Luisa Pov ON

Assim que chego em casa, na vila das amazonas, sinto o peso da manhã se espalhar pelos meus ombros. Tiro a máscara e a deixo em cima da mesa. Não estou com muita fome, mas sei que preciso comer algo. Faço um sanduíche simples, acompanhado de um suco, e me sento à mesa em silêncio. Meus pensamentos estão longe, ainda absorvendo tudo que aconteceu.

Depois de comer, vou direto para o meu quarto. A cama parece convidativa e, assim que me deito, sinto o cansaço realmente me atingir. Fecho os olhos, mas os pensamentos não param. Toda a preparação para a missão, a conversa com Milo... há tanto em jogo, tantas coisas não ditas.

Mal terminei de pensar sobre o quanto essa manhã havia sido longa e intensa quando, de repente, percebo a realidade que me aguarda. Eu terei que tirar a máscara. Maldição! Não pensei nisso quando aceitei a missão tão impulsivamente. Mas... eu não tinha escolha, não é? A Griffon Negro faz as piores coisas imagináveis, especialmente com mulheres. Recusar essa missão seria como fechar os olhos para o sofrimento delas. Era meu dever. Ainda assim, o desconforto me consome.

A máscara... Não é só uma questão de esconder minha feminilidade. Vai muito além disso. Ela sempre foi meu escudo, meu refúgio contra meus próprios sentimentos, meus desejos mais profundos e, talvez, sombrios. Usá-la me ajudou a me distanciar de quem sou, a criar uma barreira que me protege não só dos outros, mas de mim mesma. Sempre que a coloco, parece que consigo silenciar aquilo que guardo no fundo do coração, os anseios que nunca pude revelar, nem para mim.

Será que estou pronta para me despir dessa proteção? Para encarar a realidade nua e crua? Não sei. E pior, isso significa expor meu rosto. Eu sei que não deveria me importar com isso, afinal, sou uma guerreira. Mas, por algum motivo, sempre me perguntei: meu rosto é bonito? Nunca pensei nisso de verdade, não me permiti. Mas agora a pergunta surge, incômoda, persistente. Não que a resposta realmente importe. Ainda assim, me dá a sensação de vulnerabilidade, como se eu estivesse sendo despida não só de um objeto, mas de uma parte de mim mesma que escondi por tanto tempo.

Não posso negar que a máscara também serve para esconder o que sinto por ele. Essa é a verdade que sempre tentei sufocar, manter longe de qualquer suspeita. Milo... Ele sempre foi tão distante, e eu, sempre tão cuidadosa. A máscara me dá essa proteção, como se, ao cobrir meu rosto, eu pudesse também ocultar esses sentimentos que não deveriam existir.

Mas agora... Com essa missão, terei que retirá-la. E me pergunto, vou conseguir continuar escondendo o que sinto? Será que, sem essa barreira física, vou conseguir manter meus sentimentos trancados? Ou será que, aos poucos, tudo vai escapar, como uma represa que não pode mais conter a pressão?

De todas as batalhas que já enfrentei, essa talvez seja a mais difícil.

Minhas reflexões são interrompidas por batidas suaves na porta. O som me traz de volta à realidade, arrancando-me daquele mar de pensamentos que parecia me afogar. Levanto-me da cama, tentando afastar as preocupações de minha mente antes de abrir a porta.

Ao puxar a maçaneta, dou de cara com Shina. Ela está com seu olhar firme e direto, mas há uma preocupação evidente em seus olhos.

– Eu te vi sair cedo hoje – ela começa, sem rodeios, observando-me com atenção. – Fiquei preocupada. Está tudo bem?

Sua voz tem aquela mistura habitual de força e cuidado, que poucas pessoas conseguem equilibrar. Sinto que não adianta tentar enganar Shina. Ela sempre vê além das aparências, sempre sabe quando algo não está certo. Dou um passo para o lado, permitindo que ela entre.

– Entra, Shina – digo, tentando soar tranquila.

Ela entra e senta-se no sofá simples da sala. Faço o mesmo, sentando-me no outro sofá em frente a ela. Há um momento de silêncio, e sei que ela está esperando que eu fale.

– Vou partir em breve para uma missão – começo, escolhendo as palavras com cuidado. – Com Milo.

Shina ergue uma sobrancelha, claramente surpresa com a menção dele. Seus olhos estreitam-se levemente, mas ela não diz nada de imediato. Ela sabe que há mais, que essa missão não é simples.

– Não posso revelar muitos detalhes – continuo, com um certo peso na voz. – Mas é algo importante.

Shina continua a me observar, seu olhar aguçado como sempre, mas há algo mais ali, uma preocupação genuína por mim, algo que não passa despercebido. Sei que posso confiar nela, mas dizer tudo em voz alta me parece tornar a situação ainda mais real e difícil de enfrentar.

– Tem algo mais, Shina – confesso, sentindo o peso da revelação que está por vir. – Nessa missão, eu e Milo... teremos que nos passar por um casal.

Eu observo enquanto a surpresa passa brevemente pelo rosto dela, mas não demora para que ela recupere sua postura controlada.

– E isso inclui... – faço uma pausa, tomando coragem para dizer o que realmente me incomoda. – Eu vou ter que remover a máscara.

As palavras saem e, por um momento, parece que o ar na sala ficou mais pesado. Shina me encara, seu olhar se intensificando. Ela entende o peso de usar uma máscara, mas talvez não saiba o quão profundo isso é para mim.

Shina observa atentamente, e percebo que ela sente a gravidade das minhas palavras. Ela inclina a cabeça levemente, como se quisesse entender melhor o que se passa em meu coração.

– E como você está se sentindo com isso? – pergunta ela, a voz suave, mas firme.

Fecho os olhos por um momento, tentando colocar em palavras o turbilhão de emoções que está se formando dentro de mim.

– É um misto de coisas — confesso, a voz trêmula. – Por um lado, há uma ansiedade que me consome, e a insegurança parece reinar. Remover a máscara... é como abrir uma porta para o desconhecido.

Shina acena, compreendendo a profundidade do que estou dizendo.

– Eu entendo – diz ela, com um olhar que revela empatia. – Para nós, as máscaras são mais do que um símbolo de combate. Elas representam nossas lutas internas, nossos medos e inseguranças.

– E mesmo assim, você decidiu remover a sua – respondo, admirando sua coragem.

Ela sorri levemente, mas há uma tristeza em seus olhos.

– Não foi fácil – ela admite, a voz baixa. – A decisão de retirar a máscara foi um ato de coragem, mas também de vulnerabilidade. O que estava escondido atrás dela? O que eu poderia expor ao mundo? Muitas vezes, eu também senti medo de que meu verdadeiro eu não fosse aceito.

– Eu sempre imaginei que, pra você, tinha sido mais fácil – brinco, tentando aliviar a tensão. – Afinal, sua máscara parecia ter dificuldade de ficar em seu rosto!

Shina solta uma risada, e de repente o ambiente parece mais leve.

– É verdade! Às vezes me perguntava se precisaria de fita adesiva para manter aquela coisa no lugar – ela ri. — Marin vivia dizendo que, se eu tivesse que fazer valer a lei, ia acabar amando ou matando metade dos homens do Santuário.

Eu não consigo evitar rir junto imaginando a cena.

Depois de mais alguns minutos de conversa, uma leve vibração no meu cosmo interrompe a tranquilidade do momento. Fecho os olhos por um instante, captando a mensagem de Milo com clareza:

– Fomos chamados ao Décimo Terceiro Templo amanhã – ele diz de forma objetiva. – Precisamos tratar de mais alguns detalhes da missão.

Ao abrir os olhos, sinto o peso da realidade voltando. Shina, sempre atenta, percebe a mudança imediata na minha expressão.

– Alguma coisa? – ela pergunta, com curiosidade.

– Milo acabou de me avisar – respondo, tentando manter o tom leve, mas sem muito sucesso. – Que amanhã precisaremos resolver alguns detalhes da missão.

Ela me observa em silêncio por um momento, então falou de forma ponderada, mas direta:

– Luisa, talvez fosse uma boa ideia você considerar tirar a máscara agora – ela sugeriu com cuidado. – Assim, terá algum tempo para se acostumar. Se você a retirar apenas momentos antes de a missão começar, pode acabar estranhando demais… e, afinal, você precisará estar completamente à vontade para ser convincente.

Suas palavras eram sábias, carregadas da experiência de quem também usara a máscara por tanto tempo. Shina me olhava com compreensão, mas sem perder a firmeza — ela sabia o quanto aquele gesto me custaria, porém entendia a importância de me preparar de maneira adequada.

Passei a mão pela máscara, o toque frio do metal familiar contra meus dedos. Retirá-la agora, antes de todo o peso e da seriedade da missão, fazia sentido. Mas, ao mesmo tempo, parecia me expor em camadas que eu preferia deixar ocultas. Como se, ao tirar esse escudo, minha vulnerabilidade e sentimentos — aqueles que eu escondia até de mim mesma — viessem à tona sem nenhum controle.

Shina inclinou-se levemente para frente, numa postura amiga e solidária, mas firme.

– Pense nisso, Luisa – continuou ela, em tom brando, mas incisivo. – Melhor ir se adaptando aos poucos, aqui, onde você ainda tem a segurança de ser quem é. Quando o momento da missão chegar, você precisará estar pronta para encarar isso da forma mais natural possível.

As palavras de Shina ressoavam em minha mente, como se pudessem se instalar em cada pensamento, me provocando. O que ela disse fazia sentido, e não conseguiria mais ignorar a verdade. Se eu havia aceitado essa missão, com tudo o que ela exigia, inclusive a remoção da máscara, então era preciso enfrentá-la agora, enquanto ainda tinha algum controle. Respirei fundo, sentindo o frio metálico do objeto preso ao rosto e me perguntando quantas vezes já havia considerado que ele fosse uma extensão de mim.

Mas Shina estava certa; adiar só tornaria as coisas mais difíceis, e eu não queria falhar. Se eu esperasse até o último momento, poderia parecer hesitante — talvez até perder parte da confiança que Milo e os demais tinham em mim. Não, precisava fazer isso agora. Estava receosa? Sim. Mas, afinal, que sentido faria evitar esse confronto com a minha própria vulnerabilidade, algo que, em última instância, poderia comprometer a missão?

Olhei para Shina, que me observava em silêncio, respeitando cada segundo da minha batalha interna. Sua expressão era compreensiva e, ao mesmo tempo, encorajadora. Ela sabia o que eu estava passando, ela própria já havia enfrentado essa situação. Quantas vezes não a vi cruzando o Santuário sem a máscara, caminhando de cabeça erguida, exibindo a força e o orgulho de ser quem era? A máscara era uma peça poderosa de nossa identidade, mas também uma prisão. De certa forma, ela simbolizava o peso de nossas escolhas e dos sacrifícios que fizemos ao nos tornar amazonas de Athena.

Respirei fundo, sentindo o ar mais pesado, como se o ambiente ao meu redor estivesse carregado de uma expectativa silenciosa. "Preciso tirar isso agora, antes que a missão comece de verdade," pensei, com um misto de coragem e incerteza. Afinal, se havia aceitado enfrentar essa missão ao lado de Milo, teria que lidar também com minha própria decisão de abaixar essa proteção.

Deslizei os dedos pela lateral da máscara, hesitante, questionando se esse ato era pura impulsividade. Era? Provavelmente. Mas não importava mais. Se eu estava sendo impulsiva, teria que lidar com as consequências desse gesto. A máscara não poderia me proteger para sempre; em algum momento, teria que encontrar minha própria força sem o suporte dela.

– Shina, você está certa – falei baixinho, mais para mim mesma. As palavras ecoaram no espaço ao nosso redor, carregadas de uma promessa silenciosa.

Shina sorriu levemente, e por um instante, entendi que ela sabia o que isso representava para mim, sem que eu precisasse dizer uma única palavra. Ali, diante dela, senti que, ao enfrentar esse momento, poderia encontrar uma força diferente — uma força sem máscara, sem disfarces.

Ela me observou por mais alguns segundos, como se analisasse o meu estado, lendo cada sinal de hesitação ou coragem que pudesse identificar. Sem dizer nada, ela segurou minha mão e me puxou até o quarto.

Quando chegamos ao cômodo, Shina me posicionou em frente ao espelho, apertando suavemente meus ombros enquanto eu me sentava. Em um gesto calmo, ela parou atrás de mim, mantendo a mão sobre meus ombros, transmitindo uma tranquilidade que contrastava com o turbilhão que eu sentia por dentro. A imagem do espelho parecia devolver cada emoção não expressa, cada fragmento de dúvida e de força que se misturava em mim.

– Quando estiver pronta, Luisa… – a voz de Shina era suave, um sussurro de compreensão. – Pode retirar a máscara e olhar para o seu rosto. Encare quem você é. Não apenas a guerreira, mas a mulher por trás da armadura.

Fiquei em silêncio, encarando meu reflexo, estudando a máscara que, de tantas maneiras, era como uma segunda pele. O espelho devolvia a imagem fria e impessoal, mas eu sabia que, por trás dela, estava uma parte de mim que eu raramente enfrentava. Ao ouvir as palavras de Shina, percebi que não era apenas uma questão de tirar a máscara por causa da missão. Era uma escolha mais profunda, um chamado para reconhecer aquela que existia por trás de anos de treinamento e sacrifício.

Após alguns minutos, permaneci ali, encarando meu reflexo. Minha mente oscilava entre o desejo de me ver como realmente sou e o impulso de manter a máscara — minha proteção tão familiar. Mas, em um impulso sereno, levei a mão até a superfície fria do metal. Respirei fundo, sentindo o peso do momento, e deslizei a máscara para fora do rosto, lentamente.

Quando olhei para meu rosto no espelho, fui confrontada com uma versão de mim que raramente via. A pele, mais clara devido aos anos sob a máscara, contrastava com os meus olhos de um azul profundo, como o mar em uma manhã calma. Meus lábios, carnudos e naturalmente avermelhados, completavam a visão que tinha de mim mesma.

Por um instante, foi como se eu estivesse me vendo pela primeira vez, como se cada traço do meu rosto contasse uma história que até então tinha sido cuidadosamente escondida.

Ainda perdida em meu reflexo, como se estivesse redescobrindo cada linha e curva do meu próprio rosto, finalmente percebi o silêncio que pairava no ar. Shina, geralmente tão espontânea e direta, estava estranhamente quieta. Desviei o olhar para ela, curiosa com sua reação, e me deparei com um semblante de surpresa estampado em seu rosto.

– O que foi, Shina? – perguntei, tentando entender o que a deixara assim.

Ela piscou, parecendo sair de um breve transe, e disse com um sorriso leve:

– Eu só… não esperava que você tivesse um rosto tão harmonioso… e esses olhos, Luisa, são realmente lindos.

Senti meu rosto esquentar levemente. Nunca tinha me dado conta de que, de fato, jamais havia mostrado meu rosto para ninguém ali, nem mesmo para minhas amigas mais próximas. A máscara sempre esteve ali, entre mim e os outros, como uma barreira que eu nunca considerei necessário ultrapassar.

Era estranho, agora, pensar que aquele rosto que eu via no espelho era uma novidade para todos.

Percebendo o silêncio prolongado e a tensão que pairava entre nós, Shina decidiu quebrar o clima pesado com uma brincadeira leve.

– Sério, Luisa! – começou, com um sorriso travesso. – Como você consegue se esconder atrás dessa máscara, sendo tão linda assim? E, vamos ser honestas, você poderia facilmente fazer muitos homens se apaixonarem por você, especialmente o Milo!

O comentário me pegou de surpresa. Meu rosto corou instantaneamente, e não consegui conter um sorriso nervoso.

Shina, observando minha reação, pareceu perceber algo mais profundo.

— Espera um minuto... — disse, com um brilho de compreensão nos olhos. — Você não está usando a máscara apenas por causa da tradição, está? Você a mantém porque... porque talvez você ame o Milo!

O ar congelou por um instante. Eu não tinha palavras. Eu mal havia retirado a máscara e Shina já havia percebido o que nutro por Milo. Isso quer dizer, que seria questão de tempo até ele descobrir o que tento esconder há anos. Novamente me condeno por ter sido impulsiva em ter aceitado essa missão, mas agora estava feito e desistir não era uma opção.

– Não, eu... – comecei, hesitante, mas Shina ergueu a mão, pedindo silêncio.

– Luisa, pense bem! – insistiu ela, com uma expressão de empatia. – O que você sente por ele não é algo que você deve temer. É uma coisa linda!

– Eu só... não sei se estou pronta para isso – confessei, sentindo o peso da verdade em minhas palavras.

Shina sorriu suavemente, compreendendo meu dilema.

– Às vezes, Luisa, o amor exige coragem. Eu sei que a gente vivia sob leis rígidas e até injustas, mas agora temos uma outra realidade. Agora somos livres para amar e ser amadas. Não vê Aiolia e Marin como estão felizes?

Enquanto Shina falava, minha mente começou a divagar, lembrando de Aiolia e Marin. O casamento deles, que havia acontecido algumas semanas atrás, ainda estava fresco em minha memória. Era como se cada detalhe estivesse gravado em mim, como uma pintura vibrante que se recusava a desbotar.

Eu recordava como os olhos de Aiolia brilhavam durante a cerimônia, cheios de emoção e amor. Ele parecia completamente radiante, como se todo o peso das batalhas que havia enfrentado tivesse desaparecido naquele momento mágico. Marin, por sua vez, estava deslumbrante. Seu sorriso iluminava o ambiente, e o jeito como olhava para Aiolia era algo que eu sempre sonhei em viver. O amor deles era palpável, e a felicidade que exalava era contagiante, capaz de aquecer o coração mais frio.

As flores, o altar adornado com rosas e lírios brancos, a música suave tocando ao fundo — tudo parecia perfeito. Eu me vi sorrindo involuntariamente ao lembrar do beijo apaixonado que selou a união deles, e como todos aplaudiram com alegria genuína. Havia algo de inspirador na maneira como Aiolia e Marin se completavam, como se fossem feitos um para o outro, como se o universo inteiro tivesse conspirado para que eles se encontrassem.

E então, a realidade me atingiu com força. Eu olhava para aquele amor sublime e fazia com que eu sentisse uma pontada de saudade por algo que ainda não havia vivido.

– É verdade – respondi, depois de alguns minutos de reflexão. – Mas isso é diferente. Aiolia e Marin têm um amor que já floresceu.

Enquanto as palavras saíam da minha boca, percebi que a comparação entre eles e eu era inevitável. O relacionamento deles era como uma bela flor que desabrochou sob a luz do sol, enquanto eu estava presa em um canteiro de sombras, temendo a exposição. Aiolia e Marin haviam superado barreiras, enfrentado adversidades, e agora desfrutavam de uma felicidade inegável. A conexão deles parecia ser sólida, construída sobre anos de amizade, respeito e amor genuíno.

Eu me perguntei se algum dia teria algo parecido com Milo. Os sentimentos que nutro por ele são profundos, mas também cercados de incerteza. Será que ele se sentia da mesma maneira? Será que, assim como Marin, eu poderia me abrir para ele e permitir que meu coração florescesse? Ou seria apenas um sonho distante, uma fantasia que nunca se tornaria realidade?

– Eu tenho certeza de que o que nutro por Milo é amor – continuei, após meu breve silêncio. — Mas esse sentimento precisou ficar enterrado em meu peito.

Shina me olhou, e eu pude ver a compreensão em seu olhar. – O que te impede de deixá-lo livre?

– Eu não sei se Milo sente o mesmo por mim – respondi, com a voz trêmula. – E se ele não me amar? O que acontece se eu abrir meu coração e for rejeitada? A ideia de que ele possa não retribuir o que sinto é dolorosa. É como se o medo de uma queda livre me paralisasse.

Shina se inclinou para frente, sua expressão séria. — Você não pode deixar que o medo defina sua vida, Luisa. O amor é arriscado, mas também é o que torna a vida valiosa. E se ele não sentir o mesmo? Isso não significa que seu amor não é real ou que você não merece ser amada.

Suas palavras ressoaram em mim, mas ainda havia um nó apertado em meu estômago. – Eu sei, mas... – hesitei. – Eu só não quero que ele olhe para mim e veja apenas uma amiga ou uma companheira de batalha.

– Então comece a se mostrar para ele. O amor não floresce na sombra; ele precisa de luz e ar para crescer. E você é uma mulher forte, Luisa. Você pode lidar com qualquer resultado.

Eu sabia que Shina estava certa, mas a insegurança ainda pairava sobre mim como uma névoa densa. A verdade era que, por trás da bravura, eu era apenas uma mulher com um coração vulnerável, temendo a dor da rejeição.

– E se eu me abrir e ele não me quiser? – perguntei, a angústia tomando conta de mim. – O que vai sobrar?

Shina me olhou com um sorriso suave, como se estivesse vendo algo que eu ainda não conseguia. – O que vai sobrar, Luisa, é a liberdade de amar. E essa liberdade vale qualquer risco.

As palavras dela ecoaram em minha mente, e pela primeira vez, eu percebi que talvez o amor não fosse apenas sobre o que poderia acontecer, mas sobre a coragem de tentar. Eu precisava arriscar, mesmo que isso significasse enfrentar a dor. E talvez, apenas talvez, a recompensa fosse maior do que eu poderia imaginar.

– Você tem razão, Shina – respondi, sentindo uma coragem tímida brotar dentro de mim. – Talvez eu tenha passado tanto tempo escondida atrás dessa máscara que me esqueci do quanto posso ganhar se me permitir viver além dela. Eu fui treinada para enfrentar qualquer batalha… então por que esse medo é tão paralisante?

Shina sorriu, com aquele brilho de incentivo no olhar.

– Porque amar é a batalha mais difícil – ela disse. – Mas também é a única pela qual realmente vale a pena lutar.

Refleti sobre suas palavras, deixando que a verdade delas se infiltrasse em mim.

– Talvez eu deva mesmo dar esse passo. Acho que não é a máscara em si que eu temo tirar, mas tudo o que ela representa. E talvez seja exatamente isso que eu preciso enfrentar – murmurei, sentindo-me ao mesmo tempo receosa e determinada.

– É isso, Luisa! – Shina encorajou, colocando a mão sobre a minha. – Deixe Milo ver quem você realmente é. Ele merece conhecer essa parte sua, e você merece viver isso de verdade.

Respirei fundo, me permitindo sentir cada pedaço dessa decisão. Era como se, por fim, eu estivesse prestes a me libertar de uma prisão invisível que eu mesma construíra ao redor do meu coração. Por mais incerto que fosse o que eu encontraria do outro lado, essa era a chance que eu precisava dar a mim mesma.

– Obrigada, Shina. Acho que, pela primeira vez, estou pronta para dar esse passo – confessei, com um sorriso trêmulo, mas verdadeiro.

Eu sabia que o caminho seria incerto e talvez doloroso. Mas se houvesse uma chance, mesmo que pequena, de que meu amor por Milo pudesse ser retribuído, então eu não tinha outra escolha senão arriscar.

Continuamos conversando por mais alguns minutos, deixando a conversa fluir com leveza. Eu aproveitava cada palavra, me reconfortando com sua presença e com o carinho de sua amizade.

Quando o sol começou a baixar no horizonte, Shina se levantou.

– Bem, hora de ir – disse ela, com um sorriso. – Lembre-se do que conversamos hoje, Luisa. E não esqueça: estou aqui para o que precisar.

Acompanhei-a até a porta, sentindo o peso da despedida, mas também uma estranha sensação de leveza por tudo o que havíamos compartilhado. Ver Shina sair com aquele ar confiante me deu forças; de alguma forma, ela havia conseguido despertar em mim a coragem que eu nem sabia que existia.

– Obrigada, Shina. Por tudo – falei, segurando sua mão por um breve instante.

Ela apenas sorriu, cúmplice, e com um último aceno, foi embora, deixando o ambiente em um silêncio acolhedor. Fechei a porta e respirei fundo, sentindo que algo em mim havia mudado. A semente de uma nova confiança começava a germinar, e, pela primeira vez, o mundo sem a máscara parecia menos ameaçador.

Agora, só restava a mim mesma encontrar forças para dar o próximo passo.

Luisa POFF