CAPÍTULO XXIV

Elena encontrou a pequena biblioteca dos Saltzman vazia e iluminada. Apressada, sentou-se e, munida de papel e pena, começou a escrever, as mãos trêmulas. As palavras fluíam sem esforço da mente conturbada. E depois de ler a breve mensagem duas vezes, selou-a e fechou os olhos para conter as lágrimas.

Nunca recorrera à mentira, até agora. Sempre fora sincera e honesta. Jamais imaginara que um dia teria necessidade ou coragem para tanto, para mentir e enganar. Por isso, sabia que devia entregar a nota imediatamente a um criado, antes que a covardia ou a consciência a fizessem lançá-la ao fogo.

Na carta, fingia aceitar os termos do vampiro original. Faria como ele desejava e se mudaria para Nova Orleans assim que o banco confirmasse por escrito o pagamento da dívida, e que Klaus informasse que ela estava livre de sua perseguição, assim como seus familiares e amigos. Mas era uma farsa. Não tinha intenção de deixar Mystic Falls nunca mais depois da semana seguinte.

Kol não a queria de verdade. Ele já havia dito isso quando garantiu que não se casaria com ela. Oh, como seria bom poder vê-lo quando a verdade se fizesse clara! Como reagiria ao saber que gastara tempo e dinheiro por nada? Mas era imperativo que o evitasse a partir desse momento. Kol a conhecia bem, e não seria difícil desmascará-la. E se suspeitasse de sua trama… Não queria nem pensar do que seria capaz... Possivelmente ele mesmo a entregasse a Klaus.

A dúvida e o pânico borbulhavam. Ela se levantou, buscando coragem na lembrança do que dissera o repugnante Sr. de Martel, de ser o próximo da fila quando Kol a descartasse. Uma loira também figurava em seu tormento, quem ela imaginava ser uma das amantes do vampiro. Impelida pela mente conturbada, deu alguns passos na direção da porta e estendeu a mão para a maçaneta, mas alguém a abriu pelo outro lado.

— Elena?

O tom firme e sereno quase a fez desfalecer.

— O… o que faz aqui? — perguntou apavorada.

— Parece assustada. Algum problema?

— Nenhum — respondeu apressada. — Nenhum, Sr. Mikaelson. Estou… surpresa em vê-lo. Soube que tinha um compromisso aqui mesmo no bairro.

Elena acabara de falar demais. A luz da compreensão iluminou os olhos do vampiro. Dedos firmes seguraram seus braços, empurrando-a contra a porta fechada atrás dela.

— O que está fazendo? Devo ir… — Com uma das mãos, empurrava a parede de músculos que compunha o peito amplo, enquanto a outra tentava esconder a carta entre as pregas da saia.

— Todos estão se divertindo no salão.

— Os anfitriões estão ansiosos por sua presença… como sempre. Logo alguém virá procurá-lo e…

— Acabei de chegar. Disse ao criado para não me anunciar. Trouxe Rebekah comigo, ela vai ser o centro das atenções. E não encontrei ninguém além de você.

— Não esperava que viesse, Lorde Mikaelson. Já é tarde e…

— Também não esperava vir, Elena. E se continuar me chamando de Lorde Mikaelson... Estou um pouco atrasado, é verdade, mas não é isso que a aborrece.

— Nada me aborrece. Quero dizer, não quero que nos vejam aqui sozinhos…

— Reconheço que esse é um motivo justo. O que mais? Já sei. Acha que me atrasei porque estive antes aqui neste bairro visitando uma mulher. Ouviu comentários sobre mim, e parece que está inclinada a acreditar neles. — Kol estava irritado, Elena podia ver as veias sutis se formando em seu rosto — Pergunte o que quer saber. Posso confirmar o que for verdadeiro e desmentir o que for falso, se quiser saber mais.

— Não ouvi nada. — Ela reagiu nervosa. — Mas você sabe... O que mais ocupa a alta sociedade se não os afazeres dos Mikaelsons? Seu dinheiro e sua moral são, especialmente, o centro de todas as atenções nestes últimos dias. As pessoas estranham a desigualdade. Um em excesso, o outro insuficiente… — disparou, incapaz de conter a fúria e a dor.

— Bem, esse é um problema de fácil solução. Saldar suas dívidas diminuirá em muito a minha fortuna, e você sempre teve um efeito poderoso sobre minha moral — ele zombou.

— Solte-me! — Elena exigiu, usando as duas mãos na tentativa desesperada de desvencilhar-se.

Foi um movimento impensado, e Kol tirou proveito de sua agitação para apoderar-se da carta.

— Vejo que esteve escrevendo para mim — disse, reconhecendo seu nome. — Devo ficar com a carta?

— Por que não? Assim economizarei o dinheiro da postagem — concordou, fingindo indiferença. — Por favor, não leia a nota agora.

— Não sei se suportarei a espera.

Tinha de ser corajosa, ou poria tudo a perder.

— Não precisa abri-la. Posso resumir o conteúdo da mensagem, caso ainda não a tenha adivinhado. Reconheci o sentido de sua proposta… como esperava que acontecesse. E gostaria de… de receber uma comunicação formal do banco com relação ao pagamento das dívidas antes de me mudar para cá. Quanto antes providenciar o depósito, melhor. O Sr Fell mencionou juros exorbitantes... e isso foi logo depois que Damon morreu.

— Bem, fico satisfeito por saber que está tentando poupar meu dinheiro. Mas não me agrada constatar que precisa de uma confirmação do banco para ter certeza de que cumprirei minha parte no acordo. Não confia em mim?

— Não é uma questão de confiança, Sr. Mikaelson. Esse é um termo que não faz parte dos diálogos entre parceiros comerciais. Um acordo de negócios deve ter cláusulas claras que garantam a ambas as partes o direito de satisfação.

— Exatamente. As duas partes têm esse direito. Está certa de que devo ficar com a carta?

— Sim, é claro. Por que não? — Ela sorriu nervosamente. Não havia como voltar atrás agora. — Além disso, há outra cláusula... Quero uma carta de seu irmão garantindo que não virá atrás de mim ou daqueles que amo.

Kol a encarou, avaliando-a. Elena era incapaz de olhá-lo nos olhos.

— Certo. Providenciarei tudo.

— Obrigada! — Elena estendeu a mão para o vampiro.

— Há uma maneira mais simples e agradável de selar um acordo, Elena, sem a interferência de advogados e termos legais.

Fingindo não entender a insinuação, ela tentou se libertar, mas não havia se afastado alguns centímetros quando foi puxada contra o corpo forte.

— Por favor, solte-me! Tenho que ir. Minha tia já deve estar sentindo minha falta…

— Este não é um bom começo para alguém que acaba de aceitar um… acordo.

— Ainda não cumpriu sua parte. Por que devo cumprir a minha?

— Por cem mil libras e a benção de Klaus, acho que tenho direito a uma amostra.

Kol a beijou. Um beijo selvagem, diferente da carícia terna que recebera no jardim dos LaRue. Elena tentou empurrá-lo, mas sucumbiu à força superior do oponente e, com um soluço abafado, deixou-se envolver. Então o beijo assumiu uma natureza diferente, mais doce e sedutora, mais ousada e envolvente. No segundo seguinte ele a soltou.

— Tenho mesmo uma amante neste bairro — Kol confirmou a caminho da porta. — Mas isso foi antes. Esta noite vim direto da Mansão. Achei que gostaria de conhecer a verdade. Acreditar nela ou não é uma decisão sua.

A frieza com que ele tratava do assunto a inflamou.

— O que aconteceu? Ela o desagradou de alguma forma? Não demonstrou charme servindo sangue, talvez? O que fez com ela? Trocou por um faqueiro de prata? E por mim, o que receberá? Um objeto enfeitiçado?

Kol se deteve a encarando. Elena respirava agitadamente, mas ele permanecia calmo e sereno.

— Se está se referindo ao incidente comentado por toda a cidade, saiba que também fiquei chocado. Não esperava que o serviço fosse tão… completo. Quanto à outra insinuação… Presumo que Lucien Castle esteja aqui. Ele abordou o assunto diretamente com você? — Kol demonstrou irritação — Reconheço que o sujeito é odioso, mas nem mesmo ele seria capaz de discutir tais questões com uma dama. Deve ter ouvido a conversa entre outros convidados.

— Eu nunca ouço conversas alheias!

Elena pensou que tinha de distraí-lo. Se eles continuassem a falar sobre isso, ela acabaria revelando toda a dor e revolta provocadas pela descoberta acidental. Depois disso, descobrir o motivo por trás de sua carta seria fácil. Só havia um jeito de distraí-lo. Pela primeira vez em sete anos, aproximou-se de Kol Mikaelson espontaneamente e passou os braços sobre seus ombros.

— Lamento ter sido tão impertinente. Estou… mais cansada e abalada do que imaginava. Gostaria de beijá-lo e…

— Desista, Elena. Não sou mais aquele vampiro tolo de antes. E não me satisfaço com a mesma facilidade. Espero que seu maravilhoso marido a tenha iniciado corretamente na arte do amor, porque estou realmente preocupado com minha satisfação. Afinal, é um investimento de cem mil libras, além de um acordo com o próprio diabo, na forma de meu irmão, o que torna a possibilidade de trocá-la por um artefato mágico praticamente inviável. Fique tranquila, minha querida. Na segunda-feira receberá do banco a confirmação de que o devasso imoral pagou a dívida de seu impecável e correto marido, junto com a carta de meu irmão garantindo a sua segurança e daquela cidadezinha inteira, se você quiser. Agora, pode me beijar.

Pois bem, se era isso que ele queria… Erguendo-se na ponta dos pés, fechou os olhos e esperou pelo beijo. Nada aconteceu. Irritada com a frieza de Kol, colou os lábios nos dele e exerceu pressão, mas ele não reagiu.

— Oh, não vou perder tempo com isso. Se não quer ser beijado…

A resposta petulante foi interrompida pelo beijo atrevido do vampiro que entreabriu seus lábios para executar uma verdadeira invasão erótica. Ele mordeu o lábio inferior dela, e Elena sentiu o gosto de sangue. Mas tão rápido quanto a invasão começou, ela terminou, deixando-a tonta e aturdida.

— Eu… não gostei disso… — Elena murmurou, sentindo-se traída pelo próprio corpo.

— Vai acabar se acostumando.

Furiosa, passou por ele e saiu da biblioteca, limpando o sangue dos lábios e rezando para que ninguém soubesse o que tinha acabado de acontecer naquele cômodo.