A elfa chegou, cabisbaixa, aproximando-se da mestra, que estava no escritório que Pericles costumava usar quando estava em casa. Marge continuava trabalhando, fazendo um levantamento tanto dos artefatos que poderiam vender quanto o valor que tinham no mercado. O próximo passo seria pesquisar potenciais compradores.
-Chichi, o que deseja? – Marguerith perguntou, sem desviar o rosto das anotações.
-Um moço quer falar com mestra. Moço que Chichi não conhece. Moreno, de olho muito azul.
Marge levantou a cabeça, bastante surpresa. Embora a descrição fosse vaga, algo lhe dizia que era Alphard quem estava na soleira da porta.
-Ele não ousaria... – ela murmurou, entre o incrédula e o apreensiva.
Seguiu pelos corredores até chegar no hall de entrada da Mansão. Exatamente como ela previra, lá estava ele. Com os braços nas costas, uma bolsa de couro a tiracolo, e um expressão absurdamente séria.
-Boa tarde, Alphard – ela disse de forma polida e neutra.
-Boa tarde, Marge. – ele respondeu, deixando involuntariamente um sorriso lhe escapar. – Desculpe aparecer sem avisar, mas depois de ontem, percebi que tinha que vir vê-la.
A mulher mordeu de leve os lábios, sentindo-se ligeiramente culpada por ter baixado a guarda na comemoração do aniversário de Walburga. No começo da festa, ela o ignorara, mantivera uma postura distante com Alphard, não apenas por se sentir magoada... Ele a abandonara e ignorara por oito anos, talvez fosse uma emoção infantil e vingativa, mas ela queria dar-lhe o troco, de algum modo...
As coisas poderiam não estar bem entre ela e Pericles, entretanto, isso não significava que ela desejava cair nos braços de sua antiga paixão caso o reencontrasse.
Contudo, a verdade era que Marguerith ainda tinha medo de cair na mesma armadilha que a enredara na adolescência. Ela demorou muito para matar o amor que sentia por ele, para admitir que aquilo foi uma tolice juvenil e que era a hora de ela se tornar uma adulta de verdade.
-Ontem não significou nada. Aquilo foi só um momento de nostalgia, Alphard - ela disse, suspirando - Acho que você não entendeu que eu mudei, você mudou... Somos duas pessoas bem diferentes daquelas que fizeram aquelas promessas. Tenho um marido e dois filhos agora.
O moreno assentiu, não esperava outra resposta de Marguerith que não aquela.
-Eu acho que não fui claro na minha motivação em vir aqui. Não desejo ser um incômodo na sua vida, mas ao mesmo tempo quero que saiba a verdade sobre o que aconteceu entre nós.
-A verdade? – Marge balbuciou, sem compreender as intenções de Alphard.
O homem abriu a bolsa de couro cru e, de lá, tirou uma pequena bacia, e um vidrinho com um líquido prateado.
-Uma penseira? - ela perguntou.
-E minhas lembranças do dia que íamos no casar...
Ela demorou a pegar os objetos, ainda um pouco incerta se desejava remexer nas cinzas daquelas memórias.
-Se decidir vê-las, se quiser conversar, sabe onde me encontrar. – Alphard falou, se despedindo com um discreto menear de cabeça.
Ela mordeu o dedo indicador, para se impedir de gritar. Já era tarde, não queria inadvertidamente acordar os filhos. Ainda assim, a emoção tomou conta de todo seu corpo. As lágrimas desciam por seu rosto, quentes como a raiva que lhe ferviam nas entranhas, fazendo seu corpo tremer em espasmos.
Ela se sentiu no limite da sanidade... O que Sirius havia feito com ela... Com eles... Era inominável...
Ela se levantou, olhando uma última vez para as memórias de Alphard, dentro da penseira em cima da penteadeira do seu quarto. A voz grave do falecido tio dizendo: obliviate!
Como anos atrás, um impulso forte a dominou. Ela se levantou, procurando, em um recanto escondido do guarda roupa, uma pequena caixa de madeira. Ela a abriu revelando um anel de ouro branco com uma pequena esmeralda e uma chave. Marge pegou a chave, apertando-a com força.
Não demorou muito tempo, depois disso, para que Alphard visse a porta do seu apartamento sendo aberta pela antiga noiva. Ele deixou que aquela forte sensação de déjà vu lhe dominasse, como se ele voltasse a ser aquele jovem apaixonado de dezessete anos que esperava ansiosamente a noite para estar ao lado da amada.
-Marge... – ele sussurrou.
-Não fala nada – ela disse enquanto fechava a porta atrás de si – Por favor, não fala nada.
No instante seguinte, ela caminhou até ele, o beijando com uma intensidade que chegou até surpreender Alphard. Por alguns instantes ele manteve-se de olhos arregalados até se permitir saborear aquilo que tanto desejara desde que suas lembranças voltaram.
Entremeios a carícias, os dois se dirigiram para o quarto, deixando-se cair na cama.
Marguerith fechou os olhos, sentindo a pele dele contra a sua, a barba ligeiramente mal feita arranhando seu rosto e seu pescoço, enquanto ele distribuía beijos rápidos até a base dos ombros. Ela sentia que estava perdendo o controle e não se importava.
Sem atentar para o que estava fazendo, ela sentou-se sobre o tórax de Alphard, as pernas cada uma de um lado do corpo dele, ao mesmo tempo em que soltava os cabelos. Ele observou-a com os olhos azuis, curioso para saber o que ela faria a seguir. Marge inclinou-se sobre ele, colando os lábios de ambos novamente em um beijo extremamente passional, enquanto as mãos pequenas dela corriam pelo peito dele, antes de pararem no cós da calça. Só então ele a segurou, invertendo novamente as posições, aprofundando o beijo.
Àquela altura, ambos já tinham perdido completamente o controle. A blusa de Marguerith caiu no chão com um movimento rápido, a boca de Alphard movendo-se contra o pescoço dela. Ela mordeu os lábios, incapaz de pará-lo. Não quando estar com ele era o que ela mais desejava.
Os raios matutinos incidiram sobre o rosto sonolento de Marguerith. A mulher apertou um pouco mais os olhos. Definitivamente ela não queria se levantar da cama, se sentia ainda exausta, quase exaurida. Ainda de olhos fechados, puxou a ponta do lençol para se cobrir mais um pouco, quando sentiu uma mão pesada postar-se sobre sua cintura, e um hálito quente a lhe bafejar na altura da nuca.
Como uma descarga elétrica a percorrer-lhe por todo o corpo, as lembranças da noite anterior emergiram dos recôncavos mais profundos de sua mente. Os sentidos agora estavam completamente alertas por causa do choque.
Idiota, idiota, idiota... - pensava consigo mesma, enquanto levantava-se em um salto da cama, constatando, quase horrorizada, como já suspeitava, que estava completamente nua.
Alphard não acordou, nem mesmo com o movimento brusco de Marguerith. Apenas mudou de posição na cama... Estava imerso em um sono pesado e profundo.
Ansiosa, a mulher começou a juntar as roupas espalhadas pelo assoalho do pequeno apartamento. Precisava ir embora dali o mais rápido possível... Não desejava ser vista saindo suspeitamente da casa de Alphard.
Estúpida... Estúpida... Estúpida... Tantos anos se segurando... Tantos anos tentando ignorar o que sentia... Tentando se esconder atrás da postura rígida e séria que esperavam de uma Black. Para perder cabeça em um rompante de raiva?
Ela era realmente patética...
Definitivamente, Marguerith Black-Thorne se sentia a mais patética das criaturas... Lembrou-se de quando contara para a irmã sobre estar apaixonada por Alphard.
Querida, até acho compreensível que se acredite apaixonada pelo Alphie. Confesso que ele possui certos atrativos que podem interessar a algumas mulheres... Mas já ponderou o quão inadequado ele seria para você? Nosso primo nunca vai passar de um boêmio. É com esse tipo de homem que você quer passar o resto da sua vida? Alguém que facilmente acabaria com seu nome e te daria um casamento cheio de insegurança?– foram as palavras de Betelgeuse.
O que a irmã diria se a visse ali naquele momento?
Marguerith meneou a cabeça, tentando afastar aqueles pensamentos... O que estava feito não tinha mais volta.
Completamente vestida, arrumou os cabelos da melhor maneira que podia. Antes de sair, deu uma última olhada em Alphard. Conhecendo-o, tinha certeza que provavelmente, ele a procuraria para tirar satisfações, contudo, ela ainda não estava preparada para ter aquela conversa.
