Capítulo 6
O retorno para casa foi muito mais difícil do que Harry poderia imaginar, ainda que demorara de fato apenas alguns minutos entre caminhar até o ponto de desaparatação e enfim se ver diante da casa onde morava. Diferente do dia anterior, o antes desse e todos os outros que os precederam dessa vez havia um peso nas costas de Harry, o peso da verdade, o peso de saber que era o ômega de alguém, era predestinado biologicamente a ser parceiro e não propriedade. Havia a chance de conhecer pela primeira vez o que era estar com alguém porque queria, porque desejava e não apenas para suprir os desejos nojentos de um ser dominante.
Parado diante da casa Harry desejou voltar para Hogwarts, voltar para Snape, tocá-lo novamente como fizera a pouco. Ao fechar os olhos podia sentir o calor do hálito dele em seus lábios, a maciez dos dedos em seus cabelos e a eletricidade que passava por suas peles. Era intenso e profundo como Harry jamais sentira antes e queria sentir de novo, ah como desejava sentir de novo e sentir mais, muito mais. No entanto, aquele provavelmente não era um futuro a qual estava destinado, pois Snape não o queria. Ainda que a atração o chamasse, o professor o negava, o mandara embora.
Harry se lembrava de ler em algum dos livros que Snape o fizera ler sobre sua espécie que dois predestinados que não se unissem podiam sofrer muito, seus corpos definhariam e ainda que não morressem, viveriam em sofrimento por muito tempo devido a distância. Snape preferia esse futuro a lutar por si, o mestre de poções escolheu seu caminho sozinho e por ele seguiria o deixando a mercê do Alfa dominante que naquele exato momento abria a porta da frente da casa e o encarava com olhos furiosos.
- Quer me explicar o motivo de estar parado no meio do jardim, na chuva?
Chuva? Apenas naquele momento Harry percebera as gotas de chuva que batiam em seu rosto e desciam por suas bochechas, era uma chuva fina e fria, mas que nem de longe chegava ao vazio e tristeza que sentia dentro de si, por isso não havia reparado nela, aquelas gotas poderiam até estar fazendo carinho visto os espinhos que Snape cravara em seu coração. Ele não o queria.
- Estava pensando. – Respondeu caminhando para dentro passando ao lado de Zabini e sentindo o quão diferente era a energia que emanava daquele corpo em comparação com o que sentira perto de Snape. Era uma energia repulsiva, fria e até mesmo cortante.
- Pensando? – Riu Zabini quando Harry passou ao seu lado. – Desde quando você pensa, Potter? Que eu saiba apenas aquela sangue ruim da Granger pensava entre vocês.
- Não fale assim dela. – Disse Harry se virando e encarando Zabini, a raiva subindo por sua pele. – Você não tem direito, ela é mil vezes melhor do que você e esse seu sangue idiota.
Harry não sabia dizer o que o fazia agir daquela forma, se era todo o sentimento acumulado pelo que já passara nas mãos de Zabini ou pela negação de Snape, mas era algo que ardia dentro de si e o fazia perder o medo das consequências de seus atos diante do sonserino. Virando as costas para Zabini, Harry caminhou pela sala a caminho do quarto, os pés batendo forte no chão e a água que escorria por suas roupas molhadas deixando um rastro no chão. Tudo que queria era se jogar na cama e esquecer que aquele dia acontecera, esquecer Snape e sua rejeição, seu cheiro que ainda inebriava sua mente e mais ainda o toque de seus dedos, tão macios e confortáveis, mas a ira de Zabini o golpeou com força.
- Volte agora! – Gritou o sonserino.
O grifinório levou a mão ao pescoço onde estava a marca que Zabini deixara em sua pele. Ardia como nunca ardera antes, parecia que havia um ferro em brasa sendo enfiado com toda a força naquela região exaurindo sua magia e sua força o fazendo obedecer a ordem do Alfa dominante. Os dentes de Harry cerraram enquanto seus pés arrastavam-se sozinhos em direção a Zabini, a cabeça explodindo.
- Você ousa tratar dessa forma o seu Alfa? – Questionou Zabini fechando a mão no pescoço de Harry.
Os dedos fecharam com força impedindo que o ar entrasse em sua garganta, a raiva de Zabini era visível em seus olhos recheados de loucura, o sonserino tinha o rosto duro quase o transformando em um monstro de ódio. Harry podia sentir o corpo gritando por ar e sabia que logo desmaiaria nas mãos dele, entretanto, o que Zabini não sabia era que Harry também estava carregado de ódio, raiva e ressentimento. Ainda que estivesse sendo brutalmente enforcado e que suas forças deveriam ser usadas para se livrar de seu agressor, Harry teve forças o suficiente para falar algo que jamais conseguiria antes.
- Você... não... é... meu... Alfa. – Dissera Harry antes que o inconsciente o carregasse em suas mãos macias, mas não antes de ver o sorriso demoníaco de Zabini.
Snape olhava para o líquido marrom em seu copo e tentava não pensar em nada, porque se pensasse seria em como era um enorme idiota, um burro que tivera em suas mãos o ômega predestinado a ser seu parceiro em magia, em vida e amor e o deixara escapar entre seus dedos. Escapar não, o expulsara com suas próprias palavras e querer, ele mesmo o mandara para longe de si, justo aquele que fazia seu coração bater mais forte, que o arrepiava e trazia sonhos durante a noite.
Respirou fundo tentando escolher quais das duas desculpas usaria para tentar se convencer de que fizera a escolha certa ainda que soubesse que não fizera. Diria que fora por ser Harry Potter, o filho de Thiago, o menino insolente que atazanara sua vida por anos enquanto era aluno ou diria que era por que teria que voltar a fazer o ato cruel que prometera a si mesmo que jamais faria por sua própria vontade, tirar a vida de outro ser.
Não importava, as duas eram idiotas, apenas desculpinhas esfarrapadas que ele mesmo sabia não serem plausíveis. Harry era um homem, um bruxo poderoso e que trazia em seu peito a bondade que conhecera quando criança em Lilian nos momentos em que a ruiva o ajudava a superar os abusos infligidos por seu pai, ela o curava de suas feridas e não pedia nada em troca, assim como Harry se doara a causa da segunda guerra bruxa sem querer nenhuma retribuição ou reconhecimento. Ainda que fosse prepotente e arrogante em certos momentos, aquele garoto era bom e talvez isso o assustasse, não estava acostumado a ter a bondade tão perto. E quanto a matar Zabini com suas próprias mãos, sem usar magia como dita as regras implícitas de sua raça, no fundo não teria problemas com isso. Era muito pior matar inocentes como já tivera que fazer a mando do Lord das Trevas ou não impedir a morte deles pelas mãos dos comensais que cumpriam missões ou apenas divertiam-se. Nunca matara alguém com as próprias mãos, é verdade, mas matar alguém como Zabini não seria tão difícil assim, ainda mais depois de saber como ele subjugava Harry, o maltratava e abusava dele. Do seu ômega.
O ômega que poderia aceitá-lo, talvez não o amar de verdade, mas aceitar sua pessoa, seus defeitos e passado. Harry sabia que era um comensal da morte, sabia da sua história com Lilian, da culpa que o corria por dentro e dos sacrifícios que fizera durante todos aqueles anos. Ele o perdoou, o compreendeu, o aceitou e ele o mandou embora.
O copo quebrou entre seus dedos cortando a pele ao apertá-lo sem nem mesmo perceber que o fizera. Snape olhou para o sangue escorrendo e manchando sua pele, no entanto aquela dor não era nada se comparada com o que acabara de sentir em sua alma. Era uma dor de perda, da oportunidade perdida, da chance jogada no ralo. Ele poderia ter alguém como nunca imaginou que poderia e por Merlin, ele queria, como queria. Jogando a cabeça para trás Snape olhou para o teto de seus aposentos, a mão ensanguentada balançando para fora da poltrona manchando o tapete de vermelho, não importava, tudo que importava agora era a verdade de que queria Harry Potter ali com ele, queria ter aquele menino sorrindo bobamente ao seu lado, sentia vontade de tocar em sua pele, colocar seus dedos entre os cabelos revoltos como fizera antes, sentir o cheiro doce que emanava de sua pele e beijar os lábios vermelhos que o chamavam. Queria protegê-lo, queria a chance de ser para ele o que ele quisesse que fosse, amigo, amante, protetor, professor, confidente, o que fosse, ele seria. Sabia disso agora e sentia-se o maior dos idiotas por não ter seguido esse sentimento antes e beijado Harry ardentemente naquele dia na Floresta.
Ah, se arrependimento matasse, Snape estaria enterrado ao lado de Dumbledore naquela ilhota e o velho daria risada de sua cara pela burrice que fora capaz de cometer.
No entanto, aquele erro poderia ser consertado e seria.
Snape se levantou pronto para limpar os cacos de vidro espalhados pelo chão e curar o ferimento de sua mão, mas esquecera completamente dos cortes quando levou a mão ao peito sentindo uma dor indescritível que o fez cair no chão. Os cabelos tampavam sua visão e o deixavam no escuro assim como sentia que Harry estava naquele momento, caindo no abismo do vazio. Podia sentir que Harry estava sofrendo, havia dor, muita dor. O professor afastou os cabelos do rosto o sujando com sangue, era o seu ou o dele? Nem mesmo saberia dizer, tudo estava misturado, sua dor com a dele, seu sangue era seu, mas poderia ser dele, sabia que havia sangue dele derramado.
Foi difícil não se deixar sentir aquelas dores, Harry era seu ômega e sua ligação era muito intensa fazendo-o sentir fisicamente o que ele estava sofrendo. Precisou de toda sua força interna para concentrar-se e afastar aquele sentir para longe, bloquear as dores e o medo que vinha dele. Se não fizesse isso não poderia ajudá-lo e tudo que queria naquele momento era ir até Harry e o acolher em seus braços, tirar todo o sofrimento que estava sentindo, salvá-lo, não poderia perdê-lo, sabia disso desde a Torre de Astronomia, não poderia perde-lo e para isso teria que trazer a tona a persona que enterrara em seu passado. Aquela que o visitava quando tudo era pesado demais.
Quem estivesse de fora conseguiria ver a transformação de Snape quando o mesmo deixou vir à tona, renascendo de onde fora guardado a sete chaves, o comensal da morte. Sua respiração controlou-se, os pensamentos foram guardados atrás de muros sólidos em sua mente, o medo expulso para o fundo de seu ser, a dor pairava em sua epiderme, mas era sua amiga, o fazia afastar os cabelos do rosto e endireitar a postura crescendo a coluna e erguendo a cabeça. Seus ombros largos agora traziam a tensão que os deixavam duros, o rosto firme e sem expressão, completamente concentrado em seu objetivo. Mas eram os olhos que mais mudaram, os negros olhos tinham sido preenchidos durante os anos posteriores a guerra, eram calmos, afiados ainda, mas cheios. Naquele momento eram os túneis de outrora, vazios de sentimentos, apenas pedras duras e cortantes.
Ignorando os cacos e os ferimentos, Snape pegou seu sobretudo e o abotoou até o pescoço, colocando por cima a capa esvoaçante. Respirando calmamente caminhou pelos corredores do castelo, ignorando as portas de entrada e subindo os degraus até a Fênix que nem mesmo esperou a senha e girou admitindo-o para a sala da diretora.
- Pode entrar. – Escutou a voz de McGonagall após alguns segundos batendo na porta maciça.
Ao entrar encontrou a bruxa amarrando o robe e arrumando os cabelos claramente despenteados mostrando que estivera recolhida e acabara de acordar.
- Por Merlin, Severus, é madrugada, o que houve? – Perguntou Minerva acendendo os archotes com um aceno de varinha. Só depois que todos foram acesos que a bruxa olhou atentamente para Snape e no mesmo instante identificou que a sua frente estava o homem que não via há anos. – Por que o trouxe de volta?
- Porque é necessário.
- Você está sangrando. – Disse caminhando-se até ele e tocando em seu rosto que trazia um rastro vermelho na bochecha alva. – Mas não tem ferimento. – Comentou ao passar o dedo no rosto dele. Passando os olhos pelo homem viu sua mão ferida. Retirando a varinha do bolso do robe fez com que os cortes fossem fechados e o sangue limpo das mãos e do rosto.
- Não precisava.
- Precisava sim. – Disse a mais velha dando as costas e indo se sentar em sua cadeira atrás da mesa carregada com os papeis que ela como diretora tinha que analisar em seu dia a dia. – Por que está aqui?
- Vim avisar que vou buscar Harry e trazê-lo para cá.
- Então ele realmente é o seu ômega? Seu parceiro?
- Sim, eu senti isso ontem no treinamento e confirmei há pouco quando senti por nossa ligação que ele corre perigo, ele está fraco. Zabini deve ter descoberto e usou de sua dominação para subjugá-lo da pior maneira possível e eu vou buscá-lo.
- Sabe que Zabini estará lá e só poderá trazer Harry se fizer o desafio.
- Então eu o farei.
- Está decidido mesmo a desafiar Zabini até a morte?
Snape aproximou-se da mesa, seus passos silenciosos e pesados, sua aura fazendo o fogo dos archotes tremeluzirem, os olhos perigosos.
- Harry é meu ômega, eu vou salvá-lo e matar Blásio Zabini.
- Então vou com você.
- Não. – Snape deu as costas e já estava quase na porta quando sentiu a presença da bruxa atrás de si e se virou para encontrá-la já devidamente vestida com suas vestes bruxas e os cabelos presos no chapéu preto.
- Eu não te pedi permissão, comensal.
A bruxa tomou a dianteira e abriu a porta descendo as escadas em espiral e caminhando-se rapidamente para o ponto de desaparatação com Snape em seu encalço feito um fantasma sombrio com sua capa a esvoaçar em suas costas. Assim que chegaram ao ponto certo ficaram de frente um para o outro e Snape poderia facilmente dizer que assim como ele trouxera o comensal à tona, Minerva também trouxera uma outra persona dela para a superfície, pois a anciã trazia uma aura de poder que não aparecia em seu dia a dia. Com um aceno de cabeça ambos desaparataram e aparataram diante da casa de Blásio Zabini.
- Há proteção ao redor da casa. – Comentou McGonagall.
- Isso não será problema. – Disse Snape erguendo a varinha e apontando para frente.
- Calma. – Disse a mulher colocando uma mão no braço de Snape e sentindo a magia intensa que vinha dele. – E se Harry não estiver aí.
Snape baixou a varinha, deu um passo a frente e fechou os olhos concentrando-se.
- Ele está, mas quase não posso mais senti-lo, nem mesmo por nossa ligação. Ele está fraco. Não sinto mais ninguém.
Snape então ergueu a varinha se concentrando. O feitiço azul bateu diretamente contra a parede de escudo fazendo-o brilhar e mostrar sua extensão sobre a casa. O escudo era forte, mas a vontade de Snape era mais forte, o mestre de poções apertou a varinha em sua mão, cerrou os lábios e estreitou os olhos. Uma gota de suor desceu por sua testa e caiu da ponta de seu nariz no exato momento em que o escudo se quebrou. A passagem estava livre.
- Eu posso senti-lo. – Disse Snape respirando fundo. Os olhos antes ferinos agora preocupados. – Ele está morrendo.
Não foi preciso mais do que um segundo para que o homem saísse correndo em direção a entrada estourando a porta com um feitiço e adentrando a residência.
- Lumos!
A varinha de McGonagall iluminara todo o ambiente. A casa estava vazia, não apenas de residentes, mas de alma, Snape podia sentir o peso daquele local, era o mesmo peso que a Mansão Malfoy tinha tanto antes como depois de usada de quartel general pelo Lord das Trevas. Era uma casa e não um lar.
- Severus. – Chamou McGonagall baixinho. Ao se virar Snape viu que a bruxa apontava a varinha para o chão onde podia se ver pintos de sangue. – Acha que é de Harry?
- Pelos hematomas que já vi nele, com certeza. A dominação de Zabini é muito forte e Harry não consegue se defender com magia, muito menos fisicamente, Zabini é maior e mais forte que ele.
- A magia dele deve estar muito fraca, não consigo achá-lo com feitiço. – Sussurrou McGonagall ainda olhando para o sangue no chão. – Ache-o.
Snape caminhou até o meio da sala e olhou para a lareira, havia fotos ali nenhuma que fosse de Harry. Não havia nada ali do jovem, nem um fio de cabelo, mas havia o sangue. O sangue de Harry, a dor de Harry. Fechando os olhos Snape usou a dor de Harry para senti-lo, baixou os muros que levantara e se deixou sentir aquela dor, era intensa. Havia a dor física que fazia arder sua pele, mas era muito pior a dor que sentia na alma, Harry estava se sentindo abandonado, sozinho, sem esperança alguma de outro destino. Ele só não sabia que Snape estava ali por ele e que o homem destruiria o mundo para achá-lo. Demorou alguns segundos, mas então Snape abriu os olhos e caminhou até uma porta no fundo da cozinha, McGonagall em seu encalço.
- Alohomora.
A porta se escancarou e apresentou uma escada que levava a um porão. Junto com a lufada de ar que subiu pelo local Snape sentiu a magia de Harry e seus joelhos o levaram ao chão.
- Severus! – Exclamou Minerva aproximando-se e segurando Snape pelos ombros.
- Ele está morrendo. – Disse Snape baixinho tentando regular a respiração. A magia fraca de Harry o atingia com força o deixando igualmente fraco. – Ele precisa de mim.
Esforçando-se e com a ajuda de McGonagall, Severus desceu as escadas que levavam a um corredor de pedras que terminava não em um porão, mas em uma masmorra fria e escura. A anciã iluminou o local enquanto segurava o braço de Snape com a outra mão com receio de que o companheiro desmaiasse. Os olhos negros olhavam com atenção os locais iluminavam, o local era frio e fedido, o ar abafado por não ter entrada de ar, o chão de pedra era áspero e estava molhado. Nem a pior masmorra de Hogwarts, onde os trasgos viveram por um tempo eram daquela forma e era ali que Harry estava, bem ali onde a luz acabara de iluminar, jogado no chão de costas para si.
- Harry. – Chamou Snape se aproximando e ajoelhando-se ao lado do menino. – Harry?
O menino estava seminu, vestido apenas com uma cueca claramente mal-vestida. Seu corpo mostrava sujeiras escuras em sua pele alva claramente marcada com hematomas e cicatrizes antigas que deixaram Minerva horrorizada. Com cuidado e sentindo cada vez mais as dores que seu ômega sentia, Snape virou Harry o deitando de costas e precisou de muita força de vontade para não socar a parede da masmorra e nem desmaiar pela fraqueza que sentia vindo do menino. Harry estava ensanguentado, quase não conseguia ver o rosto do menino com devido os hematomas e cortes que fizeram seu rosto inchar. O peito do menino mexia-se devagar com a respiração fraca.
- Ele está morrendo. – Disse McGonagall ajoelhada ao lado do menino usando sua varinha para analisar a saúde do garoto. – Ele tem muitos machucados internos. Precisamos levá-lo agora para Hogwarts. – A bruxa acariciou os cabelos pretos de Harry e então olhou para Snape o encontrando em choque olhando para Harry. – Severus. – Chamou sem ser respondida. – Comensal! – Os olhos negros mexeram-se encarando-a. – Harry precisa de você, faça o que sabe fazer. Não sinta.
Não sentir, era isso que Snape precisava fazer naquele momento, não sentir. Não seria fácil, a força da ligação entre eles era intensa mesmo a dor era forte. Mas Harry precisava dele, de sua força tanto física como mental para conseguir tirá-lo daquele local. O comensal permaneceu olhando para Harry enquanto erguia novamente os muros mentais que guardavam os sentimentos atrás deles não deixando-os passar e permitindo que fizesse o que precisava ser feito. Snape abriu os olhos e Minerva soube que não havia mais dor e se houvesse ele seria maior do que ela.
Sem dizer uma palavra Snape pegou Harry em seus braços tomando todo o cuidado para não o machucar mais do que o necessário. McGonagall o ajudara a aconchegá-lo sem agravar seus ferimentos. O grifinório estava inconsciente e seu corpo mole. O homem sentia o quanto ele estava frio e ao levantá-lo viu uma poça pequena de sangue no chão, sangue que pingava de sua cueca. O ódio fez subir a bile na garganta de Snape, ele olhou para McGonagall e viu que a bruxa sabia o que havia acontecido com Harry e que ela mesma seria capaz de matar Zabini com as próprias mãos. Se houvera antes qualquer dúvida em matar o Alfa dominante, agora não havia nem mesmo uma molécula de dúvidas. Snape o mataria com seus próprios dedos naquele pescoço longo, queria ver a alma saindo daquele corpo o deixando para ser apenas uma casca vazia.
Precisando tirá-lo daquele local o quanto antes, Minerva guiou Snape de volta para o hall de entrada da casa e de lá para fora onde poderiam desaparatar. Sabendo que Harry estava fraco e que toda a sua força estava sendo usada para manter-se consciente e poder carregá-lo, Snape aceitou a ajuda de McGonagall para guiá-lo na aparatação. A bruxa aproximou-se e segurou firme nos braços de Snape concentrando-se em seu destino. Em um segundo estava diante do castelo e rapidamente abriu os portões e caminhou com rapidez pelo jardim. Snape suava e ofegava, mas dispensara a ajuda que McGonagall pediria para Hagrid. Sabia que o meio gigante levaria Harry para a enfermaria com mais rapidez devido seus passos serem muito maiores assim como sua força em carregar o garoto magrelo como ele, mas não conseguiria deixá-lo naquele momento, Harry era sua responsabilidade, tinha que cuidar dele mesmo que isso o exaurisse ao máximo.
- Papoula! – Chamou Minerva quando irromperam pelas portas duplas da ala hospitalar.
A medibruxa saiu de sua sala com rapidez, os olhos ainda grudados de sono, mas que rapidamente se arregalaram ao ver o corpo desfalecido nos braços de Snape.
- Rápido, o coloquem nessa maca.
Sem perder tempo Madame Pomfrey passou a varinha por toda a extensão do corpo de Harry, e de novo e de novo, dando muito atenção ao rosto e ao peito. Grunhia algumas coisas que Snape não conseguia entender e ignorava os pedidos de informações enquanto se concentrava no paciente. Ainda sem dar nenhum retorno as perguntas a medibruxa rapidamente limpou o sangue seco e fechou alguns ferimentos do rosto de Harry sendo possível agora ver seus olhos e seus lábios. Com um pouco de dificuldade ministrou uma poção que fez com que a respiração melhorasse e os batimentos cardíacos, antes tão fracos, ficassem mais fortes.
- Ele está melhor, eu posso sentir. – Comentou Snape se aproximando da cabeceira da maca e olhando para o menino.
- Está melhor, mas está longe de estar bem. – Disse Madame Pomfrey respirando fundo. – Severus preciso que se afaste, tenho que examinar o corpo todo dele e preciso de privacidade.
- Não vou sair daqui. Ele é meu ômega. – Disse Snape entredentes.
- E é meu paciente, eu exijo que dê privacidade para eu fazer meu trabalho. – Disse a medibruxa devolvendo o olhar tão intenso e gélido quanto o dele. - Não pense que tenho medo desse seu olhar, já costurei sua pele mais vezes do que gostaria para que seu comensal me cause algum arrepio.
- Vamos, meu caro, deixe-a trabalhar. Não ficaremos longe, estaremos logo atrás da cortina.
Snape não gostou, mas aceitou e se afastou vendo a medibruxa fechar a cortina ao redor da cama. Demorou alguns minutos para que ela abrisse a cortina e quando o fez Harry já estava devidamente vestido com o pijama da ala e coberto. Parecia dormir tranquilamente.
- Eu dei uma poção fortalecedora, repositora de sangue e a sono sem sonhos para que ele possa ter uma noite mais tranquila. – Disse Madame Pomfrey. – Os hematomas do rosto sairão naturalmente, os cortes foram curados, há alguns ossos da costela que foram quebrados por chutes, esses eu preciso que o senhor Potter esteja acordado para que se curem, pois preciso que o corpo esteja mais forte, por enquanto isso causa apenas dor e não perigo a vida dele. E... – Nesse momento a medibruxa respirou fundo e olhou para Snape com um olhar triste. – Olha, eu sou acostumada a ver casos de abusos, vocês sabem muito bem que quando denunciamos alguma família de nossos alunos eu tenho que acompanhar o exame médico no St'Mungus e já ouvi muitas histórias e muitos casos. Mas nunca me deparei com algo assim. Severus, ele foi extremamente violentado, o senhor Potter estava brutalmente machucado e perdeu muito sangue devido as fissuras. Eu consegui curar é claro e ele não terá mais nenhuma dor nessa região, mas não tenho como curar o psicológico dele, as lembranças e os traumas. O que aconteceu com ele, foi mais que crueldade.
O homem nada disse, apenas assentiu e se aproximou de novo da cabeceira da cama puxando uma cadeira para se sentar ao lado de Harry. Seus dedos passaram devagar pelos cabelos pretos agora limpos e penteados. Quase não encostando na pele passou a mão pelo rosto com marcas roxas e desceu pelos ombros e braço tocando em sua mão inerte. Apertou-a de leve, a pele estava mais quente. Ele mesmo se sentia melhor, mesmo sem o comensal que agora se fora de volta para os confins de seu ser, podia sentir que a magia do garoto se curava e fortalecia.
- Me desculpe. – Pediu apertando a mão dele.
Não conseguiu dizer muito mais do que aquilo, mas se pudesse, se conseguisse diria para Harry o quanto se sentia culpado por tudo que acontecera com ele, que fora de fato sua culpa por negá-lo quando deveria ter o beijado e trazido para seus aposentos chamando Zabini para um duelo e protegendo-o das mãos cruéis daquele louco.
O mesmo louco que exigira sua entrada algumas horas depois, quando o sol começava a nascer no horizonte. Snape, que permanecera ao lado de Harry na ala hospitalar tão preocupado que nem pregara os olhos, retesou o corpo ao sentir a presença do Alfa dominante. Sem se demorar apertou novamente a mão do grifinório, fechou a cortina envolta da cama e saiu da ala hospitalar caminhando calmamente até a entrada do castelo. Podia ver ao longe a figura do ex-aluno atrás dos portões. McGonagall e Hagrid, que possivelmente fora quem o vira primeiro e foi chamar a diretora, aproximavam-se.
- O que deseja, senhor Zabini? – Questionou Minerva diplomática, mas com olhos perigosos, a mão segurando firmemente a varinha.
- Quero meu ômega. – Respondeu Zabini com os dentes cerrados. O ódio claro em seu rosto fino. – Vocês o roubaram e eu quero de volta.
- Harry não é um objeto para ser roubado. – Sentenciou Hagrid sendo seguido de um rosnado de canino. O meio gigante trazia seu arco em suas mãos, devidamente apontado para o ex-aluno.
- Ah, ele é sim, o melhor dos objetos e eu quero de volta, ele me pertence.
- Harry não pertence a você. - A voz de Snape chegou alta e clara, mesmo o professor estando a vários passos de distância e caminhando calmamente, a capa arrastando no chão. – Ele não pertence a ninguém, muito menos a um ser insignificante e asqueroso como você.
- Aí está. O mentiroso. – Snape, que se aproximara do portão ficando cara a cara com o jovem, pôde sentir o cheio de álcool no hálito. Zabini tinha saído para beber, enquanto Harry agonizava no chão. – Tudo aquilo era um truque para roubar meu ômega e eu idiota acreditei. Tudo que você queria era o Harry, mas não vai conseguir. Ele é meu e eu vou pegá-lo de volta, você sabe disso, sabe que não podem me impedir é a lei de nossa espécie. – Zabini se aproximou mais ainda do portão para que somente Snape o escutasse. – E quando eu o tiver de volta, Harry será a bunda mais fodida do Reino Unido.
O portão abriu com tanta força que Zabini foi jogado para trás caindo no chão. Snape avançou com a raiva estralando fazendo sair faíscas de sua varinha, jogou-se sobre o bruxo e antes que Zabini tivesse tempo ou reflexo para pensar pôs a varinha no pescoço dele, seu corpo prensando-o no chão e seu rosto lívido de ódio.
- Severus, não! – Gritou McGonagall. – Pense em Harry.
- Faça. – Disse Zabini rindo. – Faça.
Snape queria muito fazer, um feitiço, um único feitiço e aquele ser morreria e sua alma vagaria para longe, para os confins do inferno, seria rápido e ainda que ele não merecesse, indolor. Mas se fizesse isso, se deixasse que sua vontade prevalecesse naquele momento, Harry morreria em breve e Zabini sabia muito bem disso, sabia que se um Alfa morre de forma não natural e não por um duelo, seu ômega não pode se juntar a outro Alfa, seu corpo definha e ele morre alguns meses depois. Era isso que ele queria, matar Harry de uma forma ou outra.
- Se eu não o tiver, ninguém terá. Ele é meu! – Disse Zabini voltando a rir.
- Professor! – Chamou Hagrid. – Não faça uma besteira.
Contrariado Snape afastou a varinha aos poucos. Com a outra mão fechou os dedos no colarinho da camisa o puxando para perto.
- Eu o desafio, Blásio Zabini, para lutarmos até a morte pelo ômega Harry Potter.
