QUANDO NOS TOCAMOS
BY DAMA 9
Nota: Os personagens de Saint Seya não me pertencem, pertencem a Masami Kuramada e a Toei Animation.
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Importante!
Dama 9 e amigos incentivam a criatividade e liberdade de expressão, mas não gostamos de COPY CATS. Então, participe dessa causa. Ao ver alguma história ou qualquer outra coisa feita por fã, ser plagiada ou utilizada de forma indevida sem os devidos créditos, Denuncie!
Boa Leitura!
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Capítulo 6: Equilíbrio Distante.
(...) Porque cada vez que nos tocamos,
eu sinto essa estática
E cada vez que nos beijamos,
eu alcanço o céu (...)
.I.
Arrumou a alça da bolsa sobre o ombro enquanto parava por alguns segundos tentando recuperar o fôlego, respirou fundo seguidas vezes antes de tirar um lenço de algodão branco do bolso traseiro da calça e passá-lo pela testa, mesmo estando perto de anoitecer, o calor ainda era intenso naquela época do ano, deveria estar acostumado com isso depois de tanto tempo ali, mas não... Ainda não estava. O que muitas vezes era motivo para despertar aquele tenro sentimento de saudade de casa que vez ou outra lhe acometia.
Balançou a cabeça levemente para os lados, não sabia o porquê mestre Shion havia invocado de querer restaurar aquele lugar esquecido pelos deuses, mas acabara aceitando o desafio como uma forma de ocupar o tempo ocioso.
Seu jardim era o mais belo de toda a Grécia, se não do mundo, mas as Rosas de Peixes em sua máxima perfeição floresciam sozinhas agora, então decidira concentrar-se em outro jardim, obviamente não tão perfeito quanto o seu, mas havia belas flores ali que estavam sendo negligenciadas e ele era o único que poderia resolver isso.
Guardou o lenço de volta no bolso e continuou a subir a colina, o jardim dos deuses estava abandonado há mais de quinze anos, desde o início da batalha contra os Titãs de Chronos, era incrível que algumas das estatuas que foram confeccionadas exclusivamente para aquele lugar ainda estivessem intactas, principalmente depois da passagem de Aiolia por ali.
Aquele garoto não tinha um pingo de delicadeza e isso não mudara muito ao longo dos anos, era impossível esquecer o estrago que ele poderia causar quando estava em seu melhor dia. Durante muito tempo se perguntou por que Ares simplesmente não o eliminava, em vez de mandá-lo para missões cada vez mais complicadas, seja na Grécia ou em outros países, mas a verdade era que nenhum oponente era forte o bastante para enfrentar a determinação do cavaleiro de Leão, um cavaleiro capaz de destruir com seus punhos um esquife de gelo eterno com mais de três metros de altura e cinco de diâmetro, ou de ir a extremos para proteger aqueles que lhe são caros devia ser temido, mas acima de tudo, respeitado. Mesmo sendo um moleque rebelde que lhe atacava os nervos; ele pensou serrando um dos punhos sob a alça da bolsa.
Assoprou levemente a franja azulada que caia sobre seus olhos, carregar aquele monte de ferramentas colina acima não era nada agradável, se ao menos houvesse encontrado com Mú no caminho, poderia pedir uma carona agora que Shion liberara o ariano da regra que o impedia de usar telecinese para se locomover entre as doze casas.
Faltava pouco para alcançar os portões de ferro quando seus ouvidos captaram um som baixo carregado pelo vento, franziu o cenho ao deixar os orbes correrem para todos os lados, buscando a origem do som, enquanto entrava no jardim.
O som tornou-se mais alto agora, parece que não estava sozinho ali como desejava; Afrodite pensou aborrecido. A sua frente um grupo de estatuas já havia sido quase totalmente coberta pelas eras que haviam crescido e se entrelaçado no mármore, precisaria dar um jeito naquilo também; o cavaleiro pensou, mas surpreendeu-se ao deixar seus orbes recaírem aos pés da estatua de Afrodite e notar que o som, semelhante a um soluço vinha dali, onde uma jovem de longas melenas douradas e tristes orbes azuis jazia encolhida.
Tinha a impressão de já ter visto aquela garota antes, mas onde? –ele se perguntou. Ela parecia tão frágil e desamparada que era de cortar o coração, isso se deixasse algo do tipo lhe abalar. Aproximou-se cautelosamente, sendo ela amazona ou não, era melhor se precaver e impedir um ataque surpresa, se houvesse um.
-Hej damen*! Você está bem? –Afrodite perguntou chamando a atenção da moça.
-Uhn!? –ela murmurou assustando-se ao constatar que não estava mais sozinha.
-Perguntei se você está bem? –ele repetiu agora em grego, supondo que ela poderia não o ter entendido da primeira vez por ter utilizado o idioma de sua terra natal.
-Eu... sim; June respondeu, enquanto passava as mãos nervosamente pela face, tentando aplacar as lágrimas que ainda caiam.
-Não é o que parece; Afrodite falou desconfiado.
-Mesmo que não fosse, não é da sua conta; ela rebateu ferina, antes de se levantar.
-Calma aí mocinha; o cavaleiro aborrecido. –Só perguntei se estava bem, os motivos que te levaram a isso não são problemas meus e nem me interessam; ele falou antes de se afastar.
Está vendo idiota! – ele pensou irritado. Isso era o que recebia por demonstrar uma ínfima preocupação com as pessoas, por isso preferia as rosas, além de mais dóceis, não falavam e por tanto, não lhe aborreciam com suas emoções frágeis e contraditórias.
-Idiota! – June resmungou cruzando os braços na frente do corpo.
-O que disse? –Afrodite falou, voltando-se para a amazona com os orbes azuis perigosamente estreitos.
Quanta insolência, quem aquela menina pensava que era para lhe tratar assim. Logo ele, o cavaleiro de ouro da casa de Peixes? –ele pensou estalando os dedos longos e finos, fazendo surgir entre eles uma delicada rosa vermelha.
-Rosa... Vermelha; June murmurou empalidecendo.
-Hei! – Afrodite falou correndo até ela, impedindo a queda iminente quando a jovem desmaiou.
Droga! Só queria lhe dar uma lição mostrando o perigo que estava correndo por lhe irritar, não a fazer desmaiar. Maldição! Aquele definitivamente não era seu dia; ele praguejou em pensamentos.
Não estava entendendo nada, afinal, qual o trauma daquela garota com rosas? Não, era melhor não saber. Saber seus motivos acabaria o envolvendo nos problemas dela e de quebra, geraria um envolvimento emocional não desejado, mas ao abaixar os olhos para a pequena figura entre seus braços, engoliu em seco. Ela parecia tão frágil e ferida, balançou a cabeça levemente para os lados, sabia que iria se arrepender depois, mas não podia deixá-la ali sozinha e desacordada; o cavaleiro concluiu suspendendo-a do chão e aninhando-a entre os braços.
Ouviu-a murmurar algo, mas em seguida voltou a silenciar, com a mão livre arrumou a alça da bolsa no ombro, antes de seguir para fora do jardim, adeus planos de começar a trabalhar ali naquele dia, se mestre Shion reclamasse, o transformaria em adubo para suas rosas.
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Retirou a última compressa fria da testa do cavaleiro, agora ele dormia tranquilamente e a febre cedera. Suspirou pesadamente, aquilo tudo era tão confuso, por um momento pensou realmente que fosse Hades ali, mas como Athena dissera, não tinha direito de se apegar a ele na falta do marido; Cora pensou, enquanto distraidamente acariciava uma mexa de fios esmeralda que caia sobre o ombro dele.
Entretanto, a divindade da justiça não tinha como saber o tamanho da dor que cortava seu coração cada vez que se lembrava de que o companheiro jamais voltaria. Quem sabe o desejo de ter Hades de volta fosse tão grande que tinha aquelas alucinações, vendo o marido vez ou outra refletido nos olhos do cavaleiro, até mesmo sentindo seu cosmo envolver-lhe a alma e acalmar-lhe o coração.
Balançou a cabeça levemente para os lados, precisava aprender a bloquear seus pensamentos ou acabaria enlouquecendo por causa deles; ela pensou vendo-o pouco a pouco abrir os olhos.
-Oi; o cavaleiro falou levemente sonolento.
-Oi; Cora respondeu com um fraco sorriso.
-Sinto como se tivesse sido atropelado por um titã; Shun falou, levando uma das mãos a cabeça, sentindo-a latejar.
-Você teve um pouco de febre e ficou bastante tempo dormindo; ela explicou.
Lembrava-se vagamente de ter dormido, mas não de como chegara ali. A última coisa concreta de que se lembrava era da conversa com June. June! –ele pensou levantando-se rapidamente, sentindo sua mente estalar.
-Preciso falar com a June; Shun falou agitado.
-Shun, calma; Cora pediu, tentando detê-lo.
-Não, eu preciso encontrá-la; ele falou preocupado.
Não devia tê-la deixado sozinha no jardim, mas por algum motivo sentira-se inquieto e saíra, depois disso, tudo era muito vago. Droga! June poderia estar em qualquer lugar agora, mas era culpa sua o fato dela estar chorando; ele pensou desesperado.
-Do que está falando Shun? –Cora perguntou confusa.
-Da...; ele parou ao voltar-se para a jovem de melenas negras.
Uma imagem passou rapidamente diante de seus olhos, viu-se na entrada da Fonte de Athena em um lugar onde podia observá-la a distância, mas Cora não estivera sozinha naquele momento, Milo conversava com ela, depois viu-se falando algo ao Escorpião, mas o que?
-Shun! – ela chamou agitando a mão na frente de seus olhos, tentando chamar-lhe a atenção. –É melhor voltar a descansar, você ainda não está bem;
-Não posso, primeiro tenho que encontrar a June; ele falou antes de levantar-se rapidamente e seguir para fora do templo, deixando uma Imperatriz atônita para trás.
Mesmo que não fosse capaz de corresponder aos sentimentos da amazona, não deixava de se preocupar com ela, nem se absteria da culpa de ser o causador de seu sofrimento. Se ao menos não estivesse tão confuso, talvez pudesse vir a amá-la com a mesma intensidade do amor inocente que um dia sentira. Entretanto, algo lhe dizia que as coisas não iriam se ajeitar tão facilmente assim; ele pensou descendo as escadarias do décimo terceiro templo correndo.
Precisava encontrá-la e ter certeza de que June estava bem, essa era sua prioridade agora, depois iria falar com Milo e perguntar o que realmente havia acontecido; ele pensou.
.II.
Com cuidado, deitou-a sob os lençóis de cetim azulado, não era dado a trazer estranhos para sua casa, pelo contrário, detestava visitas inesperadas, mas jamais iria abandonar àquela jovem no jardim, sem ter certeza de que ela ficaria bem. Querendo ou não, aquela moça era sua responsabilidade agora, mas quem era ela afinal? –ele se perguntou enquanto afastava a colcha e a cobria com um lençol fresco.
-Filipe; ouviu uma voz irritada lhe chamar.
Serrou os punhos irritado, enquanto deixava o quarto tomando o cuidado de fechar cuidadosamente a porta atrás de si.
-Grrrrrrrrrr, já não disse para não me chamar assim; Afrodite exasperou ao interceptar o italiano no meio do caminho.
-Como se eu me importasse com isso; Máscara da Morte falou com pouco caso, dando de ombros.
-O que quer aqui? –o pisciano perguntou cansado. Aquele idiota nunca iria mudar.
-Vim ver se seu jardim estava pegando fogo ou coisa parecida; ele falou indiferente.
-Por quê? –Afrodite perguntou chocado, aspirando instintivamente o ar para sentir se havia algum indício de fumaça ou fogo que não notara antes.
-Você subiu os templos como um louco e passou por Câncer sem parar para me atormentar, por isso pensei que estivesse pegando fogo aqui em cima, ou coisa do gênero; ele explicou, gesticulando casualmente.
-Não; o cavaleiro falou balançando a cabeça levemente para os lados. Por que cancerianos tinham que ser tão dramáticos? Não que Máscara da Morte fosse o canceriano típico, mas vez ou outra ele parecia ser acometido por essa estranha preocupação por alguém além dele mesmo, o que era bastante bizarro se fosse pensar bem nisso; ele concluiu em desalento. –Só estava com pressa;
-Certo; o canceriano falou desconfiado, notando os esporádicos olhares que o outro lançava para trás, em direção aos quartos do templo. –A propósito, Athena pediu que você fosse ao último templo falar com ela;
-Sobre o que?
-Não sei, mas suponho que seja sobre uma amazona nova que chegou ao Santuário;
-Não vou treinar um pupilo se é o que Athena está pensando; Afrodite falou enfezado.
-Não, ela já é amazona e tem armadura;
-Então?
-Estou me referindo a namoradinha do Andrômeda; ele respondeu com um sorriso malicioso. –Ouvi o Escorpião falando com Kamus, parece que ela chegou há pouco tempo;
-O que isso tem a ver comigo? –Afrodite perguntou confuso.
-Talvez porque ela possa tentar matar você, acho que Athena quer evitar isso. Por quê? Não faço ideia; ele falou debochado.
-Me matar? –o pisciano falou incrédulo. –Mas porque...; ele parou lembrando-se da jovem no quarto a poucos metros dali e teve uma estranha intuição sobre isso.
A reação que ela tivera quando vira a rosa vermelha. Será? Mas era coincidência demais.
-Você sabe como ela é? –Afrodite perguntou casualmente.
-Loira, rostinho de anjo, brilhantes olhos azuis. Uma cabeça que eu não me importaria em ter na minha coleção; ele completou com um sorriso sádico.
-Não se atreva a encostar a mão nela; o pisciano vociferou.
-Uhn! Está interessado, é? –Máscara da Morte provocou malicioso.
-Não tem nada a ver uma coisa com outra; ele resmungou aborrecido. –Deixe a garota em paz;
-Não tenho interesse em loiras mesmo; o italiano falou dando de ombros com pouco caso. –Mas fique atento, de anjo ela só tem o rostinho. Como qualquer mulher, ela não é confiável e pode te matar ao menor deslize; ele falou indo embora.
-Como é exagerado; Afrodite resmungou, vendo-o desaparecer ao longo do corredor.
Será que alguém, um dia seria capaz de entender aquele cavaleiro? Provavelmente não. É, isso porque diziam que cancerianos eram sensíveis e amáveis; ele pensou rindo. Era impossível saber se Guilherme estava realmente preocupado consigo, ou se na verdade queria apenas ver o circo pegar fogo. Entretanto era obrigado a admitir que em parte ele tinha razão, se aquela menina que estava em seu templo estivesse relacionada ao cavaleiro de Andrômeda, teria mais problemas do que estava disposto a lidar; ele pensou enquanto passava a mão levemente pela franja arrepiada, enquanto deixava o templo, rumo ao último.
.III.
Nos últimos anos podia contar nos dedos o número de vezes em que deixara seu templo para descer até ali, a mais recente, fora há quase dois anos atrás quando a batalha nas doze casas terminara e acompanhado dos últimos cavaleiros de ouro vivos no Santuário, ajudara a restaurar as armaduras dos cavaleiros de bronze.
De olhos abertos, descia as escadarias apreciando o silêncio e a calmaria que recaiam sobre o Santuário com a chegada da noite, em outros momentos teria evitado descer todos os templos até ali, mas a conversa que precisava ter com o guardião da primeira casa era séria demais para ser feita de maneira impessoal, ou por telepatia.
Atravessou as colunas de mármore, notando com surpresa que a casa não aparentava ter sido totalmente destruía a pouco menos de seis meses. Como um dos muitos milagres que precederam a volta dos cavaleiros, a reconstrução do Santuário era uma delas e talvez, a mais surpreendente; ele pensou.
O corredor principal estava vazio e escuro, mas podia enxergar uma ínfima luz no fim do corredor, onde as escadas para a casa do guardião ficavam, cada templo era tão singular quanto seu morador, enquanto o templo de peixes tinha um imenso jardim de rosas, o de virgem possuía a sala das Árvores Gêmeas e sagitário, um labirinto entalhado nas cavernas rochosas formadas embaixo dele.
Era difícil saber o quão diferentes eram os demais templos, já que nunca frequentara a casa dos outros cavaleiros, mas a primeira casa parecia bem comum em vista das outras.
-Não se engane cavaleiro, você poderia se surpreender com o que pode encontrar aqui; a voz do ariano reverberou por todo o salão, ressoando pelas paredes de mármore com uma intensidade que faria qualquer um retroceder, mas não ele, obviamente.
-Estava me perguntando se iria encontrá-lo aqui ou perder a viagem? - Shaka comentou vendo as luzes acenderem-se de repente, ofuscando-lhe a visão por alguns segundos. Maldição! Era como se ele soubesse que estava com os olhos abertos e houvesse feito de propósito.
-Como pode ver, por enquanto ainda estou aqui; Mú falou abrindo a porta no topo das escadas e indicando para que ele subisse logo.
-Normalmente não sinto seu cosmo em Áries; Shaka falou casualmente. –Imaginei que você pudesse estar em Jamiel;
-Já faz um bom tempo que não vou até lá; o ariano respondeu vagamente sem oferecer a ele uma explicação sobre a capacidade que tinha de ocultar o próprio cosmo, tornando impossível até mesmo para Shaka saber sua localização, a menos que ele quisesse.
Seguiu de volta até a cozinha, onde originalmente estava até sentir a presença do virginiano em seu templo.
–Há que se deve essa visita? Espero que não seja a ameaça de uma nova guerra santa; ele comentou.
-Por que diz isso? –Shaka indagou arqueando a sobrancelha, enquanto o cavaleiro puxava uma cadeira em volta da mesa e indicava outra a ele.
-Para lhe fazer sair de Virgem e ainda por cima vir até aqui, acredito que só a iminência de uma nova guerra; ele respondeu mordaz.
-Os anos podem ter se passado, mas você ainda continua um insolente; o virginiano resmungou contrariado.
-Se vamos trocar insultos é melhor eu terminar meu chá, espero que não se importe? –Mú falou, enquanto tranquilamente se servia de uma xícara de chá que deixara sobre a mesa.
Suspirou irrequieto, aquilo iria ser mais difícil do que planejara, deveria ter imagino que Mú não iria facilitar as coisas para si. Também pudera, já deveria ter colocado na cabeça que a paciência daquele cavaleiro era capaz de irritar um santo e se ele não estivesse disposto a ajudar, teria um grande problema pela frente.
-Servido? –o cavaleiro indagou, indicando a outra xícara.
-Por favor; Shaka respondeu num resmungo.
A essência suave de morango e canela recendeu pelo ar seguido por uma nuvem prateada que caia sob a borda da xícara de porcelana. Observou os movimentos metódicos e precisos do cavaleiro e franziu o cenho levemente.
-O que foi? –Mú perguntou arqueando a sobrancelha.
-Nada; ele apressou-se em responder.
Por mais que fosse evidente não ser bem-vindo ali, o cavaleiro agia com tranquilidade e refinamento, quase como um fidalgo. Nunca havia reparado nos modos dele antes, o que não era de se surpreender já que o cavaleiro voltara a viver no Santuário fazia pouco tempo. Entretanto isso não era importante agora, embora fosse bastante curioso reparar nisso.
Mú jamais voltou a pisar no Santuário desde a morte de Shion a quinze anos atrás, embora na época não houvesse dado tanta importância para isso, sabia o risco que correra ao tomar o partido de Ares, quando confrontara ele no mausoléu dos cavaleiros, durante o enterro do Grande Mestre.
Por mais calma e tranquilidade que ele demonstrasse sentir, era evidente que o ariano se assemelhava mais a uma caixa de Pandora, com uma infinidade de coisas guardadas e que ninguém ousaria desvendar, diferente de Aiolia que sempre fora expansivo com suas emoções, fossem elas boas ou más.
-Insultos a parte, imagino que haja um motivo para você ter vindo aqui, não? –Mú falou levando a xícara aos lábios e sentir que o líquido já estava temperatura correta para ser ingerido, sem que precisasse resfriá-lo para tal.
-O que eu tenho para falar com você é referente ao Shun; Shaka respondeu pegando a xícara que lhe fora oferecida e aspirando lentamente o aroma, antes de assoprar a fumaça prateada, notando a sobrancelha fina do cavaleiro arquear-se, quase o repreendendo por isso.
-Ele está se desenvolvendo bem, mas seu cosmo ainda não está em equilíbrio; o ariano falou pensativo.
-Eu acredito que tem alguma coisa interferindo com a concentração dele e impedindo que ele controle a expansão do cosmo de uma vez; o virginiano explicou.
-Faz sentido, mas o que isso tem a ver comigo? –Mú indagou com os orbes verdes cintilando de maneira perscrutadora.
-Eu estive pensando que, se talvez ele desenvolvesse uma forma de canalizar e liberar esse cosmo em expansão, ele sofreria menos desgaste físico e fortaleceria seu autocontrole; Shaka explicou.
-O desgaste físico vai acontecer de uma forma ou de outra, as células de seu corpo não estão preparadas para comportar o nível de energia que ele está acumulando, apenas canalizar o cosmo e liberá-lo não vai ajudar muito, porque quando ele cansar demais, vai perder o controle de qualquer forma; Mú explicou, vendo-o franzir o cenho.
-Imagino que para usar a telecinese seja necessário despender muita energia, não? –Shaka falou casualmente, contornando de maneira distraída a borda da xícara com a ponta dos dedos.
-Você sabe que sim; Mú respondeu desconfiado.
-Eu pensei que talvez você pudesse ensiná-lo a usar a telecinese, de forma que ele queimasse parte da energia acumulada, já seria um bom começo; ele falou como quem não quer nada.
-Shaka, eu já tenho um pupilo a quem ensino telecinese, você sabe bem disso; o ariano respondeu com os orbes estreitos. –Mas você pode muito bem cuidar disso, já que ele é seu sucessor e você conhece o procedimento tanto quanto eu; ele rebateu.
-Shun é meu sucessor, mas você está mais bem preparado para isso nesse momento; ele falou serrando os punhos nervosamente, odiando ter de admitir aquilo e o real motivo de tê-lo procurado.
-Uhn! Interessante; Mú murmurou com um fino sorriso nos lábios pousados sob a borda de porcelana. –Mas diga a verdade Shaka;
-O que? –o cavaleiro perguntou cauteloso.
-O que exatamente você está escondendo de Athena, que o fez vir até mim? –Mú indagou, deixando a xícara sobre a mesa e recostando-se na cadeira, enquanto cruzava os braços na frente do corpo.
-Não sei do que está se referindo; Shaka falou incomodado.
-Ah! Você sabe sim; o ariano pressionou. –Se não, você teria ido falar com mestre Shion em vez de estar aqui... Se acaso eu aceitasse cuidar do Shun, não pensa mesmo que eu entraria nisso as cegas, não é?
-Mú, se você não está preocupado com o caso do garoto, sinto ter lhe incomodado, pensei que por tê-los apoiado no começo você fosse ao menos capaz de demonstrar alguma consideração com o garoto; ele exasperou levantando-se bruscamente.
-Sente-se!
-O que? - o cavaleiro falou, mas assustou-se quando viu-se obedecendo ao comandando do ariano.
-Primeiro, com quem me preocupo ou não, não é da sua conta! - Mú falou num tom velado de aviso, enquanto os olhos verdes cintilavam de forma perigosa pregando o outro cavaleiro em seu acento. –Segundo, se tem alguma coisa errada com ele, eu quero saber, não venha bancar o ofendido comigo Shaka, que isso não vai funcionar. Não tenho nada a perder aqui, já você... Pode dizer o mesmo? - ele completou.
Respirou fundo sentindo-se inquieto com a intensidade do cosmo do cavaleiro, sempre o considerara uma pessoa pacífica, mas era obrigado a admitir que desde a invasão ao Santuário pelos espectros de Hades, Mú já não aparentava mais a mesma serenidade de antes, aliás, uma serenidade que mascarava uma natureza tão violenta quanto uma tempestade em alto mar.
-Tem um cosmo diferente pairando pelo Santuário desde que nós voltamos e os cavaleiros foram encaminhados a Fonte de Athena para se recuperarem; ele respondeu depois de alguns minutos de silêncio reflexivo. –Desde então Shun vem sofrendo com algumas interferências em seu cosmo e em sua personalidade. Eu... Bem... Tenho quase certeza de que isso está relacionado ao constante descontrole dele, mas falei com mestre Shion e Saga, nenhum dos dois parece ter sentido esse cosmo que notei;
-Acha que ele desenvolveu uma espécie de esquizofrenia ou dupla personalidade depois das guerras? –Mú indagou.
-Não exatamente; Shaka respondeu passando a mão nervosamente pelos cabelos. –Mas acho que isso o está afetando, causando o descontrole e a expansão do cosmo. À primeira vista ele parece bem e saudável, mas existem momentos que ele tem crises de febre vindas do nada, ou age de maneira estranha; ele explicou.
-E você atribui isso ao cosmo? –ele perguntou pensativo.
-Em parte; Shaka falou pausadamente. –Nós sabemos que após a batalha no Santuário do mar, Julian Solo perdeu a memória e com isso, o cosmo de Possêidon ficou adormecido. Atualmente ele não representa risco algum para nós, mas não sabemos se isso vai continuar assim ou por quanto tempo;
-Você não está querendo dizer que talvez Hades...?! - Mú começou.
-Não tenho certeza; Shaka o cortou, enquanto respirava fundo, ponderando como continuar. –Em uma de nossas seções de meditação, Shun falou que vem se sentindo inquieto demais ultimamente e que isso era causado por coisas que ele vinha sentindo, mas que pareciam não pertencer a ele;
-Uhn! Então você acha que de alguma forma, ele e Hades ainda podem estar conectados, mesmo depois do término da guerra?
-Seria uma forma de explicar por que ele anda agindo de maneira diferente nos últimos tempos, Hades pode ter tido seu corpo imortal destruído nos campos Elíseos, mas o que nos garante que ele não possa ter fragmentado sua alma de novo e mantido uma parte de si adormecida em Shun?
-Com que propósito? –o ariano indagou.
-Recomeçar uma guerra talvez; ele sugeriu especulando.
-Não parece muito provável, principalmente porque todos os espectros estão mortos; Mú falou pensativo. Talvez houvesse outro motivo bem mais complexo e egoísta; ele pensou, mas para ter certeza teria de investigar pessoalmente. –Vou conversar com Shun e fazer uma avaliação do estado dele, mas não lhe dou certeza de que irei ensiná-lo; ele avisou.
-Já é um começo; Shaka resmungou antes de terminar de tomar o chá.
Não era nada fácil ter de estar ali e pedir ajuda daquele insolente, mas não havia alternativa enquanto não descobrisse o que realmente estava acontecendo com Shun; ele pensou exasperado.
Aliás, pensando bem, ele não parecera nada surpreso quando mencionara sentir aquele cosmo estranho pairando no Santuário; Shaka pensou, voltando o olhar desconfiado para o ariano.
-Fim do primeiro round, agora vamos para as injurias e ofensas? –Mú indagou em tom de provocação, como se houvesse lido seus pensamentos.
Continua...
N/A: *Hej damen – significa "Olá moça" em Sueco. Lembrando que o cavaleiro de Peixes nasceu na Suécia e uma parte de sua história pode ser encontrada em "Vale das Flores" e "O Jardim das Rosas".
