Disclaimer: Stranger Things obviamente não me pertence, ele veio da mente incrível dos irmãos Duffer. Também pertence a Netflix.
Perdidos no Tempo
"Samantha nunca imaginou que o ato de colocar margaridas brancas no túmulo de sua avó a levaria direto a uma viagem para o desconhecido. Ela só queria se sentar lá e dividir o peso que a nova amiga parecia carregar, mas ao invés disso viu seu mundo virar de cabeça para baixo em um piscar de olhos.
Ou..
Onde Sam, ao ouvir histórias sobre Billy Hargrove, acaba desencadeando um evento misterioso de viagem no tempo e chega na Hawkins de 1984."
Capítulo 01 - O que estava escrito no seu epitáfio?
Hawkins, Indiana - 1986
Samantha Scott estava exatamente naquele lugar quando a viu pela primeira vez. Entre o verde das árvores e o cinza dos túmulos, os cabelos acobreados lhe chamaram atenção. Sam estava sentada mais ao fundo em um monólogo com a lápide de sua avó contando tudo sobre sua mudança da Carolina do Norte para Indiana, sobre como estava triste por se separar de seus amigos e todas as suas inseguranças acerca da faculdade. Hawkins foi a casa de seus avós por longos anos e ela adorava visitá-los nas férias de verão, conseguia até mesmo lembrar com clareza o cheiro dos biscoitos que vovó Margot fazia, mas isso não significava que era ali onde queria estar.
A garota mais à frente parecia triste enquanto encarava uma lápide inegavelmente nova. A dor da perda nunca foi um sentimento fácil de lidar, porém algo quebrou profundo em seu coração ao observar a imagem dos ombros caídos em um misto de derrota e desalento. Enquanto Sam falava aos montes sobre suas frustrações via um silêncio solitário engolir a menina de cabelos ruivos. Foi exatamente por isso que assim que a viu ir embora naquela manhã de sábado se dirigiu sorrateira até o túmulo agora vazio.
William Hargrove. 1967-1985.
Então entendeu o porquê de tanta solidão. Era uma perda recente e precoce, quem quer que ele fosse tinha sua idade. Tão novo. Sam voltou até o túmulo de sua avó, pegou uma flor do arranjo que tinha levado e depositou na grama em frente a sepultura dele. Quem quer que William Hargrove fosse, merecia um pouco de calor naquela pedra fria.
..
A segunda vez que a viu foi bastante parecida com a primeira, a não ser que dessa vez quase sentiu o coração pular pela boca e os olhos castanhos saltarem da face.
– Quem é você? – ouviu uma voz quase raivosa perguntar enquanto terminava de colocar um pequeno arranjo de margaridas na grama.
O susto tirou um pulo genuíno de suas ações. Sabia que era invasivo colocar flores no túmulo de outras pessoas, mas sabia também que esses pequenos gestos eram importantes para sarar a ferida dos que ficavam. Com a mão no peito e uma expressão de culpa explicou quem era, o que estava fazendo ali e o porquê de seus atos.
– Sou Samantha Scott, mas pode me chamar de Sam. Me mudei para Hawkins na quinta-feira passada – iniciou esperando não tê-la ofendido, ou que o seu falatório a assustasse. – Eu te vi aqui da última vez em que vim visitar o túmulo da minha avó, ele fica logo ali atrás.
– E o que estava fazendo em um túmulo que não era o dela? – a garota perguntou desconfiada.
– Vim trazer flores para ela e achei que pudesse deixar algumas aqui.
A menina ruiva deu de ombros enquanto encarava as flores. Havia um turbilhão de coisas acontecendo no olhar triste que ela sustentava.
– Obrigada – foi a única palavra que ouviu antes de ir em direção a avó. Sem apresentações, sem mais conversas, apenas um agradecimento franco.
..
Duas semanas tinham se passado quando elas se encontraram pela terceira vez. A garota desconhecida já estava sentada sobre a grama quando Sam passou com dois buquês e um envelope.
– Olá – saudou a outra. – Posso colocar?
Recebeu um aceno de cabeça positivo. Podia ver pela visão periférica que ela acompanhava seus movimentos enquanto ajeitava o pequeno arranjo que tinha acabado de comprar.
– Por que margaridas brancas?
Sam não esperava por um diálogo naquela manhã e se surpreendeu quando ouviu o questionamento
– Eram as favoritas da minha avó – respondeu dando de ombro.
Com um sorriso melancólico nos lábios a garota a olhou nos olhos.
– Talvez eu deva trazer uma caixa de Marlboro da próxima vez. Billy adorava aquela porcaria. Mas se quer saber eu gosto de flores então obrigada mais uma vez.
– Disponha. E sobre o Marlboro eu não achei uma má ideia.
Satisfeita com sua ação, se encaminhou para o túmulo de sua avó, mal deu dois passos quando foi parada no meio do caminho.
– Sam – ouviu seu nome através do cemitério vazio. – Sou Maxine Mayfield, Max.
– É um prazer conhecê-la, Max.
Agora em frente a sepultura da avó abriu o envelope que tinha em mãos e passou a ler uma das inúmeras cartas que o avô deixou antes de sua doença se agravar. O alzheimer era verdadeiramente triste.
"Minha querida Margot..."
..
Da quarta vez em diante elas estabeleceram um companheirismo silencioso. Não era amizade, ou cumplicidade. Eram apenas duas pessoas quase estranhas que dividiam as manhãs em um cemitério. Max não era tão mais nova assim do que ela. Seria o quê, três ou quatro anos mais velha que a garota? A idade não importava quando Sam, com o tempo, percebeu o quão solitária, machucada e culpada ela se sentia.
Elas compartilharam histórias pessoais sobre suas vidas. Não foi tão complicado assim contar que perdeu sua avó aos cinco anos de idade e que não muito depois seu avô se entregou a tristeza. Que era por causa dele, por sua doença agravada, que se mudaram para Hawkins onde ele uma vez viveu ao lado da esposa. Mas notou o quão difícil foi para ela contar que Billy era seu meio-irmão, que seus pais haviam se casado os juntando em uma família esquisita e que ele morreu no ano anterior devido a explosão do shopping center da cidade. Como o pai do rapaz não aguentou a situação e de maneira covarde as abandonou à própria sorte.
– Homens – pensou em voz alta quando estava deitada em sua cama.
Entretanto nem todos os homens eram assim. Apenas os idiotas.
Com o tempo descobriu que Max parecia solitária não porque não tinha ninguém, mas sim porque tinha se afastado de todos os que conhecia. Ela não conseguia mais se conectar a eles. Nem ao namorado – seriam eles agora ex? – Lucas Sinclair, ou aos amigos, ou a sua melhor amiga, Eleven, que partiu para a Califórnia. Não que fosse falar isso, mas Eleven parecia um nome exótico demais para se ter. No final ela tinha se fechado em uma espiral interminável de culpa que começava a preocupar Sam.
– Eles não gostavam do Billy. Os meus amigos. Mas também, quem gostaria?
– Tão ruim assim? – perguntou oferecendo um chiclete para ela.
– O cara era um super babaca. Se você já conheceu algum babaca antes, tenho certeza de que o Billy era pior. Ele tinha um mullet com permanente como se fosse o mais novo astro do rock, usava calças apertadas esperando que as meninas pirassem por isso, era grosseiro com as pessoas e agia como se o mundo devesse ser grato por sua existência – Sam tinha certeza de que o odiaria. Aquele tipo de garoto existia aos montes e manter distância era o mais inteligente. – Eu sinto falta dele e nunca achei que diria isso.
Ali estava. Não importa quem seja a pessoa, alguém, de alguma forma, sentirá sua perda. Max sentia a do meio-irmão com ares James Dean em Rebel Without a Case e preferiu confiar isso a uma quase estranha que tinha acabado de chegar à cidade do que em seus amigos.
Sobre Billy, ouviu tanto este nome nos últimos dias que sua curiosidade passou a crescer mais e mais. Qual seria sua real aparência para tantas vezes ouvir que se valia dela? Max dizia que ele tinha o cabelo de um astro de rock. Será que era um mais curto e domesticado como o de Roger Taylor ou longo e selvagem como David Coverdale? Que grande piada.
Agora já tinha perdido a conta de quantas vezes elas tinham se encontrado, chegaram em um nível que já poderiam se considerar amigas. Na maioria das vezes ela tagarelava por ambas, mas em alguns momentos Max deixava transparecer algo do seu interesse. Nos últimos dias estava obcecada por Kate Bush e não tinha nenhum problema nisso, a própria Sam era apaixonada por Wuthering Heights, a questão é que quando ouviu a música a letra entrou por seus ouvidos como uma sentença. Não era apenas uma música, Running Up That Hill era um desejo que puxava a menina para um lugar escuro e sem vida.
– Por que as cartas? – Max perguntou, elas estavam em frente ao túmulo de sua avó.
– É algo do meu avô. Quando a vovó morreu ele disse que ainda não tinha dividido tudo o que queria com ela. Que sempre deixou para falar o que sentia depois até que ela não estava mais lá no outro dia. Foi quando ele começou a escrever.
– E sobre o quê ele escreveu?
– Sobre tudo. No começo sobre as coisas que se arrependia e as que deixou de falar, com o tempo passou a contar histórias do cotidiano – a amiga a encarou com dúvida no olhar, por certo não entendia a lógica em mandar uma carta para alguém morto. – As cartas nunca foram verdadeiramente para a vovó. Ele dizia que sim, mas servia como uma terapia para ele. Pode acreditar, escrever sobre os seus sentimentos é libertador.
..
Depois disso elas ficaram alguns dias sem se encontrarem. Todas as vezes que Sam ia ao cemitério não via sinal de Max, porém se mantinha firme na missão de deixar as margaridas no túmulo de Billy. Em uma dessas vezes até se sentou iniciando uma conversa com a lápide dele. Naquele dia em específico estava atrasada, precisou esperar sua mãe chegar em casa para que pudesse deixar o avô com ela e depois conseguir sair. Em seus fones Klaus Meine cantava sobre um casal que estava separado, mas que para o cara não havia outra garota como aquela. No One Like You ainda era o seu vício mesmo após 4 anos de seu lançamento e provavelmente continuaria sendo por muito mais. Em passos quase saltitantes demais para o lugar em que estava viu a costumeira cabeleira ruiva sentada em frente a lápide do meio-irmão. Abaixou os fones e se aproximou com um sorriso no rosto que logo morreu quando parou em frente a ela.
Os olhos de Max estavam brancos virados para cima. Colocou uma mão em seu ombro e chamou por seu nome, porém nada parecia fazê-la acordar. A sensação de que algo muito ruim aconteceria começou a fazer seu coração bater mais rápido. Um garoto chegou apressado parando ao seu lado.
– O que aconteceu? – ele perguntou desesperado também tentando acordar a menina daquele transe assustador.
– Eu não sei. Cheguei aqui e ela estava assim – Sam o reconheceu da locadora. Ela o tinha visto uma vez trocando um dos cartazes da vidraça do lugar enquanto esperava o pai no carro.
– Max. Max – os dois gritavam em desespero, mas nada do que tentassem conseguia uma resposta.
– Ela precisa de um médico – gritou tentando colocar suas ideias no lugar. Quando tentou sair, o garoto segurou a sua mão.
– Não! – a firmeza em sua voz fez com que ela congelasse no lugar. Como assim não? Ele gritou para outros dois garotos que saíram correndo de um carro próximo e subiram até onde estavam. – Quem é você? Como conhece a Max?
– Sou Samantha. Nós somos amigas.
Aquelas pessoas deveriam ser os amigos que ela tanto falava, uma parte deles ao menos. O trio simplesmente ignorou sua existência enquanto tentavam trazer a menina de volta aos seus sentidos, o cara da locadora gritando para um deles ligar para outras pessoas. Sam, com os olhos já cheios de lágrimas, só conseguia pedir uma resposta da amiga, esperando que ela acordasse.
Aqueles foram os piores minutos da sua vida. O garoto de boné voltou depois de algum tempo, desesperado, com um walkman e várias fitas cassetes esparramando tudo no chão. Ele gritava "Qual a preferida dela? Qual a preferida dela?" deixando todos confusos. Sam e o jovem de jaqueta vermelha pegaram a fita da Kate Bush ao mesmo tempo, inserindo no tocador, mas não houve resultado. "A pilha. Está sem pilha!", alguém gritou em desespero. Os olhos de Max tremiam em suas órbitas. Em um pensamento rápido soltou o próprio walkman do cinto substituindo as fitas e ligando, assim que o fone foi colocado na garota algo mais absurdo ainda aconteceu. Ela estava voando.
O cemitério estava vazio, porém os gritos dos quatro enchiam cada espaço em um eco de desespero.
– Que porra é essa? – perguntou para ninguém em específico. Max levitava a uma boa distância do chão. – Max! Max, não. Por favor.
Tão abrupta quanto subiu ela desceu, os minutos que levaram para acordar pareceram horas. Todos se jogaram no chão, chorosos, ao redor dela. Max repetia: "Eu tô aqui. Eu tô aqui" em uma voz quase falha, como se estivesse tão assustada que todo o ar tivesse escapado dos pulmões.
Naquele final de tarde as apresentações foram feitas e ela conheceu Steve, Lucas e Dustin. Mais do que conhecer os amigos de sua nova amiga, os obrigou a abrirem o bico sobre o quê raios estava acontecendo. Sem alternativa os garotos se revezaram contando tudo sobre um antigo laboratório na cidade que fazia experimentos em crianças, que um destes experimento, Eleven, abriu sem querer um portal com seus poderes para o que chamavam de Mundo Invertido. Sobre as criaturas que já enfrentaram antes vindas desse lugar: Demogorgon, Democão, Devorador de Mentes e agora esse Vecna que colocava suas vítimas em transe antes de assassiná-las como vinha acontecendo. Era ele e não Eddie Munson o responsável pelas mortes na cidade. Que tudo tinha começado há 3 anos quando Will, outro amigo deles, tinha sido sequestrado e desde então suas vidas se resumiam a impedir que os monstros trouxessem o caos para Hawkins.
No começo ficou cética, como os vilões de um jogo de tabuleiro viravam realidade e atacavam pessoas? Parecia ridículo, mas depois do que tinha visto naquela tarde seria ingênua se não acreditasse. A história terminou de ser escancarada quando Sam deu sinais de que iria surtar com tanta informação. Max se sentou com ela, segurando sua mão finalmente contou a verdade sobre como Billy tinha morrido em uma batalha no shopping Starcourt protegendo Eleven do Devorador de Mentes e como aquilo foi usado por Vecna para colocá-la no transe.
Naquela noite, quando chegou em casa, tinha tanto o que pensar que sua cabeça parecia prestes a explodir. Como seus pais saíram para jantar fora, Sam se sentou com o avô na sala e desabafou antes que surtasse de verdade. Para ser sincera, se tratava de um monólogo, mas foi libertador poder contar para alguém tudo o que sabia e como o trauma de Max a tinha feito prisioneira. O homem idoso apenas a encarava enquanto soltava dez palavras por segundo, o estágio avançado de sua doença degenerativa não o permitia mais se comunicar ou compreender.
Quando se mudou para Hawkins ouviu diversas histórias sobre a cidade ser amaldiçoada. Crianças desaparecendo, jovens mortos por descuido de grandes empresas e o desastre do shopping Starcourt foram as maiores delas. Sam acreditava se tratar de um exagero de cidade pequena, de uma infeliz coincidência entre os acontecimentos, até que há poucos dias uma colegial foi encontrada morta seguida de um jovem jornalista. Agora sabia a verdade sobre cada um dos casos.
– Isso é tão triste. Por causa dessa droga que o governo fez eles não puderam ter uma vida normal – enxugou uma lágrima que cismava em escorrer. – O que mais me dói é saber que ainda há risco, que o Vecna só está esperando um passo em falso. Ela vai fazer o quê? Passar o resto da vida ouvindo Kate Bush? Eu juro que se eu pudesse... se eu pudesse…
O que ela faria? Mataria uma criatura que te ataca mentalmente? Mais parecia um filme de terror, como se Freddy Krueger virasse realidade.
– Gostaria que o Billy não tivesse morrido. Se nada disso tivesse acontecido, Max não teria um trauma e não precisaria passar por essa situação. Se pudesse eu o traria de volta apenas para que ela não sofresse mais. Eu traria Billy.
Assim que o avô dormiu ela foi para o quarto e se jogou na cama ainda usando a mesma roupa daquela tarde. Precisava de um banho urgente. De cabeça para baixo jogou as pernas na cabeceira encarando os tênis. Achou que demoraria para dormir depois de tantos acontecimentos, precisava apenas de alguns minutos de silêncio total para reorganizar os pensamentos, mas em um momento de distração fechou os olhos adormecendo como um passe de mágica. Quando acordou no dia seguinte sentiu uma claridade irritante. Será que tinha esquecido as cortinas abertas? Assim que abriu os olhos sua visão rodou numa mistura de céu noturno e o prata da lua. Ela se sentou sentindo folhas secas sob suas mãos. Em um susto olhou ao redor vendo árvores por todos os lados.
– O quê...?
Tentou se beliscar para ter certeza de que não estava sonhando, a dor que sentiu sendo bastante real. Não sabia o que tinha acontecido, mas tinha acabado de acordar no meio de uma floresta depois de deitar em sua cama. No que ela tinha se metido?
..
Hello guys!
É isso. A estória terá em média de 9 a 10 capítulos, boa parte já está finalizada então só vou precisar me programar para postar e escrever os que faltam. Aproveito para lembrar que revisei bem rapidinho, então é provável que haja vários erros. Desculpa por isso.
O que acharam? Vale a pena acompanhar? Quais as expectativas de vocês? Me digam aqui embaixo.
See ya!
