CAPÍTULO IX
Certo dia, depois de supervisionar a organização das tarefas domésticas e antes de iniciar os preparativos para o jantar, Elena foi até o túmulo do marido, sempre lamentado que ele tivesse morrido para defendê-la.
— Sabia que a encontraria aqui. – Uma voz masculina disse.
A voz a assustou. Ajoelhada, ela se virou para o homem que, apressado, estendeu a mão para ajudá-la a se levantar.
— Lamento muito, Sra. Salvatore. Não queria assustá-la. Matt disse que eu poderia encontrá-la aqui e… precisava conversar sobre algo importante. Peço desculpas por ter invadido um momento tão pessoal, mas é realmente importante.
Em pé, Elena o encarou.
— Não se desculpe, Sr. Fell, estava mesmo prestes a voltar à pensão. Logo será hora do jantar. Gostaria de ficar e cear conosco? — indagou, tentando ser simpática com o advogado de seu finado marido.
Logan Fell recusou o convite com evidente relutância, mas agradeceu a cortesia. Sua visita era surpreendente. Normalmente ele aparecia uma vez a cada seis semanas para ajudá-la com os investimentos e informá-la sobre sua situação financeira, mas apenas duas semanas se passaram desde a última vez em que estivera ali.
Aos trinta anos, ele era um homem agradável e de confortável posição econômica. Parecia eficiente em tudo o que fazia e fora de grande utilidade nas semanas seguintes à morte de Damon, sempre pronto a explicar que provisões o marido deixara, fundos que, com administração cuidadosa e muita economia, seriam suficientes para mantê-la e garantir sua sobrevivência. Dessa vez ele parecia mais nervoso que de costume.
— Algum problema, Sr. Fell?
— Sim, Sra. Salvatore, temos um problema. Mas acho melhor deixarmos esta conversa para quando estivermos em sua casa.
Elena concordou ansiosa e caminhou apressadamente. Quando chegaram à pensão Salvatore, Elena examinou os papéis que o advogado trouxera.
— Não tínhamos seguro contra incêndio? — Elena perguntou perplexa, olhando para os papéis que o advogado espalhara sobre a mesa do escritório.
— Não, Sra. Salvatore. Fiquei perplexo e furioso com a descoberta. Acredito que seu marido esqueceu de renovar o seguro, então não há apólice. Todo o estoque se perdeu consumido pelo fogo.
— Como essa perda poderá afetar minha vida… e a vida aqui?
— Você terá que vender a propriedade para pagar os credores.
Elena sentiu-se enfraquecer. Tinha uma propriedade com Damon, uma grande fazenda que produzia grãos e queijo. Mas o celeiro e o depósito haviam incendiando e eles perderam tudo semanas antes de Damon ser mordido por um lobisomem.
— Nunca! Damon tinha certeza de que ficaríamos seguros. Ele queria que tivéssemos um lar e as terras, esperava que pudéssemos manter os poucos criados que nos servem com tanta lealdade. Vender nossa fazenda seria como trair os desejos de meu finado marido. Deve haver outra solução.
— Lamento, Sra. Salvatore, mas não temos outra saída. O banco que emprestou dinheiro a juros exorbitantes para o investimento na produção, agora cinzas, está exigindo o pagamento. Preciso saldar parte da dívida o mais depressa possível. Não temos mais nenhum estoque para vender e angariar dinheiro para o pagamento dos juros. Ainda há a outra fazenda, em Grove Hill, cujo aluguel está atrasado, mas Damon jamais processaria uma família que já está sofrendo com tantas atribulações. Além disso, o dinheiro também não seria o suficiente, mas creio que precisará vendê-la em breve também.
Elena assentiu. Era uma fazenda pequena e com poucos rendimentos. Os inquilinos passavam por momentos de provação. A família tinha perdido dois dos filhos para uma febre, e a jovem mãe sofria do mesmo mal. Adam Stuart, um homem de quase cinquenta anos, lutava para cuidar da fazenda sozinho e ainda criar três filhos com menos de cinco anos de idade. Exigir o pagamento do aluguel atrasado seria desumano. De fato, era hora de ir visitar a família e levar um pouco da manteiga e do queijo produzido na fazenda Salvatore. Matt havia contado que, tomado pelo desespero, o Sr. Stuart vendera a última vaca leiteira da propriedade.
Houve um tempo em que Damon pudera ajudar os vilarejos e famílias mais pobres. Agora havia pouco que os Salvatore pudessem oferecer aos mais necessitados. Na verdade, em breve Elena estaria precisando da caridade alheia para sobreviver.
— Haverá algum resíduo da venda?
— Muito pouco, minha querida…
— E quanto a pensão?
— A venda da fazenda saldará suas dívidas, mas só. Poderá manter a pensão, mas até quando eu não sei, dado os gastos que a propriedade exige. Terá que conversar com seu cunhado, visto que os dois são proprietários do lugar. Juntos devem decidir o que fazer. Sei que Stefan Salvatore não parece ter recursos suficientes para prover todas as despesas, uma vez que ele fez um grande investimento na escola que fundou com a esposa.
— Mesmo vendendo tudo, ainda assim não é certo que sobre algum dinheiro para providenciar um lar para mim, meu pai e minha tia, e alguma quantia para Stefan e Caroline?
Logan Fell sabia que nada restaria da quantia angariada com a venda das propriedades da família Salvatore, mas revelar a verdade estava além de sua coragem. Elena sabia que ele só queria confortá-la, suspeitava da realidade da situação.
Elena pensou em sua própria família. Ela não tinha nada. Seu pai havia perdido todo o dinheiro no jogo. Ele voltou para Mystic Falls quando perdeu tudo, em busca do dinheiro restante de seu falecido irmão. Ela era grata que Jeremy tivesse sua própria casa, sua única herança, que agora estava alugada, uma vez que Jeremy e Bonnie foram morar em Denver, onde Jeremy trabalhava.
Elena quisera que Stefan pudesse ajudá-la, mas como irmão mais novo, ele não herdara muita coisa dos pais. Não tinha uma grande fortuna. Caroline também não tinha muito, apenas a casa da família, que se encontrava alugada. Eles tinham emprestado dinheiro ao banco para inaugurar uma escola em Mystic Falls, tinham sua própria dívida. A pensão era tudo o que restaria a Stefan e Elena.
Enquanto a viúva estava perdida em pensamento, Logan Fell olhava para a mulher que desejava e admirava em segredo. Em silêncio, tentava encontrar a ousadia necessária para expressar sua proposta.
— Há outro caminho, Elena. Você pode… deve se casar.
— Casar-me? Meu marido morreu há oito semanas! Ainda é muito cedo, e além do mais, não quero…
— Compreendo minha querida, que em circunstâncias normais o luto seria mais longo. Mas em sua situação… uma situação desesperadora… Bem, as pessoas saberiam entender e aceitar tal comportamento. Que escolhas tem? Ou encontra um homem que a queira como esposa, ou consegue um emprego, ou vai ter de suplicar pela caridade dos fiéis na igreja. Sem falar naquele vampiro original que a persegue!
— Que homem haveria de querer uma viúva com uma propriedade cuja manutenção é caríssima? Além de ser um bem que ele jamais poderá ter, visto que Damon exigiu que se eu me casasse novamente, a propriedade jamais passaria para o controle do meu novo marido. Crê que há um santo milionário? Isso não existe. Além disso, eu seria uma ameaça à vida desse homem, considerando o que aconteceu ao Damon.
— Tem razão, nenhum homem aceitaria tal fardo. A fazenda Salvatore terá de ser vendida para o pagamento de suas dívidas, porque ninguém assumiria encargos tão pesados. A outra propriedade, em breve terá o mesmo fim. Mas poderá ficar com a pensão. E como mulher viúva, vai precisar de proteção e segurança. E qualquer cavalheiro ficaria orgulhoso… feliz por poder tê-la em sua casa… — E em sua cama, ele pensou. — Com o dinheiro da venda da propriedade, poderá saldar as dívidas e garantir provisões para seus familiares antes de se casar. Seu marido deverá mantê-la depois disso e protegê-la.
— O que tem meus familiares? Se está se referindo a meu pai e tia Jenna, eles irão comigo para onde quer que eu vá e…
— Damon Salvatore era único. Um homem de coração puro e generoso. Aliás, os Salvatore, visto que seu cunhado Stefan cuida da sogra. Mas um novo marido não aceitará tal arranjo — ele afirmou, deixando os olhos se deliciarem com a visão dos seios pequenos e arredondados sobre o corpete do vestido preto. Nem mesmo o luto diminuía os encantos de Elena.
Logan Fell estava disposto a fazer sua proposta e esperava que ela fosse aceita. Mas sua generosidade jamais se estenderia ao pai e à tia da mulher que desejava ter. Ganhava um salário razoável, tinha boas perspectivas e uma casa confortável. Imaginava poder proteger Elena do vampiro Original com o apoio da aliança dos fundadores. Elena seria bem-vinda e poderia compartilhar de tudo que tinha, mas seus deveres de marido terminariam aí. Não aceitaria viver com um sogro decrépito e uma tia solteirona cuja língua não cabia dentro da boca.
Elena não conseguia pensar em mais nada. Perderia a fazenda Salvatore. Tinha dívidas a saldar, e por isso perderia a propriedade que estava na família de seu marido por três gerações. Mas como evitar o desastre? A sugestão de Logan Fell fazia sentido? Encontraria realmente a salvação ao lado de um homem bom e generoso? Sem falar na questão sobrenatural. Um marido seria apenas mais um alvo para Klaus chegar até ela.
Aceitara a proposta de Damon Salvatore e fora feliz em sua companhia. Mas Damon era conhecido de família, seu pai o tinha aprovado e considerava um bom vampiro, que a protegeria e a manteria por toda a vida. Mas as circunstâncias de seu casamento não foram as ideais. Ela o aceitara num momento em que o futuro parecera vazio, quando seus sonhos de amor tinham se desfeito e a ameaça à sua vida era constante. Damon fora sua salvação, mas nunca tiveram um casamento real. Casar-se agora exigiria que ela cumprisse suas funções como esposa. Elena não queria se casar novamente sem amor.
— Meu pai e minha tia vivem bem aqui. Gostaria que meu pai pudesse passar seus últimos dias no mesmo lugar.
— Sabe que sou capaz de tudo para agradá-la, minha querida, mas manter a fazenda Salvatore, mesmo que só por mais um mês, está além de todas as possibilidades. Por outro lado… já deve ter adivinhado meus sentimentos, Elena. Nunca fui capaz de escondê-los. Há muito tempo a admiro. Envergonho-me de confessar que, apesar de toda a afeição que tinha por meu querido e finado amigo Damon, já a desejava e o invejava quando ainda era vivo. Eu seria o mais orgulhoso dos homens se aceitasse ser minha esposa. Tenho uma casa confortável e um bom salário. Possuo negócios e estou progredindo tão depressa que já penso em procurar por um sócio. Além disso, como membro das famílias fundadoras, posso utilizar todos os recursos para protegê-la e livrá-la daquele vampiro que a persegue.
Elena o encarou perplexa. Não esperava por aquela declaração. Ela nunca imaginou que o homem nutrisse interesse por ela.
— Por favor, senhor… Estou surpresa com o que me disse... Não imaginei... Sou muito grata por sua proposta, mas não posso… não posso nem pensar em casar-me neste momento. Sua bondade em oferecer sua casa, sua proteção e seu dinheiro causam-me grande honra, mas não posso aceitar…
— Eu entendo. É normal que uma viúva tenha ao menos um ano de luto. Não teria formulado o pedido tão cedo em circunstâncias normais, mas vivemos uma situação de urgência. As pessoas entendem que a dificuldade financeira contraria tais códigos. Sem falar na ameaça à sua vida. Mas aceito sua necessidade de tempo para refletir. Espero que considere minha proposta e a aceite, Elena. Depressa.
