CAPÍTULO VIII
Era uma manhã nublada. O céu cinzento combinava com a aura de Elena: pesada. Ela olhava pela janela da pequena biblioteca da pensão para o céu repleto de nuvens. A poucos minutos terminara de organizar as contas domésticas e chegara à mesma conclusão de sempre: precisava economizar. Teria de cortar mais despesas.
Damon não era previdente. Ele gostava do luxo, da vida boa, de ter do bom e do melhor. Elena era quem punha rédeas aos gastos do marido. Damon sempre elogiara sua capacidade de administrar a casa sem gastar muito, negociando com comerciantes, supervisionando os empregados e a cozinha, solicitando reduções nos preços de algumas contas e contratos… Mas era difícil manter a pensão e as terras, quando se gastava mais do que se recebia.
A verdade era que Elena temia as dívidas deixadas pelo marido, dívidas que ela desconhecia. E como se não bastasse, temia sua nova condição, de viúva. Não que temesse ficar sozinha, solitária. Seu temor tinha um nome: Klaus, e ela não conseguia ignorar o medo que se tinha alojado em seu estômago ao pensar que ele estava vindo atrás dela.
Elena examinou os retratos que levava ocultos em um camafeu, preso a uma corrente em seu pescoço. Os rostos haviam sido retratados há vinte e um anos, pouco depois do casamento. O do pai era suave e belo, emoldurado por abundantes cabelos loiros. Sua mãe parecia serena, com tranças negras e cintilantes, que criavam o contorno perfeito para o rosto delicado e alvo, como o dela. Os olhos de ambos eram brilhantes e alertas, de um azul céu. Sua mãe era vinte anos mais jovem que o marido.
Sempre que olhava para a imagem da mãe que jamais conhecera, Elena compreendia o sofrimento do homem que a adorara e perdera. Entendia o que causara o ressentimento do pai. Sua mãe perdera a vida quando a trouxe ao mundo, e o poderoso John Gilbert jamais a perdoara por isso.
Elena crescera sozinha e triste como se fosse um fardo indesejável, não uma filha querida. Seu pai a enviou para o irmão e a cunhada, Grayson e Mirada, que se esforçaram em promover um lar, uma família para Elena. Eles tiveram Jeremy um ano depois e Elena fora feliz por cinco anos.
Por uma fatalidade, aqueles que ela pensara serem seus pais, morreram em um acidente de carruagem, deixando Elena e Jeremy órfãos. Tia Jenna, irmã de Miranda, se dedicou a ocupar o lugar vazio deixado pelos pais que Elena e Jeremy perderam.
Quando mais velha, Elena tomou ciência de suas verdadeiras origens e passou a admirar a coragem da tia, uma mulher solteira e sem recursos que dependia da caridade do irmão de seu cunhado para sobreviver.
John retornou para Mystic Falls quando perdeu todo seu dinheiro. Jenna o acolheu, ele já estava doente. Sua tia sempre repreendeu John Gilbert por deixar a única filha de lado e dedicar toda a sua atenção ao sobrinho, Jeremy. Mas John sempre a ignorava. Com o passar do tempo, Elena percebeu os sentimentos de seu pai, o quanto era preterida e desprezada, e que Jeremy era o filho que John nunca teve, aquele a quem o pai se dedicava. Ela nunca se sentiu parte de uma família depois da morte de seus pais adotivos, seus tios de sangue. Embora ela cuidasse e respeitasse o pai, não o amava. Seu amor era dedicado ao irmão, Jeremy, e Jenna, que nem era sua tia de sangue, mas quem Elena tinha como uma segunda mãe.
Elena concentrou-se novamente nos rostos dos pais. Um suspiro escapou de seu peito quando ela se lembrou da fraqueza e da demência do pai. O sofrimento ainda não terminara. Seu pai nunca se recuperara completamente da agressão sofrida, o esfaqueamento por um vampiro, e com o passar do tempo, sua mente fora afetada. John Gilbert estava definhando e a demência se instalando.
— Elena.
Elena se assustou quando seu cunhado a chamara.
— Estou voltando para casa. Amanhã virei com Caroline.
— Obrigada Stefan, mas não é necessário. Vocês precisam tomar conta da escola e têm sua própria casa, façam isso. Eu estou bem.
Stefan a encarou, Elena sabia que ele não acreditava nela.
— Juro que estou bem.
— Eu sei que sim, mas é de Klaus que temos medo. Não queremos deixá-la aqui sozinha...
— Estou protegida, Bonnie lançou um feitiço.
— Apenas para a casa. Se Klaus vier aqui e a forçar a sair?
— Bem, eu tentarei barganhar com ele. Ele precisa de mim viva para seu propósito.
— Não quero arriscar, e não fará diferença em nossas vidas.
— Stefan, eu vou me cuidar. Agora eu quero que você se cuide também, assim como Caroline. Fiquem alertas e atentos. Temo que Klaus queiram feri-los para me fazer ir até ele, como aconteceu com Damon.
Elena viu a dor nos olhos do cunhado.
— Podemos cuidar da escola e de você. Mudar para cá é a melhor opção para nós agora. Vamos alugar nossa casa e assim teremos mais uma renda para pagar pelo investimento na escola. Além disso ficaremos com você e isso é mais seguro.
— Caroline...
— Está mais do que feliz com este arranjo. Ela quer ficar aqui com você. Bonnie e Jeremy também ficarão por mais uns dias. Mas Pense nisso como uma grande reunião, uma grande família.
— Eu não sei como agradecer a bondade de vocês... Eu não quero que renunciem a suas vidas por mim...
— Não estamos fazendo isso, Elena. Estamos cuidando uns dos outros. Pense assim. A pensão é muito grande, estando todos nós aqui, dividimos as despesas, assim fica mais fácil. Também poderei ajudá-la com as propriedades da família.
Elena sabia que ele estava certo, e no fundo estava feliz com o arranjo. Se sentiria muito só na grande pensão se ficasse apenas com Jenna e seu pai. Apenas não conseguia se sentir em paz com a ameaça de Klaus à sua família e seus amigos. Quem estava perto dela se tornava um obstáculo para ele, e assim, um alvo. Elena não queria perder mais ninguém. Damon fora uma vítima. Klaus o atacara e fizera com que um lobisomem o mordesse, isso causou a morte de Damon.
— Não quero carregar a culpa por mais mortes. — Elena lacrimejou.
— Ei, você não é culpada de nada. — Stefan caminhou até ela e a abraçou. — Nós a amamos Elena, e por isso estamos aqui. Somos seus amigos, sua família. Você não vai nos impedir de protegê-la e cuidar de você.
— Eu só... - Elena não conseguiu conter as lágrimas.
— Não chore, só queremos vê-la bem e feliz.
Stefan a abraçou e ela se agarrou ao cunhado. Era impossível ser feliz, ela pensou. Sofria com a saúde de seu pai, e pela morte de Damon, além dos sofrimentos de toda a sua vida. Todas as manhãs agradecia pela vida, sua e de seus entes queridos. Todas as tardes, visitava o cemitério, aqueles que partiram. Todas as noites chorava de tristeza e medo. Era um ciclo.
