Marguerith fechou o registro da ducha, enrolando o corpo em toalha branca, macia e felpuda, enquanto, com uma segunda, enxugava seus cachos negros, bastante úmidos. Com passos leves, ela saiu do banheiro, entrando no quarto conjugado.

A moça sentou-se na beirada da cama, onde estava estendida a roupa que iria usar para aquela ocasião: além da roupa íntima, podia se ver uma blusinha branca de abotoar, de mangas curtas e com gola arredondada, uma saia azul rodada que no corpo ficava na altura do joelho. Aos pés da cama, havia um par de sapatos pretos de fivela.

Se lhe perguntassem em retrospectiva, nunca imaginaria que seria com aquela roupa que iria se casar.

Aquilo não lhe importava. Em breve estaria com Alphard. E seriam felizes.


O rapaz olhou com carinho para seu pequeno apartamento, pensando consigo que a partir daquela noite seria a moradia dele e da esposa.

Esposa... Aquelas palavras lhe pareceram tão doces em seus pensamentos e uma sensação de alegria lhe preencheu o peito.

Ele trancou a porta e guardou a chave no bolso. Nesse momento, ele foi surpreendido, do nada, com um soco no plexo solar e um golpe na cabeça.

Antes que perdesse a consciência, notou os vultos de dois homens se revelarem ao desfazerem um feitiço desilusório.

A primeira coisa que Alphard percebeu quando começou a despertar foi que estava amarrado a uma cadeira.

A segunda foi a figura de seu tio Sirius Black sentando em uma confortável poltrona na frente dele, com as pernas cruzadas, e uma das mãos se apoiando na bengala.

O rapaz então começou a esquadrinhar o lugar, chegando a conclusão que estava em alguma espécie de galpão e que provavelmente os dois homens grandes e mal encarados ao lado do patriarca dos Black eram quem o tinham atacado.

-Você joga mais sujo do que eu havia imaginado – Alphard gritou, sem esconder a raiva que lhe fervia o sangue. Mesmo sabendo que seria inútil, se debateu para tentar se soltar das cordas.

-Eu te disse para não se aproximar mais da minha sobrinha. – o patriarca não escondeu o tom de notável satisfação ao falar aquelas palavras.

Antes que Alphard pudesse responder, um dos grandalhões se aproximou, lhe dando um murro que parecia ter a potência de uma marreta. O olho direito do rapaz inchou imediatamente. Outros golpes foram desferidos enquanto Sirius sorria ao ver o sobrinho gemer de dor.

O último soco foi tão forte que a cadeira caiu para trás e uma pequena poça de sangue se formou debaixo do rosto de Alphard. Apesar dessa barbárie, o rapaz ainda estava consciente.

-Levantem-no. – Sirius ordenou.

-Vai ter que me matar para eu desistir de Marge. – Alphard balbuciou em desafio, mesmo bastante ferido. Cairia lutando de alguma forma. Mesmo que fosse usando as palavras.

O patriarca dos Black ergueu-se da poltrona e se dirigiu até onde estava o rapaz, enquanto tirava a varinha de dentro do bolso interno dpo paletó escuro que usava.

-Não se preocupe, meu caro sobrinho. Não vou precisar recorrer a isso. – o velho sorriu como um predador perigoso e experiente.

Apontando a varinha para Alphard, Sirius murmurou:

-Imperius!


O crepúsculo começava a se aproximar dos céus de Londres, tingindo a superfície do Tâmisa em tons dourados, fazendo com que a água do rio parecesse ser feita de ouro líquido. Aquela beleza, contudo, não conseguia atingir o coração de Marguerith Black. Os orbes verdes se encontravam perdidos em um ponto indefinido, e o nervosismo lhe tomava o estômago, causando ânsias.

Fazia uma hora que estava ali, esperando Alphard para que fossem oficializar o casamento junto às autoridades bruxas. E ele ainda não dera nenhuma notícia.

O piado insistente de uma pequena coruja fez com que a moça saísse do poço de preocupações em que se afundara. A ave parou exatamente na linha de visão de Marguerith, fazendo com que ela percebesse de imediato que aquele não era um pássaro comum.

Em resposta à intuição da moça, a coruja soltou o envelope que trazia consigo e que Marge conseguiu apanhar em pleno ar.

Ela abriu a carta com dificuldade, os dedos tremendo, ansiosos. A primeira coisa que buscou, ao abrir o papel, foi a assinatura. Era de Alphard!

O coração dela falhou por um segundo para logo em seguida acelerar violentamente. Com as mãos ainda tremendo, afastou o papel de si, começando a ler. A boca estava seca pelo nervosismo. Desejava saber se o noivo estava bem, desejava descobrir a verdade sobre aquela demora.

"Marge: - ela começou a ler.- Eu gostaria que houvesse outra maneira de dizer isso. Ou que eu não precisasse dizê-lo. Mas manter silêncio sobre o que aconteceu não fará bem a qualquer um de nós dois.

A moça mordeu os lábios, começando a ter um mau pressentimento sobre o que estava por vi.

Os últimos meses foram maravilhosos e em momento algum quis magoa-la ou engana-la. Mas hoje, me arrumando para te encontrar para nos casarmos, compreendi que não poderia fazer isso com você.

Somos jovens demais, inexperientes demais. Com o tempo, o amor viraria rancor e nos odiaríamos.

Por isso, eu decidi partir.

Melhor que eu te deixasse agora com as boas memórias do que vivemos.

Marge soube, antes mesmo de ler ela soube. Os olhos começaram a se encher de lágrimas e o corpo a tremer em pequenos espasmos. Ainda assim, mesmo sentindo-se engolfada pelo desespero, ela continuou lendo, os olhos aterradoramente fixos nas palavras escritas.

Entenda, por favor, que eu precisava colocar alguma distância de todo esse turbilhão para que as coisas pudessem entrar em perspectiva; para que eu não deixasse meu desejo superar o correto a se fazer. Não poderia estragar a sua vida. Você estava certa em ter medo.

Eu não sei se você entende tudo o que estou tentando dizer; eu mesmo sou da opinião de que meus pensamentos estão confusos demais para fazerem sentido. A única coisa que eu sei, você merece uma vida melhor que aquela que eu poderia te dar

Por favor, perdoe-me.

Alphard Black."

Nesse ponto, o pranto transbordava no rosto de Marguerith, os espasmos se tornavam mais fortes, e a cabeça parecia girar violentamente. Ela sentia-se comprimida por toneladas de emoções tão densas e sobrepujantes que mal conseguia respirar ou se mover. Raiva. Dor. Tristeza. Descrença. Pânico. Desespero. Desalento.

Mecanicamente ela tirou a varinha da bolsa e apontou para a carta. No mesmo instante, o papel pardo começou a se consumir em uma chama fria e azulada, mas com seus olhos embotados, Marge mal notou a carta se tornando um amontoando de cinzas prateadas.

Sem saber como, Marguerith conseguiu aparatar de volta para casa e se refugiar em seu quarto, deixando o pranto tomar conta de todo seu ser. Pôde ouvir nesse momento a porta se abrindo e os passos familiares de Hesper entrando, mas ainda assim não conseguiu se levantar.

- Marge? – ela correu para junto da sobrinha – O que aconteceu?

-Alphard... ele foi embora... Tio Sirius... Bete... Eles me avisaram... Eu não quis acreditar...

-Minha querida... Eu sinto tanto...- ela fez um cafuné suave na cabeça da moça.

Marguerith apenas se manteve passiva, deixando que Hesper tomasse conta dela, tirando-lhe os sapatos. A tia trouxe-lhe uma poção amarga, que lhe queimou o fundo da garganta, mas que ao mesmo tempo trouxe uma sensação de estupor libertadora.

Algo que Marge necessitava para resgatá-la daquele emaranhado de emoções nocivas. Aos poucos a escuridão sonolenta desceu sobre ela, abençoando-a com um sono silencioso.

A moça virou-se na cama, sentindo o corpo e a cabeça pesados, os olhos ainda ardiam. Apesar do desejo de permanecer deitada por um tempo não definido, talvez por toda a eternidade, ela retirou a manta de si, esforçando-se para se erguer.

Ela sentiu o frio do assoalho sob seus pés, contudo, ainda se sentia anestesiada a ponto de não se incomodar com aquela sensação.

Calçou os sapatos e forçou-se a ir para a sala, precisava pelo menos mostrar para a tia que estava um pouco melhor. Não queria deixá-la mais preocupada do que estava.

- Bom dia. – ela disse, com a voz fraca.

- Você está melhor, querida?

A moça assentiu minimamente. Em comparação à noite anterior, sentia-se menos mal, todavia , perguntava-se se algum dia voltaria realmente a se sentir bem. Sentia-se fraca demais para esboçar qualquer reação que quebrasse aquele estupor em que se via presa.

Hesper aproximou-se da sobrinha, pousando-lhe um beijo no rosto. Sabia que a moça estava sofrendo. E não compreendia o que aconteceu para levar o rapaz a tal extremo, contudo percebia o quão difícil tudo aquilo estava sendo para Marguerith.

- Venha. – Hesper murmurou em uma voz suave – Pedi que preparassem seu café da manhã. Apenas coisas leves, considerando seu mal-estar.

Marge deixou-se levar até a mesa. Sentou-se na cabeceira, com Hesper próxima a ela . Havia torradas e chá. Nada mais. A moça pegou uma das torradas, enquanto a tia lhe servia uma xícara de chá, contudo, assim que a mordiscou, sentiu o estômago se revolver.

Ela pousou a torrada em um pratinho, soltando um suspiro.

- Eu sinto muito. – foi a única coisa que Hesper conseguiu falar depois de algum tempo, comprimindo a mão da sobrinha em uma tentativa parca de consolo -Sei que agora dói, mas o tempo realmente cura todas as feridas.

Marguerith não respondeu, ela não conseguia acreditar naquilo, não conseguia acreditar em nada minimamente parecido. Não queria nem ao menos pensar em qualquer coisa. Tudo o que ela desejava naquele instante era permanecer na companhia da tia. Apenas aproveitar aquele carinho... aquele calor... deixar que ele minimizasse um pouco o vazio que havia dentro de si.