Existe uma certa hierarquização no seu clã, não existia um chefe ou um líder que os liderava, eles coexistiam um com o outro perfeitamente a medida do possível. A hierarquização funcionava em forma de quanto respeito e perigo alguém do clã representava. Como todo o distrito vermelho foi transformado em um complexo e ao redor dele foram construídos os estabelecimentos de negócio, ele era como uma pequena vila dentro de Konoha.
Tinha supermercados, padarias, lojas, bordéis e muitos outros, acompanhado pelo grande número de pessoas que moravam nele. Sakura tinha esquecido como existia tanta gente, caminhando pelas ruas do complexo de seu clã, agora ela é forçada a lembrar.
Principalmente, quando todos os olhos estão em sua pessoa, eles sabem que ela matou seus pais e o motivo, caso contrário eles a teriam matado por machucar um dos seus. Eles a olham com certo respeito e é com esse respeito que Sakura descobre que está subindo na hierarquia de seu clã.
Contudo, apenas o respeito não vai mantê-la viva nesse mundo. Seus pés param diante do bordel mais luxuoso e grande do lugar, ela entra com a cabeça erguida e se dirige ao escritório que antes pertencia a seus pais, mas agora é dela, a filha que tirou a vida deles.
Sakura sente como se os fantasmas de seus pais estivessem em suas costas, seguindo e observando cada passo que ela dava daqui para frente, como se dissessem que ela teria que valer o sangue que derramou deles.
A bela mulher de pele escura e olhos verdes, Kyoko era seu nome, já estava em pé ao lado da única mesa que ocupava o lugar.
- Bem vinda, ojou-chan - Kyoko tinha um sorriso sereno em seu rosto e se curvou diante a criança na sala.
Sakura não respondeu, sabia o que significava. Ela caminhou em direção a mesa e se sentou na grande cadeira, só depois disso é que ela respondeu.
- Você vai trabalhar para mim ? - Sakura questionou a mulher, nunca desviando seus olhos esmeraldas.
- Não apenas trabalhar, também vou servi-la, ojou-sama.
Sakura avaliou e sabia em seu instinto que poderia confiar nela, o clã era uma família, independente de como o relacionamento de todos era formado. Ela assentiu e deu sua primeira ordem, como também anunciou uma decisão que estava pensando há algum tempo.
- Você será meu braço direito nos negócios e vou me matricular na academia de Konoha, para me tornar uma shinobi.
Kyoko apenas sorriu um pouco mais e seus olhos brilhavam para a criança com desejo de poder. Ela não se enganou com a pessoa que decidiu seguir. A criança será a mudança que seu clã precisa para se tornar mais poderoso e unido como uma verdadeira família dentro de Konoha.
As crianças brincavam tranquilamente em frente a academia, despreocupadas e alegres em seus grupos. Sakura observou os grupos já estabelecidos, analisando as posições de poder estabelecidas. Crianças de clãs aliados juntas, crianças civis normais, crianças do mesmo clã e os solitários iguais a ela sozinhos e separados, que conscientemente eram do clã Haruno, tirando um menino loiro balançando debaixo de uma árvore.
Ela podia entender porque as crianças Harunos se mantiveram isoladas. Não era preciso ser um gênio para descobrir um dos dois motivos. O primeiro, sendo que eles não gostam de interagir um com o outro, mas mantiveram respeito e acenavam em reconhecimento. O segundo motivo, seria que seu clã não era bem visto entre o resto de Konoha.
No Clã Haruno, existiam poucos shinobis, um número que não se comparava à mesma quantidade dos outros clãs, mas todos eram conhecidos por serem violentos, astutos, brutais e sanguinários. Não é uma boa reputação para os pais deixarem seus filhos perto de uma criança Haruno.
Aviso que virou um ditado não dito.
Sakura não se importava completamente, ela nunca estava sozinha, sendo que Inner era uma presença constante em sua vida. Ela não se dignou a se apresentar quando o instrutor chamou aluno por aluno em frente a sala, o professor logo a ignorou quando viu de que clã ela fazia parte.
Sua turma era inteiramente feita de crianças civis e uma criança Haruno, sendo Sakura. A academia não era difícil, mas o sistema que foi construído para beneficiar as crianças de clãs e não crianças como ela e as civis, dificultava muito.
Todo o material era composto com assuntos que eram desconhecidos para crianças civis e os professores não ajudavam dando algum material para auxiliar. A parte física também não era boa, os professores não explicam como realizar katas ou alguns alongamentos adequados para crianças iniciantes. Eles sabiam que a maioria das crianças civis iriam desistir ou se formariam genis pelo resto da vida, não valia o tempo deles. Sakura pergunta se eles nunca pensaram que era pela desigualdade e abandono da educação certa, que isso se transformou em uma realidade em suas mentes.
Foi preciso os primeiros meses para Sakura aprender que se não encontrar outro meio de progredir, ficaria presa com habilidades medíocres que a levariam à morte em um campo de batalha. Ela não poderia contar com o seu instrutor de turma e nem mesmo os livros da biblioteca, esses que eram restringidos e com pouco conteúdo permitido para uma criança civil sem afiliação a um clã importante de Konoha.
Então ela fez o que um Haruno sempre faz quando precisa de ajuda, pede orientação a outro de seu clã. No meio de seu grande escritório, analisando alguns papéis, Sakura se dirigiu a mulher ao seu lado, a mesma que sempre parecia ter respostas para suas perguntas.
- Kyoko.
- Sim, ojou-sama.
- Preciso aprender os caminhos da vida shinobi que a academia não se dedica a ensinar para crianças com meus status de civil e Haruno.
Kyoko observou atentamente a criança à sua frente. A mesma a surpreendeu quando em poucos meses conseguiu entender como funcionam os negócios de seus pais e fazia planos para melhorá-los e mudar alguns, os bordéis sendo um deles.
A criança era mais inteligente do que ela deu crédito inicialmente, não é uma surpresa que ela tenha achado falhas no sistema da academia. Uma pessoa veio à mente quando ela pensou em algum Haruno que poderia ensinar a vida de um shinobi.
- Não se preocupe, tenho alguém que teria o prazer de apresentar as artes do mundo shinobi para ojou-sama - Kyoko respondeu com uma inclinação de cabeça. Um sorriso mais predatório surgindo em seu rosto.
Sakura tinha a leve impressão que a escuridão que crescia dentro dela iria se aprofundar à medida que ela infiltrou-se mais no sistema que constitui seu próprio clã. Porém, apesar de ter essa noção, não vai se deixar ser dominada por ninguém.
Eu sempre estarei aqui para impedir que você caia na escuridão, outer.
Sakura sentiu sua mente se acalmar com a declaração de Inner. Sim, Sakura nunca está sozinha para enfrentar o que o mundo jogue contra ela.
Seu corpo doía ao caminhar em direção a academia, Kyoko arrumou um dos shinobis de seu clã para ajudá-la a não ficar para trás. O mesmo homem que se livrou dos corpos de seus pais. Embora tenha sido sua ideia, seu corpo e mente não estavam muito felizes com as conseguencias do treinamento (tortura) que eram infrigidos quase todos os dias.
Muitas vezes pensou em desistir, mas um fogo crescente em seu peito e a voz de Inner em sua cabeça a impediram de cair perante aos ensinamentos do homem que a obrigou a chamá-lo de tio, como se fossem muito íntimos do que realmente eram.
Ela parou de frente a academia, seu corpo doía e estava com sono depois de trabalhar tanto no escritório. Sakura iria seguir seu caminho até sua sala, esperar sentada era mais tentador do que em pé, mas um grito de dor chamou sua atenção.
Vinha atrás do bosque que ficava perto da academia e onde ela estava. Sakura vem de um clã que é conhecido por não se importar com o que acontece com outras pessoas ou interferir em problemas alheios. Mas o som de choro de uma criança a deixava curiosa.
Ela sabe que pode se arrepender, mas não custa nada dar uma olhada, certo ?
Claro, é só uma olhadinha. Se for uma criança sendo intimidada é só ignorar e ir embora.
Inner estar certa, Harunos não se intrometem nos problemas dos outros. Quando Sakura se esgueirou no bosque mais a fundo, ela teve a cena degradante para assistir. Tinha cinco crianças mais velhas chutando uma criança encolhida no meio do círculo formado por eles. Era ela que estava chorando, não era para menos, seu corpo estava coberto de feridas e sangue. Nada que seria risco de vida, mas o suficiente para ir mancando para casa.
Sakura apenas assistiu a cena e esperou que algo diferente acontecesse, ela tinha o sentimento que o garoto espancado dava a sensação estranha de uma fera enjaulada. Contudo, um dos meninos notou que eles tinham companhia e avisou os outros.
Eles observaram a criança de casaco grande cobrindo parte de suas feições e lembraram que era a nova criança do selvagem clã Haruno. Eles olharam um para o outro, todas as cinco crianças estudavam na mesma sala que a criança Haruno. Eles não eram idiotas para provocar um, embora eles sejam conhecidos e vistos sozinhos e isolados, era de conhecimento comum que se tocar em um, é provocar todos os outros.
Um dos meninos se colocou em frente ao grupo, se portando como o líder. Tinha cabelo castanho e olhos da mesma cor, cheios de arrogância e certo medo. Sua voz era firme quando falava com Sakura.
- Estamos apenas brincando com a escória da vila, você quer se juntar ?
A pergunta ficou presa no ar, a criança recém chegada não deu atenção aos pirralhos que fingiam não estar com certa quantidade de medo dela. Sakura estava prestando atenção na criança ferida no chão, era o garoto loiro que sempre ficava sozinho debaixo da árvore. Ele não levantou a cabeça em nenhum segundo e continuou chorando baixinho, talvez esperando que Sakura também se juntasse aos outros.
Nosso palpite estava certo, era apenas uma criança sendo espancada. Vamos embora.
Hun, Inner tinha razão. Que decepcionante, ela já estava planejando ir embora sem oferecer ajuda ou uma resposta à proposta deles. Porém, o grupo de crianças interpretou o silêncio como arrogância e ficaram irritados. Eles olharam um para o outro e decidiram que iriam espancar mais uma escória da vila.
- Imaginei que uma escória não iria prejudicar outra. Afinal, meu pai diz que os Harunos são apenas prostitutas e vagabundos, um clã que não passa de lixo - O líder do grupo se aproximou mais da criança e soltou palavras mais venenosas - Aposto que vocês comem seu próprio lixo e matam cachorros para se divertir naquele lixeiro abandonado que chamam de complexo.
Um silêncio sombrio tomou conta do lugar, sendo pertubado pelas risadas das crianças que zombavam de seu clã.
Acabe com eles, outer. Esses vermes insultaram nossa família.
Sakura tinha planejado ignorar tudo, virar e ir embora. Mas isso foi antes que o garoto arrogante abrisse a boca. Ninguém critica seu clã na sua frente e sai impune, muito menos esses pirralhos.
O lugar voltou a ficar silencioso, mas pertubado outra vez, só que pela voz feminina e fria da criança Haruno.
- No meu clã, temos uma regra que não nos intrometemos nos problemas dos outros - Sakura pronunciou, sua voz saia mais fria a cada palavra e ela podia ver as crianças dando passos para trás - Eu tinha planejado ir embora tranquilamente, mas agora, estou com um pouco de vontade de me exercitar antes das aulas começarem. Fico feliz que se candidataram para me ajudar nessa questão.
O bosque começou a encher-se de uma pressão sufocante, sem que ninguém percebesse, Sakura puxou o garoto que proferiu aquelas palavras e deu um chute forte em sua barriga. O garoto se dobrou de dor e um pouco de sangue saiu de sua boca. Mas não acabou por aí, antes que os outros acordarem de seu estupor, ela agarrou um e deu um soco que o mandou voando direto para o chão. Sakura não parou por isso, ela teve certeza de espancar cada um até que eles correram chorando e sangrando.
No final, Sakura olhou para a criança que continuava no chão tremendo, ela se aproximou lentamente para não assustá-la ainda mais. Ele levantou a cabeça no instante em que seus pés pararam em sua frente. Sakura nunca tinha visto olhos azuis tão bonitos como esses, lembrava o azul do céu acima de sua cabeça. Lindos e brilhantes. Pena que estavam cobertos de medo e uma certa pitada de solidão. A voz do garoto era fraca quando pronunciou a pergunta que estava entalada em sua garganta.
- V-você…vai… me bater t-também ?
- Não, não vale meu tempo ou esforço. Não bati neles para te proteger, foi exclusivamente por terem insultado minha família.
O garoto ficou calado apenas por alguns segundos, logo um grande sorriso iluminou seu rosto e seus olhos assumiram um brilho animado. Não havia mais lágrimas. Ele lembrava o sol de tão radiante depois de uma chuva.
- Isso foi incrível! Você apenas os derrotou como se não fosse nada e …
O garoto não calava a boca e Sakura estava muito cansada para pedir para ele parar. Ah, ela se sentou e tirou a mochila de suas costas, pegou umas bandagens, pomada e um lenço. Quando se aproximou do garoto tagarela para cuidar de suas feridas, ele se afastou assustado pelo seu toque.
- O que está fazendo ?
- Cuidando de seus ferimentos antes das aulas começarem.
O garoto a observou atentamente, como se estivesse analisando qualquer mentira ou maldade em suas palavras. Sakura esperou ele fazer isso, não era diferente de muitos gatos vadios que andavam pelo distrito. O garoto finalmente assentiu e a observou cuidar de cada uma de suas feridas com delicadeza e gentileza que contradiziam seu comportamento frio.
Quando Sakura terminou de cuidar dos ferimentos do garoto que a olhava com um sorriso tímido no rosto, percebeu que as aulas já devem ter começado faz algum tempo, ela suspirou com isso e arrumou suas coisas para voltar para casa, ela tinha muito trabalho para fazer ainda. Foi parada em suas ações ao ouvir a voz do garoto na sua frente.
- Você já vai embora ?
- Sim, mas vou para casa. As aulas já devem ter começado e não to com vontade de frequentar elas - Sakura respondeu se levantando para ir, mas uma mão em seu pulso a impediu de ir mais longe.
- Já que você n-não vai assistir as aulas… p-podemos…brincar no parque… j-juntos ?
Sakura percebeu a hesitação na voz, o tremor e o medo de rejeição.
Contudo, ela também percebeu os olhos cheios de esperança que a fitava atentamente, esperando sua resposta. Sakura sabe que deve recusar, seu corpo está todo dolorido do treinamento e ela não dormiu direito nos últimos dias, atolada em papelada. Mas, algo dentro dela não queria abandonar essa criança. Ah, se um Haruno for interagir com alguém de fora do clã, tem que ser sério. Sakura olhou novamente para o garoto e o analisou. Hun, não deve ser um problema, ele não tem amigos e isso cai bem com ela.
Em um movimento lento, Sakura tirou a mão de seu pulso e puxou seu capuz que cobria parte de suas feições.
- Sou Sakura Haruno.
O garoto olhou fascinado para ela e logo um enorme sorriso surgiu em seu rosto.
- Meu nome é Naruto Uzumaki.
Os anbus escondidos nas sombras das árvores, observaram a interação da criança jinchuuriki e da garota Haruno. Suas ordens eram claras, não podiam se mostrar ou impedir qualquer agressão a criança loira, apenas se sua vida estivesse em risco. Eles já tinham se acostumado a ver a realidade sofrida do garoto e a violência que recebia todos os dias, seja das crianças da academia ou do orfanato, ou os civis e shinobis que tem grande ódio pela criança.
Quando a garota Haruno entrou no bosque, eles pensaram que ela iria ignorar ou espancar todas as outras crianças para se divertir. Não seria uma surpresa, eles tem uns poucos Harunos nas fileiras dos anbus, mas todos eram conhecidos por sua violência, sede de sangue e astúcia. Não eram indivíduos que o resto deles gostavam de interagir.
Quando o garoto civil disse aquelas palavras sobre o clã da garota, os anbus sabiam que iriam assistir uma cena de violência. Não estavam enganados, a garota os espancou até tirar sangue e as crianças fugirem chorando e ensanguentadas. O Anbu com máscara de cão observou se a garota iria machucar o seu protegido. Ficou surpreso quando ela cuidou de suas feridas e aceitou o pedido de brincar com Naruto.
O anbu conhecia Naruto muito bem, viu o olhar fascinado do garoto quando a criança Haruno tirou o capuz e expôs seu rosto e cabelo. Uma aparência bem exótica e única, mas foi o cabelo dela que fez ele e os outros ficarem rígidos.
Eles sabem que o clã Haruno também é conhecido por sua variedade de cores de cabelos e aparência exótica, tendo alguns com cabelo rosa, mas são alguns desses que fazem parte da anbu e tem um reputação de serem brutais, sanguinários e verdadeiras feras em missões que os deixam inquietos.
A imagem de gêmeos com cabelos rosa de um tom mais claro e um homem do mesmo tom escuro, surgiu na mente do Anbu com máscara de cão. Ele tinha vontade de tirar Naruto de perto da garota, mas ele viu como Naruto estava rindo e sorrindo enquanto brincava toda a tarde com a garota que voltou a cobrir seu rosto com o capuz.
Ele vai ter que avisar a Minato para ficar de olho atento em Naruto ou deixar as coisas acontecerem naturalmente. Ele não se importa de onde vem a garota, enquanto ela não machucar Naruto, ele ficará em seu canto e não irá se envolver.
