Spider estava se acostumando a ter o próprio quarto agora, e ter uma nova casa, por consequência. Abrindo os olhos, ele acordou e se sentou, reunindo as energias para mais um dia.
Ele estranhou não encontrar o pai na cabana, novamente, só Varang e ele ali, o que o deixou um tanto acanhado de repente.
-Bom dia, meu menino - ela desejou - venha, se junte a mim.
-Bom dia - ele disse depois de um bocejo, sentando-se ao lado dela.
Um pouco mais relaxado, Spider pegou um pedaço das frutas que estavam ali, se alimentando novamente, com certa dificuldade por passar o alimento por debaixo de sua máscara.
-Você não pode retirar a estrutura do seu rosto, não é mesmo? - Varang questionou, sentindo um pouco de pena dele.
-Ah isso aqui? - ele chegou a bater um dedo indicador no vidro da máscara - é, são as vantagens de ser um humano em Pandora, eu não consigo respirar o ar daqui, é mortal pra mim.
-Eu entendo - ela assentiu - lembro de ver pessoas do céu usando algo assim.
-Eu achei que era o primeiro humano que vocês viam - ele cruzou os braços, intrigado.
-Pessoalmente, sim - ela confirmou - eu tive visões pela mente de seu pai, por tsaheylu.
-Entendi - Spider se segurou para não fazer outra careta, pensando na intimidade deles - bom, você deve ter visto tudo que ele fez.
-Vi, e foram justamente essas visões que me fizeram enxergar o motivo da dor e do arrependimento dele - ela explicou com paciência - e conhecendo você agora, é o que me faz entender sua revolta.
-Eu acho que não estou mais revoltado assim - Spider resolveu ser um pouco mais sincero e expor seus sentimentos - mas é difícil de esquecer.
-Lembrar é importante, para não cometer os mesmos erros outra vez - Varang aconselhou.
-Vou me lembrar disso - ele sorriu para ela - e você? Está bem? Digo, você e a minha... irmã?
-Estamos bem, obrigada por perguntar - Varang acariciou o próprio ventre, sorrindo.
-Se precisar de ajuda com alguma coisa, pode me pedir - ele ofereceu, gentilmente.
-Muito obrigada, Spider - ela agradeceu - na verdade, eu gostaria de te pedir uma coisa, mas não tem a ver com minhas condições físicas.
-O que é? - ele ficou curioso.
-Convoquei toda a tribo para uma celebração hoje, em sua homenagem - ela avisou.
-Tipo uma festa enorme? Obrigado, mas não precisava - o menino ficou um tanto constrangido.
-Imagino que esteja pensando em outro tipo de festa - Varang chegou a rir - mas essa serve para apresentá-lo ao clã, como um aliado, como membro da família da olo'eyktan.
-Entendi, ainda assim é bastante importante - ele sentiu empolgação surgir dentro dele, estaria no centro de uma cerimônia na'vi, o que era algo de que ele sempre quis participar - quer dizer que eu tenho que fazer alguma coisa especial nessa festa?
-Bom, vamos coroá-lo com fogo - ela disse diretamente, sem explicar muito as palavras, o que fez com que Spider se espantasse.
-Eu posso morrer queimado, não sou a prova de fogo, sabe? - ele disse com cuidado, para não ofendê-la.
-Há muito para você aprender sobre nós, com certeza - ela sorriu com paciência, contendo-se para não rir outra vez - vou contar exatamente o que vai acontecer. Eu acenderei uma tocha sobre a sua cabeça, você deverá fazer um juramento com sua mão sobre o fogo, mas eu garanto que não será queimado. Depois disso, você poderá aproveitar a festa e tudo mais, haverá dança e música, e até mesmo malabarismo.
-Parece agitado - ele comentou - e que bom que eu não vou ser queimado.
-Claro que não, eu jamais feriria o filho do meu marido - Varang garantiu outra vez - além disso, mesmo antes da cerimônia, eu já o considero parte da família.
-Obrigado - Spider agradeceu.
Mais tarde, os dois se ocuparam com os preparativos da cerimônia. Miles encontrou Spider nervoso e preocupado.
-Deixa eu adivinhar, ela te falou da festa? - ele perguntou, cruzando os braços.
-Não é uma festa, é uma cerimônia - Spider o corrigiu, convencido - e por que você sabe antes de mim disso tudo?
-Ser o consorte da olo'eyktan tem suas vantagens - disse seu pai, orgulhoso - mas não se preocupa garoto, eu tiro suas dúvidas até lá, já vi uma meia dúzia dessas cerimônias desde que cheguei aqui.
-Sério? Então me diz o que eu tenho que fazer, o que é esperado de mim? - ele perguntou, voltando ao pequeno pânico.
-Varang já disse o que será feito? - seu pai quis ter certeza.
-Sim, mas imagino que eu ainda tenha que me arrumar pra isso, da maneira correta - ele apontou, fazendo suas próprias comparações, com o que conhecia dos Omatikaya.
-Verdade, você precisa de trajes novos, mas antes dele, um bom banho - o pai sugeriu.
-Eu não vou mergulhar naquelas fontes - Spider decidiu categoricamente.
-Temos uma banheira bem aqui, você pode usá-la - ele indicou - Varang preparou acessórios pra você, depois de colocar, eu posso ajudá-la com as pinturas em você.
-Tá bom - Spider suspirou.
Estava um pouco menos nervoso agora, deixando aquela empolgação de antes tomar conta dele. Miles deu privacidade ao menino, que se banhou e foi para o seu quarto, encontrando os tais acessórios que seu pai tinha falado antes.
Havia um bracelete comprido para seu punho, com desenhos parecidos com o do arco que tinha visto antes, para o seu braço esquerdo, um bracelete mais fino cheio de pedras roxas, com certeza colhidas dos vulcões. O que chamou mais sua atenção, foram as bandagens roxas, iguais as que Miles costumava usar em torno do peito.
Colocar tudo aquilo o fez se sentir parte do clã das cinzas, como se finalmente sua busca por um lugar no mundo estivesse terminando.
-Bom, aí está você, quase pronto - Varang surgiu, o despertando dos próprios pensamentos.
-As pinturas, claro - Spider compreendeu.
Ele se sentou com calma e deixou que a madrasta o marcasse com a tinta vermelha e amarela mais viva que tinha visto em toda sua vida. Quando ele se levantou, estava pronto para seguir seus líderes, finalmente entrando para o clã das cinzas oficialmente.
