"Portanto, agora existem estas três coisas: a fé, a esperança e o amor. Porém a maior delas é o amor." 1 Coríntios 13:13
"AAAHAHAHAUHUUHUHUHUUUAHAHAHHAHHAAAAAHAAHA! GUUUUHUHUAHAHAHAHAAA!"
No topo de um prédio, Estér observava os últimos momentos de Mitakihara. Com a sua risada ensandecida cortando o som dos ventos tempestuosos, Walpurgisnatch sobrevoava a cidade, após ter sobrevivido, sem sofrer um arranhão, aos explosivos preparados por Homura.
A garota mágica que havia falhado mais uma vez ainda tentava perseguir seu alvo, enquanto confrontava com uma miríade de sombras de garotas mágicas, lacaios da lendária bruxa, que riam e zombavam do esforço inútil.
"Yaaaww..." Estér bocejou. Ela já havia visto aquilo tantas vezes, a única coisa que a interessava era para qual linha do tempo que Homura iria na próxima tentativa. "A areia no relógio de pulso dela deve estar prestes a acabar."
Homura conseguiu diminuir a distância, porém Walpurgisnatch a notou e lançou um prédio inteiro contra a garota. Ela preparou o escudo em seu antebraço para parar o tempo, mas toda a areia roxa havia escorrido para o compartimento inferior. "Não..."
"Bingo," Estér disse ao ver a garota mágica ser atingida pelo prédio e seu corpo voar para outro prédio destruído. A mulher alongou o corpo para acordar e ficar pronta para agir. "Parabéns, Homura-chan, sua Madoka vai morrer juntinho com a família dela, o melhor final que você já conseguiu. Ela nem vai sofrer muito! Até eu fiquei com inveja agora." Após o sarcasmo, ela aguardou pela magia que a garota usaria para pular para uma outra linha do tempo.
No entanto, isso não aconteceu.
"Hmm? Ela ainda não desistiu? Está cada vez mais teimosa..." Estér esperou um pouco mais, antes que novas preocupações a incomodassem. "Talvez ela esteja muito ferida para usar o seu relógio de pulso, ou presa sob os escombros." Ela deu um passo à frente. "Walpurgisnatch já vai destruir a cidade e Homura-chan está muito perto. Não posso arriscar a perder tudo agora."
Contudo, ela sentiu uma súbita pico de magia, uma nova fonte, seguida de uma coluna de luz rosa que partia do prédio onde Homura havia caído. "Isso... Madoka? Como?"
O brilho foi perdendo força, mas então um feixe rosa subiu até as nuvens, até onde estava se formando um intricado desenho de círculos conectados e linhas mágicas da mesma cor.
"Eu não sei como, não me importa como, essa garota é estúpida demais." Balançando a cabeça, Estér sorriu. "Mesmo com todos os seus avisos, Homura-chan, mesmo com o que aconteceu com a amiga dela da escola, Madoka ainda acha que pode 'salvar o dia' sem pagar o mesmo preço."
Quando o feixe alcançou o desenho, um buraco nas nuvens tempestuosas se formou e expandiu rapidamente, revelando o tranquilo céu azulado.
"E Walpurgisnatch será derrotada novamente por um mero golpe da nossa futura destruidora," Estér disse e suspirou, "Homura-chan... É hora de ir. Você não quer ouvir os gritos dela."
Do desenho no céu, incontáveis flechas de energia rosa foram disparadas para todas as direções.
O que fez Estér franzir o cenho. "Isso é novo."
Toda aquela magia atraiu a atenção de Walpurgisnatch, mas a grande bruxa começou a desintegrar.
Nenhuma flecha a atingiu, o que está acontecendo? Estér não estava mais sorrindo.
Walpurgisnatch era apenas agora uma grande engrenagem, o seu verdadeiro corpo, diante de uma nova coluna de luz rosa que havia surgido.
"Está tudo bem. Está tudo bem agora. Não precisa mais odiar ninguém. Não precisa mais amaldiçoar ninguém. Voltarei para antes que assuma essa forma e suportarei o fardo por você." A voz de Madoka ecoou pelo ar como um trovão.
O que ela fez? O que ela quis dizer com isso? Estér sentiu seu coração palpitar, e ela odiou isso. "Garota estúpida! Esse seu grande show de graciosidade custará o seu mundo!"
Uma explosão de luz engoliu Walpurgisnatch e todo resto.
"Ah!" Estér se protegeu com magia diante daquele súbito poder. Ela não sentiu uma onda choque, mas os seus pés não estavam mais tocando o chão. "O qu- gak?!" O ar escapou de seus pulmões sem controle, ela não conseguia mais respirar. A atmosfera se foi? Eu preciso salvar Homura! Fazendo uso de todo repertório de magias que a sua vasta biblioteca de almas podia oferecer, Estér localizou Homura e a teletransportou para mais próximo dela, então ela criou um campo de força invisível grande o bastante e uma atmosfera apropriada.
A luz então se foi e Estér viu o planeta Terra, o círculo azul proeminente com pinceladas de branco e verde flutuando em um céu escuro limpo, que contrastava no horizonte com uma vastidão cinza e sem vida. "Estamos na... Lua?"
A mulher alta de cabelos brancos estava flutuando, assim como Homura, que estava desacordava e muito ferida, mas a gema da alma intacta era prova de que ela ainda estava viva.
"A gema dela não está em um bom estado, melhor curar ela." Homura foi envolvida pela luz da magia de Estér. Quando a luz dissipou, a garota não tinha nenhum ferimento, até mesmo a sua roupa havia sido restaurada e não havia mais marcas de sangue.
Com outro feitiço, o solo lunar ficou em uma temperatura confortável. Estér gentilmente deixou Homura no chão e se afastou. Ainda que não devesse ser possível para garota sentir a presença dela, era melhor não tomar riscos.
Logo Homura acordou e se levantou, estando bastante confusa.
Enquanto isso, Estér estava analisando a situação. Por que fomos transportadas para cá? O que Madoka fez?
[Você está aqui também.]
[Qu'ube?] A mulher olhou envolta, mas não avistou criatura em lugar algum.
[Então você também deve ser uma viajante do tempo. Por isso também irá testemunhar.]
[Testemunhar?] Estér não gostou de ter sido descoberta. [O que Madoka desejou? Me diga exatamente, palavra por palavra!]
[Claro.] Kyuubey respondeu através da telepatia, [Essas foram as palavras dela: 'Desejo apagar todas as bruxas antes que elas nasçam. Todas as bruxas de todos os universos, tanto do passado quanto do futuro, com as minhas próprias mãos! Não me importo com o que vou me tornar. Todas aquelas que lutaram contra as bruxas, que acreditaram na esperança como garotas mágicas, não quero vê-las chorar. Quero que estejam sorrindo até o fim. Se houver alguma regra ou lei que impeça isso, eu a destruirei. Eu a reescreverei. Essa é a minha oração... Esse é o meu desejo. Agora! Realize meu desejo, Incubator!']
"Esse desejo... Tantas frases..." Estér franziu o cenho, falando consigo mesma. "C-Como?! Claro, ela tem o poder para isso, mas como? Essa criança ingênua, mesmo quando ela tinha alguma informação, ela sempre desejou salvar de alguém, ou cidade, ou até mesmo o mundo. Sempre lhe faltou ambição para desejar algo nessa escala."
Um grande cometa negro surgiu, em direção à Terra, sua cauda cobria as estrelas.
[O que é isso?] Estér perguntou para Kyuubey.
[Como estou explicando para Homura Akemi, essa é a gema da alma que a oração de Madoka criou. Ela está desse tamanho devido a todo o desespero que ela tem que suportar com o imenso desejo que ela fez. Se ela foi capaz de criar esperança o suficiente para um universo inteiro, então ela também acabará trazendo desespero o suficiente para destruí-lo.]
[Não seja ridículo!] Não piscando mais os olhos, Estér viu o cometa chegar ao planeta.
O bólido de escuridão então desabrochou e começou a tomar forma. Um par de braços gigantescos abraçou o planeta, enquanto do 'corpo' apareceu uma face macabra. Metade da face tinha uma máscara, com a imagem da Terra e da Lua como sendo seu olho e sua boca, respectivamente. A titânica bruxa do desespero terminou de envolver todo o planeta, sendo quase impossível distinguir o astro em relação ao abismo infinito que circundava.
"Não..." Homura cobriu o rosto e começou a chorar.
"Se o desejo dela afeta o passado e o futuro... então..." Enquanto Estér caiu de joelhos, custando a acreditar no que seus olhos mostravam. "Eu... Eu sou responsável... Eu..." Ela rangeu os dentes. "Eu devia ter matado Homura e Madoka desde o princípio! Mas eu me deixei levar pelas minhas ambições de NOVO! AAAAHHH!" A mulher apoiou as mãos no solo lunar, sua respiração ofegante denunciando desespero que fervia dentro de seu peito. "Leona... desculpe, eu não pude ser uma deusa nem para ti, eu só pude ser humana, jogando fora tudo o que construímos juntas por uma chance, um milagre para você ser feliz comigo." Lágrimas umedeceram o pó cinza, enquanto faíscas negras ameaçadoras saíam da gema corrompida na tiara. "Eu queria provar o contrário para Qu'ube, mas... A humanidade é pequena demais para o universo."
"Não se preocupe. Está tudo bem."
"Essa voz..." Estér ergueu a cabeça e viu uma nova luz no céu, como uma estrela que estava nascendo.
Essa estrela era Madoka, em um vestido de puro branco, com uma saia que se confundia com o fundo galáctico e suas mechas de cabelo rosa partiam para todas as direções, para todos os infinitos.
"Meu desejo é apagar todas as bruxas. Se isso realmente se realizar, então nem mesmo eu terei motivo para me desesperar!"
Completamente perplexa, Estér testemunhou Madoka conjurar um arco e preparar uma flecha com uma aura descomunal. "E-Ela realmente se tornou? Uma... Uma..."
Quando a flecha foi disparada, um verdadeiro bombardeio cósmico se formou, atingindo a bruxa que envolvia o planeta. Era a causa contra o seu próprio efeito, a aniquilação da causalidade.
A energia liberada por aquele momento cegou Estér.
E então ela abriu os olhos.
Ela se sentiu flutuando dentro de um mar de cores. "O quê?" Mas o que mais a surpreendeu foi quando ouviu a sua própria voz. Estava diferente, fraca e suave, era uma voz que ela havia abandonado faz muito tempo. "Hã? Onde? Eu..."
Então ela olhou para seu corpo, agora nu. Era como se ele fosse feito de luz, parcialmente translúcido. Era um pouco difícil de distinguir ele em meio a todas aquelas cores, mas ela tinha certeza que ele estava menor. Seu par de seios era quase inexistente de tão pequenos e suas mãos e pés podiam ser confundidos com o de uma criança.
"Sou eu. Meu velho eu..." Estér se deu conta que não estava sentindo algo em sua testa. Ela pôs a mão e não encontrou a sua tiara, nem a sua gema. "Eu não estou mais ouvindo elas..." Ela nunca se sentiu tão leve, como se seus pecados tivessem sido absolvidos. Ela só havia uma conclusão para toda essa paz. "Eu... morri?"
[Isso é impossível para você, Eisheth Zenunim.]
[Qu'ube.] Tão inesperado foi ouvir a voz daquele alienígena desprezível, que Estér relevou a ousadia de usar aquele nome. [O que é agora?]
[O universo está sendo reescrito conforme a oração de Madoka Kaname. Por violar a causalidade, ela deixará de existir. Ela se tornará um conceito, uma lei natural, incapaz de interagir com qualquer um.]
[Você ama conjecturar, hein? Já eu prefiro apostar que você está errado.] Estér sorriu. [E eu devo ganhar.]
Kyuubey não respondeu.
E o tempo passou. "Eu não consigo sentir ele." Estér olhou para seu o corpo para as cores em sua volta, sem encontrar algo para orientá-la. "Eu sinto que estou indo para um outro plano de existência... Talvez ele não esteja totalmente errado."
Então ela sentiu uma magia familiar.
"Homu... ra-chan?" Estér olhou para direção de sua sensação. Ela forçou a vista, pois estava muito distante e era difícil de distinguir com todas aquelas luzes coloridas, mas ele pôde confirmar.
Homura também estava nua, em corpo translúcido, sendo abraçada por outra garota... Era Madoka?
"Isso..." Ela não tinha palavras para expressar. Em toda aquela odisseia que aquela Homura havia passado nas linhas do tempo, Estér não esperava tal fim. "Bem, isso não era o que eu planejava, mas eu não deveria estar feliz? A humanidade está mais segura sem a minha presença, e não haverá mais bruxas," observando as duas garotas flutuando abraçadas, ela continuou a ponderar, "se há algo que eu possa lamentar, é não poder se despedir da Leona dessa última linha do tempo." Ela fechou os olhos. "Com universo sendo reescrito e sem bruxas, Qu'ube não deverá trazer o sistema de garotas mágicas. Leona não poderá fazer o seu desejo de liberdade ou, se a história mudar drasticamente, ela nem nascerá. Como posso jugar isso?" Ela respirou fundo e balançou a cabeça. "O que estou pensando? Eu não tenho nenhum poder agora."
Ela reabriu os olhos e continuou a ver as duas garotas. Ela experimentou e descobriu que podia fazer o seu corpo se mover por aquele oceano místico com a mera força de vontade, mas evitou se aproximar mais das outras duas. "Devo interromper o que elas estão fazendo e cumprimentá-las? Hmm..." Após uma breve consideração, Estér concluiu. "Eu também fiz parte disso, não é? Porém elas nem irão me reconhecer. Com o meu corpo original, elas irão pensar que sou uma adolescente que nem elas, e não uma mulher com uma bagagem de milhares de anos." Ela assentiu e começou a se mover. "Sim, eu preciso ver o que Madoka se tornou."
De repente, Estér sente algo segurar uma de suas canelas e ser puxada de volta. Ela se virou. "Hã? Quem?"
"Hihihihi!" Era uma garota, mas não era um corpo translúcido, era mais como uma silhueta, uma sombra de uma cor só. No caso daquela misteriosa garota, era vermelho.
"Hahahahaha!" "Kukukuku!" "HeheheheEEEHH!" "Uhuhuuuhuhu!"
Ela não estava só. Era uma multidão de sombras de garotas, cada uma com uma cor, rindo.
"Quem são... Oh..." Estér franziu as sobrancelhas ao reconhecer algumas vozes. "Vocês são as almas que eu absorvi, não é? O que fazem aqui? Vocês estão livres de mim, vão curtir as suas pós-vida e me deixem só."
O mar de cores teve um súbito movimento, como uma onda passando.
"O que é isso?" Estér olhou para onde estava Madoka e Homura.
As duas garotas abraçadas estavam se afastando gradualmente.
"Não..." Estér, de imediato, tentou segui-las, mas uma sombra agarrou o seu braço. "Me deixe ir!" Contrariando o protesto, mais sombras se agarraram ao seu corpo, que aos poucos perdia a translucidez. "Me larga!"
"Hihihihi!" "Hahahahaha!" "Kukukuku!" "HeheheheEEEHH!" "Uhuhuuuhuhu!"
Madoka e Homura foram ficando mais distantes.
"Não! NÃO!" Estér sentia todo o peso retornando. "Eu não posso voltar!" Ela estendeu o seu braço em direção ao único resquício de esperança que ainda tinha. "So... Socorro! SOCORRO! AQUI! Eu estou AQUI!"
Contudo, o mar de cores se apagou. As únicas cores vinham das sombras, que continuavam com a sua cacofonia de gargalhadas.
O braço estendido foi segurado e derrubado por aqueles que a deusa subjugou. Sua visão vilipendiada por mãos sacrificadas, sua boca amordaçada pelas as suas vítimas, de uma lista que estava destinada a crescer por toda eternidade. Antes disso, se provendo de seu âmago humano, Estér esvaziou os seus pulmões em um grito.
"MAAAAADDDOOOOOOOKKKKAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHH!"
A origem do mundo
E Madoka acordou, vestida em seu pijama verde, as madeixas de seu longo cabelo rosa espalhados sobre a cama.
A luz da manhã atravessava as cortinas de seu quarto. Havia o canto de pássaros, a previsão do tempo era de que seria um dia ensolarado.
Quanto tempo havia passado? Certamente apenas uma noite, mas na Lei dos Ciclos, um tempo infindável caberia dentro desse período.
Madoka suspirou, pousando a mão em seu peito pesado. Ainda que seu corpo feito de magia não pudesse cansar, seu espírito cambaleava. Pacificar bruxas, guiar milhares e milhares de garotas, buscando resolver seus conflitos, tantos os internos quantos os externos... Era muito trabalho e nunca era o suficiente.
Nesses breves momentos em que estava sozinha, com um tempo para refletir, havia sempre uma sensação de que havia deixado alguém para trás. Como um grito de desespero muito distante, que ela não sabe quando ou onde o ouviu.
"Será que Homura já acordou?" Era preciso se distrair dessas preocupações, Madoka se virou na cama para pegar o seu smartphone, mas, para a sua surpresa, ele estava desligado. "Hã?" O dispositivo permaneceu no mesmo estado após algumas tentativas de ligá-lo. "A bateria acabou?"
Ela deixou a cama para buscar o carregador, mas não o encontrou no lugar que ela sempre deixava antes de dormir. "Ué? Será que ainda está na maleta da escola?" Com mais pressa, ela procurou na maleta, até tirou tudo que havia dentro, mas não encontrando nada. "Onde? Será que eu o perdi?"
Ela olhou para a luz do dia na cortina, se dando conta. "O despertador não tocou, será que não estou atrasada?" Ela arregalou os olhos. "Oh não! Homura pode ter me chamado e eu não atendi! Ela com certeza virá correndo para cá!"
Madoka deu uns tapas leves em sua bochecha e saiu com pressa de seu quarto. No corredor, ela se deparou com o seu pai, Tomohisa Kaname, que estava abrindo a porta de vidro para entrar no jardim interno da casa.
Ele parou ao notar a sua filha aproximando. "Madoka? Bom dia, por que a pressa?"
"Eu não estou atrasada?" Ela indagou.
Ele franziu o cenho e ajeitou os óculos. Sorrindo, ele respondeu, "Eu diria que você acordou um pouco mais cedo que o habitual. Houve algum problema com o despertador?"
Madoka abaixou o olhar diante da perspicácia de seu pai. "O meu smartphone apagou e eu não encontro o carregador. Você o viu?"
"Hmmm..." Tomohisa coçou o queixo enquanto pensava. "Não, mas talvez a sua mãe pegou."
"A mãe?" Madoka voltou a olhar para ele, com um ar de surpresa.
"Sim, você sabe como ela vive perdendo o carregador dela, né? Na última vez, ela havia colocado por engano na bolsa de uma colega do escritório, enquanto estavam em um bar." Com um sorriso acanhado, Tomohisa coçou atrás da cabeça. "Ontem ela estava um tanto bêbada. Ela pode ter pego o seu carregador e esquecido de devolvê-lo."
"Ah..." Madoka assentiu. "Então vou perguntar a ela quando ela acordar."
"EEEEeeellllaaaagghghh... qquuuuueghhhmmmm?"
"Hã?!" Madoka se virou ao ouvir o grunhido atrás dela.
Era a sua mãe, Junko Kaname, também ainda de pijamas. Cabisbaixa, com os olhos semiabertos, com baba no canto da boca, ela parecia um zumbi. "Bbboommm... dddiaaaa..."
Atrás da perna dela, o pequenino Tatsuya Kaname a estava empurrando. "Olhem! Acordei ela, sozinho!"
"Ah... sim..." Madoka sorriu. "Bom dia!"
Junko pôs as mãos nos ouvidos. "Nãooo precisa falar... tão aaalto... Eu tô acordada." Ela fez umas caretas enquanto tentava abrir mais os olhos. "Vocês... Tavam falando de mim?"
"Você por acaso está com o meu carregador?" Madoka foi direto ao ponto, estando ciente de que Homura poderia estar chegando a qualquer momento.
"Não, eu tenho meu." Junko franziu o cenho. "Você o perdeu?"
Tomohisa perguntou, "Você não deixou na sua mala da escola?"
"Eu já procurei lá," Madoka respondeu, agora mais preocupada.
"Pode ter caído debaixo da cama," ele sugeriu, "você procurou lá?"
Madoka arregalou os olhos, se dando conta. "Não, na verdade não."
"Hmmm." Tomohisa assentiu. "Se você não encontrar lá, eu te empresto o meu. Não sei se é o mesmo modelo, mas iremos ver." Ele então deu atenção para a sua esposa 'zumbificada'. "E você vai precisar mais do que café forte, eu vou preparar um suco desintoxicante."
Junko não ficou muito feliz em ouvir aquilo. "Só me dê algo que tenha sabor bom."
Tatsuya foi correndo até a perna do pai. "Eu quero suco também!"
Tomohisa afanou a cabeça dele. "Claro que irei preparar um para você."
Vendo-os distraídos, Madoka se afastou em silêncio e voltou ao quarto. Após fechar a porta, rapidamente se deitou para ver o que havia debaixo da cama. Estava um tanto escuro, mas visível o suficiente e o carregador não era um objeto tão pequeno, mas ela não o encontrou ali. Desapontada, ela se levantou, pensando se havia opção que não fosse a proposta de seu pai. Talvez tenha uma maneira de usar magia para encontrar ele.
Então ela ouviu algo mais que seus pensamentos. Uma lamentação muito baixa, impossível de discernir, mas que ficou claro que não pertencia a uma pessoa, mas de uma multidão. Então veios os gritos e choros, todos abafados, mas que não escondia sua força, como ondas de uma praia distante.
Uma súbita, próxima, presença.
O corpo de Madoka reagiu aquela pressão. Ela se virou de uma vez e viu no canto de seu quarto, sob o véu da penumbra, uma sombra alta.
Os olhos da silhueta negra brilharam em rosa e ela começou a se aproximar. Sob a luz vindo através da cortina, uma mulher com feições estrangeiras, com musculatura forte, com suas formas femininas esculpidas com perfeição. Um par de faixas de tecido, uma azul e uma branca, eram as únicas coisas que cobriam as suas partes mais íntimas, enquanto o restante que ela vestia eram jóias. Sua pele marrom reluzia uma textura macia sem defeitos e seus cabelos brancos muito longos eram lisos e sem nenhum fio desalinhado. Adornando a cabeça, havia uma tiara, e nela havia uma gema da alma muito escurecida, corrompida, contrastando com todo o resto.
Com imponência e graça em cada passo, a mulher ficou na frente de Madoka, acentuando ainda mais a grande diferença de estatura entre as duas.
A garota de cabelo rosa e pijamas ficou boquiaberta.
Enquanto que a mulher sorriu, dizendo em japonês, "Bom dia, Madoka Kaname."
Madoka piscou algumas vezes, antes de sorrir também. "Você... Você finalmente veio."
Pega de surpresa, a mulher parou de sorrir. "Você me conhece?"
"Ah, talvez você não acredite," Madoka respondeu, abaixando o olhar, "eu me lembro de você, enquanto eu era uma bruxa. Você me derrotando, salvando o mundo, muitas e muitas vezes."
A mulher permaneceu em silêncio.
Madoka continuou, "eu queria tanto te agradecer, mas nunca te encontrei. Eu só pude esperar, rezar que você não morresse, para enfim chegar esse dia." Ela voltou a trocar olhares com a visita honrosa. "E você sabe o meu nome. Você deve saber mais do que isso sobre mim. Qual é o seu nome?"
A mulher assentiu. "Você pode me chamar de Estér."
Madoka recuou e sentou na cama, colocando a mão ao lado de si, guiando. "Venha, nós temos um tempo para conversar."
"Sim, nós temos." Estér aceitou o convite educadamente e sentou ao lado da garota, com a cama fazendo muito barulho, protestando com o peso da mulher alta e forte.
Só pelas atitudes e pelo tom de voz, Madoka sabia que a mulher estava sendo cautelosa, havia uma tensão no ar. "Se você tivesse vindo para me matar, você já teria vindo antes. Você deve ter as suas dúvidas quanto ao que sou agora, ou talvez você já ouviu falar sobre a Lei dos Ciclos."
Estér olhou de relance para ela, enquanto erguia as sobrancelhas. "Eu ouvi rumores que você se tornou uma deusa. 'Deusa das garotas mágicas', 'a salvadora'."
"É o que alguns acreditam." A garota de pijama suspirou. "Mas quando eu fiz o meu desejo, eu disse para o Incubator que eu não me importaria com o que fossem me chamar. Isso continua sendo verdade, isso não importa, desde que eu possa impedir que as garotas mágicas se percam no desespero."
"Mas você continua essa farsa, não é?" Estér voltou a sorrir. "Pois... O que as garotas mágicas que você está ajudando pensariam se soubessem a verdade?"
Madoka ficou em silêncio, com suas mãos inquietas segurando uma a outra.
"Isso se tornou muito grande, não é?" Estér continuou, "Você as engana, e continuará as enganando por toda a eternidade, se possível. Ou muitos morrerão, talvez até você."
Madoka abaixou a cabeça e fechou os olhos, tentando encontrar melhores palavras, mas falhando. "Eu sinto muito..." Então, ela sentiu um tapinha nas costas.
"Você não deve pedir desculpas, pois isso é o que chamamos de FÉ, elas acreditarem em você é tudo o que importa," Estér afirmou, "agora, você deve aceitar a sua posição, assumir as consequências do que você fez, o seu desejo. Seja uma deusa, até o fim."
"Estér..." Madoka olhou para mulher e mostrou tímido sorriso. "Você é uma pessoa muito madura. Você deve ter muitos anos como garota mágica."
Estér deu de ombros. "Uma mulher que se preze não revela a sua idade."
"Você salvou tantas vidas." Madoka assentiu, com se concordasse consigo mesma. "Você tem bom coração, você é verdadeira heroína."
Agora séria, Estér balançou a cabeça. "Você está se precipitando."
"Não, eu não estou." Os olhos de Madoka se tornaram dourados. "Eu posso ouvir os gritos delas, em sua gema."
Estér virou a cara.
"Você fez coisas ruins, e elas te assombram até hoje," Madoka disse, "por isso que você falou sobre consequências das minhas ações. Você aprendeu com as suas e não é mais aquela pessoa que já fora."
"Sim." Estér suspirou. "É sobre isso."
"Você já carregou esse peso por tempo demais." Madoka começou a estender a mão até a gema corrompida na tiara da mulher. "Chega de lamentações. Eu irei todas libertar todas vocês."
Estér deixou a cama, se levantando a rapidamente. Ela andou até o outro lado do quarto e se virou para a garota.
Os olhos de Madoka voltaram a serem rosas. "Estér?"
"Não, isso não irá acontecer como você quer." Estér balançou a cabeça, com um fraco sorriso, um sorriso de resignação. "Quando você acha que está no controle, é quando você perde tudo."
A porta do quarto abriu de repente e violentamente. O primeiro a entrar foi o pai, seguido da mãe e do irmãozinho.
"Hã?!" Madoka ficou boquiaberta com a entrada inesperada. Um calafrio subiu pela espinha, pois ela notou que havia algo de muito errado neles. O corpo dos três estavam tremendo, como se estivessem fazendo um grande esforço para se libertar de algo invisível. A boca deles estavam fechadas, mas os olhos estavam lacrimejados e ranho descia pelas suas narinas, como se estivessem chorando copiosamente.
Despreocupada, Estér fez um gesto com a mão.
Imediatamente, Tomohisa, Junko e Tatsuya se alinharam e se ajoelharam na frente de Madoka. A família ficou entre a garota na cama e a mulher de pé no outro lado do quarto.
Com os olhos arregalando, Madoka levantou a voz, "O que está FAZENDO?"
"Eu estou controlando o corpo deles." Estér ergueu o dedo indicador, assim como as suas sobrancelhas. "Mas saiba que eles estão vendo e ouvindo tudo."
Madoka notou que isso era verdade ao trocar olhares com a sua família.
Junko, com as veias saltando para fora devido ao esforço, só conseguiu um leve balanço com a cabeça.
"Eles também sentem dor, é claro."
Madoka voltou trocar olhares com Estér, balançando a cabeça e franzindo o cenho. "Por quê?"
"Eu já fiz essa pergunta muitas vezes. Eu quase nunca obtive uma resposta, e mesmo assim eu tinha que lidar com o que estava acontecendo na minha frente." A mulher alta de cabelos brancos pôs as mãos na cintura. "Certo, vamos fazer o seguinte: você diz quem da sua família, e qual osso, e então irei quebrá-lo. Se você demorar demais, eu irei decidir."
"I-Isso é um teste?" Madoka juntou as mãos na frente de sua respiração inquieta. "Você quer provar algo. Sobre... Sobre consequências?"
"Não," Estér disse com frieza.
Logo após isso, a cabeça de Junko e de Tatsuya viraram para ver o pai, Tomohisa. A mão direita foi estendida e então o dedo do meio foi sendo dobrado para cima, para além do limite possível. A pele rasgou, revelando o osso fraturado e o sangue verteu, gotejando no piso.
Tomohisa não gritou, ele não tinha como gritar. No entanto, o semblante de dor era inconfundível, seus olhos fechados firmemente, os músculos do seu pescoço tensionados.
Junko e Tatsuya só puderam derramar mais lágrimas.
"Pare." Madoka balançou a cabeça e gesticulou. "Estér, espera. Espera!"
"Isso não é um joguinho. Eu irei torturar a sua família até a morte, na sua frente, e cumprirei isso até o fim." Estér então suspirou. "Mas eu acho que você tem razão. Eu adquiri um 'coração mole' e comecei com o seu pai ao invés do seu irmão."
O braço esquerdo da pequenina criança foi levantado por uma força invisível. Tatsuya arregalou os olhos.
A cabeça de Tomohisa e de Junko foram viradas para poderem testemunhar o que aconteceria com o filho deles.
"Vamos compensar isso." Estér ergueu as sobrancelhas. "Que tal eu torcer o braço inteiro dele?"
Junko também arregalou os olhos, o corpo inteiro dela estremeceu.
"Oh? O coração da sua mãe está batendo ainda mais rápido, eu acho que ela irá infartar," Estér disse, "Madoka, não se esqueça, você pode dizer quem e qual osso, eu irei respeitar o seu pedido. Assim, você vai conseguir deixar que o seu irmão seja o último a morrer."
Madoka abaixou a cabeça, alternando então em olhar para o chão do quarto e olhar de relance para Estér.
"Hã?" A mulher de cabelos brancos semicerrou olhar e sorriu. "Hmmm... Eu conheço essa face. É a face de alguém que parou de bancar a boba e está considerando as reais opções."
Madoka não olhou mais relance, engolindo seco.
"Para me parar, há uma opção muito mais simples que qualquer outra." Estér apontou para a sua gema da alma. "Acerte aqui com a sua flecha divina e tudo acaba."
A garota de pijamas fechou os olhos com força e pressionou os lábios.
"Aahhh... Mas você não pode, não é? Você as ouve." Estér abriu um sorriso maior. "Destruir a minha gema iria matar todas as garotas mágicas que estão dentro dela."
Madoka continuou cabisbaixa, parada, como se estivesse resignada.
Enquanto Estér prosseguia com as provocações. "Quantas almas são? Dez mil? Trinta mil? Talvez cinquenta mil? Por quantas você permitiria que a sua família sofresse até morte, OOOHH 'grande deusa das garotas mágicas'? Responda rápido ou eu ire-" Até que ela sentiu algo na sola de seus pés. "O quê?"
Veias negras se formaram nos pés, que estavam agora pisando em uma sombra distorcida de forma sobrenatural.
Era a sombra de Madoka. A garota deixou a cama, ficando de pé. Ela reabriu os olhos, agora dourados.
A malha de veias negras foi subindo rapidamente pelas pernas, chegando ao torso de Estér. "Ghhh!" Desesperada, ela voltou a olhar para a garota.
"Eu ainda não entendo por que você fez isso," Madoka falou com certa convicção, "mas eu não vou deixar você continuar para saber."
Tomohisa e Junko, carregando cenho franzidos, olhavam para a sua filha.
Com um semblante mais triste, Madoka disse para eles, "Me desculpe por deixar isso acontecer. Eu... irei consertar isso, fazer com que isso seja esquecido."
As veias negras espalhavam pelo peito e braços, e estavam prestes a alcançar o pescoço. Estér ergueu a cabeça, em uma vã tentativa de evitar o que era certo de acontecer. "Não! N-NÃO! ISSO NÃO PODE TERMINAR ASSIM!"
Madoka voltou a prestar a atenção para a mulher.
"AAAAAHHHHHHH!" A cabeça de Estér foi tomada pelas veias negras completamente. "Aaaahh..." Então ela olhou para Madoka, com um sorriso. "O que achou da minha performance? Huhuhu..."
Piscando os olhos, Madoka parecia ainda estar absorvendo o que estava acontecendo.
Estér fungou o nariz, soltando uma grande quantia de líquido negro viscoso, como piche, na palma de sua mão. "Eca... Essa sua 'salvação' é nojenta. Fui sábia em sempre evitar me contaminar com isso quando eu confrontei a sua bruxa."
O olhar dourado de Madoka arregalou-se e ela ficou boquiaberta.
"Huh? Está surpresa?" enquanto lágrimas negras desciam de seus olhos, Estér explicou, "é muito simples. Uma alma muito, muito querida que eu tenho em minha posse desejou pela liberdade absoluta. Nada pode me controlar."
Madoka murmurou, "Ishtar..."
Estér parou de sorrir.
"Ah... Ah..." A luz dourada nas írises da garota desvaneceu. "Vo... V-Você... Você é a deusa Ishtar!"
"A deusa da fertilidade e da guerra, provedora de vida e morte," Ishtar falou, soando mais como um anúncio, "a deusa das paixões, das ambições. A epítome da fé humana em sua própria natureza..." Ela olhou para as veias negras em seu corpo. "Como você extraiu essa informação? Eu estou segura que você não conseguiu vilipendiar a minha alma."
"Você existe." Madoka abaixou olhar, com as pernas bambas com o choque. "Você é real..."
"Será que algo vazou da minha gema para o cérebro desse corpo?" Após ponderar isso, Ishtar retornou a sua atenção para a garota e a sua família subjugada. "Lendo a sua mente, parece que você não obteve mais nada além disso." A expressão da deusa endureceu. "Contudo, isso não era para você saber."
Madoka ouviu um estalo súbito. "Hã?" E viu os três membros de sua família caírem de face ao chão, ficando imóveis. Ao ver a posição nada natural de suas cabeças, ela logo concluiu que o som que ouvira era de seus pescoços terem sido quebrados. Estremecendo, ela consultou a outra deusa, esperando estar errada.
"Vamos acelerar." Ishitar estendeu o braço, apontando a sua palma da mão aberta para garota de pijama.
Madoka sentiu um forte empurrão invisível e então o impacto de suas costas com a janela, a destruindo. "HHYYYAAAAHHHH!" Quando se deu conta, se viu voando em alta velocidade sobre a cidade de Mitakihara, sem controle ou, melhor dizendo, sem o controle dela. Em um flash de luz, ela mudou para seu uniforme de garota mágica e formou um par de asas de energia rosa para estabilizar e ver melhor qual era o destino.
Era um dos mais modernos arranha-céus no centro da cidade, um colosso de aço e vidro.
Madoka já estava tão perto, que ela podia ver o seu próprio reflexo nas grandes vitrines do prédio. Ela só teve tempo de proteger o rosto com os braços antes de arrebentar o grosso vidro. O barulho foi tremendo, seguido de muitos gritos de sustos. Antes que pudesse processar onde estava, ela sentiu uma mão agarrar com força o seu pescoço, a fazendo parar de voar. "Gnnnkhh!"
Era Ishitar, que já estava ali. Seus olhos rosas brilhando, contrastando com a gosma preta que saía pelos orifícios de sua face.
"Gnnn..." Assim que ela segurou o braço da mulher alta e forte, Madoka foi arremessada. Ela se chocou violentamente com algumas escrivaninhas, derrubando computadores e monitores. Os gritos que ela ouvira, que antes eram de sustos, passaram a ser de desespero.
O local era um grande escritório e os funcionários haviam acabado de chegar para o trabalho. Agora, muitos buscavam a saída mais próxima enquanto outros tentavam fazer chamadas com os seus smartphones.
Ishtar estendeu a mão em direção àquelas pessoas. "Não."
Todos os dispositivos pifaram e as portas fecharam sozinhas, de forma súbita e violenta.
Madoka começou a se levantar lentamente, ficando de joelhos. Seu uniforme de garota mágica estava arruinado e ensanguentado, havia um grande pedaço de vidro enterrado em seu abdômen. Ela então trocou olhares com a outra deusa.
Ishtar deu um leve sorriso, erguendo as sobrancelhas e assentindo.
Madoka entendeu que ela estava oferecendo algum tempo como gentileza. Ela então arrancou o pedaço de vidro com facilidade, sem dor alguma, mas fazendo com que vertesse mais sangue, escorrendo pelo seu tutu e formando uma larga poça envolta dela.
Ishtar pigarreou e cuspiu, atingindo o piso com um liquido viscoso negro.
A poça envolta de Madoka escureceu rapidamente, também se tornando um piche. Como se fosse vivo, o cuspe no chão começou a rastejar, se aglutinando com a poça.
Os olhos de Madoka ganharam tons dourados e a poça preta foi sendo a absorvida pelo seu corpo. Cacos de vidro menores que ainda estavam perfurando o corpo da garota foram sendo empurrados para fora à medida que as feridas fechavam, até o uniforme foi reparado. No fim, era como se nada tivesse acontecido com ela.
"Fascinante." Ishtar cruzou os braços. "Então, jovem deusa, você ainda acha que fará me parar com conversinha?"
Madoka havia pressentido que algo ruim estava para acontecer, mas nada havia preparado ela para isso. "Ishtar..."
A mulher de cabelos brancos manteve sua postura imponente.
A garota olhou de relance para os funcionários do escritório. Alguns ainda tentavam em vão abrir as portas, enquanto outros se escondiam debaixo das escrivaninhas. "Você me vê como uma ameaça, sendo uma deusa? Eu não tinha intenção de..."
Ishtar revirou os olhos e estendeu o braço em direção aos funcionários.
Uma bem vestida funcionária do escritório foi erguida no ar e puxada por uma força invisível até a deusa com veias negras. "AAAHHH! KKKYYYAAAAHHH!"
"Não!" Madoka exclamou.
"Não?" Ishtar franziu o cenho. "Não o quê? Ela só existe por causa de mim."
"AAAHHH! SOOOCCCOOOOO-" Funcionária continuou a gritar desesperada, mas ela voz dela se foi. Então ela viu as suas vestes sendo rasgadas de uma vez, assim como o seu cuidadoso penteado fora desfeito.
Madoka ficou vendo aquela funcionária, agora nua, girando lentamente no ar como se fosse uma carne para ser assada.
"Eu conheço o teu desejo, Madokami, eu sei o porquê de fazer tal desejo." Ishtar também olhou para a mulher nua, com um leve sorriso de satisfação enquanto a via chorar e gritar, sem ser capaz de emitir um som. "Qu'ube te contou que foi graças ao desejo das garotas mágicas que a humanidade chegou nesse patamar de civilização. Se não eles ainda seriam um bando de animais covardes vivendo em cavernas."
"Sim." Madoka juntou as mãos, como em uma reza. "Agora, por favor, solte-a. Você não precisa dela para provar nada."
Ishtar a ignorou e continuou a falar, "O que ele não te contou é que isso não era o resultado planejado, pois o desejo das garotas mágicas pode tanto trazer avanços para humanidade como também a sua destruição. O sistema todo existia para nos podar, mantermos fracos, não deixar nós sermos mais do que gado." Ela fez um gesto circular com o dedo indicador.
A funcionária nua acompanhou movimento, rodopiando, fazendo ela ficar de cabeça para baixo.
Enquanto Madoka ergueu as sobrancelhas, processando aquela revelação.
"Foi graças ao meu dedo posto na ponta dessa balança, que a humanidade pôde prosperar. Você, jovem deusa..." Ishtar então olhou para as outras pessoas no escritório, anunciando, "Vocês todos nesta sala só existem por causa das minhas ações. Vocês devem suas vidas nesse conforto moderno a mim!" Ela bateu em seu próprio peito, sorrindo. "Vocês poderiam até me chamar de mãe, mas eu prefiro que não. Eu não carrego esse tipo de amor comigo."
De tanto rodopiar, a funcionária não aguentou mais, vomitando e urinando.
Testemunhando aquilo, Madoka fez uma careta. "Por favor, Ishtar..."
"Porém, há um problema," sem parar de falar, a antiga deusa retornou a sua atenção para a garota ajoelhada, "por mais que a humanidade tenha prosperado, o risco de extinção é ainda real e eminente. Basta um desejo muito ruim, de uma garota com muito potencial... Como você." A face de Ishtar, manchada de veias negras, estremeceu de tensão. "Mas você é diferente, seu potencial podia crescer, sem limites. Seu desejo podia resolver tudo..." Os olhos dela arregalaram-se. "Mas o que aconteceu? Você não só o desperdiçou, você o usou para manter o sistema de garotas mágicas!"
"Eu..." Madoka se lembrou daquele dia, com a Mitakihara à beira da destruição na janela do abrigo, sua postura diante da mãe. "Eu fiz isso pois era tudo muito injusto! As esperanças das garotas sendo consumidas e desvirtuadas."
"Você ainda acha que as bruxas eram o único problema?" Ishtar balançou cabeça e exasperou, "uma deusa não pode se dar ao luxo de ser tão TOLA!"
Mas a coragem na voz da Madoka persistiu, mesmo diante da sobrepujante presença, "Você teme pelo futuro da humanidade, eu entendo agora, mas eu estive no futuro. Meu desejo tornou isso possível."
Ishtar finalmente permaneceu em silêncio.
"A humanidade irá descobrir que existem civilizações alienígenas. Incubator irá se revelar e será o nosso intermediador." Madoka assentiu. "Não haverá extinção, e sim uma nova era."
Ishtar fez um súbito gesto com a mão e a funcionária parou de rodopiar. A mulher pelada estava toda suja, mas ainda viva e consciente.
Madoka suspirou aliviada.
Em tom mais calmo, Ishtar então falou, "O que eu te disse sobre esse sentimento de estar no controle?"
Madoka não disse nada, apelas piscou os olhos.
"Qu'ube como intermediador? Contato com outros alienígenas? É?" Ishtar franziu o cenho. "A tecnologia deles permitiu eu ser criada, além de você, além das bruxas, e até as leis naturais do universo serem reescritas." A antiga deusa quase riu, como se não estivesse acreditando. "V-Você não aprendeu nada. Você... Você seriamente acredita que esse futuro não pode ser 'desvirtuado' também?"
A garota não hesitou em responder, "Eu vou lutar para que ele aconteça."
"Com o quê? Você só tem a esperança do que viu, mas fé não tem parte com isso," Ishtar escarneceu, dizendo, "e, no momento, eu não tenho fé em ti, jovem deusa da nova era."
A funcionária pelada sentiu uma força puxar o seu abdômen. "aaaAA-" Uma força tão tremenda que, partindo de sua virilha até o peito, o corpo dela se partiu como um ovo, e sua carne, tripas e sangue derramaram sobre a piso do escritório, formando uma pilha grotesca.
Nenhum funcionário ali exclamou ou gritou, nem mesmo as mulheres, tamanho era o medo de ser o próximo.
Madoka olhou para aquela pilha de carne, com um silêncio de luto.
"Você nem piscou. Você realmente alcançou a divindade." Ishtar jogou para longe os restos mortais da funcionária que ainda flutuavam. "Eu matei a sua família. A Madoka que eu conheci estaria em prantos, em completo choque."
"Eu sempre vivo me perguntando se eu fiz o melhor desejo..." Madoka olhou para a outra deusa, dizendo quase como um sussurro, "desculpa."
"Não estou aqui para ouvir isso. Eu estou aqui para fazer você sentir o que é ser uma deusa." Lágrimas negras desceram pela face de Ishtar. "Mas isso jamais funcionaria com a sua família, não, você está em todas as linhas do tempo."
"O quê?" Madoka sentiu um aperto forte em seu peito. Algo no tom daquela mulher escancarava algo pior viria.
"Quantos funerais deles você já viu? Há infinitos deles, não é? Infinitas vidas de seus familiares para você testemunhar, e a maioria deve ser mais longa e feliz do que a que você presenciou hoje." Ishtar chacoalhou uma de suas mãos. "Por isso que eu vim preparada."
Ao ver a mulher abrir a mão, Madoka arregalou os olhos e estremeceu. Era uma semente da aflição, com detalhes metálicos que remetiam a uma ampulheta.
"Ah, você sabe, não é?" Ishtar alcançou uma de suas lágrimas que descia perto da boca com a sua língua, que também estava manchada de veias negras. "Como resultado de ter feito um desejo para viajar no tempo, não há nenhuma outra Homura Akemi como garota mágica nas linhas do tempo além dessa."
Madoka rangeu os dentes e começou a arfar intensamente.
"Sim, essa é a única 'Homura-chan'. A única que tinha apenas você como razão para viver, em uma devoção sem fim, se não doentia por assim dizer. Eu já tive alguns zelotes como ela, realmente sei do que estou falando." Ishtar ficou assentindo, semicerrando o olhar e falando um tom mais zombador, "você sabe que ela é única, pois você viu o que acontece com ela quando ela não é uma garota mágica. Quantas vezes você a viu pular daquela ponte?"
A pele de Madoka ganhou uma palidez cadavérica e foi tomada por veias negras. Ela balançou a cabeça, e gesticulou desesperadamente com ambas as mãos. "N-Não faça isso!"
"Eu farei, e então ela nunca mais poderá se juntar a você na Lei dos Ciclos." Ishtar mostrou um sorriso, mas a sua face contorcia com uma raiva contida. "Quando essa semente for destruída, ela partirá para sempre, E NEM EU POSSO REVERTER ISSO!"
Madoka se prostrou diante de Ishtar. "Eu faço qualquer coisa!"
Contudo, a imponente deusa respondeu prontamente, "Seu desejo tinha esse poder, não você!"
Madoka começou a rastejar deixando um rastro gosmento preto no piso. "Por favor!" Ela visava o pé da outra deusa, mas Ishtar deu passos para trás. Então, em um acesso de frustração, Madoka socou o chão. "É minha culpa, é tudo a minha culpa!"
Ishtar ergueu as sobrancelhas.
E Madoka continuou, "Se você conhece Homura-chan, então você sabe que ela não merece isso." Com a cara colada no chão. "Fui eu que fiz o desejo! Você pode fazer o que quiser comigo."
"Qualquer coisa?"
"Sim! Sim!" Madoka pressionou ainda mais a testa contra o piso. "Eu imploro por toda sua experiência e sabedoria. Poupe a vida dela e aplique toda a sua devida justiça em mim!"
"Levanta a cabeça."
Hesitante, a garota obedeceu a antiga deusa e, para a sua completa surpresa, viu a semente da aflição no chão, se equilibrando em seu fino e longo pino.
"Pegue, jovem deusa," Ishtar disse, "se levante mais."
Sem certeza de mais nada, Madoka lentamente pegou a semente. Ela então se sentou no piso e trocou olhares com a antiga deusa.
O semblante de Ishtar era de tranquilidade, não havia mais o olhar de uma julgadora.
Até parecia que a tensão no ar havia ido embora, tanto que alguns funcionários que estavam se escondendo ousaram levantar as suas cabeças para ver o que estava ocorrendo.
"Eu ouvi o que queria ouvir, eu estou satisfeita." Ishtar deu um risinho. "Huhu, eu até estou me sentindo uma senpai agora."
Madoka certamente não compartilhava dessa alegria, mas ela abaixou a cabeça e suspirou, abraçando com força a semente. Ela havia entendido o que poderia perdido.
"Mas entender não é o mesmo que sentir na pele isso," com olhos brilhando, Ishtar falou, "eu coloquei um feitiço que irá inverter a matéria dessa semente."
Madoka levantou a cabeça de imediato, franzindo o cenho.
"Caso não entendeu, a semente de Homura-chan vai se tornar antimatéria pura já já!" Ishtar escancarou os dentes em um grande sorriso, antes de desaparecer instantaneamente.
Perdendo-a de vista, Madoka virou a cabeça e olhou para todas as direções. Ela não conseguia a sentir presença dela, nem mesmo da parte de si mesmo que estava no corpo daquela mulher. "Quê..." Então um brilho veio debaixo.
Era semente da aflição. O brilho intensificou, se tornando cegante.
Mas Madoka não fechou os olhos naquele instante, muito pelo contrário. "Não! Não! NAAA-"
Naquela manhã, um outro sol nasceu no meio do centro de Mitakihara. Aqueles que foram consumidos pela imensa esfera de luz e calor vaporizaram instantaneamente.
E esses seriam os mais afortunados.
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Momentos antes.
A porta do elevador abriu-se, revelando estar vazio. Mami e Nagisa viram seus reflexos no espelho ali instalado, cada uma vestindo o uniforme de suas respectivas escolas.
As duas entraram e a loira apertou o botão para descer até o térreo. "Hoje é o meu primeiro dia no clube de chá."
"Você já disse isso duas vezes antes da gente deixar a casa," Nagisa disse, enquanto a via porta do elevador fechar e ele começar a descer, "mas... Você não parece muito feliz."
"Eu estou, mas também estou muito nervosa," Mami explicou, "Sasa-san me disse que há... hmmm... Muita competição entre os clubes em Shirome. Os membros do clube de chá devem ser muito exigentes, não somente na qualidade do chá, mas também na etiqueta."
Nagisa suspirou e balançou a cabeça, não aprovando o que ouviu. "Eu já te disse que você devia retornar para a escola de Mitakihara."
"Não, está tudo bem." Mami corrigiu a sua postura e estufou o peito. "Essa é uma grande oportunidade de fazer novas amizades. Com Sasa-san agora estudando em Kazamino, eu estou muito isolada."
"E a Mikuni-san?" Nagisa questionou.
"Mikuni-san..." Mami abaixou o olhar. "Há ela, mas..."
O smartphone da Nagisa vibrou.
"Oh?" Mami olhou de relance para ela. "É ele?"
A garota de longos cabelos brancos pegou o dispositivo que estava em sua maleta escolar. "É, deve ser-"
As luzes apagaram e o elevador parou.
Nenhuma luz de emergência acendeu e as duas ficaram na completa escuridão. "O que fo-"
Um forte estrondo de impacto, seguido pelo ronco de desmoronamento, abafou qualquer grito que elas pudessem fazer.
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Kirika bateu palmas e deu pulinhos de alegria. "Amorzão vai ficar tão feliz em saber que você comeu todo o café da manhã que ela havia preparado."
Yuma estava sentada em sua grande cama, em seu quarto na velha mansão dos Mikuni. Em seu colo estava uma bandeja com uma tigela vazia, que antes estava preenchida com sopa de missô.
A pequena garota não compartilhava da mesma energia que Kirika, "Papa, será que mama volta logo?"
"Sim!" a garota de olhos de cor citrino respondeu com plena certeza, "amorzão não consegue ficar muito tempo longe da gente, né?"
Yuma ficou cabisbaixa.
"Awww, meu amorzinho, não fica assim..." Kirika sentou ao lado dela e a beijou na cabeça. Seus lábios sentiram os pedaços de jade que estavam incrustrados no couro cabeludo da menina. Ela então ficou acariciando os tufos de cabelo verde. Sob todo aquele jade, a pele de Yuma estava ficando cada vez mais visível, mas momentos de tristeza como aquele poderia pôr a perder todo o progresso. "Eu também estou com saudade dela, mas nós somos crescidas, não somos? Ela vai ficar orgulhosa que nós cuidamos do nosso lar, não vai?"
Yuma assentiu timidamente.
"Ela vai sim." Kirika deu mais um beijo e pegou a bandeja. "Você pode descansar um pouco mais, enquanto eu preparo um banho bem gostoso. Ok?"
Yuma assentiu mais uma vez e olhou para ela. "Obrigada, papa."
"Isso não é nada comparado em ver você melhorar." Com um largo sorriso, Kirika deixou o quarto. Caminhando com a bandeja pelo longo corredor da mansão, ela murmurou para si mesma, "Amorzão, nós vamos conseguir..."
De repente, um flash de luz preencheu o ambiente, como um trovão, mas diferente de um trovão, a luz dissipava muito mais lentamente.
Tão preparada para isso que, no tempo que teve o susto, Kirika invocou uma aura violeta, que se espalhou pela mansão. Deixando a bandeja com a tigela para trás, que começaram a cair lentamente, ela voltou correndo para o quarto de Yuma.
A pequenina ainda estava na cama, olhando assustada para a janela que havia estourado. Tudo lentamente, cacos de vidro estavam voando e línguas de fogo consumiam a mobília e o colchão.
Kirika arregalou os olhos.
Notando a presença dela, Yuma se virou e questionou, "Papa, o-o quê?"
"VEM!" Kirika a pegou e carregou em seus braços, enquanto rachaduras serpenteavam pelas paredes e o teto começava cair. Ela saiu correndo com a menina pelo corredor, já com o chão desnivelando e desabando. "Nós temos que chegar no porão!"
Chegando no hall principal da mansão, ela saltou para chegar no andar inferior e seguiu para o corredor que dava acesso ao porão. No entanto, aquela parte da mansão já havia desmoronado quase que por completo. "Não pode ser!" Kirika então voltou para o hall, buscando uma alternativa.
Não havia uma. Por mais lento que as paredes e teto estivessem caindo, eles carregavam a mesma força que eles teriam se estivessem caindo na velocidade normal.
Yuma viu o semblante desesperado de Kirika, olhando de um lado para o outro. "Papa..."
Amorzão, eu não vou falhar contigo.
Decidida, Kirika pôs Yuma no chão e ficou sobre ela.
"Papa?!"
"Não olhe, amorzinho." Kirika sorriu. "Feche os olhos."
Mas Yuma desobedeceu, vendo que atrás de Kirika o teto estava chegando perto.
Então, escuridão.
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Em uma parada de ônibus, Sasa aguardava o veículo que a levaria para a escola. Vestindo um uniforme clássico, de camisa branca e saia azul, com um laço vermelho, ela estava resmungando, "Ahhh... Eu não acredito. Eu me tornei garota mágica pra deixar essa vida de perdedora e olha onde eu tô agora."
Ela olhou para o seu anel mágico na mão esquerda. "Como essa deusa sabe se eu não tô indo pra escola ou não? Será que ela mandou alguém pra me espionar?" Ela também deu uns tapas no ouvido, pois havia um zumbido incômodo. "Talvez aquela Homura, ela me dá calafrios."
O zumbido diminuiu e ela suspirou, depois continuou a falar consigo mesma, "Mas eu acho que ela não sabe sobre a minha magia. Ela nunca mencionou nada sobre eu ter feito uma lavagem cerebral nos meus pais pra que eles me tratem bem, hmmm..." a ponderação de Sasa ficou mais animada, "eu poderia fazer isso com os professores, pra eles me darem as respostas dos testes, até mesmo uma nota boa sem que eu precise fazer nada!" Ela deu uma espreguiçada. "Aí eu poderia ficar de bobeira na escola, não seria tão ruim... Hã?"
Ela notou os outros estudantes que estavam na parada de ônibus. Eles olhavam assustados para ela.
"O-O quê?" Rangendo os dentes, Sasa estendeu a sua mão esquerda com o anel na direção deles. "Esqueçam tudo o que ouviram de mim!"
Os estudantes ficaram atônitos, sem piscar os olhos.
"E esqueçam tudo o que estudaram pra hoje também!" Sasa se afastou deles, ranzinza. "Bando de enxeridos."
Nesse momento, o céu brilhou como se houvesse um trovão distante, mas céu estava limpo, e o brilho dissipava lentamente.
"O que é isso?" Sasa notou que as outras pessoas na rua pararam para ver aquele estranho fenômeno. Será que é magia? Ela decidiu deixar a parada de ônibus e procurar o topo de um prédio para ver de onde aquilo estava vindo.
Kazamino não tinha muitos prédios altos, não seria difícil ver até o horizonte. Após confirmar que ninguém estava olhando, Sasa pôs magia em suas pernas e deu um grande salto.
Assim que aterrissou no topo do prédio, ela pôde ver a fonte daquele brilho: Uma bola de fogo subindo aos céus, seguido por uma coluna de fumaça, formando um cogumelo de destruição. Sasa arregalou os olhos ao se dar conta. "Peraí, isso não é como... como..." Ela pôde também ouvir a comoção dos que estavam nas janelas dos prédios, testemunhando aquilo.
Ela continuou contemplado aquele cogumelo ficando cada vez mais alto. "Essa direção... Isso é em Mitakihara!" Boquiaberta, Sasa não conseguia acreditar em seus olhos.
Minutos depois, ela viu uma espécie de 'onda de vento', arrebentando as janelas dos prédios no caminho e vindo até ela. "Oh mer-" Ela ouviu o som da explosão quando a onda a atingiu com violência, a derrubando, ela quase caiu do prédio. Enquanto Sasa se levantava, ela ouvia o som de alarmes que dispararam e o grito desesperado das pessoas nas ruas.
"Por quê? Será que aquela deusa sabia que isso iria acontecer?" Sasa pôs ambas as mãos à cabeça. "Nós estávamos comendo bolo juntas dias atrás, com Mami-san." Ela abaixou o olhar, com um semblante de preocupação. "Mami-san..." Mas então balançou a cabeça. "Não! O que estou pensando? É melhor assim. É melhor que a deusa morra, é melhor que todo mundo morra."
A imagem de Mami e Nagisa vieram em sua mente, e seu coração respondeu com um aperto. "Não." Com os olhos lacrimejando, Sasa abraçou o próprio peito para tentar conter aquele sentimento. "Para, Sasa! Não seja trouxa! Elas merecem isso."
Quando ela começou a ouvir sirenes de ambulância e dos bombeiros, outra idéia veio em sua cabeça. "E se a deusa ainda estiver viva?" Ela continuou a conjecturar, "ela pode estar esperando que eu venha pra ajudar. Ela pode até me punir se eu não fizer nada." E chegou em uma possibilidade mais lucrativa. "Ela pode NÃO estar esperando pela minha ajuda, e me dever uma. Eu posso exigir uma RECOMPENSA!"
Sasa se deixou envolver por uma luz, trocando seu uniforme escolar pelo o seu uniforme mágico de cor caramelo, lembrando um bobo da corte. Em suas mãos, ela conjurou a sua fiel vara metálica de ponta curva.
"Isso parece idiota, mas também parece ser uma oportunidade única pra eu brilhar!" Ela esfregou olhos, secando as lágrimas, antes de fazer uma pose espalhafatosa. "Tadah! Mami-san, fique com inveja, pois Sasa-chan tá a caminho pra salvar o dia!"
Então, pulando de um topo de prédio para outro, ela seguiu caminho para Mitakihara.
Próximo capítulo: Um último milagre
