McGuillen não soubesse que James sabia quem era sua namorada e queria que permanecesse assim.

Aquilo poderia ser divertido.

— Como disse antes, não o derrotei sozinho. Tive muita ajuda: amigos, da minha esposa...!

Ex-esposa.

Oh, que correção rápida e acalorada, sr. McGuillen!

— Perdão?! — perguntou inocentemente, contendo o riso.

— Sua ex-esposa, não? Eu, ahm, ouvi falar que é solteiro. — Sam coçou a nuca, claramente desconfortável por quase ter sido pego.

James sorriu.

— Fico lisonjeado, McGuillen, mas apesar de ter conferido meu estado civil, você não faz o meu tipo.

O agente olhava de um para o outro, sem saber se deveria se envolver na conversa.

— Eu não sei o seu estado civil por interesse, Potter.

— Oh, não? Isso é algo também de conhecimento geral? Quem fica fofocando sobre a minha vida assim? Eu sou tão desinteressante.

— Não, é apenas acaso, eu acho. — Sam finalmente desconectou o olhar do seu. — Acho que temos que informar para qual nível devemos ir, não?

Sim, eles tinham. Mas estava ficando divertido agora.

— Normalmente. Eu pensei que a pessoa responsável por enviar o elevador direto para o nível sete, teria encantado para enviá-lo para onde deveria ir depois.

Os dois na sua frente se entreolharam. O agente se mexeu e foi o responsável por enviá-los direto ao átrio.

De repente, o dia estava mais feliz. James cruzou os braços na frente do corpo e se balançou em seus pés, quase cantarolando enquanto sentia o desconforto do jogador mais talentoso dos últimos tempos por estar no elevador com ele.

Quem diria!

Sam lançou alguns olhares em sua direção pelo canto de olho, fazendo James se divertir cada vez mais.

— Você é mais famoso do que eu, mas não sei o seu estado civil. — James recomeçou a conversa. — Pelo interesse no meu, eu diria que está solteiro?

— Eu temo que não — Sam respondeu.

— Ah! O quanto alguns editores do Semanário das Bruxas ficariam felizes em saber dessa novidade... Ou já saiu a informação em algum lugar? Eu costumo ler mais o Profeta Diário e Transfiguração Hoje.

— Ninguém sabe e agradeceríamos se continuasse assim, sr. Potter. — O atarracado começava a ficar um pouco agitado.

— Oh, claro. Não sou conhecido por espalhar fofocas. Porém, se estivessem nesse elevador e dado essa informação a Sirius, um outro Auror e que calha ser o meu melhor amigo, seria diferente.

— Black costuma ser fofoqueiro? — Sam quase gritou, virando-se completamente para ele, alarmado. James teve que segurar o riso novamente. Era tão fácil deixar aquele cara na ponta do precipício.

Nunca imaginaria isso do grande Sam McGuillen. No campo, ele parecia tão centrado, a salvo das inseguranças, tão confiante...

Aparentemente, não é o mesmo para a vida pessoal.

— Conhece Sirius Black? — perguntou, demonstrando choque.

— Ouvi falar — respondeu o homem, virando-se de costas para James quando o nível do átrio finalmente foi anunciado.

Assim que a grade se abriu, ficou claro que a notícia de que Sam estava entre eles havia se espalhado rapidamente, pois antes quem queria apenas pegar o elevador e ir para o seu nível trabalhar, esperavam com ansiedade pelo jogador.

E pelo o que parecia, James teria que ser encarregado da segurança dele. Aquela brincadeira não estava mais engraçada.

Mas trabalho era trabalho e ele fazia o seu muito bem.

— Com licença. — Passou entre Sam e seu agente, saindo do elevador e abrindo espaço. — Se vocês não quiserem pegar Sarapintose, eu recomendo se afastarem! — informou para a multidão.

Aquilo deu o efeito desejado, pois todos se afastaram rapidamente, deixando um corredor largo para que James guiasse o jogador e seu agente pelo local. Enquanto andavam, "sarapintose" era ouvida aos cochichos, como se fosse uma onda.

— Está maluco? Se espalharem que Sam está com Sarapintose, pode perder a vaga no time. Os diretores já começariam a cobrir os gastos para o funeral! — o agente murmurou ao seu lado.

— Ninguém disse que Sam McGuillen está doente. Pode ser muito bem você, não?!

O agente arregalou os olhos enquanto James continuava a guiá-los por entre os olhares curiosos, porém, também temerosos. Muitos deles também pesarosos por não conseguirem um autógrafo com o grande astro.

Grande coisa. Para que um autógrafo? Para guardar um pedaço de pergaminho em uma gaveta e esquecer para sempre? Quem pega um autógrafo e faz algo com ele? Você não come, não leva para sair, não salva a sua vida. É simplesmente um pouco de tinta que foi deslizada pela mão de alguém famoso.

Grandíssima coisa.

Levou a ambos para a chaminé mais afastada de todos, entregando o pequeno caldeirão que continha pó de flu para visitantes.

— Sua casa — o agente informou e logo pegou o pó de flu, partindo para algum lugar desse mundo que Sam McGuillen mora.

O jogador pegou seu montante de pó de flu e se virou para James.

— Obrigado pela ajuda.

— Faz parte do meu trabalho.

— Eu não sabia que Auror-Investigador também tomava conta da segurança de jogadores.

Aquele cara não dificultava a tiração da cara que James poderia fazer com ele.

— A cada vez que abre a boca, McGuillen, eu tenho mais certeza que você tem algum interesse e que andou estudando sobre mim. Não é conhecimento geral a minha posição no Ministério, normalmente eu sou reconhecido por ser apenas um Auror.

O cara deu uma meia revirada de olhos.

— Talvez eu apenas devesse partir...

E assim o jogador se foi, deixando James pensando o quanto Lily, aparentemente, gostava de falar sobre o ex-marido para o atual.

-J-

Chegou no seu escritório e jogou tudo o que tinha em mãos no pequeno sofá, indo direto para a sua mesa.

Ali, um pergaminho sinalizado como urgente lhe aguardava:

"ATIVIDADES SUSPEITAS NA PENÍNSULA BALCÂNICA"

Não era a primeira vez que tinha esse tipo de informação. Há poucos meses, chegou em seus ouvidos que rastros de magia das trevas foram encontradas por lá, porém, nada foi descoberto pela equipe de Aurores da região.

Não ajudava o fato da região estar em uma guerra civil trouxa, o que poderia levar alguns bruxos a aproveitarem a fragilidade da situação.

Pegou o mapa de sua gaveta e o desenrolou em cima da mesa. Naquele momento da história, era difícil dizer qual país era o quê. O interessante daquele mapa era poder consultar todas as informações anteriores que foram escritas com uma pena especial, que seguia as mudanças de fronteiras ou o que quer que fosse.

Na última informação que ele mesmo tinha anotado, a atividade suspeita do começo do ano aconteceu em uma floresta da Albânia, quase fronteira com a Grécia.

Conferiu o pergaminho e, com a pena especial para mapas, escreveu as coordenadas, tendo a localização sendo apontada no mapa. Não era longe da última vez, o que só aumentava a desconfiança de que não era coincidência ou acidente dois acontecimentos das trevas no mesmo lugar.

Por que os Aurores não encontraram nada na última vez? Era apenas um local onde ocorriam reuniões de magia das trevas de tempos em tempos? Ou algo mais específico estava ocorrendo embaixo dos narizes de todos?

— PRONGS!

Levantou o rosto do mapa para encontrar Sirius parado na sua porta.

— O que foi?

— Eu falei tanta asneira, coisa que te faria ficar com os cabelos mais em pé do que o James adolescente tinha, e você nem se mexeu.

— Eu estou tentando entender algumas coisas sobre uma informação que acaba de chegar — continuou, voltando os olhos para o mapa.

— O que é?

— Algo nos balcãs de novo. Estou começando a achar que não são bruxos tentando tirar proveito da situação trouxa do local, pois está vindo com longas pausas. E sempre os mesmos sinais da mesma magia obscura. Como se fosse um...ritual, uma reunião. Tem algo de muito estranho. Estão tentando passar despercebidos, mas não estão tendo muito sucesso.

Seriam bruxos sem experiência ou erros que estavam sendo cometidos?

— Dois Aurores foram mandados para lá ontem depois de uma coruja de Moody. Alguém deve ter achado importante te informar, mas acho que estão trabalhando nisso já.

Se Moody estava nisso, então a situação parecia estar sob controle, mas ficaria de olho. Voltaria naquele mapa nos próximos dias, assim como tentaria reunir mais detalhes dessas excursões de Aurores ingleses para a região.

Largou-se em sua cadeira, pegando alguns outros pergaminhos para continuar o trabalho do dia anterior, quando deixou de lado para correr até Hogwarts e assistir a seleção de Harry.

— Encontrei Sam McGuillen — disse enquanto molhava uma pena para assinar um relatório.

Ouviu Sirius sugar o ar em surpresa.

— Quando?

— Hoje, há poucos minutos.

Pegou outro pergaminho, molhando a tinta novamente e assinando mais um relatório.

— E você deu uma rasteira nele?

James enrugou a testa, mas continuou suas assinaturas.

— Não!

— Lançou um discreto Cuecatius, para ele ficar esperto?

— Também não.

Apesar que teria sido engraçado chegar no átrio do Ministério com Sam McGuillen pendurado pela cueca dentro do elevador.

— Disse que você foi o melhor capitão de Quadribol de Hogwarts, colecionando vários troféus para a Grifinória?

— Tentador, mas não.

— Pediu um autógrafo?

— Menos ainda. — Colocou os pergaminhos assinados de lado e olhou para o amigo. — Fui segurança dele do nível sete até a saída de visitantes.

Sirius soltou uma gargalhada curta e desacreditada.

— Te colocaram como segurança de Sam McGuillen? O atual da sua ex?

— Ninguém me colocou em lugar algum, além de eu mesmo naquele elevador errado, na hora errada. Precisavam de um Auror ali, é só tinha um Auror disponível: eu.

Sua mão alcançou outro pergaminho e assinou.

— E então, você deu um soco nele ali?

— Eu não agredi fisicamente o cara, Sirius. Nem lancei um feitiço para que um braço esquerdo crescesse no lugar do direito. Eu fiz o meu trabalho e é isso.

— Duvido. — James suspirou em resposta. — James Prongs Potter nunca deixaria o atual da Lily Evans passar batido.

— Pois deixei! A menos que...

— Ah, a menos que o quê? — Sirius soava empolgado.

— Eu não pude deixar passar a oportunidade de que ele não sabe que eu sei sobre eles, além de ele não querer que o agente dele comentasse algo. Talvez estivesse com medo de mim.

Sirius soltou uma risada por entre os lábios.

— Prongs, não vamos tão longe assim. McGuillen é um batedor, e o melhor de todos. Você viu o tamanho dos braços dele? Ele te derrubaria em um segundo.

Levantou o rosto para Sirius.

— Isso é você me dando apoio moral, Padfoot?

— Isso sou eu sendo realista. Se vocês dois resolvessem cair em uma briga à moda trouxa, ou seja, sem varinhas, eu estaria falando com você no St. Mungus agora.

— Ele não é tão grande assim. Eu sou mais alto, aliás.

— Mas não mais forte.

Soltou a pena.

Do jeito que Sirius falava, até parecia que estava fora de forma. Não estava. Não tinha braços do tamanho de uma perna, porque não rebatia balaços todos os dias da vida...mas estava com um ótimo físico, obrigado.

Não queria ter braços do tamanho dos de Sam McGuillen também. Os seus eram perfeitos e fortes, por sinal, e combinavam muito mais com todo o resto do seu corpo.

Corpo este, aliás, que Lily sempre elogiou, sempre gostou de tocar e fazer o que queria, na hora que queria.

E por que isso importava mesmo? Pois não importava. Apenas pensou nisso, pois estava sendo comparado com o atual.

— Estou melhor do que você, isso é fato — retrucou. Sirius gargalhou.

— Nos seus sonhos, Potter. — O amigo sentou em sua frente. — Mas e então?

James levantou o olhar para o amigo.

— "E então" o quê?

— Você não deu um soco, nem rasteira, muito menos lançou um feitiço. Parece que brincou um pouco com ele...mas e então?

— Não estou entendendo, o que você quer que eu diga?

— Você sabe o que eu quero que você diga.

— Não, eu não sei. Seja específico.

— Prongs, você sabe!

Sim, ele sabia. Sirius queria ouvi-lo dizer o que sentiu de verdade ao estar na presença do cara. Tiveram essa conversa antes, na época de Hogwarts, quando um dos seus colegas de time saiu com Lily no sexto ano.

Mas parece que tinha que lembrar o seu melhor amigo que ele não era mais um adolescente que tinha sido rejeitado, um ano antes, pela garota que gostava.

— É muito estranho conhecer alguém tão famoso. A gente esquece que eles são apenas pessoas normais, como nós — desconversou.

Sirius bufou, impaciente.

— Você é famoso e posso garantir que não é uma pessoa normal, apenas um pé no saco.

Uma coruja entrou pela porta, carregando um envelope bonito. James estava mais do que acostumado a ter correspondências chegando sem parar em seu escritório, mas aquele não parecia um pergaminho para apenas ser assinado.

O envelope caiu em sua mesa e a coruja partiu sem nem piar.

Não havia remetente, o que achou mais estranho ainda.

" Auror Potter,

Muito obrigado pela sua ajuda mais cedo.

Como agradecimento, aceite esse singelo presente. Eu posso arranjar mais, caso queira.

Espero que aproveite.

McGuillen.

P.s: eu continuo não interessado no seu estado civil, apenas quero agradecer. Traga quem quiser."

Dentro do envelope, havia dois ingressos VIP para um dos primeiros jogos do campeonato inglês.

Na tribuna do jogador. Ou seja, no melhor lugar do estádio!

— Own, e não é que eles estão se tornando amigos?! — Sirius comentou ao ler o pergaminho e ver os ingressos na mão de James. — Qual será a próxima gentileza: você se oferece para ser o segurança dele 24h?

— Isso é inveja? Ciúmes, talvez?

— Pf, você bem que queria, não é? — Sirius desdenhou, olhando para as próprias unhas. — Você não é tão importante assim, Prongs.

— Assim como você. — James deu de ombros e se jogou contra a cadeira. — Porque, aparentemente, ele te conhece. Eu toquei no seu nome e ele parecia bem íntimo.

— Há, quem está com ciúmes agora?

Jogou os dois convites em cima da mesa, mas ainda encarando-os.

— Não estou, assim como você não está. Mas você não me falou nada sobre ele...nunca disse que conheceu o cara e, apesar dos pesares, é uma celebridade do Quadribol. Deveria se gabar, como faria normalmente.

— E você me perguntaria em quais circunstâncias eu conheci o cara.

— Claro que não. — Fez um bico, contrariado. — Como você o conheceu, por falar nisso?

Sirius riu por um momento.

— Eu fui visitar Harry e, por azar, ele estava lá. Imagina a minha cara ao encontrar Sam McGuillen na sala de estar, comendo biscoitinhos de manteiga.

— Você foi sem avisar?

— Não, mas acho que o nosso batedor favorito sim. Lily não o jogaria na sarjeta por aparecer sem aviso, então acabei comendo biscoitinhos de manteiga com ele por uns cinco minutos. Cara gentil.

James não se importava que seu melhor amigo tivesse conhecido e gostado do atual da sua ex. Não era um problema, nunca seria. Só queria ter sido informado antes por questões de logística.

Simples assim.

— Legal — comentou sem empolgação e voltou para os seus pergaminhos.

— Eu também fiz uma investigação completa nele. Cada suspiro dado, cada unha mordida, cada móvel que ele acertou o dedo mindinho desde que nasceu, está na minha sala.

— E qual o veredicto?

— Ele estudou em Uagadou, porque a mãe é da África do Sul. O pai é Irlandês, mas faleceu há alguns anos. Ambos bruxos. Sem irmãos, sem outra família: nada de primos, tios e tias, avôs ou o que seja. A mãe dele vive na Escócia hoje em dia e é sempre visitada por ele. McGuillen não tem conexões estranhas ou suspeitas, com uma vida quase chata. Ficava jogando Quadribol sozinho em casa, rebatendo balaços...por isso ficou tão bom. — Sirius pareceu pensar por um momento. — Acho que é o principal.

— Você conferiu tudo isso por Lily?

— E por Harry. Se vai ter uma pessoa nova na vida dele, melhor conferir, não?

Sim, era melhor. Assim que soube daquele namoro, pensou que deveria investigar o cara. Mas como Sirius estava melado naquela história antes dele, pegou a dianteira.

— Me diz uma coisa: você está entediado? Apesar das coisas estarem mais tranquilas, eu não tive momento algum para conferir sobre o cara desde que eu descobri sobre eles.

— Eu fico de guarda muitas vezes e ler alguns pergaminhos de pesquisa me ajuda a passar o tempo, por isso fico pesquisando coisas aleatórias, como Sam McGuillen ou famílias de crianças de 11 anos que vão entrar em Hogwarts. Já você, estuda as informações que chegam, mapas, provas, comparece às reuniões e interrogatórios, cria e planeja muitas das guardas que eu faço, aliás...

— Você também faz essas coisas.

— Só dos meus casos. — Sirius abanou a mão, querendo deixar isso de lado. — Então eu tenho mais tempo livre do que você.

— Eu tenho algumas guardas para fazer nos próximos dias e semanas. Se quiser me enviar tudo o que tem, assim eu posso matar o tempo também.

Odiava, com todas as suas forças, aquele sorriso infernal de Sirius Black. Aquele que ele dizia, sem abrir a boca, que sabia o que você estava fazendo. Bem, ele estava errado. Sabia que o amigo pensava que ele queria ler todo o dossiê por si, por ciúmes, mas queria ler para saber quem era o cara que esteve e, possivelmente, estará na presença do filho.

Sirius levantou, também de uma maneira que James odiava: como se soubesse que estava certo, mas a outra pessoa não queria admitir.

— Vou começar a mexer a bunda e trabalhar. Tenho alguns vários casos para entregar para alguns Aurores.

— Trabalhar me soa como uma ótima ideia para você, já que parece ter bastante tempo livre para juntar informações sobre alguém com quem você gostou de compartilhar biscoitinhos de manteiga.

Sirius soltou aquela característica risada de um "há" apenas. Aquilo também era irritante.

— Assinar pergaminhos te cai bem, assim como vai cair bem a sua bunda na cadeira daquela tribuna do seu novo amigo.

— Espero que tenha biscoitinhos de manteiga — respondeu.

— Não, Prongs, isso é só entre McGuillen e eu. Vocês podem encontrar o melhor snack que lhes convém.

— Boa ideia, Padfoot. Talvez comeremos muitos amendoins. O quanto eu esperei para dividir um pacote daqueles amendoins caramelizados com alguém...

Sirius era alérgico à amendoins.

— Faça bom proveito, James. Coma até sua barriga explodir.

— Talvez eu traga alguns para você, caso eu me sinta generoso, Sirius. Vou deixá-los em cima da sua mesa.

— E então você verá onde sua bunda vai cair em cima depois disso, Potter.

James riu com vontade.

— Espero que seja relacionado à McGuillen e não você, Black.

O amigo apenas deu as costas e saiu da minúscula sala, deixando James satisfeito.

Pegou um outro pergaminho, pronto para assinar, quando viu uma sombra aparecer na porta.

— Aliás, eu aceito o convite para o jogo — disse Sirius, desaparecendo logo depois.

Poderia até ir atrás dele e continuar aquela discussão, mas todos sabiam que o segundo convite seria dele, então seria inútil.

Infernos! Por esse mero detalhe, Sirius tinha ganhado aquela discussão.

Desta vez.

-J-

Quando sentou no sofá da sua casa no final daquela noite, estava acabado.

Pegou o frango que tinha comprado no caminho e planejava terminá-lo e ir direto para a cama. O dia seguinte seria cheio, com algumas reuniões com dois outros Departamentos do Ministério, além de um caso na fronteira com a Escócia e que precisava da sua atenção.

Prongs?!

A voz vinha da lareira ao seu lado. Ali, via o rosto de Remus.

A preocupação lhe atingiu de imediato.

— O que houve? Harry está bem? Você está bem?

Estamos bem, não se preocupe. Harry jantou e foi para o dormitório há algumas horas. Ele está se divertindo, se enturmando, e soube que está indo bem nas aulas. Eu o terei apenas amanhã. Vou deixá-lo contar mais por carta. Ele me disse que iria enviar para vocês três amanhã, contando um pouco de tudo.

— Eu estava me perguntando o motivo do silêncio dele, mas acho que Hogwarts é muito mais interessante de se explorar do que enviar cartas para as pessoas aqui fora. Não julgo.

Muito mais, convenhamos. Mas vocês ouvirão dele logo, não se preocupe.

— Não ouvimos nada vindo de você também. Como foi o primeiro dia?

Engraçado. Estar de volta como adulto é bem diferente, além de estar sentado na mesa de frente para os alunos, ao invés de ser um deles, possa ser um pouco intimidador no começo. Mas tudo está indo como deveria ser.

— Eu pagaria alguns galeões para ver isso. — Sorriu para o amigo, vendo-o contente. — Mas imagino que não tenha me chamado para falar sobre o seu nervosismo na mesa dos professores.

Não, não chamei. — Remus pareceu ponderar suas próximas palavras, fazendo James deixar o frango de lado e se aprumar no sofá, querendo estar completamente virado para o amigo. — Eu preciso me informar mais, observar mais antes de pular em conclusões erradas...mas... Malfoy parece testar o terreno com Harry.

— Como assim?

Você sabe que, desde que Lucius negou veementemente toda a sua participação como Comensal ao lado de Voldemort anos atrás, sua reputação com muitos do seu antigo grupo caiu drasticamente. Ele não é mais o cara cheio de influência no Ministério ou em qualquer outro lugar, e o seu filho parece sentir isso também em Hogwarts.

— Draco Malfoy está sendo excluído?

Eu não usaria essa palavra, mas pensando em como as coisas eram com Lucius, mesmo ele sendo mais velho do que nós na época de Hogwarts e mal tendo passado tempo com ele nesses corredores, a gente sabe como ele era, como as pessoas o tratavam. Mas não está sendo o mesmo com o filho. — Remus pareceu olhar para trás, assegurando-se de não ser ouvido. — Sirius me pediu para manter um olho no garoto, mas estou começando a achar que ele é quase inofensivo.

— Lucius está vivendo um pouco na penumbra por anos, é verdade, apesar do nariz sempre estar quase tocando o teto. Não ficaria surpreso do filho ser considerado um perdedor.

Bem...a chave da minha frase anterior é "quase inofensivo". Eu não confio nele e, pelo o pouco que vi, tenta se aproximar de Harry, como se o quisesse como amigo.

— Hm, isso não é bom. Tantas outras pessoas para ele se aproximar, então qual motivo o faria se aproximar de Harry? — respondeu ao amigo, mas ao mesmo tempo refletindo.

Se você estiver de acordo comigo, eu prefiro interferir um pouco. Ele está perto demais para a minha tranquilidade, especialmente quando tudo me parece pouco nítido.

Não tinha muito o que pensar sobre aquilo. Um Malfoy sempre seria um Malfoy. E o fato deles não conhecerem Draco Malfoy era preocupante, caso ele estivesse mesmo tentando ser amigo de Harry.

De maneira geral, não deveria se intrometer nisso. Se Harry quisesse fazer as amizades que fossem em Hogwarts, então que fizesse. Mas um Malfoy? O filho de alguém que lutou ao lado de Voldemort? Era arriscado demais.

— Fique de olho, Moony. Interfira caso ache necessário, eu tenho 100% de confiança em você e nos seus julgamentos.

Vou continuar.

— Enquanto isso, vou fazer uma pequena visita para o outro Malfoy. Tenho certeza que Lucius vai adorar me ver, sem aviso prévio, em sua mansão e com um pergaminho me autorizando vasculhar o lugar.

Remus riu.

Eles deveriam saber que dar poder para quem não pode ter, daria esse tipo de coisa. Pelo menos, eu sei que você usa para o bem.

— Para o nosso bem, sem sombra de duvidas.

Apesar da pequena descontração no final da conversa, aquilo não lhe acalmou.

Por que Draco Malfoy estava se aproximando de Harry? Mesmo se fosse inocentemente, não querendo fazer mal, por que escolher Harry como amigo?

Assim que viu aquela cabeleira loira na seleção, sabia que algo poderia surgir, só não esperava tão cedo assim. Talvez fosse para o melhor, podendo cortar o mal pela raiz.

Estava cansado de cortar o mal quando a árvore já estava alta demais. Cometeu esse erro no passado, mas não o faria mais.

Então Lucius e Narcisa Malfoy receberiam uma visita dele o mais rápido possível.


Mais um dia no Ministério. Mas hoje, ele tinha uma missão: encontrar Lucius Malfoy.

Não era raro vê-lo pelos corredores, tentando se enturmar, puxando o saco de pessoas bem próximas do Ministro, querendo sentir-se um pouco mais importante do que estrume de verme. Caso não o visse, iria para o ataque direto: autorização de busca e apreensão. Não buscaria e nem apreenderia nada — a não ser que a coisa estivesse muito na cara —, mas queria estar de frente àquele infeliz e saber quais as razões do seu filho tentar se aproximar de Harry.

Talvez tivesse instruído o filho a tentar amizade com alguém que poderia trazer luzes à família novamente. Harry era tão famoso quanto ele e Lily, mas os dois sempre fizeram o possível para que o filho ficasse mais na retaguarda, afinal, nada aconteceu com ele naquela noite de 1981. Tirando a batalha e o fato de que vazou para o mundo que Voldemort procurava por Harry, o garoto era apenas um garoto, filho de pais que enfrentaram o tal Lord das Trevas 4 vezes, vencendo a última.

Por isso ele não entendia essa vontade repentina de um Malfoy querer se enturmar. Lucius nunca tentou uma aproximação com nenhum deles. Se ele tentasse, depois daquele interrogatório há dez anos, sabia que qualquer um dos marotos riria da cara dele.

Mas hoje, James teria que se aproximar, mesmo tendo escrito na sua testa que não era para darem as mãos e jogarem Snap Explosivos no chão do Ministério.

Aquilo, de certa forma, lhe dava uma certa adrenalina. Sentia falta de um pouco de ação, apesar de não querer que uma nova guerra começasse ou bruxos das trevas resolvessem fazer uma bagunça. Talvez era falta de ser mais Auror e menos Investigador, apesar de gostar bastante da investigação.

— Argh! — Reclamou assim que entrou no átrio.

Na verdade, não era o trabalho o problema. Era tudo. Estava entediado na sua vida em geral, sem nada de novo acontecendo.

Harry havia embarcado há dois dias para Hogwarts e sabia que não passaria tempo com ele até o Natal. O que faria do seu tempo livre, então? Poderia voltar com treinos de Quadribol, ou até mesmo assistir alguns jogos...

O tema Quadribol não estava lhe agradando muito nesses últimos tempos, para ser sincero.

— Auror Potter! — alguém o cumprimentou.

— Olá, James. — Outro trabalhador acenou quando passou correndo por ele.

— Reunião às 11h, Potter.

Por Morgana. Nem tinha chegado perto dos elevadores ainda.

Pegou sua cópia do Profeta Diário e começou a olhar as notícias da primeira página, procurando por algo, seja pelo ponto de vista profissional quanto pelo pessoal: algum ataque bizarro? Movimentos suspeitos? Anúncio de reunião sobre artigos trouxas no fim de semana?

Adorava aquele último. Aprendeu tanto com essas reuniões, ainda mais do que aprendeu em Hogwarts e em Godric's Hollow. Não podia comparar, para ser sincero, pois os nascidos-trouxas que comandavam aquelas reuniões, queriam aprofundar bastante o conhecimento dos bruxos interessados e...

Sua nuca arrepiou e sentiu que estava sendo observado, como se estivesse em uma bolha e seus ouvidos se fechavam. Aquela sensação... sabia que aquela sensação não era por estar sendo observado, ou não por qualquer um. Aconteceu algumas vezes na sua vida, além de não a sentir há muito tempo. Por anos, para ser exato. Seus olhos levantaram, como sendo chamados, para um ponto específico à sua direita.

Parou.

Seu coração disparou.

Lily soltou um rápido sorriso em sua direção. Ela estava parada, conversando com uma senhora que James não fazia ideia de quem era, mas a ruiva não parecia muito empolgada com a conversa. Ela tinha os olhos focados nele enquanto a outra não parava de falar.

Abaixou o jornal e continuou assistindo a cena, enquanto Lily olhava para ele, às vezes para a senhora tagarela, depois para ele de novo.

Deveria...? Deveria salvá-la da conversa? Lily não tirava os olhos dele pois precisava de ajuda para sair dali? Ela era muito educada, às vezes até demais, e costumava ficar presa em conversas chatas na maior parte do tempo da sua vida. E ele a resgatou tantas vezes...

A ruiva crispou os lábios, claramente desconfortável com o "blá blá blá" infinito ao seu lado.

Sim, ela precisava ser resgatada.

Mas tinha que ser ele? De todos ali?

Inferno de Morgana!

Virou em sua direção e quando estava prestes a começar o seu caminho até elas, alguém apareceu ao lado de Lily, sorridente e falante. Mais falante do que a senhora.

Sirius Black.

James parou novamente, rindo. Agora a concorrência seria grande.

O maroto colocou um braço pelo ombro de Lily e não parava de falar, se dirigindo tanto para a ruiva quanto para a senhora.

— Bom dia, Potter — alguém o cumprimentou, mas ele não respondeu, ainda prestando atenção na cena desenrolando-se a alguns bons metros de si.

Que começo de semana bizarro era aquela. Teve um encontro inesperado com Sam McGuillen, alguém que você não esbarrava à toa por aí. Principalmente quando ele estava com a sua ex-esposa.

E ainda teve que assegurar que ele saísse dali em segurança.

Depois, tinha tudo planejado para caçar Malfoy naquele lugar ou em sua mansão, pois o seu filho tinha interesse em Harry.

Agora, Lily. Nunca a viu no Ministério em todos esses anos, nem em lugar algum, mas já podia contar duas vezes em poucos dias. Ainda que uma delas estivesse quase programada, já que ela iria até a plataforma para levar Harry e ele sabia disso.

Não importava. Ela estava à salvo agora com Sirius.

Sorriu um pouco, a cumprimentando, e estava prestes a pegar o seu caminho de volta aos elevadores, quando Lily empertigou-se ao vê-lo partir, fazendo James estancar.

Encararam-se por alguns longos segundos. James tentava entender o que estava acontecendo e Lily parecia apenas desconectada de tudo, mergulhada nos próprios pensamentos.

A senhora se despediu da ruiva e do maroto que conversava, fazendo Sirius virar-se para Lily, finalmente, mas percebendo que ela tinha os olhos focados em outro lugar, virou na direção de sua atenção.

— Merda! — James leu os lábios do amigo.

Os dois o encaravam e James sentiu que deveria finalmente fazer algo: ir até eles.

A cada passo dado, a cada pessoa que desviou, era uma chance de desistir. Não era obrigado a juntar-se, nem qualquer coisa perto disso.

Então por que estava indo? Era idiota?

Sim, era.

Parou na frente dos dois e teve certeza que não deveria ter ido apenas ao olhar para Lily. O sorriso que ela carregava, o olhar tão cheio de vida...

Maldição!

— Eu vejo que achou outra pessoa para te socorrer — disse a primeira coisa que veio à mente.

Pelo canto do olho, viu que Sirius amaldiçoava-se.

— Sim, Sirius veio ao meu socorro. Obrigada, Padfoot. — Lily lançou um rápido olhar agradecido para o amigo.

— De nada, Lils. — Sirius sorriu e olhou para o relógio. — Poxa, olha só. Eu tenho uma reunião em dez minutos, então terei que deixá-los. Eu te mando uma coruja hoje, ruiva. — O maroto se despediu da mulher. — Falo com você depois, Prongs.

Sem esperar qualquer reação, Sirius se afastou. Ele encontrou um outro Auror no caminho e puxou uma conversa, indo em direção aos elevadores.

— Eu imagino que você também esteja ocupado — Lily comentou arrumando a bolsa em seu ombro. — Não vou tomar o seu tempo.

Quando você convive por anos com alguém, você aprende coisas e, normalmente, essas coisas não mudam. O modo como elas mentem pode ser uma delas. Na plataforma, James sabia que ela estava mentindo sobre tudo estar bem no trabalho. E ali, agora, via todo o nervosismo dela. Poderia dizer que era o desconforto em estar na sua frente, de reencontrar o ex marido novamente, mas os olhos dela sempre entregavam muito e, naquele momento, eles estavam gritando desconforto por algo a mais.

— Você está bem? — Foi obrigado a perguntar.

Ela abriu e fechou a boca algumas vezes, antes de rir.

— Sim. Por que a pergunta? — Ela ajeitou a bolsa no ombro novamente.

Exato, por que ele estava perguntando? Não era da sua conta. Lily, mesmo se tivesse um problema naquele segundo, não iria compartilhar com ele. Por que ela compartilharia, certo?

— Desculpe. Eu apenas...esqueça. — Ele um riu um pouco sem graça. — Bom dia, Lily!

Deu as costas com um aceno educado e foi para os elevadores, xingando a si mesmo por ser tão idiota.

Pegou o jornal que estava amarrotado embaixo do braço e tentou voltar sua atenção para as notícias. O que estava indo fazer antes mesmo?

Ah, Lucius Malfoy. Tinha que achar aquele pedaço de estrume em algum lugar.

— Esses elevadores sempre tão cheios, não?! — A voz de Lily se fez presente ao seu lado, fazendo James quase saltar de surpresa. — Eu sempre achei que os bruxos poderiam ter maneiras mais fáceis e inteligentes de se locomoverem dentro de um prédio.

Que diabos...?

— Podemos aparatar — respondeu ele, ainda sem entender o motivo dela estar ali, ao seu lado.

Não era ela que estava toda nervosa e ansiosa há dez segundos, provavelmente por estar com ele?

— Sim, é uma maneira. Então por que ter elevadores?

— Controlar a entrada e saída das pessoas?! — ele disse sem realmente estar na conversa, ainda esperando seus neurônios acordarem e entenderem o que estava acontecendo.

— O que me faz voltar ao ponto: os bruxos poderiam ter algo mais fácil e inteligente do que caixas apertadas, levando pessoas para cima e para baixo, não?

Se ele queria saber se Lily estava bem, ali estava a resposta: não, ela não estava. Ou ele estava achando aquilo tudo muito estranho para encontrar a normalidade naquela conversa.

Mas não foi ele mesmo quem disse que poucas coisas parecem mudar depois de conviver bastante com alguém? Lily, desde sempre, teve uma mente inquieta, curiosa sobre tudo. Ela podia passar longos minutos dissertando sobre o que ela pensava sobre escrever com penas em pergaminhos, algo tão banal, assim como aquele tópico sobre elevadores poder durar o dia todo em sua mente.

A questão ali, na verdade, não era sobre a sanidade dela por conta do tópico estranho, mas por quem ser o remetente de toda a sua inquietação sobre aquilo.

Quantas tardes, noites, madrugadas eles não passaram apenas discutindo e devaneando sobre as coisas aleatórias da vida? Do mundo bruxo, do mundo trouxa...

Havia tanto a se perguntar, tanto a descobrir. A mente inquieta e curiosa dela sempre se deu bem com a mente curiosa e criativa dele. Conversas e risos; beijos e abraços; cochilos e momentos de carinhos sempre os acompanhando, fazendo minutos, horas, passarem como segundos.

Apertou o jornal e o colocou embaixo do braço.

— O que te traz ao Ministério? — perguntou, mudando de assunto. — Pensei que o centro de pesquisa de poções não tivesse ligação alguma com o governo.

— Continua não tendo — ela respondeu, não parecendo ofendida ou desconfortável pela mudança na conversa. — Estou aqui para assuntos pessoais.

Ótimo. Com certeza ela estaria pegando aquele elevador e indo até o nível sete, não? Talvez eles casassem jogadores de Quadribol ali ou qualquer coisa do tipo.

— Claro.

Pegou o jornal novamente, torcendo-o inocentemente.

Começava a se perguntar o motivo dos elevadores agora. Infernos, como demorava. Um trabalhador que estava louco para sentar na sua mesa e colocar as coisas em ordem nem poderia se dar ao luxo de chegar no horário? Custava muito ser um pouco mais rápido?

Assim que um deles parou em sua frente, finalmente, James se virou para ela.

— Tenha um bom dia, Lily.

Sorriu e entrou naquela caixa apertada, pegando o jornal logo em seguida, querendo esquecer que trombou com a ex mulher no átrio do Ministério.

Vejamos, o que tinha de interessante?

— Aposto que você também está questionando a existência dos elevadores.

Levantou os olhos para vê-la parada na lateral do elevador, ao seu lado. Ela não o encarava, apenas assistia todas aquelas pessoas entrando naquele cubículo.

— Honestamente? Sim.

Porque se não fossem os elevadores, os dois não estariam ali, dividindo o mesmo metro quadrado. Se não fossem por eles, James não estaria respirando o perfume doce e leve dela, nem ficaria encarando o tom de vermelho escuro de seus cabelos.

— Olá, Srta. Evans. — Uma mulher na faixa dos cinquenta anos a reconheceu algumas cabeças de distâncias. — Está adiantada, isso é ótimo.

— Se pudermos começar nossa reunião alguns minutos antes, eu agradeceria. — a ruiva respondeu.

James não reconheceu a mulher em questão. Até diria que ela não trabalhava no Ministério ou não ficava muito tempo por ali.

E ela não tinha sotaque britânico.

— Claro, sem problemas.

Era um sotaque americano. James conhecia poucos estrangeiros ali e aquela mulher não era um deles.

Nível três, Departamento de Acidentes e Catástrofes Mágicas, incluindo o Esquadrão de Reversão de Mágicas Acidentais, Central de Obliviação e Comissão de Justificativas Dignas de Trouxas.

A voz anunciando o nível três o sobressaltou. Tinha perdido o nível dois. Maldição!

Algum dia naquela semana ele poderia simplesmente ir direto ao seu escritório? Qual era a dificuldade?

E por que tudo envolvia Lily?

Ficou quieto, remoendo cada pequena decisão que vinha tomando ultimamente. Alguns segundos poderiam ter evitado o seu encontro com Sam McGuillen ontem. Se não tivesse aquele arrepio na nuca que sempre tinha quando Lily o olhava, também passaria batido por sua presença.

Mas era difícil demais ele poder decidir as coisas e ter paz, não é?

Qual seria a próxima? Pegaria o elevador com o resto que sobrou de Voldemort?

Nível seis, Departamento de Transportes Mágicos, que inclui a Autoridade da Rede de Flu, o Controle de Aferição de Vassouras, a Seção de Chaves de Portais e o Centro de Testes de Aparatação.

— Acho que nos vemos por aí, James.

O quê? Ela estava indo para uma reunião neste nível? O que ela, possivelmente, poderia fazer ali? Não tinha ligação alguma com o seu trabalho.

Lily sorriu para ele, um sorriso verdadeiro. Não era por educação e nem falso. Foi um sorriso verdadeiro.

Aquilo fez seu peito pesar, esquecer que estava condenando o mundo por tê-lo colocado ali dentro com ela. Sentiu pena daquele pequeno e patético James dentro de si, que parecia gostar de receber migalhas da ex mulher.

— Será que você terá esse azar? — disse ao vê-la prestes a sair do elevador.

A ruiva se virou para ele.

— Eu não tenho medo do azar. Nem da sorte. Eu gosto de aproveitar tudo o que a vida oferece.

Ela saiu e desapareceu por entre as tantas pessoas, deixando um James desestabilizado para trás.

Merlin, o que estava acontecendo?

O que a sua vida estava oferecendo ali? Uma amizade ou coleguismo com Lily depois de tudo? E ele queria o que estava sendo oferecido?

Ele poderia? Sobreviveria?

Aparentemente, não era uma escolha dele. Se trombasse com Lily Evans novamente, só podia torcer para ser a sorte lhe sorrir e nunca o azar.

Ou nenhum dos dois. Não trombar com Lily seria o melhor.

Isso. Faria isso. Sem mais trombadas com Lily.

Estava decidido.

Sem mais nada com Lily.

Chega.


N/A:

Olá de volta!

Sem prolongar aqui. Para vir o outro mais rápido, já sabem: é ficando em cima de mim hahaha funcionou para este capítulo vir hoje, pelo menos xD

Até a próxima! ;)