Childhood Dream Of Draco Malfoy
Por Ginsy
[Harry Potter x Draco Malfoy]
Capítulo II
Num simples movimento, caiu sobre o sofá de couro localizado no meio da sala comunal da Grifinória e espreguiçou-se cansado.
Os três botões da sua camisa do uniforme estavam entrebertos, fechou os olhos e inclinou a cabeça contra o teto, e uma imediata sensação de leveza atingiu todo o seu corpo, como se pudesse adormecer ali mesmo, e confessou que poderia ter adormecido se não fosse por Hermione que adentrou na grifinória em passos largos e pesados, batendo o quadro da Dama Gorda, acordando Harry do seu leve sono, de forma repentina.
Hermione atirou contra o seu peito um manto preto, que Harry agarrou um pouco confuso, era um manto da grifinória, excecionalmente bem dobrado, ele reparou. Analisou a postura de Hermione, que ansiava o momento em que Harry abrisse a boca.
Harry arqueou um sombracelha em confusão. Agradecia-lhe? Mas pela face de Hermione, ela esperava mais uma explicação. Mas que explicação?
— O que é isto? — Ele acabou dizendo de uma forma um quanto parva.
— Um manto da grifinória. — Disse ela impassivel, ainda permanecendo de pé, parecendo tão gigante.
Os braços cruzados sobre o peito e o repetitivo bater do pé de Hermione estavam começando a incomodar Harry.
— O que é que você quer que eu faça com ele?
— É seu? — Ela rapidamente cortou.
— Não sei. — Disse meio atordoado, a cara de quem tinha acabado de acordar. Ele analisou o manto. Provavelmente era seu, ele pensou. Mas a realidade ainda vagueava longe, ele ainda parecia dopado. — Você encontrou-o onde?
— Na arquibancada.
— Talvez alguém se tenha esquecido dele lá.
— Você tem a certeza, Harry?
Harry fez uma careta e voltou novamente a sua atenção para o manto que segurava.
— Se você está querendo insinuar alguma coisa pode dizer, Hermione.
Harry pousou o manto ao seu lado no sofá e fechou novamente os olhos, a nuca no encosto do sofá, mas o bater do pé de Hermione parecia cada vez mais alto e mais incomodativo.
— Você ainda não se perguntou o porquê de Malfoy ter ficado assistindo o treino da Grifinória de hoje?
— Malfoy sempre fica espiando os treinos da Grifinória, você é que não nota.
— E quem lhe disse que ele esteve espiando o time hoje?
— Então por que outra razão ele estaria lá?
— Porque parece que você se esqueceu do seu manto nos dormitórios da sonserina e Malfoy esperou o treino acabar para lhe entregar. — Harry ergueu a cabeça tão rapidamente que o seu pescoço estalou. — O que é que você andou fazendo na sonserina?
— Foi o que ele lhe disse?
— Foi.
— Aquele idiota. — Harry resmungou entre dentes e voltou a encostar a cabeça no sofá. — Fique sabendo que ele está mentindo.
— Ele não parecia estar mentido.
— Bem, em parte ele está-
— Em parte, Harry? Como é que você pode possivelmente esquecer-se de uma peça de roupa nos dormitórios da Sonserina?
Harry bufou e olhou para o teto, a realidade atingindo-o num rompante.
— O que é que você está insinuando? Que eu estou andando com alguém de lá? Com Malfoy?
— Malfoy parecia que estava tentando proteger você, eu achei estranho. Mal eu comecei fazendo perguntas, ele tentou ir embora e passar despercebido.
— "Tentando proteger" mas acabou mentindo?
— Você ainda não explicou como ele acabou com seu manto. Que tipo de obsessão é que você tem com Malfoy para chegar neste ponto?
— Que ponto? Você está acreditando nas palavras dele e não nas minhas- Quer dizer, em parte é verdade mas-
— Mas? — Harry revirou os olhos e lançou as mãos ao ar, exasperado. — Harry, você tem de parar de andar atrás de Malfoy ou caso contrário, ele vai começar interpretando mal, você ouviu? O que seria de você se começassem surgindo rumores desse tipo?
— Desse tipo... — Harry repetiu. — Eu nunca andaria com Malfoy. Eu muito menos andaria com algum rapaz, páre de acreditar nas palavras dele. Eu apenas emprestei meu manto porque ele estava com frio.
— Muito hétero e ingénuo da sua parte, Harry. — Ela debochou. — Vá falar com Malfoy, parece que ele ficou com a ideia errada das suas boas intenções.
Hermione subiu a escadaria deixando-o para trás, estendido sobre o sofá, pensando no que ia fazer a seguir.
Harry sabia que se fechasse bem os olhos ele ficaria um momento preso no tempo.
Aquela sala que situava-se perto das masmorras de Hogwarts, era bastante húmida o que tornava difícil dizer se o habitual horrível odor que se assemelhava a roupa mal seca era da sala propriamente dita, ou então das poções que sempre acabavam com um cheiro tóxico de tão mal confessionadas que elas eram pela grande maioria dos alunos, além que na pequena dispensa onde se podia encontrar alguns produtos extra necessários à produção das poções haviam coisas incrivelmente nojentas, como cera de ouvidos de gigantes ou mucosidade de vampiros.
Harry colocou uma mão à frente da boca como se, com a força do pensamento, pudesse vomitar.
Contudo, ele havia-se mostrado bastante bom na tarefa de fazer poções ultimamente com a ajuda valiosa daquele livro roído por traças, que o auxiliava em quase todas as suas tarefas. A sua atenção nos últimos tempos estava em grande parte concentrada naquele pequeno livro velho e em Malfoy, então não lhe restava grande tempo para além daquilo, que já consumia grande parte do seu dia quando Harry não estava dormindo. E mesmo assim, às vezes ainda sonhava com Malfoy ou com a possibilidade hipotética de Hermione lhe roubar o livro do Príncipe Mestiço, fazendo Harry acordar de sobressalto durante a noite para checar se o livro continuava debaixo da sua almofada.
Mesmo que ele quisesse, Harry não conseguia achar algo para focar a sua atenção que não fosse tão intigrante como aquele empoeirado manual de Poções e um rapaz de cabelo loiros.
Harry acabou colocando a culpa para o que estava acontecendo bem à frente do seu nariz no seu entusiasmo gradualmente mais desmedido para decifrar ambos. Ou então, ele havia errado as instruções, porém duvidava que o dono daquele livro estivesse enganado sobre o procedimento daquela poção em concreto, apenas porque Harry estava cheirando algo que o apanhou de surpresa.
Concluiu assim, que não estava algo de errado com a poção e sim, consigo mesmo.
— Você já terminou, Harry? — Ron aproximou-se do seu caldeirão e inalou a pequena fumaça que a poção emitia, e fez uma careta na direita de Harry. — Que cheiro é este?
— Cheira mal?
— Er- não... — Ron debruçou-se mais sobre o caldeirão, tentando extrair o máximo de fragrância que conseguia. — Quer dizer... A minha poção não está cheirando assim.
— Isso é porque você não passou da segunda etapa, seu burro. — Malfoy passou por eles dois, andando sobre duas muletas e com um sorriso de contentamento no rosto pálido.
Era notável que Malfoy estava doente, ele estava mais branco que os fantasmas que rondavam Hogwarts, como se a qualquer momento ele fosse desabar.
Harry não conseguia desgrudar os seus olhos de Malfoy, rumores diziam que Malfoy tinha ficado sem equilíbrio durante um treino de Quidditch enquanto voava, o que ele achava muito improvável e pouco credivel.
Ron, por outro lado, encarava Malfoy no seu silêncio sombrio, esperando o momento em que Malfoy se desequilibraria. Isso não aconteceu.
— E o que é que você fez, sua doninha fedorenta? Se não fosse por Crabbe e Goyle ficarem ir buscando ingredientes para você, você nem teria começado a poção.
Malfoy sorriu com escárnio, ficando ainda mais aterrador, na direção de Ron.
— Eu estou de repouso.
— Andando pela sala? — Harry subitamente disse.
Malfoy regeu os dentes.
— Tenho de exercitar a minha perna para conseguir dar um pontapé no seu traseiro o mais cedo possivel.
E Malfoy deu-lhes costas, não esperando uma resposta, e encaminhou-se para o seu lugar. Ron fez o dedo do meio pelas costas de Malfoy.
— Aquele idiota sempre tem uma resposta para dar.
— Você sabe como é Malfoy.
— Esse é o problema. — Ron olhou meio decepcionado para a sua própria poção no outro lado da bancada. — Slughorn disse mesmo que o cheiro depende da pessoa que estava cheirando a poção e não da sua composição, não é? Acho que não coloquei os ingredientes certos. Deste jeito, vou acabar chumbando a poções.
— A minha também não me parece estar completamente certa, na verdade. — Harry inclinou-se sobre a sua própria poção para se certificar daquilo que estava dizendo.
— Pensei que o Príncipe nunca se enganava. Afinal não é de grande ajuda. Mas Harry, Slughorn não tinha dito que a sua estava "excecional, como esperando do Senhor Potter"? — Imitou Ron.
Harry deu de ombros e voltou a olhar para a poção.
— Foi o que ele disse.
— Porque raio você parece triste, Harry? — Ron deu-lhe uma palmada no ombro tentando animá-lo. — Eu fico-me perguntando ao que cheirava a poção para Slughorn. Para ele saber que está bem feita é porque o cheiro era igual aos outros que ele havia cheirado. — Harry não respondeu, perdido em pensamentos enquanto olhava para o borbulhar do líquido. — E a você, ao que é que lhe cheira Harry?
Harry levantou os olhos verdes do caldeirão e pestanejou, enquanto encarava Ron, este que esperava ansioso pela sua resposta.
Por cima do ombro de Ron, Harry acabou cruzando olhares com Malfoy, colocando toda a sua atenção completamente naqueles olhos cinza frios que o tentavam decifrar. Por momentos, ele havia-se esquecido que Ron estava bem na sua frente, olhando para ele com um ar impaciente enquanto ansiava por uma resposta.
— Então Harry? Ao que cheira a poção para você?
Harry parecia ter acordado num sobressalto e voltou a olhar para Ron.
Para sua sorte, ao que parecia Malfoy tinha derrubado um frasco de vidro da sua própria bancada, o que acabou causando um alto murmurinho em toda a sala de aula, para grande inconveniente do Professor Slughorn.
— Oh- Oh não se preocupe Senhor Malfoy, não se preocupe, — Balbuciou Sloughorn ao aproximar-se de Malfoy e ver o que ele tinha derrubado. — Acontece. Acontece. Ahm- Talvez seja melhor se você for dispensando mais cedo, já vi que já acabou a sua Poção.
Havia um grande e largo sorriso estampado na face de Malfoy.
— Crabbe, pegue na minha mala e-
— Não, não. O Senhor Crabbe ainda não está dispensado visto que não acabou a sua poção.
O sorriso de Malfoy desvaneceu rapidamente.
— Então como é que eu vou levar as minhas coisas?
Slughorn analisou brevemente os alunos que estavam na sala.
— O Senhor Potter pode levar para você já que ele é monitor. Potter! — Harry olhou para Slughorn no outro estreito da sala, sem espanto porque já tinha posto ouvidos na conversa. — Sim, rapaz, venha cá, venha.
— Oh, não, não. Eu prefiro ficar aqui.
Malfoy voltou a sentar no banco de madeira e colocou as muletas de lado.
— Deixe de ficar fazendo birra. — Harry arrancou a mala de Malfoy das mãos gordas de Crabbe e colocou-a no seu ombro.
— Professor, Potter está só esperando estar a sós comigo para dar uma tareia a um sonserino indefeso.
Slughorn trocou um olhar com Harry e analisou-o de alto a baixo. Harry deu de ombros quando os olhos minúsculos e negros de Slughorn voltaram a recair sobre os seus olhos verdes.
— Eu não acho que o Senhor Potter irá bater em você.
— Isso é porque você não o conhece como eu conheço. — Malfoy cruzou os braços mostrando que não ia sair dali com Harry.
— Malfoy, eu não vou bater em você.
— Eu não confio em si.
— Que eu me lembre você foi o ultimo que me deu um murro no nariz. — Harry não percebia o porquê de Malfoy se estar comportando do jeito que se estava comportando. Atitudes infantis como aquelas já eram de se esperar vindas de Malfoy, ele frequentemente ficava reclamando e dando uma acentuação mais dramática à realidade, por vezes até que tinha a sua graça, outras vezes, como aquela, eram apenas irritantes e completamente descabidas. — Fique à espera que Goyle e Crabbe acabem a poção então. Você ficará ai para sempre.
Após um longo e indeterminado momento de ponderação, em que Harry estava pronto para largar as coisas que segurava, Malfoy ficou olhando para a poção inacabada de Crabbe sob o ombro, e com muita indignação, ele acabou se rendendo e ergueu-se do banco com as muletas na mão, dirigindo-se para a saida. Harry só teve tempo de acenar a Ron e sair atrás de Malfoy.
— Para quem anda de muletas você anda extremamente rápido.
Malfoy parou no lugar, quase fazendo Harry chocar contra as suas costas se não se tivesse desviado antecipadamente.
— Você está querendo insinuar alguma coisa?
— Eu não.
— Então fique calado.
Malfoy continuo andando até que finalmente se apercebeu que Harry não estava caminhando atrás de si. Isso fê-lo dar meia volta e voltar-se para trás com uma expressão mais antipática que o habitual. Definitivamente Malfoy parecia chateado, pensou Harry. Não que ele desse a mínima.
— Você perdeu a capacidade de andar, foi?
Harry suspirou cansado. Não deveria ter aceitado, mas ele era demasiado simpático para negar um pedido de um professor. Ajeitou novamente a mala no ombro e começou caminhando em passos largos.
Para duas pessoas que brigavam toda a vez que se cruzavam, o clima que se tinha instalado entre ambos era pesado. Harry continuo andando atrás de Malfoy mas sempre atento, temendo que ele tropeçasse nos próprios passos.
— Você está tentando establecer um vinculo silencioso comigo, Potter?
— E você está tentando estabelecer uma hostilidade comigo?
Malfoy olhou para ele com um certo desespero no olhar e revirou-os, continuando a sua reta sem esperar que Harry o acompanhasse.
— Tinha-me esquecido como você é idiota. Fique calado.
— Eu teria ficado se você não me tivesse feito uma pergunta.
Malfoy olhou para Harry sobre o ombro e soltou um "Tsc" sobre a respiração.
— Só queria perceber se você ainda estava vivo ou se era Peeves andando atrás de mim.
— Peeves já o teria mandado da escadaria abaixo.
— Vontade também não lhe falta, não é, Potter?
— Como é que você adivinhou?
Malfoy parou no sitio, fazendo Harry parar ao seu lado.
— Caminhe ao meu lado. Eu não confio em você.
— Eu não o vou empurrar.
— Eu não tenho nenhuma doença, você pode caminhar ao meu lado.
— Eu não quero passar a ideia errada.
Malfoy analisou o fundo corredor ao redor com uma expressão plena.
— E daí? Eu não estou vendo ninguém aqui. Você está com medo que pensem que somos amigos?
— Eu estou com mais medo do que você pode inventar sobre mim e depois levar uma coça da sonserina.
— Se você continuar idiota assim eu farei questão que você a leve. Do que é que você está tentando acusar-me desta vez?
— Você deu o manto a Hermione porque?
— Oh, então é isso... — Malfoy riu-se levemente e olhou para Harry com uma expressão divertida. — Acabei com o seu romance de adolescente?
— Não faço ideia do que você estava tentando fazer, mas não funcionou.
Malfoy suspirou cansado.
— Eu não estava tentando atingir você, Potter. Não fique com a ideia errada. Eu tentei por dias entregar-lhe o manto sem que ninguém percebesse, mas por algum motivo seus amigos ranhosos não desgrudaram de si uma única vez. Até que Granger descobriu, eventualmente.
— E no momento que ela descobriu você teve de lhe contar uma versão diferente daquela que aconteceu?
Malfoy deu de ombros.
— Você acha que eu ia desperdiçar uma oportunidade daquelas? É o que você merece por ser intrometido.
— Eu tentei ajudá-lo.
— Você quase me matou de susto naquela noite, Potter.
— Eu já lhe pedi desculpa por isso, e como você pode ver, quem saiu dali com cara roxa fui eu.
— Mas valeu a pena não? Só para conseguir fazer-se de coitado e chamar á atenção da pobretona "Oh Harry o que aconteceu com você..." — De forma provocativa, Malfoy tentou imitar a voz de Ginny e começou acariciando a face de Harry na zona mais arroxeada, e como se não fosse irritante o suficiente, começou rindo da cara pálida de Harry quando ele lhe tocou. Harry tentou afastar-se mas Malfoy pegou no queixo de Harry com a mão e sorriu macabramente, parecendo doentio. — De zero a dez quanto é que você dá á minha imitação?
— Quatro. — Harry respondeu levantando um pouco o queixo mas prendendo o seu olhar com o de Malfoy, que por sua vez, ainda segurava o queixo de Harry. — Ginny tem as mãos mais macias que você.
O leve sorriso convencido da face de Malfoy desapareceu e num instante largou o queixo de Harry um quanto bruto, como de costume.
— Por isso é você gosta que aquela grudenta tenha sempre as mãos em cima de você.
Malfoy apoiou-se novamente nas muletas e começou andando, enquanto Harry o acompanhava.
— Ginny é irmã do meu melhor amigo.
— E daí?
Bem, Malfoy tinha valores bastante suspeitos.
— Ron me partiria em pedacinhos se soubesse que tenho o minimo interesse na irmã mais nova dele.
— E com razão. Eu mataria você.
— Assustador como sempre.
— Assustador é o seu gosto pessoal. De todo o mundo que você poderia escolher, você decide que quer ficar com a pobretona. Falta de gosto desse tipo deve ser defeito de nascença.
— O seu gosto pessoal também deve ser bastante duvidavel.
— Eu não tenho tempo para ficar trocando cartas de amor, Potter.
— E você acha que eu tenho?
— Mas pelos vistos os dois idiotas a quem você chama de melhores amigos têm. Eu bem vi Granger e Weasly se comendo debaixo das bancadas. Quando é você vai arranjar uma vida amorosa também?
— Com você inventado rumores de que fiquei com alguém da Sonserina, talvez nunca.
— Eu nunca disse que você ficou com alguém da sonserina, só a ideia por si só é simplesmente absurda. E não coloque a culpa em mim por você não conseguir arranjar ninguém. — A boca de Malfoy parecia um trem sem travões. — Você é arrogante e fica o tempo todo arranjando brigas.
— Não muito diferente de si.
— Pois, mas eu tenho o meu charme, independentemente do quão ruim você acha que eu possa ser.
Harry suspirou, sem ter um argumento para contradizer Malfoy. A verdade é que quando Malfoy não era terrivel, Malfoy era muito atraente, e não só Harry, mas como toda a Hogwarts compartilhava do mesmo sentimento. Murmurinhos e risos envergonhados ecoavam cada vez que Malfoy passava, mas Malfoy nunca se impressionava com nenhuma dessas demonstrações de devoção, porém ele sempre era bastante simpático quando alguém avançava na sua direção e lhe acenava timidamente, e com um leve sorriso presunçoso no rosto, por mais falso que fosse, Malfoy acenava devolta.
Para Harry, Malfoy não passava de um adolescente mimado e irritante. Se Harry um dia ousasse ter uma demonstração tão idiota como essa em frente á sonserina, era como estar a sujeitar-se a ser um cordeiro para o abate. Por algum motivo, ele sempre teve a sensação que os sonserinos achavam que Harry poderia, de alguma forma, roubar Malfoy deles, mas Malfoy também tinha uma lealdade desmedida para com a Sonserina que os próprios sonserinos não tinham noção.
E por falar em Sonserinos, ao cruzar o corredor deram de caras com Zabini, sentado no parapeito do corredor, acompanhado de um outro rapaz, que virou a cabeça para trás assim que Zabini fez-lhe sinal que haviam pessoas a aproximar-se, pessoa essa que rapidamente Harry percebeu que era Theodore Nott.
Harry reparou que os rapazes rapidamente limparam um pó branco assim que perceberam que Malfoy estava acompanhado. Aquele corredor era o ultimo de Hogwarts, localizado nos calabouços da velha escola, tão humido e frio pois era o piso mais perto do Lago Negro. Não admirava nada que Malfoy sempre parecesse tão doente e vulnerável.
Zabini rapidamente se ergueu quando percebeu quem era a figura que acompanhava Malfoy, enquanto isso, Nott continuava tentando limpar as provas de algo ilegal que estavam fazendo.
Ele olhou de esguelha para Malfoy que não estava minimamente interessado. Ele provavelmente sabia o que se estava passando ali.
— O que é que você está aqui fazendo? — A pergunta soava mais a uma ameaça, como se Harry tivesse enchido Malfoy de porrada.
— Por que? Eu não posso estar aqui?
— Não. — Zabini cortou rapidamente.
— Onde é que isso está escrito?
— Eu é que o estou avisando, Potter.
— Então não está escrito em lado nenhum?
Zabini estava pronto para erguer o braço com o punho fechado, mas Nott colocou uma mão pesada no ombro do rapaz, evitando que ele pudesse concretizar o movimento.
— Malfoy não parece estar incomodado, e muito menos parece que Potter o está tentando incomodar, não há razões para brigar, certo?
Malfoy suspirou levemente e olhou para Harry, demorando uns segundos para falar algo.
— Potter só estava carregando as minhas coisas. — Ele fez um movimento de cabeça como que lhe indicando para entregar a mala a Nott. — Potter já ia voltar para trás, não era?
Harry mordeu o lábio á medida que os olhos de Malfoy esbugalharam na sua direção, e revirou os olhos após esticar a mão para entregar a mala de ombro a Nott.
— Se eu vir você aqui novamente eu quebro sua cara. — Zabini disse com desdém.
— Eu acredito que você me verá muitas mais vezes.
E deu meia volta. Ele não sabia o porquê de ter dito aquilo, mas se Malfoy podia insinuar coisas a Hermione, então ele também poderia insinuar coisas a Zabini e deixar o clima pesado na sonserina, assim como Malfoy tinha feito consigo.
Inevitavelmente, aquela sua ousadia excessiva acabou se virando contra si.
Fazia agora dois dias que um grupo de Sonserinos haviam-no arrastado para dentro de uma sala de aula vazia, aproveitando aquele momento de descuido da parte de Harry para socá-lo, embalados no escuro daquela velha sala de aula. Ele ainda se tinha tentado defender, mas lutar contra seis pessoas era demasiado para um mero adolescente. Tudo o que mexesse com Malfoy era como um tratado de guerra para com toda a Sonserina, mas ele também não pediria perdão quando não tinha feito nada de errado.
— Outch Mione, cuidado! — Harry berrou entre dentes.
Hermione passava cuidadosa um pequeno pedacinho de algodão sobre as feridas abertas no rosto de Harry. Apesar do ardor, a lenha ao longe queimando dava uma sensação acolhedora ao ambiente da sala da grifinória. Aquilo ajudou-o a acalmar-se.
— Você não estaria assim se não tivesse arranjado briga com a Sonserina, Harry.
— Mas eu não puxei briga com eles, eu já lhe contei Mione, eles é que socaram o inferno de mim.
— Eu acho que nós deviamos ir lá e socá-los de volta.
— Ron! — Hermione berrou e acabou sem querer fazer muita força com o algodão no rosto de Harry. — Ai, desculpe, Harry.
— Não se preocupe. — Mas era notória a dor no tom. Harry pegou no algodão e tentou desinfetar as próprias feridas, lançando um sorriso carinhoso á melhor amiga.
— Quando eu cruzar com Malfoy eu vou quebrar ele no meio. — Cuspiu Ron, as suas bochechas começavam a ficar da cor do seu cabelo com o tamanho excitamento. — Quando aquela ratazana sair do covil a que ele chama de casa eu vou partir cada dente daquela boca.
Às vezes, Ron conseguia ser mais assustador que Malfoy.
— Ronald! — Hermione avisou num tom imperativo. — Você está sendo mais imaturo que a Sonserina toda junta.
— Malfoy muito provavelmente nem está sabendo do que aconteceu.
Os olhares recairam sobre a sua pessoa como se Harry tivesse dito a coisa mais absurda à face da terra.
— Há dias você andava acusando Malfoy sobre tudo de ruim que acontecia dentro de Hogwarts e agora você está defendendo-o? Você está ficando mole, Harry? Aconteceu alguma coisa durante o caminho para a Sonserina que você não quer contar?
— Ou que tenha acontecido antes disso? — Hermione calmamente acrescentou às palavras de Ron. — Algo que explique o porquê de Malfoy ter ficado á sua espera nas arquibancadas?
— Você não esquece isso, Mione?
— Que história é essa? — Ron logo perguntou.
Harry revirou os olhos, afundando-se no sofá e Hermione tentou desviar o assunto.
— Eu sinto que você não está sendo honesto, mas que seja, Harry. — Ron acabou dizendo.
— Assim como vocês, eu acho que a Sonserina interpretou mal.
— Isso não nos impede de ir lá e socá-los.
— Ron! — Hermione chamou-o á atenção.
— É melhor não. Malfoy não irá gostar.
Ron esbugalhou os olhos pela segunda vez e apertou o braço de Harry, tentando chamá-lo á atenção. Para enorme infelicidade de Harry, Ron apertou bem no sitio de uma ferida.
— E você acha que ele dará a mínima? Quando ele descobrir você acha que ele vai dar bronca nos Sonserinos? Não, amigo. Ele muito provavelmente dará uma palmadinha nas costas e de Zabini, e dirá para se esforçar mais da próxima vez.
— Ron você está magoando Harry! — Disse Hermione preocupada.
No fundo, Harry acabava concordando em grande parte com as palavras de Ron, então ele era incapaz de o contradizer, e bem, aquela talvez fosse uma das razões pelas quais ele odiava tocar no nome de Malfoy perto de Ron, até porque cada vez que eles acabavam falando sobre ele ou sobre a sonserina, raramente era por bons motivos.
No dia seguinte, Harry saiu da enfermeira ainda num estado que Madam Pomfrey considerou de horrendo e já se haviam passado quatro dias desde o sucedido. O lábio de Harry tinha sido brutalmente arrebentado com a força dos socos, o seu nariz estava partido e completamente ensaguentado. Das últimas memórias que tinha era de sentir um gosto forte de sangue invadindo a sua boca e carreiras de sangue escorrendo pelos cantos do seu lábio. Sabia que algures ao lado da sua cabeça estava uma poça de sangue de quando cuspiu aquele liquido vermelho que se acumulava dentro da sua boca e pintava o seus dentes de uma cor escarlante viva. Após isso, tudo era escuro e solitário. Toda a sua vida havia sido assim, apedrejado e jogado no canto de um estreito sem a mínima empatia, nem um único pingo de compreensão nutrido pela sua pessoa. Aquela tinha sido a conclusão a que tinha chegado antes de desmaiar.
Adentrou no Grande Salão sem ousar cruzar olhar com a mesa da Sonserina enquanto segurava um saco de gelo contra o lábio. Não tinha a mínima disposição de se armar em herói e colocar-se à mercê de levar um pontapé na bunda pela segunda vez. Ele ainda estava se recuperando da porrada que havia levado há dias, e ele não era burro para se colocar em outra briga sem uma razão justificável.
Encaminhou-se na direção da mesa da grifinória a passos rápidos e sentou-se entre Ginny e Neville, de frente para Ron e Mione.
— Você está terrível, amigo.
— Boa observação. — Harry pegou num copo de água e bebeu com muito custo em abrir a boca. — O que é que lhe deu a dica?
— Se você está chateado, você deveria descarregar em Zabini, — Ron deu uma trinca num pedaço de pão. —Ou então em Malfoy, agora que ele está aqui.
A boca de Ron estava tão cheia que Harry não conseguia perceber o que ele lhe estava dizendo.
— O que você disse?
— Olhe para trás. — Ron fez um gesto de cabeça, insinuando o outro estreito do Grande Salão. — Malfoy está sentado na mesa da Sonserina, ao lado de Zabini e de Parkinson. Só de olhar para a cara dele perco o apetite para comer.
Ginny que ouvia a conversa de socapa viu, sem muito surpresa, Ron dar outra mordida no pão e revirou os olhos.
Harry virou a cabeça com muita dor e viu Malfoy ao longe, cochichando qualquer coisa no ouvido de Pansy Parkinson e sorrindo. Voltou-se então para a frente, não esboçando qualquer emoção. Agora que Malfoy estava ali Harry percebera que toda aquela inquietação que o deixava acordado durante a noite e impaciente durante o dia, havia sido bastante desnecessária. Malfoy estava ali, como se nada tivesse acontecido, parecendo tão impossível de culpa e remorso, assim como todos os outros ao seu redor. As coisas sempre haviam sido daquele jeito, então não conseguia fingir surpresa.
O dia tinha passado como todos os outros. Eles haviam jantado e ido para a sala comunal da grifinória, como faziam todas as noites. Harry sentou-se no sofá da sala comunal da grifinória e permaneceu lá até não sobrar mais ninguém além dele mesmo. Não só era dificil tentar não ter pesadelos consecutivos com Voldemort, como a tarefa tinha-se tornado completamente impossível com todas as dores que cobriam o seu corpo. Harry continuo estendido no sofá, os pés sobre a mesa rasa no meio da sala comunal.
Harry suspirou levemente, num breve sopro e inclinou a nuca para trás, pousando a cabeça no encosto do sofá. A tranquilidade atingindo-o como um furacão. Fechou os olhos e só acordou na manhã seguinte com o barulho da correria dos alunos do primeiro ano, subindo e descendo a escadaria em passos pesados, pegando livros que se haviam esquecido ou rezando a Merlin para não levarem detenção por se ter esquecido de realizar o trabalho de casa de Transfiguração. Abriu um olho levemente e voltou a fechá-lo na esperança de conseguir voltar a adormecer, quando para sua surpresa alguém começou cotocando o seu ombro, com um bocado de força. Harry tentou ignorar mas a força que a pessoa estava forçando no seu braço estava começando a magoá-lo, e a contragosto, abriu os olhos com uma expressão arrogante.
— Você pode parar Ron?
— Pensei que estava morto. — Disse Ron um pouco receoso, fazendo Harry entender que talvez tenha soado demasiado ríspido.
— Não, mas você quase furou meu braço.
— Desculpe amigo. Só queria saber se você vem à aula agora.
Harry olhou para o relógio de pulso que carregava para todo o lado como uma pequena relíquia e fez uma careta de desgosto.
— Já estou atrasado. É melhor faltar.
— É aula com Snape, Harry. Mione vai matar você se não o vir entrando na sala quando o sino tocar.
— E Snape mataria-me se eu entrasse a meio da aula e bem, entre Mione e Snape, prefiro morrer às mãos de Mione. Além que já tenho de ver Snape nas aulas de Oclumentia, prefiro tirar uma folga hoje.
— Então e Malfoy?
— O que tem Malfoy?
— Eu pensei que podíamos socar Malfoy e Zabini quando a aula terminasse, por aquilo que fizeram a você.
— Se eu batesse em Malfoy toda a vez que arranjo problemas por causa dele, eu já teria sido expulso de Hogwarts.
— Mas você vem almoçar com a gente, certo?
— Eu devo ir à segunda aula, não se preocupe.
— Vou andando então, se despache Harry.
Ron saiu da Grifinória quando a grande maioria dos alunos já tinham saído, mas bem atrás de Ron, Ginny passou rente ao sofá de Harry.
— Bom dia, Harry.
Ainda que não fosse muito esforçado para cumprir horários, ele continuava sendo monitor.
Harry continuo andando pelos corredores quase vazios de Hogwarts. Estava quase na hora de recolher, ele conferiu no seu relógio de pulso que marcavam dez e meia da noite. O seu manto preto da Grifinória esvoaçava a cada passo que Harry avançava, anuciando a chegada da sua pessoa entre os corredores amplos e frios de Hogwarts.
O dia havia sido cansativo. Tudo o que desejava naquele momento era chegar ao dormitório da Grifinória e deixar o seu corpo deslizar pelos lençóis macios da sua cama. O fim de semana estavam chegando, e nada o deixava mais feliz que isso, pois significava que não precisava de ter aulas de Oclumencia com Snape.
Harry virou num corredor e quando estava prestes a subir um dos lances de escadas, a descer vinha também Draco Malfoy, que acabou tossindo com o susto que tomou, como se estivesse prestes a engasgar-se, anuciando também a sua presença.
Harry ficou fitando-o de alto a baixo, na parte baixa das escadas.
— Vejo que já consegue andar sozinho. — Malfoy parecia bem sem as muletas. — Mas isso não significa que você possa estar vagueando por ai após o recolher.
— Sem você continuar falando muito eu vou socar o seu traseiro.
Harry revirou os olhos.
— É melhor você se despachar comendo isso. Está quase na hora do recolher. — Disse Harry um quanto frio e impassível.
Malfoy começou descendo o lance de escadas sob o olhar curioso de Harry. A forma como ele se estava comportando, como se ele mandasse, envolvido no seu silêncio tenebroso, conseguia incomodar extremamente Harry.
A cada passo que se encontrava mais perto do outro rapaz, sentia-se cada vez mais doente, estava um pouco ansioso, afinal, o que iria Malfoy dizer desde os últimos acontecimentos? Além que Harry não conseguia deixar de se sentir ainda um pouco rancoroso pela forma como a sonserina o havia tratado há dias. Por causa disso, ainda no seu queixo e na sua sobrancelha haviam feridas abertas que não estavam sarando tão depressa como ele gostaria, e sem esquecer o seu olho esquerdo que estava ligeiramente arroxeado ao redor, dando a sensação, ao longe, que Harry tinha mais olheiras do que aquelas que ele na realidade tinha.
— Bons olhos o vejam, — Malfoy franziou as sombracelhas na sua direção. A expressão ficava mais carregada à medida que se aproximava de Harry. — O que aconteceu com a sua cara?
Disse Malfoy analisando-o de alto a baixo, deixando Harry desconfortável por debaixo do manto preto da grifinória com aquele olhar fixo nele. O mesmo olhar parecia ter chegado ás feridas espalhadas pela face de Harry e nas suas mãos. Malfoy levantou uma mão para tocar no rosto de Harry, mas Harry afastou calmamente a mão do seu rosto, agarrando no pulso fino de Malfoy.
— Pergunte a Zabini.
Malfoy apenas o ficou fitando por uns segundos sem dizer nada.
— Sempre que vejo a sua cara horrenda parece que você andou lutando com o Salgueiro lutador. — Ele acabou por dizer. Malfoy deu outra dentada na sandes que trazia.
— E cada vez que o vejo você continua inconveniente como sempre. O que é que você está fazendo aqui? — Harry colocou as mãos nos bolsos do manto e ficou ali em pé, olhando para Malfoy que parecia uma criança à luz da lamparina.
— E você está ligeiramente mais impaciente hoje, mas eu vou-lhe dar um desconto. Aturar Weasly todo o santo dia deve ser exaustivo.
— E como se não bastasse tenho de aturar você também.
— Eu estou acabando de jantar.
— O banquete acabou faz uma hora. Você deveria ter ido jantar com todos os outros.
— Eu iria se Weasly não estivesse do outro lado do salão olhando para mim como se quisesse roubar o meu jantar.
— E eu a pensar que seria o meu dia de sorte e que não me cruzaria com você mais hoje.
— Você só está aqui porque você quer.
— Eu estou fazendo as minhas rondas, você é que não deveria estar aqui.
Malfoy sentou-se no parapeito da janela do corredor. A luz do anoitecer iluminava parcialmente a sua face pálida enquanto este acabava de comer a sua sandes. Harry manteve-se de pé, fitando-o e aquecendo as suas mãos nos bolsos do seu manto.
— Certo, eu já percebi, você está de mau humor. — Malfoy suspirou pesadamente e ajeitou os leves fios de cabelo por detrás das orelhas, sob o olhar chateado de Harry. — É porque Zabini puxou briga com você?
— Zabini não puxou briga comigo. Ele simplesmente achou que seria engraçado me apanhar sozinho e me socar.
Malfoy estava pensativo, enquanto balançava os pés, um pouco apreensivo no seu lugar. Houve um momento de silêncio constrangedor antes dele falar algo.
— Você só teve o que merecia por ser intrometido, Potter. — Harry revirou os olhos no seu lugar. — Além que, se Zabini fez o que fez, foi a critério dele. Estou dizendo isto para o caso de você pensar que fui eu que mandei ele.
— Então você está aqui para limpar o seu nome?
Malfoy deu outra dentada.
— Mas o meu nome está limpo.
— Certo. — Harry encostou-se contra ao varão da escadaria, de frente para o outro rapaz. — Eu estava à espera que você tivesse um pouco mais de consciência e não ficasse do lado dele.
— Você está querendo que eu escolha entre você e Zabini?
— Nesta situação-
— Eu vou sempre ficar do lado da Sonserina, Potter, nem que eles matem você na porrada.
— Assenta com você. — Harry rapidamente cortou, o tom ríspido. — Você pode ir embora? Eu gostaria de ir para a Grifinória cedo.
Malfoy suspirou fortemente pela segunda vez num curto espaço de tempo e olhou pela janela ao invés de morder a sua sandes, como se olhar para Harry o começasse irritando como de costume.
— Se você fosse às aulas eu poderia ter-me explicado. Não fique achando que eu concordei com a atitude deles, eu só fiquei sabendo depois de ter acontecido.
— Não há nada para você explicar. Você é da Sonserina e eu da Grifinória, essa é uma explicação suficiente, não foi o que você disse?
— Eu tomo responsabilidade se você quiser em nome da Sonserina, sendo eu o monitor. Mas vou-me lembrar disso da próxima vez.
— Então isso significa que ainda há a chance de Zabini socar o meu traseiro pela segunda vez?
Malfoy olhou para si como se estivesse prestes a arrancar a sua cabeça e dar de comer á lula do lago negro.
— Se você continuar irritante dessa forma ele irá socar você muitas mais do que duas vezes.
— Sim, eu imaginei que sim.
— Ainda assim, — Malfoy inclinou a cabeça para o lado, olhando para Harry meio divertido. — Não entendo porque é que você está tão chateado. A pobretona não ficou cuidando de você estes dias, foi isso? Talvez Zabini deveria ter socado você um pouco mais.
— Você sempre puxa esse assunto por que? Está tentando que eu comece gostando dela? Ou você gosta assim tanto dela que não consegue parar de pensar no momento em que eu e ela fiquemos juntos?
— Não seja idiota. Eu nunca tocaria nela, nem que eu estivesse ás portas da morte. — Malfoy mordeu novamente um pedaço da sandes. — Nem você deveria.
— Se você está tão preocupado, então arranje-me alguém.
O rapaz começou tossindo. Harry chegou perto dele e sentou-se também no muro, dando leves batidinhas nas costas de Malfoy.
— Quer que eu vá buscar um pouco de água? — Harry estava pronto a levantar-se, mas Malfoy agarrou no seu pulso e fê-lo sentar-se novamente.
— Eu não entendo como é que pensam que você é inocente.— Ele disse entre tossidas.
— E eu não estou entendendo como é que alguém consegue comer uma sandes tão devagar.
— Estou a saborear. — Disse Malfoy após ter dado mais uma dentada minúscula na sua sandes. Harry estava habituado a ver Ron comer, visto que fazia a maioria das suas refeições sempre na sua companhia, e não havia uma possível comparação entre a brutalidade de Ron com a lentidão de Malfoy.
— Você pode ir saborear para a Sonserina.
Malfoy deu um leve tapa no braço de Harry como uma simples forma de repreensão.
Passos ecoaram no fundo do corredor.
Malfoy parou de mastigar subitamente, olhou ao seu redor e novamente encarou Harry.
Harry tinha uma sombracelha franzida e levantou-se. Ele pensou que ouvir coisas fosse um outro possível efeito secundário das suas constantes insónias.
— Se for Peeves querendo nos pregar um susto eu juro que o dou de sobremesa aos Dementadores lá fora. — Disse Malfoy se levantando também.
Harry continuo observando o fundo do corredor, mas não havia sinais de mais ninguém para além deles dois.
— Acho que alguém nos estava espiando.
— Ou então viram o idiota herói do mundo bruxo no corredor e fugiram não querendo levar detenção do monitor malvado.
Quando Harry virou o rosto para a frente estava Malfoy de pé, muito próximo de si, mas Harry não se abalou, e permaneceu no seu lugar. Viu que Malfoy ainda tinha metade da sandes na mão.
— Você também deveria ir andando para a Sonserina se não quer levar detenção.
— E eu estava indo, até você aparecer e me interromper.
Malfoy deu outra dentada e virou costas a Harry. Harry teve de resistir á tentação de travá-lo e dizer que o levaria à Sonserina, mas lembrou-se não só das palavras de Zabini da ultima vez que se cruzaram, como também sabia que se Malfoy estivesse em perigo, que ele próprio se defenderia.
— Não fique andando por ai. — Harry acabou dizendo, a voz um pouco trêmula.
— Não tenciono me cruzar com você outra vez, não se preocupe.
Ali estava Draco Malfoy, o lider da sonserina, a quem todos naquela casa prestavam uma devoção quase doentia e inexplicável. Harry nunca percebera como é que eles tinham acabado por se apegar a Malfoy de tal forma que sempre se havia mostrado mais importante proteger e cuidar de Malfoy do que deles próprios. E o sentimento era recíproco. Malfoy sempre havia agido por bem da sonserina, sempre havia dado a cara quando a sonserina era acusada do quer que fosse. Ele sempre estava lá, defendendo-os, pelo mero facto deles serem sonserinos.
Claro que Malfoy iria defender a sonserina uma vez mais, e tudo o que Harry viesse a dizer apenas os levaria a uma troca de argumentos mórbida e sem fundamento.
Harry checou o ponteiro das horas no seu relógio de pulso, verificando que, de facto, já passavam vinte minutos das onze horas e quase durante uma hora, ele e Malfoy não tinham se tentado estragular até à morte.
Mantê-lo por perto era um grande alívio, além que não era assim tão mau como ele pensava ser.
Malfoy deu costas deixando Harry para trás, estático no mesmo sitio enquanto observava a figura virar num corredor e desaparecer da sua vista.
E com um certo pesar das suas palavras, ele e Malfoy haviam voltado ao seu estado habitual de hostilidade. Era difícil sair daquele ciclo vicioso que eles, inevitavelmente, haviam criado, então, apesar de qualquer esforço, eles sempre acabariam envolvidos naquela bolha de rivalidade porque era definitivamente mais fácil e mais cómodo odiarem-se a tentarem dar-se bem.
Haviam crescido destinados a odiar um ao outro, porque era assim que tinha de ser, então eles simplesmente tentaram conformar-se que era assim que tinha de ser entre eles, sem dar uma única chance um ao outro, o que também seria extremamente difícil tendo em conta todas as circunstâncias.
Mas Harry ainda se lembrava do brilho do olhar de Malfoy quando Malfoy colocou, pela primeira vez, os olhos em si. Para uma criança mimada como ele, o sentimento que sentiu ao ver Harry à sua frente no Beco Diagonal há seis anos deveria ter sido algo parecido ao que se sente quando se recebe um novo brinquedo como prenda de aniversário.
E ainda mais difícil deveria ter sido digerir o facto que Harry não estava interessado a ser tomado por ele.
E agora ela percebera que aquele sentimento de Malfoy para com ele havia durado a vida toda deles.
O sentimento de inconformidade.
Eles tinham um ódio profundo e obscuro, que crepitava no peito de Harry e fazia Malfoy perder a sua postura de menino bem educado, rápido se transformando em brigas nos corredores que faziam todos os outros estudantes se afastarem. Brigas que duraram anos até aos dias de hoje.
O sentimento de renúncia disfarçou-se de ódio para Malfoy.
Hermione já lhe havia dito entre linhas que ele não descarragava em Malfoy a indignação em relação ao seu destino cruel de ser chamado para uma guerra que ele não começara.
Para Hermione, como ela lhe havia dito, Harry com suas brigas, procurava uma justificação para aquela rivalidade entre eles e finalmente se poder conformar que era assim que tinha de ser entre ele e Malfoy.
Mas será que havia a possibilidade de Malfoy puxar briga por ser um frustado incoformado com a relação entre eles?
Afinal, Harry curvou-se perante todos os rumores maldosos sobre a Sonserina e Malfoy, e aceitou-os.
Então, era evidente que a maior vitória para Malfoy seria um dia ser admirado por Harry e fazê-lo ocupar um pouco do seu tempo para lhe dar a atenção que ambicionou ter por um longo periodo de tempo.
Mas ele conseguia perceber que até mesmo para Malfoy, que se estava esforçando ligeiramente mais agora que tinha chances para isso, estava achando difícil se aproximar de Harry.
Os anos acabaram colocando os dois em posições completamente diferentes na vida.
E não havia muito tempo que restasse para ambos reverterem toda a situação.
Que diabos, aquilo era um absurdo. Mesmo que ele tivesse a oportunidade para isso, Harry provavelmente a ignoraria, para bem da sua saúde mental e da de Ron.
Oh, Ron, se ele lesse os pensamentos de Harry com certeza, ficaria o próximo semestre sem falar com ele.
E o dia mal tinha começado e lá estava ele, perdido em pensamentos que envolviam Malfoy. Aquilo havia-se tornado mais habitual que o costume, estava a um ponto de se poder ser considerado excessivo.
Tão distraido que nem deu por si encarando o vazio, mais precisamente uma face pálida e ossuda do outro lado do grande salão. Harry só deu por si quando do outro lado, Malfoy fez um gesto com a cabeça levantando o queixo e arregalando os olhos cinza, estreitando-os na sua direção.
— "Para onde você está olhando?" — Harry leu entre lábios, a cabeça apoiada na palma da sua mão e o cotovelo apoiado no tampo da mesa.
Harry subiu o olhar dos lábios finos de Malfoy e voltou a encarar os seus olhos sem nada dizer, o que fez Malfoy revirar os olhos no seu lugar e cruzar os braços sobre o peito, notoriamente incomodado.
Rapidamente, Ginny sentou bem na frente de Harry, tapando-lhe a visão e roubando a atenção de Harry.
