A companhia de Draco Malfoy foi uma lufada de ar fresco. Ele aparecia apenas aos finais de semana, mas para ele que ficou meses sem conversar com ninguém, foi ótimo. No começo foi um pouco estranho, então eles começaram a falar de quadribol, um terreno neutro. Quando os dois começaram a ficar confortáveis, outros assuntos surgiam e quando perceberam, estavam trocando diários encantados e conversando durante as aulas de Draco.

A desculpa que deram para Draco sair aos finais de semana foi que ele precisava aprender a desempenhar o papel que esperava por ele ao se formar em Hogwarts: ele é o herdeiro Malfoy e como tal, quando chegar o tempo, será lorde Malfoy. Durante aquele tempo, ele aprenderia que todas as suas ações refletiriam em sua família. Para essa desculpa funcionar, ele realmente começou a ter aulas particulares aos sábados com Harry.

Era diferente de tudo o que ele já aprendeu, mas Harry estava gostando das aulas. Ele não esperava usar o título como Draco, mas era interessante aprender sobre o seu mundo e como se portar em sociedade.

Suas conversas então giravam ao redor das aulas, do quadribol e do que eles esperavam de seu futuro. Draco tentou uma vez falar sobre o outro pai do filho de Harry, mas a pergunta não foi bem recebida, então ele deixou isso de lado e continuou a comparar notas das aulas.

O diário que compartilhavam foi outra coisa também. Draco fazia questão de compartilhar o que ele estava aprendendo e Hogwarts e Harry procurava em seus livros, que de fato nunca chegaram a ser usados na escola. Toda essa situação o fez relaxar com a gravidez e esquecer um pouco tudo o que viveu antes de sua decisão de fugir do mundo mágico.

A sala que Harry separou para ter suas aulas com Draco é iluminada pela luz suave do outono, que entra pelas grandes janelas. O ambiente é aconchegante, com prateleiras repletas de livros antigos, uma lareira crepitante e poltronas confortáveis que convidam ao relaxamento. A mesa entre eles está coberta de pergaminhos e livros abertos, mas a concentração de ambos parece estar em qualquer lugar, menos nas lições que tiveram naquele dia.

Harry passou as mãos pelos cabelos, um hábito que adquiriu quando está pensativo. Seus olhos verdes estão fixos em um ponto distante, como se

Estivesse perdido em seus pensamentos. Draco, sentado à sua frente, percebe o desconforto do amigo, mas hesita em interromper o silêncio. Eles construíram uma amizade baseada na confiança e respeito mútuo, mas há certas barreiras que Draco sabe que não deve ultrapassar. Pelo menos, não ainda.

- Harry... você parece distante hoje. Está tudo bem? - Perguntou em um tom suave, quase hesitante.

Harry piscou, como se estivesse voltando de algum lugar distante, e força um sorriso. Ele não quer sobrecarregar Draco com seus pensamentos, mas algo em seu peito o pressiona, pedindo para ser liberado.

- Eu estava apenas pensando. - Soltou um suspiro pesado com a voz carregada de uma mistura de cansaço e incerteza. - Pensando sobre como tudo mudou tão rápido. Como minha vida virou de cabeça para baixo em tão pouco tempo.

Draco inclinou-se ligeiramente, seus olhos cinzentos fixos em Harry, um brilho de compreensão neles. Ele sente o peso nas palavras de Harry, como se cada uma fosse uma confissão.

- Você quer falar sobre isso? - O tom era cuidadoso.

Harry hesitou, seus dedos tocando a borda de um dos pergaminhos na mesa. Ele já compartilhou tanto com Draco, mas essa conversa que quer ter hoje era diferente. É mais profunda, mais pessoal. Ele sente um nó se formar em sua garganta, mas finalmente decide que precisa falar.

- Draco, você sabe que eu... que eu nunca tive uma relação normal com meus parentes trouxas, muito menos com o mundo mágico. - Sua voz era trêmula, mas decidida. - E agora, com tudo isso acontecendo, eu... eu sinto que estou finalmente começando a entender algumas coisas. Coisas que eu queria entender antes.

Draco escutou atentamente, seus olhos nunca deixando os de Harry. Ele sabe que essa é uma conversa importante, algo que Harry precisa tirar de dentro de si.

- Eu estou pensando em me aproximar do meu pai. De Thomas. Eu sempre mantive distância dele, com razão, é claro. Mas agora, ao descobrir a relação que a gente tem e com um bebê a caminho... eu sinto que preciso tentar, pelo menos, entender melhor quem ele é. - Harry respirou fundo, tentando encontrar as palavras. - E talvez, entender um pouco mais sobre mim também.

O silêncio que se segue é carregado de significado. Draco vê a vulnerabilidade no rosto de Harry, algo raro de ser visto no menino que sobreviveu. Ele percebe que Harry está em uma encruzilhada emocional, tentando encontrar um caminho que faça sentido.

- Isso é algo grande, Harry. - Draco escolheu seu tom com cuidado. - Eu não posso nem imaginar como deve ser difícil. Mas se você sente que é o momento certo, talvez seja algo que você precise fazer, por você e por seu filho.

Harry acena com a cabeça, mas seu olhos estão distantes novamente, como se estivesse olhando para o passado. Um passado cheio de dores, perdas e confusões que ele nunca conseguiu entender completamente.

- Eu sei. Só tenho medo de como as coisas vão ser. Tenho medo de que, ao entender, eu acabe trazendo à tona mais dores do que respostas. Thomas sempre foi um vilão na minha história e ter seu papel mudado de uma hora para outra me faz sentir como se eu não estivesse pronto para lidar com isso.

Draco estende a mão sobre a mesa, tocando levemente a mão de Harry. O gesto é simples, mas cheio de apoio. Harry olha para ele, grato pela presença de Draco em sua vida, mesmo que por tão pouco tempo.

- Você não está sozinho. Eu sei que parece que o peso do mundo está nos seus ombros, mas você tem pessoas que se importam com você. Pessoas que estarão ao seu lado, independente de como as coisas se desenrolem.

Harry sentiu um calor calor no peito ao ouvir as palavras de Draco. Pela primeira vez em muito tempo, ele sente que talvez não precise enfrentar tudo sozinho. Mas há uma questão que ele ainda precisa resolver, uma que tem evitado há meses.

- Tem uma coisa que eu preciso te pedir. - Seu tom era vulnerável. - Algo que você pode achar estranho, mas eu preciso que você entenda. O pai do meu filho... eu sei quem ele é. Mas eu não quero que ele saiba. Ele me machucou muito, dizendo palavras horríveis... Eu não quero que ele saiba que vai ser pai. Você promete que vai manter minha gravidez em segredo? Não sei em quem eu posso confiar.

Draco ficou em silêncio por um momento, digerindo a revelação. Ele percebe a profundidade da dor nas palavras de Harry e entende que, seja qual for a razão, Harry está pedindo isso para proteger alguém que ele ama, mesmo que essa proteção signifique mantê-lo distante.

- Eu prometo. Eu não vou contar a ninguém. Mas... você tem certeza disso? Não é algo que você deveria decidir sozinho.

Harry desvia o olhar , sentindo o peso da culpa e da responsabilidade. Ele sabe que Draco está certo, mas a dor do passado é algo que ele ainda não conseguiu superar.

- Eu sei... - Sua voz não era mais que um sussurro. - Eu não posso permitir que ele se coloque em risco. Mas eu prometo que quando toda essa situação se resolver, ele saberá.

O silêncio que se segue é pesado, cheio de emoções não ditas. Harry sabe que está tomando uma decisão difícil, mas sente que é o que precisa ser feito. Ele só espera que, no final, não acabe o machucando.

Mais tarde naquele dia, Draco voltou para a mansão Malfoy com uma tarefa a cumprir: chamar Thomas. Harry estava tenso, não sabia o que esperar dessa reunião, mas sua gravidez já aos sete meses o forçou a enfrentar essa situação. Ele não era burro, sabia que precisaria de ajuda. E só ter Draco não era o suficiente.

Harry estava no jardim quando Thomas apareceu. O jardim era um lugar tranquilo, onde o som dos pássaros e o vento suave criavam um ambiente sereno. Mas dentro de Harry, o caos reinava. Thomas se aproximou devagar, hesitante, e Harry levantou o olhar ao vê-lo de aproximar. O relacionamento novo entre eles era complicado.

- Harry... - Thomas tinha um olhar curioso.Ele parou a alguns passos de distância, sentindo o peso da conversa que está prestes a ter.

- Eu estava pensando, pai... - Era a primeira vez que ele o chamava assim. - Acho que quero tentar me aproximar de você. Entender sobre quem você é, sobre quem eu sou e de onde vim. Com meu filho quase pronto para nascer, eu sinto que preciso disso.

Thomas observou Harry por um momento, sua expressão difícil de ler. Ele sempre foi um homem de poucas palavras, mas a gravidade do que Harry estava dizendo não passava despercebida. Seu filho fez um gesto para ele se sentar ao seu lado e Thomas hesitou um pouco antes de se aproximar.

- Eu esperava que um dia você quisesse entender mais sobre o que eu sou e sobre nossa família. Eu só não pensei que isso fosse acontecer assim, de repente.

Thomas sentou-se ao lado do filho, o olhar fixo no horizonte. Ele sentiu uma mistura de alívio e ansiedade. Nunca foi fácil para ele expressar seus sentimentos, especialmente com seu filho, mas essa conversa era necessária.

- Eu passei tanto tempo tentando escapar do que as pessoas jogavam em cima de mim... do que minha vida se tornava cada vez mais. Mas agora, com um filho a caminho, parece que não posso mais fugir. Eu quero... eu preciso entender, para para poder a ele algo melhor.

Thomas observou o filho, vendo pela primeira vez em muito tempo um vislumbre do menino que ele nunca chegou a criar, nem vê-lo como filho, já que estava cego por sua loucura. Ele sentiu um aperto no coração, sabendo que essa conversa estava longe de ser fácil para Harry.

- James, seu outro pai... Ele era um homem complicado, tão cabeça dura quanto você, pelo pouco que percebi. - Thomas soltou um bufo divertido. - Ao contrário da crença do mundo mágico, ele era tão escuro quanto eu. Foi isso que nos aproximou. Nós compartilhávamos dos mesmos ideias, da mesma força mágica. Ele era como uma lufada de ar fresco em minha vida, então mesmo nadando na loucura, tentei protegê-lo. Para isso tive que forçar meus comensais a escondê-lo e nunca, jamais compartilhar sua localização comigo.

Harry ouviu em silêncio, sentindo as palavras afiadas cortando através de camadas de mágoas antigas. Ele nunca soube muito de seu pai, além das histórias de bravura e heroísmo. Ouvir sobre seu lado sombrio, fez Harry sentir um peso novo, uma conexão com o pai que nunca conheceria.

- Eu nunca soube disso... A história que o povo conhece é diferente. - Seu tom era baixo e doloroso.

- Eu sei... Talvez, se eu tivesse feito o mundo conhecer nosso relacionamento, as coisas teriam sido diferentes. Mas a população não gostava de mim naquela época, então eu mantive minha família em segredo, não querendo que sofressem o que eu sofri. Mas agora, eu quero mudar essa interpretação deles e também quero que você escreva sua própria história, tendo minha vida como um exemplo do que nunca fazer.

Harry sentiu seus olhos se encherem de lágrimas, mas ele as segurou. A dor de ouvir isso é quase insuportável, mas há também um conforto estranho em saber que, mesmo com todos os erros, seu pai está ali, desejando o melhor para o seu futuro.

- Eu quero conhecer minha família, que te conhecer. - A determinação era palpável. - Eu aceito sua oferta de ficar com os Malfoy. Eu confio na palavra de Draco e na sua de que vou ficar bem.

- É tudo o que eu peço, filho. Narcisa é uma ótima curandeira, ela será capaz de te ajudar. Lucius foi para a escola com James e Lily, ele ficará feliz em te contar as aventuras que viveram juntos.

- Obrigado... - Harry respirou fundo, sabendo que esse pedido não podia ser deixado de lado. - Mas... prometa que durante esse tempo, enquanto as coisas se ajeitam no mundo mágico, eu nunca verei Severus Snape, eu sei que ele é seu seguidor.

Thomas se assustou com o pedido. Não era algo difícil de se fazer, mas ele esperou que ele listasse outras pessoas que nunca o vissem.

- Eu faço isso, mas por que Severus Snape? Ele te machucou? - Thomas já pensava em diferentes maneiras de fazê-lo se arrepender por ter feito qualquer mal ao seu filho.

- Ele é o pai do meu filho e digamos que não terminamos em bons termos. - Harry confessou. - Você provavelmente está pensando em matá-lo, mas eu não quero que você faça isso. Independente do que ele tenha me falado, eu sei que ele fez isso para a minha segurança.

- E como você tem certeza disso?

- Eu... Nós namorávamos, então compartilhamos muitas coisas. Dentre elas, a nossa falsa de confiança em Dumbledore. As atitudes do diretor nunca foram confiáveis. Mesmo com tantos caminhos a seguir, ele sempre seguiu o pior para todos, mas consequentemente o melhor para ele.

Thomas o estudou bem. Ele sempre soube que o diretor não tinha sempre boas intenções em mente, mas ouvir isso de seu filho já cortou metade do caminho. Talvez seja hora de expor os segredos.

- E o que ele tem a ver com o seu término?

- Severus estava feliz quando me viu chegando em Hogwarts, mas quando fui visitar ele depois do horário, vi Dumbledore sair de seu apartamento e de repente Severus estava mudado. Suas palavras eram cortantes, mas seu tom estava diferente.

- Sim... provavelmente o diretor tem algo a ver com isso. - Thomas concordou, pensando em seus planos futuros. - Eu vou evitar que Severus descubra, pela própria proteção dele.

Harry sentiu um alívio imediato, como se um peso tivesse sido levantado de seus ombros. Ele olhou para seu pai, realmente olhou para ele, e pela primeira vez, sentiu que talvez, apenas talvez, as coisas pudessem melhorar.