Naruto mal conseguiu dormir depois de tudo que viveu na noite passada. Sua mente estava tão inquieta que o impedia de usufruir de qualquer descanso. Sem mencionar que seus lençóis tinham o cheiro adocicado e inebriante da mulher dos seus sonhos, era difícil aquele aroma invadir seu sistema e seu corpo não queimar de saudades dela imediatamente.

Em sua mente mirabolante, ele tentava calcular algum plano, alguma estratégia, qualquer coisa para poder ficar com Hinata após a partida da cidade de Kiri. Na carta que recebeu, Kakashi lhe disse que não precisava se apressar para retornar, o que o dava uma vantagem. Ele poderia protelar alguns dias em Otahan até Hinata decidir sobre eles, porque, mesmo que ele estivesse disposto a ficar um tempo considerável por lá apenas por ela, agora ele tinha um novo compromisso com a Folha, o de se preparar para ser Hokage. Portanto, mesmo se quisesse, ele não poderia se mudar. Naruto teria que conversar com Hinata sobre uma possível volta dela à Konoha caso ela aceitasse ficar com ele. E sendo honesto, essa parte o assustava. Somente a ideia de conversar com ela sobre o que eles tinham o deixava nervoso. Sinceramente, não sabia nem por onde começar. Sua incapacidade em formular palavras apropriadamente na presença dela o fazia parecer um idiota. Ele não queria se atrapalhar. Sabia exatamente o que estava sentindo e queria transmitir seus sentimentos para ela.

Naruto tentava não pensar muito sobre os reais motivos que fizeram Hinata partir de Konoha, mas ignorar o fato de estarem em vilas separadas não funcionaria mais, agora que ele queria tê-la por mais tempo, agora que ele estava disposto a abrir seu coração para ela. Kiri os uniu, mas não era onde eles permaneceriam.

A ideia de uma recusa o estremece e Naruto decide afastar o pensamento. Ele teria que ser otimista se quisesse ir em frente. Sabia que Hinata e ele tinham uma conexão especial e contava que ela estivesse na mesma sintonia que ele. De qualquer maneira, não adiantava enfiar os pés pelas pernas, não é mesmo? Ele ainda teria que esperar pela resposta dela e torcer ansiosamente para ouvi-la dizer sim.

Naruto nunca esteve nessa situação antes, nunca teve que se declarar para ninguém, ele não sabia como fazer isso apropriadamente. A ideia era apavorante, se deu conta. Tudo que ele tinha como base de sustentação para suas próximas ações era a reciprocidade de Hinata para com seus toques quando estavam juntos, porque, por mais que ele tentasse, ler as expressões dela era mais difícil do que ele pensava. Ela era enigmática à sua maneira e Naruto sempre se encontrava confuso com tudo que a envolvia. Ele gostaria de pensar que tem chances com ela, mas Hinata era mulher demais para ele, admitia para si mesmo. Ele teria que ser um homem melhor todos os dias a partir do seu sim para poder ser digno de estar ao lado dela.

Sim, as palavras que ela lhe lançava quando estavam no ápice do prazer ecoavam em sua mente. Não, ele não tinha as ignorado, mas Hinata sim. Era como se ela quisesse dizer apenas o que ele queria ouvir naqueles momentos. Ela nunca chegou a justificar nada.

O pensamento embrulha o estômago de Naruto. Não, isso seria impossível. Hinata não era assim, ela era honesta consigo mesma e com todo mundo, ela seria honesta com ele. E seguindo essa linha de conhecimento, ele poderia ter esperanças de que ela também o queria.

Se ela quisesse isso tanto quanto ele, eles poderiam fazer dar certo.

. . . . . .

Do outro lado do pátio, se encontrava Hinata, cujo coração estava tão ansioso quanto o de Naruto, mas sem o conhecimento dela. A incrível noite que compartilhou com Naruto quase foi arruinada pela conversa que teve com seu pai, ele a confrontou sobre algo que ela evitou a viagem inteira.

Agora, no entanto, se tratava de algo que ela não poderia ignorar, já que era seu último dia de acerto de contas com Susumu. Dependendo de sua resposta, ela sairia de Kiri para nunca mais retornar. A cidade ficaria marcada em suas memórias apenas pela jornada compartilhada com Naruto, com um gostinho amargo por durar tão pouco tempo.

Mas algo dentro dela estava ganhando voz cada vez mais, a deixando ansiosa com a ideia de tentar prolongar seu envolvimento com Naruto. A última noite que compartilharam estava impregnada em todo o seu ser e Hinata estava tentada a se arriscar para continuar com isso. Mas para isso, ela teria que abrir seu coração para Naruto, confessar o seu amor e torcer para que ele o aceite. Ela conseguiria fazer isso? Naruto aceitaria seus sentimentos?

Ela não poderia negar que o pedido dele para conversar hoje a encheu de expectativas. O que se passava na cabeça dele? Ele iria enfim se despedir dela apropriadamente? Iria pedir para que ela o liberasse de sua missão, já que não corre mais perigo algum, para então poder voltar correndo para Konoha e finalmente iniciar seu treinamento de Hokage?

Ou, na mais fantasiosa hipótese, ele lhe diria que deseja igualmente que o envolvimento deles não se encerre em Kiri e que ele a deseja tanto quanto ela o deseja.

O pensamento inconscientemente a faz exibir um sorriso esperançoso no rosto, da qual ela lutou a manhã inteira para reprimir. Hinata não queria fazer papel de tola, de adolescente apaixonada ou de uma mulher ingênua. Ela queria ter controle das próprias emoções e situações, mesmo que fosse quase impossível ao lado de Naruto. Ela poderia encarar os fatos com razão e clareza, poderia ser madura o suficiente para aceitar o fim caso ele viesse, mas era inegável a sua obtusa esperança de que ele não queira o fim, de que ele queira continuar com ela. Esses dois últimos dias estavam pressionando Hinata para tomar uma atitude, ela sentia que deveria agir e não simplesmente aceitar o fim. Naruto aparentava apreciar a companhia dela, o que só a encorajava. Mas temia estar apenas se iludindo.

Hinata não poderia ser condenada por sonhar, poderia? Seu ingênuo e carente coração não poderia ser julgado por desejar se acalentado pelo amor de Naruto?

Apesar de ter fantasiado uma chance com Naruto a vida inteira, ela nunca esteve tão perto dessa realização antes. Era natural que seus sentimentos a deixassem eufórica e esperançosa, empurrando para o lado todo seu juízo. Ela calculava tanto cada passo que dava perto de Naruto, repreendia tanto a si mesma para não ficar sonhando acordada com ele. Ela poderia relaxar os ombros um pouco, não poderia? Ela poderia cometer essa loucura e finalmente se abrir para ele.

Ela tem o direito de sonhar que seria desejada por ele, não teria?

Era inevitável, de qualquer maneira, pois ela o amava. Ela o amava demais.

Hinata era a líder Hyuga atualmente, o que a dava autonomia para mover o clã para onde quisesse, e é claro, ela retornaria para a Folha no mesmo dia se isso significasse que Naruto e ela enfim ficariam juntos. Ela finalmente teria um bom motivo para retornar ao seu antigo lar.

Suas bochechas coradas falham em esconder dos demais olhares a sua ansiedade pelo encontro deles mais tarde. Mas antes que ela pudesse finalmente relaxar os ombros para se encontrar com ele, teria que resolver seu último dilema. Era a única coisa que a incomodava.

Sua perna direita estava inquieta durante a reunião, que em sua opinião era completamente desnecessária, já que seu pai havia reunido todos os membros Hyuga apenas para parabenizá-los pelos desempenhos na viagem. Ele poderia fazer isso em Otahan, hoje estavam todos querendo aproveitar o último dia na cidade da melhor forma que podiam.

Seus olhos já checaram o relógio incontáveis vezes e seu coração falhou uma batida quando avistou Naruto mais cedo deixando seu alojamento. Eles apenas se cumprimentaram de longe antes de Hinata entrar na sala de reunião. Após o desnecessário monólogo de seu pai, ela teve que ajudar com os preparativos para a viagem de retorno e checar seus homens feridos, verificando se todos estavam prontos para partirem.

Quando o sol da tarde lutava para brilhar em um céu que já era predominado pelo inverno chegando, ela se dirigiu até o local do encontro e a sensação que a dominava era de que seu coração iria rasgar em seu peito ao encontrar Naruto a esperando. Ele estava de costas observando a paisagem à frente, com as mãos no bolso e a máscara em seu rosto.

Os músculos de seu rosto lutam para não formarem um sorriso que entregasse seu real estado.

"Espero que com o tempo livre que teve hoje, você tenha arrumado suas coisas para a viagem, Naruto-kun."

Sua atenção é atraida de imediato para a origem da voz e Naruto caminha até ela. A ansiedade pulsando dentro dele tanto quanto nela e ambos estavam completamente alheios ao fato.

Os dois tinham muita expectativa para esse momento decisivo.

Ele levanta a máscara para sorrir para ela. "Estava pensando em pedir a sua ajuda para isso."

Suas mãos cobertas pelas luvas agarram a cintura esbelta dela na mesma hora após ela se encostar na pequena mesa de refeições atrás dela.

"Precisa da minha ajuda para arrumar suas coisas ou está me pedindo para fazer isso para você?"

"Estou genuinamente pedindo sua ajuda."

Hinata mantém as mãos atrás das costas as apoiando na borda da mesa enquanto ele avança sobre ela, enfiando o rosto na curva de seu pescoço para inalar seu cheiro e beijar sua pele.

O leve roçar de sua barba por fazer faz cócegas em sua pele e ela ri enquanto esconde o pescoço dele. "Posso cuidar disso para você mais tarde, então."

"Hum… como é fácil te convencer das coisas, Hinata." O som de sua voz sai abafado contra o pescoço dela e Hinata sente cócegas novamente, ela se encolhe. Naruto estava praticamente se debruçando sobre ela, quase a deitado sobre a mesa e Hinata tem que levar uma mão até seu peito para impedi-lo do ato.

Em meio às suas risadas e arrepios causados pelas carícias, Hinata tenta se esquivar. "Naruto-kun, pare com isso! Eu tenho cócegas… está pinicando a minha pele!"

Ele ignora o pedido e a aperta mais contra seu corpo, sentindo o mesmo se agitar de vontade dela somente por tê-la em seus braços, por estar inalando seu aroma viciante e ouvindo a sua voz melodiosa.

Ele resmunga contra sua pele sem a soltar, arrancando de seus lábios mais risadas e murmurando coisas desconexas de propósito. A mão pequena dela pressiona seu peito.

"Naruto-kun, não! Você sabe que eu tenho-Naruto-kun, pare com isso! Oh, por favor, pare com isso!"

A bolha em que imergiram se formou tão rápido que eles não notaram uma figura se aproximando da pequena cabana onde estavam, a qual as entradas não continham portas, pois era uma área de descanso.

O mensageiro Hyuga, o mesmo que foi designado de levar a carta de Rokudaime até Naruto em sua localização atual, havia visto Hinata indo naquela direção há alguns instantes e precisava falar com ela. Com o rolo de pergaminho caindo das mãos e uma caneta nos lábios, ele se aproxima distraído enquanto adicionava um pequeno X onde a assinatura da líder Hyuga deveria aparecer. Era coisa rápida, de dez segundos.

"Hinata-sama, tem um minuto? Eu precisava que a senhorita-

O som de uma terceira voz tão clara e próxima do casal quebra o momento compartilhado no mesmo segundo e Naruto solta Hinata no mesmo instante. Seus corpos se separam em alerta.

Os olhos arregalados de Hinata captam a expressão de espanto no rosto do mensageiro do clã Hyuga ao mesmo tempo que ela tenta não hiperventilar. Seu coração deu um salto tão grande no peito que ela sentiu que o mesmo pararia em instantes.

"Sakai-san…" Sua voz sai insegura e sua expressão de espanto não passa despercebido por ele. Não só o rosto como o corpo inteiro de Hinata esquenta e de repente ela se vê em uma situação completamente delicada.

Eles acabaram de ser pegos!

Os olhos do mensageiro rapidamente passam para o homem que parecia estar assediando Hinata e ele nota que o mesmo está de costas para ele, evitando encará-lo.

"Sakai-san…" Sua líder o chama novamente. "O que você… do que precisa?"

Hinata tenta recuperar a postura, mas sabe que está falhando.

Atordoado, o mensageiro se afasta lentamente. "Ah… não, não era nada, uma assinatura… mas Hinata-sama… Hinata-sama pode fazer isso depois… é, com licença."

Hinata observa, completamente pavorosa, o homem praticamente fugir da cena que acabou de presenciar. Seu corpo congela no lugar e ela sente que vai morrer de vergonha a qualquer momento. Sua cabeça começa a girar e ela se vira para Naruto, o encontrando com a mão apoiada na parede e de cabeça baixa. Tão nervoso quanto ela.

"Naru-

"Porra! Ele nos viu." Ele se vira, apreensivo. "Hinata, ele nos viu."

O olhar desesperado que compartilham era um sinal claro que esse era o momento perfeito para entrar em pânico.

Naruto nunca sentiu que seu coração poderia literalmente sair pela sua boca. Ele nunca esteve tão preocupado antes.

As pernas de Hinata estavam perdendo as forças devido ao seu nervosismo. Ela tinha que fazer algo sobre isso e rápido, mas não conseguia pensar com clareza.

"Você acha que…" Naruto começa. "... acha que ele…"

"Otou-san…" Hinata termina sua frase e a expressão de Naruto termina de cair completamente.

"Merda! Como isso foi acontecer…"

"Naruto-kun…" Hinata tentava enxergar a situação com precisão para poder dizer algo ou agir, mas estava tão atônita. Ela dirige o olhar para o local onde o homem presenciou tudo antes de virar para Naruto novamente. "Calma… e-e-eu vou resolver isso…"

Ela tenta parecer calma, mas não parece convincente o suficiente, pois Naruto parecia prestes a vomitar.

"O seu pai…" Ele a lembra. "… se o seu pai descobrir… dessa forma… Hinata, ele nunca vai me perdoar…"

"Não, calma, Naruto-kun!" Ela se aproxima e pega em suas mãos. "N-Não, ele não vai descobrir. Eu vou consertar isso… e-eu vou falar com ele agora mesmo, me espera aqui, está bem?"

"A gente devia ir atrás dele! Ele vai ir direto para o seu pai, isso se não soltar no meio do caminho."

Naruto a encara e tenta passar por ela. "Eu vou falar com seu pai antes dele!" Mas a mão firme de Hinata o segura pelo bíceps.

"Não! Não, deixa que eu cuido disso!" Ela pede desesperada. "É melhor eu falar com ele, fica aqui, está bem?"

"Hinata…"

"Eu cuido disso!" Ela suplica. "Ele é meu pai, ele vai me ouvir. Por favor, não saia daqui!"

"Nós podemos cuidar diss-

"Não! Deixa que eu cuido disso! Fique aqui e me espere, eu já volto!"

E apressada, Hinata sai correndo até o escritório improvisado de seu pai, deixando para trás um Naruto se torturando de mil e uma maneiras pelo grande deslize.

Pedir para que Naruto ficasse apenas esperando no mesmo lugar era demais para sua ansiedade somada a sua inquietude. Sua garganta seca e ele tem que se lembrar de respirar para tentar organizar suas ideias. Em meio ao pânico, uma ideia passou por sua mente. Algo que ele faria sem rodeios.

Ele poderia ter ido resolver isso de uma vez por todas, abrindo o jogo abertamente para Hiashi e lhe dizendo que o que ele tinha com Hinata não era só diversão, não era coisa de momento, ele estava a levando a sério e queria ficar com ela. Ele revelaria sua relação secreta e pediria permissão a Hiashi para cortejar Hinata. A solução veio tão claramente em sua mente, ele não pensou duas vezes antes de se mover até o escritório de Hiashi. Ele faria isso sem o menor receio.

Ele gostava verdadeiramente dela.

Ele poderia fazer isso, esse era o estilo Uzumaki de resolver qualquer coisa. Sendo rude e abertamente honesto. Seria fácil e simples, não é? Claro que não!

Como ele espera que o pai de Hinata seja condescendente com o envolvimento dele com a sua filha sendo que eles nem sequer estão em um relacionamento. Eles nem sequer são casados para… para…

Naruto se sente enjoado e apavorado.

Seus pensamentos o invadem novamente e sendo tardiamente coerente e realista, se um boato como esse não só chegasse até os ouvidos de Hiashi, como também se espalhasse pela boca do povo, a reputação de Hinata estaria arruinada e Naruto seria o responsável por desonrar a líder Hyuga.

Ela era a líder de um prestigiado clã e com costumes antigos, uma mulher solteira. Um rumor de que ela esteve em um relacionamento secreto com o seu agente ANBU assolaria certamente a sua imagem. Os anciãos de seu clã não somente a condenariam por sua atitude descabida e indecente, ela também seria hostilizada por onde passasse. Perdendo o respeito que adquiriu ao longo dos anos e sendo vista como uma mulher promíscua, sem valor, sem postura, desonrada.

Boatos como este se espalhavam feito chamas em folhas secas e poderiam ser cruelmente distorcidos.

Naruto tinha sérias chances de acabar com a vida de Hinata. Nenhum pai iria tolerar uma atitude imprudente como esta. Hiashi provavelmente tentaria o matar.

Como ele pôde baixar sua guarda assim? Por que ele tinha que ser tão idiota e imprudente? Tudo teria sido decidido hoje e agora eles estavam prestes a serem arruinados.

Tudo porque ele não conseguia manter suas malditas mãos longe dela.

A ideia de destruir a vida de Hinata o atinge como uma doença e ele precisa se sentar para não perder a cabeça.

Ele tinha que confiar que ela conseguiria resolver tudo, porque por mais que Naruto quisesse fazer isso ele mesmo, temia terminar de piorar a situação.

. . . . . . .

A passos duros e decididos, Hinata se apressa para encontrar seu pai ainda em seu alojamento, onde ele montou um pequeno escritório para se organizar. Seu coração batia tão rápido em seu peito que Hinata sentia vontade de chorar. Ela entendia perfeitamente os riscos da atual situação, ela entendia que se alguém mais descobrisse sobre o envolvimento dela com Naruto, a reputação dela entraria em jogo e ela seria arruinada. Ela precisava desfazer o mal-entendido com seu pai primeiro e então tudo estaria sob controle.

O alojamento dele parecia tão distante nesse momento. Ela teve que passar por inúmeros chalés até chegar ao dele.

Assim que ela avista a porta, Sakai-san sai por ela no mesmo instante. Seus olhares inevitavelmente se cruzam e Hinata sabe que ele reportou o que viu para seu pai, pois a sua postura envergonhada o entrega e logo ele foge dela, mais uma vez.

A garganta de Hinata doía, mas ela engole em seco e respira fundo para recuperar sua postura antes de entrar no alojamento de seu pai, se preparando mentalmente para convencê-lo de que tudo não passou de um mal-entendido. Ela não queria que a imagem de Naruto ficasse manchada para seu pai.

Ela puxa a porta de correr e sobe as escadas. Ao entrar no escritório do seu pai sem nem mesmo bater, ela o encontra sentado em cima do seu tatame e abandonando o pincel que estava usando para escrever no mesmo instante.

Os olhos que Hinata herdou encaram os dela e ela precisa se lembrar de que não é mais uma garota insegura e que vivia sendo repreendida por ele. Ela era uma mulher, uma mulher amadurecida, crescida e dona da sua própria vida, completamente ciente e responsável de seus atos. Ela era confiável até o último fio de cabelo e seu pai precisava acreditar que ela não se perderia por um mero homem.

"Otou-san, Sakai-san esteve aqui?"

"Ele acabou de se retirar, você provavelmente deve ter esbarrado com ele na saída."

Um pouco tarde demais, Hinata se curva e mantém a cabeça baixa antes de se aproximar.

"Otou-san, se me permite, preciso conversar com o senhor sobre um mal-

"Sobre o que acabei de ouvir do nosso mensageiro?"

A sensação de pavor a invade e ela é forçada a corrigir a postura para poder olhá-lo nos olhos.

"O que… o que exatamente ele te disse?"

"Então estou certo, os dois vieram até mim com o mesmo tópico?"

"Otou-san, por favor, me escute… Sakai-san se precipitou, ele não tinha o direito de vir até aqui e lhe apresentar falsas acusações-

"Falsas acusações baseadas em quê? No que ele diz ter visto acontecendo entre você e seu agente ANBU?"

Os olhos de Hinata se arregalam, mas ela imediatamente retorna à sua postura firme.

"Ele interpretou a situação de maneira completamente errônea! O que ele pensou ter visto não aconteceu-"

"Você quer que eu realmente pergunte a você o que de fato aconteceu, Hinata?"

Ninguém nesse mundo conhecia melhor Hinata do que seu pai, absolutamente ninguém.

Ele a criou sozinho depois que sua mãe faleceu. Ele a treinou antes de mandá-la para a academia e ele a guiou em seus primeiros meses como líder. Ele sabia exatamente a filha que tinha e o que afligia Hinata.

A pose de líder que ela tentava sustentar em sua frente agora mesmo não passava despercebida por ele. A insegurança que ela tinha e que a assombrou por tantos anos estava evidente em seus olhos, em sua postura desconfiável e em seu tom de voz forçado.

Ele nunca precisou de seus olhos especiais para enxergar a filha que tinha. Ele a conhecia muito bem.

As sutis vacilações em sua expressão lhe diziam que ela escondia alguma coisa, mas ele não estava em posição de questionar, ou até estava, mas estava escolhendo não o fazer.

Um dilema crescendo dentro dele, o fazendo escolher entre ser um pai ou apenas um conselheiro para Hinata neste momento.

Ele aprendeu a respeitar Hinata como a nova líder de seu clã e, portanto, não queria desrespeitá-la de alguma maneira, mas ele ainda era pai dela e ela tinha deveres e obrigações que no momento pareceram ter sido completamente ignoradas por ela e por um shinobi loiro de cabelo espetado.

Hiashi realmente não queria estar tendo essa conversa.

Ele ouviu o relato de Sakai-san e imaginava que Hinata invadiria seu escritório no segundo seguinte. Confirmando suas suspeitas.

Hinata era esperta, mas ele sabia qual era seu ponto fraco.

"Eu não tenho nada a esconder se o senhor quiser me pedir uma explicação, otou-san. Eu vim até aqui para desfazer o mal-entendido que Sakai-san pode ter interpretado de uma situação recente. Ele nem sequer me deu uma chance de defesa. Veio correndo até você como se estivesse sedento por uma fofoca!"

"Ele é um de nós, ele foi treinado para reportar qualquer coisa. E o que ele diz ter presenciado foi uma situação em que você, aparentemente, estava sendo coagida."

"O que… não! Naruto-kun jamais me colocaria em tal situação, o senhor o conhece há anos, não pode ter tal pensamento sobre ele."

"E sobre você, o que você quer que eu pense?" O olhar de Hiashi não vacila um segundo sequer. "Se veio até aqui para me convencer de que o que Sakai presenciou foi um mero equívoco, eu estou todo a ouvidos, Hinata."

Ao contrário da pose inabalável de seu pai, Hinata sente seus membros tremerem. Estava tão temerosa de que Naruto fosse punido por isso que sentia vontade de chorar e implorar pelo perdão de seu pai. Parecia tao mais fácil do que enfrentá-lo.

Ela tenta parecer inflexível.

"O senhor me conhece, otou-san. O que esta diante de você é fruto da sua criação, dos seus ensinamentos. O senhor me treinou para ser uma líder e aqui estou, cumprindo todos os requisitos exigidos e sendo exatamente uma. Acha que eu me colocaria em tal situação capaz de manchar minha imagem, meu clã e arruinar minha vida possivelmente para sempre?"

Hinata encara os olhos indecifráveis de seu pai. "Sou uma mulher atuante em um mundo completamente machista. Eu não poderia me dar ao luxo de escorregar, pois não somente eu pagaria por isso para sempre, como também levaria o nome Hyuga para a lama. Eu não desejo isso!"

Hiashi acreditava em cada palavra proferida por Hinata, pois ela sempre foi impecavelmente fiel a tudo que se propôs. O problema era que o denominador comum dessa situação era Naruto Uzumaki, o único homem capaz de abalar todas as estruturas sólidas e consistentes de Hinata.

Inacreditavelmente, a única pessoa que sempre acabava por abalar a família Hyuga, não importava quanto tempo passasse.

"Você parece entender as possíveis consequências irreparáveis de seus atos no caso deles serem descuidados, é bom saber disso." Ele a encara. "Sei que você é responsável."

"Eu sempre fui." Ela o lembra.

"Sim, você sempre foi. E desde que assumiu o clã você tem tomado todas as atitudes em prol dele. Eu vejo isso." Hinata mantém sua postura. "Não pense que eu não valorizo o seu trabalho e a sua dedicação, Hinata. Você é melhor em seu cargo do que imagina." Os olhos de seu pai a encaram com afeição. "E é exatamente por ser tão boa no que faz, que eu desacreditei no relato de Sakai-san."

Um suspiro escapa dos lábios da líder.

"Mas isso ter chegado só até mim é uma coisa. Se o possível mal-entendido foi visto por mais alguém, aí teremos problemas, Hinata."

"Otou-san, eu juro, não tinha nada para ver! Naruto-kun e eu estávamos apenas-"

"Não me importa. Eu só quero que você seja menos desatenta ao que acontece ao seu redor. Para alguém que tem o maior alcance do Byakugan, você foi bem imprudente. Se Sakai-san fosse um inimigo, ele já teria espalhado os rumores pela cidade toda para te arruinar. Já pensou nisso?"

Hinata vacila. "Sim, estou ciente disso… gomenasai, otou-san…"

Hiashi observa a postura arrependida da filha.

"Acho que você tem algo a dizer, Hinata."

Ela sobe os olhos para ele.

"Mais precisamente para Susumu-san." Ele explica e Hinata enrijece. "Como eu disse, se mais alguém interpretou errado o que aconteceu, se isso chegar até Susumu, ele pode querer retirar a proposta de casamento que pretende fazer a você."

Os olhos da líder volta a fitar o chão. "Não tem nada a temer nesse quesito…"

"Por outro lado, contando com a afeição dele por você, esse momento pode ser perfeito para a situação." Hinata encara seu pai. "Ele poderia te salvar de qualquer rumor reafirmando a união de vocês."

"Eu não preciso ser salva, otou-san e eu ainda não me decidi sobre isso."

"Acho que esse impasse seria o momento perfeito para você se decidir." Hiashi a pressiona. "Porque por mais que eu acredite em você, de que nada aconteceu e de que tudo não passou de um mal-entendido, rumores como esse são difíceis de apagar."

"Sakai-san não pode falar o que ele não entende completamente."

"Se ele viu vocês, outras pessoas também podem ter visto e interpretado de maneiras diferentes, seja lá o que tenha de fato acontecido." Ele explica.

"Não tinha nada para ver, otou-san! Absolutamente nada! O senhor conhece Naruto-kun a tanto tempo quanto eu, o senhor sabe do imenso compromisso que ele tem com os seus deveres…"

"Também sei que você são grandes amigos. A relação de vocês nunca foi apenas profissional. Não pense que eu não me atento ao que se passa ao meu redor, Hinata. Não preciso de olhos especiais para enxergar verdadeiramente minha própria filha."

"O que a nossa amizade tem a ver?"

"Se você aceitar o pedido de casamento de Susumu, nunca mais retornará a ver Naruto e perderá qualquer chance de voltar para a Folha um dia. Você postergou essa decisão até aqui, mas Susumu merece uma resposta. Como ele vai se sentir se souber desse rumor? Você com certeza perderá a chance de um casamento bom, de uma boa aliança e de uma união estável. E eu sinceramente, acredito que essa união seria bom para você, assim como acredito que Susumu passaria por cima disso para ter a sua mão."

O corpo inteiro de Hinata fica tenso. "Esta me dizendo para aceitar o pedido dele somente para abafar um possível rumor sem fundamento?"

"Estou te dizendo para tomar uma decisão e ser corajosa o suficiente para sustentá-la. Esta é apenas a minha opinião tanto como pai quanto como conselheiro. E devo admitir que ouvir que minha filha está envolvida de maneira suspeita com o agente ANBU não me agradou, então estou lhe apresentando possíveis soluções."

"Eu não estou! Otou-san, está me pedindo para tomar mais uma decisão não por mim, mas pelo clã. Me casar pelo bem do clã, para evitar futuros constrangimentos pensando no clã!"

Hiashi suspira ao ver os olhos de Hinata marejarem. Não era sua intensão magoá-la sendo direto em sua opinião pessoal. Ele tinha que se justificar.

"Não, Hinata, essa decisão é somente sua e sei que talvez a minha opinião não interfira nas suas escolhas. Não quero me intrometer, mas se você se sujeitar a tais situações como esta, não lhe sobrarão muitos caminhos fáceis."

"O senhor não confia em mim, não acredita em mim…"

"Muito pelo contrário, eu confio em você e estou dizendo justamente que você é livre para fazer as suas escolhas. Eu só espero que não se arrependa delas futuramente."

O que ele estava dizendo, basicamente, era que ela teria que escolher entre um amor indefinido e incerto e um casamento que seria não só benéfico para o clã, como também para ela, pois Susumu realmente a queria. Ele era de tato um homem bom e já deixou claro as suas intenções.

"O senhor quer que eu me case com Susumu?"

Seu pai suspira novamente. "Uma aliança com ele não seria ruim, mas antes de qualquer coisa, é a sua felicidade que está em jogo, Hinata." Ele tenta transparecer de forma verdadeira sua preocupação com sua filha. "Quero que escolha o que você acredita que vai te fazer genuinamente feliz, não apenas satisfeita. Apenas comentei que diante desse inconveniente, Susumu poderia estar ao seu lado. Mas não vou lhe forçar em suas decisões."

Seus olhos confusos encaram seu pai. "E o senhor não me condenaria se minha resposta fosse não?"

"Não. A vida é sua e o futuro do clã dependerá somente de você e não do homem que estiver ao seu lado, apesar do que os anciões dizem. Eu confio em você. Acredito que pelo menos em uma coisa eu acertei em sua criação como pai… a treinei muito bem para ser uma líder."

Hinata tentava procurar alguma coisa no rosto do pai que a ajudasse a entender. A leve compreensão de que ele estava a libertando do fardo de Susumu custava a entrar em sua mente. Por mais que a ideia dela esposar Susumu o deixasse satisfeito, ele não a obrigaria a entrar em um casamento contra sua vontade.

"Você já provou ser uma líder incrivelmente competente e completamente compromissada com seu povo, Hinata. Não estarmos na Folha não nos tira poder algum, ainda somos o que somos e por mais que um casamento com Susumu fosse bom para você… estou inclinado a crer que você tem seus próprios motivos para considerar recusar a proposta."

Um rosto inconveniente surge em seu pensamento.

O olhar de seu pai lhe diz que ele sabe de seu envolvimento com Naruto e Hinata não sabe como prosseguir. Talvez ele a conhecesse melhor do que ela pensa.

"Otou-san… eu…"

"Você está certa de suas escolhas, Hinata? Esta certa do que quer?"

Ela se vê forçada a virar o rosto, pois sente que esta revelando demais.

Ela não estava certa sobre nada e por isso nunca tomou uma atitude direta em relação a Naruto. Hoje, porém, ela gostaria de fazer algo.

A vontade de estar com Naruto queima no íntimo da alma de Hinata e talvez agora, diante de tudo que tem acontecido, ela tenha forças para finalmente enfrentar esse amor. Enfrentar aqueles olhos azuis sempre foi o seu maior desafio, porém no momento ela tinha mais um em seu caminho, um que ela precisava resolver quanto antes.

A cerca de quase dois meses atrás, poucos dias após terem chegado em Kiri, em uma de suas primeiras sessões com o senhor feudal, Hinata foi notificada por seu pai sobre as reais intenções do senhor feudal em relação a ela.

Os dois homens haviam conversado sobre um possível futuro casamento, pois o senhor feudal tinha esperanças que conseguiria recuperar seus bens após a ajuda dos Hyuga e pretendia se casar imediatamente para poder se estabelecer.

Ele se encantou com Hinata no momento em que a viu e se antes a questão era apenas uma ideia, rapidamente se transformou em desejo.

Quanto mais o senhor feudal conhecia Hinata, mais ele a enxergava como uma esposa perfeita.

Ele deixou clara suas intenções primeiramente com o pai dela, para mostrar algum respeito e logo as intenções foram repassadas para ela, de forma indireta.

Hiashi não lhe disse que Susumu estava implicitamente interessado nela, apenas comentou que um acordo matrimonial entre eles poderia ser discutido após todas as principais questões serem resolvidas. Sua opinião como pai era quem um casamento com um senhor feudal seria um bom acordo para o clã e agradaria os anciãos, que estavam no pé de Hinata para arrumar um marido, como se a simples imagem dela acompanhada por um homem reforçasse a sua força como líder. Algo que a irritava profundamente.

Eles te respeitarão mais se souberem que você é casada.

Você precisa de um homem ao seu lado, lhe dará mais credibilidade.

Ela ignorava todas as vozes sempre que podia e como forma de puni-los por suas ideias arcaicas e pré-históricas, costumava dizer a si mesma que nunca se casaria. Optaria por uma vida de celibato, se fosse necessário, reinaria sozinha e continuaria sendo excelente em sua posição. Provaria para eles que ela não precisava de homem nenhum ao seu lado para lhe dar mais conforto ou segurança. Ela mesmo se bastava.

Seria uma jornada solitária? Claro que sim, mas a solidão já fazia parte de cada músculo e osso de Hinata, ocupando espaço em cada átomo de seu corpo. Ela nunca poderia ter o homem que amava, então se contentaria em trilhar sua jornada sozinha, pois acreditava que dificilmente outra pessoa despertaria seu interesse. O que sentia por Naruto era tão avassalador que a aprisionava a ele em um amor platônico e impossível. Ela tentou se livrar dessas amarras quando saiu de Konoha e funcionou por um bom tempo. Se o amor quisesse lhe dar outra chance em outra pessoa, ela abraçaria essa chance, claro que sim. Mas isso nunca aconteceu.

A ideia de se casar com Susumu se encaixava apenas nas questões políticas e Hinata sentia que não precisava ceder a essa pressão. Qualquer um se sentiria beneficiado de ser associado ao clã Hyuga. Susumu sairia mais em vantagem do que ela, seu nome ficaria famoso e ele com certeza seria mais influente.

Mas essa não era suas principais intenções, ele parecia apreciar genuinamente a companhia de Hinata e a respeitava igualmente. Mesmo tendo deixado claro suas intenções, ele nunca a pressionou diretamente sobre isso. Na verdade, o pedido oficial ainda não tinha chegado até ela, mas ela sabia que ele pretendia fazer o pedido antes dela ir embora. Hinata precisava se decidir.

"Não aconteceu nada entre vocês." Seu pai quebra o silêncio da indecisão de Hinata. "Foi o que garanti a Sakai-san. Mas claro, eu não posso desfazer o que os olhos dele acreditam ter visto."

Os olhos da filha caem sobre ele.

"Eu sinto muito… ter causado toda essa confusão, mas eu garanto que não tinha nada para se ver…"

"Não me importa o que tenha acontecido entre vocês dois, Hinata. Eu só quero que você tenha certeza do que quer. Confio em você e a vida é sua, mas também devo lembrá-la de que a sua imagem faz a imagem do nosso clã, o seu comportamento reflete diretamente em nós. Eu não deveria ter que lembrá-la disso e acredite, não estou feliz com isso."

Os ombros dela caem diante da evidente repreensão.

"Mas levando em consideração de forma cega o que você afirma ser a verdade, não voltarei mais no assunto."

A ideia claramente o incomoda, mas ele não se sentia no direito de confrontar Hinata mais diretamente. Hiashi tinha que ter fé em sua filha.

O cenho de Hinata franziu diante da atitude inesperada de seu pai. Não era assim que ele geralmente lidava com aborrecimentos. A expressão confusa em seu rosto requer uma explicação de seu pai.

"Como seu pai, eu jamais permitiria que tais suspeitas sobre a sua honra se sustentasse a ponto de arruiná-la, por isso a minha repreensão por Sakai-san ter se atrevido vir até aqui e insinuar que você estava agindo de forma indecente deve ter o colocado no lugar. Assim como eu, ele nunca mais voltará a falar sobre isso e eu apenas espero que ele tenha sido o único que acha que viu algo."

"Obrigado, otou-san… e mais uma vez, sinto muito por todo o inconveniente."

"E em relação a Susumu…" Seu pai retorna a segurar seu pincel. "… acho bom que saiba que lhe dei a permissão para esposar você." Hiashi a olha de relance. "E acredito que ele pretende noivar com você ainda hoje."

"O-O quê?"

"Eu não vou negar que ele seria um bom companheiro para você, então eu lhe dei permissão para ir adiante."

Hinata enrijeceu no lugar, levemente irritada. "Eu não entendi… primeiro você diz que sou livre para fazer minhas escolhas, mas também encoraja Susumu a seguir adiante para me cortejar…"

"Ter a minha permissão não é o mesmo que ter o seu sim." Ele a lembra. "Como eu disse, eu não iria me opor à sua união com ele, mas também respeitarei se não for isso que você deseja. Só estou te avisando para tomar uma atitude se estiver realmente certa sobre suas escolhas."

Hinata apenas encara seu pai, atordoada.

"V-Você não poderia ter me perguntado antes?"

"Poderia, mas prefiro te prevenir de não ter nenhum arrependimento. O máximo que você tera que fazer é recusar um homem. Ele sobreviverá." Hiashi a olha e suspira diante da expressão de pavor da filha. "Não quero te pressionar ou te manipular, Hinata. Na verdade, desejo que se sinta livre para trilhar o rumo que quiser. Essa decisão é apenas sua, acredite. A minha opinião é só uma opinião."

Hinata acena, num misto de alívio, alegria e apreensão.

"Obrigada pelo seu voto de confiança, otou-san."

Hiashi observa Hinata com olhos afetuosos e sente a necessidade de lhe dirigir seus sentimentos.

"Hinata…" Seu pai a chama e se levanta, contornando a pequena mesa para ficar em pé na frente dela. "Eu sei que às vezes pode não parecer, mas eu ainda desejo o melhor para você, você é a minha filha e o mesmo que desejo a Hanabi, desejo a você. Sei que você tem deveres maiores agora, mas a sua vida ainda é sua. Não pense que perdeu algum controle sobre ela." Pela primeira vez, Hinata consegue ver os inabaláveis olhos de seu pai expressar algum sentimento. Ele suspira fundo antes de continuar.

"O que acontece na sua vida pessoal é problema seu e não deveria ser do meu interesse porque você é uma mulher adulta de quase 24 anos, mas como seu pai, eu ainda me preocupo e isso nunca vai mudar. Posso não ser o pai que você sempre sonhou, mas do meu jeito eu cuido das minhas filhas, e sou imensamente orgulhoso do progresso brilhante de vocês duas."

Sentimentos conflitantes dançam dentro do peito de Hinata ao tentar interpretar as palavras de seu pai.

"Reforçando o que eu disse agora há pouco… você é livre para fazer suas próprias escolhas e eu confio que elas serão benéficas para o clã também. Apenas… tome cuidado, nem sempre vou conseguir te proteger."

A expressão em seu rosto era distorto e sofrida, como se ele fosse incapaz de transparecer seus reais sentimentos. Ele foi treinado por tanto tempo para se parecer com uma rocha indestrutível que seu rosto perdeu a capacidade de esbanjar sorrisos genuínos, mesmo quando seu coração estava sendo verdadeiro.

Hiashi se preocupava com sua filha e claro, com a reputação dela. Ele confiava nas escolhas de Hinata porque ela sempre foi uma pessoa leal aos seus ideais. Ela tinha o direito de escorregar como todo mundo, mas por conta de seu cargo, isso a condenaria em níveis catastróficos e por isso ele rondava da maneira que podia, sem se intrometer na vida dela, para que ela estivesse segura.

Era difícil simplesmente agir como um pai protegendo a sua filha, Hiashi ainda estava aprendendo a amolecer seu coração, mas ele fazia o que podia e a forma que encontrou foi humilhando o pobre mensageiro do clã, Sakai-san, por insinuar por um segundo sequer que sua líder estaria tendo uma má conduta.

Ele levaria muito tempo para se redimir dos anos que não soube ser simplesmente um pai para Hinata, mas ele estava disposto a tentar.

Ele estava ficando velho e cansado e Hinata era a pessoa em quem ele mais confiava. Ela era leal como sua mãe foi até o fim. Hiashi jamais a maltrataria novamente, ela não merecia. Ele sabia o quanto sua filha era solitária e sinceramente, não queria que ela fosse como ele. Hinata tinha um coração gigantesco e nele cabia tanto amor. Ela merecia ser incrivelmente feliz.

Seus olhos idênticos aos do pai ficam marejados com lágrimas salgadas que são despejadas em sua bochecha quando ela pisca. Sem nem mesmo se dar conta de que se movimentou, Hinata se vê abraçando seu pai fortemente contra o peito e afundando a bochecha em seu ombro.

O gesto o pega de surpresa, mas seus braços a envolvem lentamente. Ele se sente satisfeito por fazer a coisa certa. A vida inteira colocou o clã a frente de tudo. Hoje, porém, colocou a sua filha em primeiro lugar.

"Obrigado, otou-san, obrigado por me dar esse voto de confiança. Talvez fosse o que eu precisava para tomar coragem e finalmente correr atrás dos meus sonhos." Ela levanta o rosto para ele. "Obrigado por confiar em mim."

"Não importa onde ou com quem a sua felicidade esteja, eu só quero que saiba que você é livre para ir buscá-la."

O largo sorriso em seu rosto o contamina e Hiashi sorri pela primeira vez em muito tempo. Hinata deixa um beijo caloroso na bochecha de seu pai antes de se virar e sair de seu escritório, sendo invadida por um sentimento que passava longe do que ela estava sentindo quando entrou.

Seu pai a apoiava!

Ela conseguiu não só controlar uma possível reação em cadeia, como também descobriu que seu pai torcia por sua felicidade, mesmo que ela não estivesse em um casamento com Susumu.

Uma onda crescente de euforia e entusiasmo invade o sistema de Hinata e tudo que ela quer é voltar para Naruto. Saber que estava livre dessas amarras que os anciãos de seu clã tentavam a todo custo manter em torno de seus braços a deixou incrivelmente confiante. Ela poderia escolher com quem ficar, ela não seria forçada a se casar por pressão e ter o seu pai ao seu lado significava muita coisa. Ela poderia correr atrás de seus sonhos… poderia finalmente ter uma mínima chance de ser feliz com quem ela queria se ele também a quisesse.

Talvez esse fosse o empurrão que ela precisava para finalmente abrir seu coração. Para finalmente tomar uma atitude ousada e decisiva.

Hoje ela teria que resolver suas questões com duas pessoas e estava mais do que disposta a ir adiante, completamente movida por um ato de coragem.

Hinata finalmente decidiu que hoje ela teria a resposta de Naruto que buscou a vida inteira. Ontem ele disse que a queria, ele disse que ela o fazia feliz e isso a encheu de esperança. Talvez ela tenha alguma chance, talvez eles possam ficar juntos, talvez ele possa a olhar com outros olhos.

Talvez ela possa finamente abrir seu coração para Naruto e dizer o quanto o ama e ela teria que fazer isso hoje, antes de retornarem desta missão.

O palpitar de seu coração preenche seus ouvidos novamente quando ela pensa em Naruto.

Novamente, a passos largos e ansiosos, ela se dirige até onde deixou Naruto, com o coração batendo alto no peito, decidida a se abrir para ele, a lhe entregar o seu amor e torcer desesperadamente para que ele o aceite. Ela tinha que pelo menos tentar.

Seu pai a encorajou a buscar sua felicidade, seu clã não ficaria em seu caminho, então ela tinha que arriscar, pela primeira vez ela sentia que poderia arriscar.

O sol já estava quase se pondo quando ela o encontrou exatamente no mesmo lugar, na mesma postura de mais cedo, de costas e observando o por do sol adiante. Parecia que ele nem havia saído do lugar.

A visão dele a deixa ainda mais ansiosa, mais nervosa. Ela faria isso, sim. Ela estava prestes a fazer o que evitou por puro medo da rejeição. Ela iria enfim se abrir para ele, iria dizer a ele que tinha vontade de continuar com o que tinham, que hoje não precisava ser o fim, na verdade, poderia ser o começo de algo maior do que eles.

"Naruto-kun." Ela o chama e dá um passo adiante.

Naruto a ouve, mas não se mexe. Somente seu pescoço se move lentamente.

"Sim?"

Hinata da mais um passo adiante já torcendo seus dedos, uma mania que fazia quando estava nervosa e que ocasionalmente vinha a tona.

"Naruto-kun, otou-san, ele… está tudo bem, não fomos descobertos… Sakai-san foi imediatamente até ele, mas já foi tudo resolvido." Hinata se atrapalhou um pouco, ela balança a cabeça e tenta novamente. "Uma coisa de cada vez…" Ela murmura baixinho mais para si. "É… Naruto-kun, eu estava pensando… eu queria… eu queria… eu precisava conversar com vo-

"Eu também queria conversar com você." Ele a corta e finalmente se vira para ela, mas não se aproxima. Suas mãos se mantém no bolso e seu rosto está coberto novamente.

Os olhos aflitos de Hinata levantam para ele, em expectativa.

"Você queria…"

Naruto foi direto, sem rodeios.

"Eu acho melhor nós encerrarmos por aqui, Hinata."

Uma pedra parece pesar em seu estômago ao ouvir a sentença disparada sem nenhum aviso. Hinata franziu o cenho em evidente confusão.

"Encerrar…?"

"Estávamos caminhando exatamente para esse rumo de qualquer maneira, não é mesmo?"

Algo parece querer rachar dentro dela enquanto tenta acompanhar o raciocínio de Naruto.

"Naruto-kun… como assim, do que você-

"Esse lance que a gente começou, é melhor terminar por aqui." Ele tenta não a encarar. "Foi divertido enquanto durou, mas já tinha um fim previsto. Nós fomos praticamente pegos. Vamos parar por aqui antes que um de nós acabe saindo prejudicado. Essa… coisa que tivemos, é melhor assim." Ele removeu as mãos do bolso apenas para gesticular entre eles, referindo ao envolvimento deles como… "coisa".

O peito de Hinata parecia querer rasgar ao meio e seu corpo congela no lugar.

A voz de Hinata inevitavelmente falha.

"E-Eu… o que… é por conta de Sakai-san? Otou-san disse que cuidou de tudo-

"Seu pai não tem controle sobre tudo, o clã Hyuga não tem controle sobre tudo. Se Sakai conseguiu nos ver, quem garante que outra pessoa também não tenha visto? É um risco que nem eu e nem você podemos correr no momento."

"Naruto-kun… eu sinceramente não estou entendendo-

"Eu vou ser nomeado como o próximo Hokage, Hinata." Ele a lembra em um tom cortante que atinge seu peito. "Você viu a carta. Kakashi me escolheu. Eu não posso ser atrelado a um boato como esse, isso anularia as minhas chances de me tornar Hokage."

O véu do entendimento finalmente cai sobre Hinata e seu coração despenca do peito para seu estômago.

Mas é claro…

Problema. Era isso que ela havia acabado de se tornar assim que surgiu a menor possibilidade do relacionamento secreto deles vir a tona. Ela era um problema que ele não queria ter, que ele não precisava ter. Ela era um segredo que ele gostaria de ter mantido até o fim da missão.

Naruto tinha suas prioridades e Hinata não estava entre eles. Ela nunca esteve.

Ele a queria, ela o fazia feliz, mas apenas entre quatro paredes, quando o corpo dela satisfazia o dele e em êxtase, ele lhe dizia palavras capazes de ludibriar qualquer coração. Ele gostava dela apenas sob o véu da noite onde eles poderiam se esconder, não serem vistos, apenas com o seu corpo, exatamente como ela previu.

É claro que ele ficaria apavorado com o flagrante que tiveram, isso certamente arruinaria a perfeita imagem que Naruto mantinha. Ele não queria ser associado à desonra da líder do clã Hyuga, à desonra de Hinata.

A ruína dela seria irrevogavelmente mais catastrófica do que a dele, mas isso era problema dela. Ela não tinha culpa de ter nascido mulher em um mundo machista e perto dele, ela não era nada. Ele era uma promessa da Folha para o mundo, o grande herói da guerra, o próximo Hokage, o shinobi mais forte da atualidade, ele era Naruto Uzumaki e ela era o seu maior problema naquele momento, capaz de fazê-lo perder tudo que conquistou e de arruinar suas chances de realizar seu maior sonho.

Um problema que ele não pensou duas vezes antes de descartar, que fez a situação deles mudar da água para o vinho. Um problema que passou por cima de tudo que eles viveram nesses dois meses, tudo que eles sentiram, tudo que eles tiveram. Ele nunca a quis de verdade, era tudo ilusão. Mais uma vez ela se iludiu. É claro que ela se iludiu…

A expressão no rosto de Hinata machuca Naruto, mas ele não poderia retirar as suas palavras. Ele estava magoado demais para ser gentil com ela. A certeza de que eles não dariam certo o atingindo instantes atrás, esvaindo qualquer chance que ele tinha de tentar algo a mais com ela, de evoluir para algo mais concreto essa brincadeira que haviam começado. Ele arrumou uma desculpa para terminar o que começaram, mesmo não dando a mínima para sua reputação. Ele estava mais preocupado com a dela.

Enquanto ele estava se culpando e se martirizando sobre ter deixado que os dois fossem flagrados juntos, tudo que ele conseguia pensar era em uma alternativa para salvar a reputação de Hinata, caso ela fosse questionada.

Ele falaria com o pai dela se fosse necessário. Abriria o jogo e lhe contaria tudo para que pudesse prosseguir com seu envolvimento de forma correta, eliminando qualquer possibilidade dela ser arruinada. Ele assumiria todos os riscos e consequências. Se o clã dela exigisse um casamento, Naruto adornaria o dedo dela com um anel no mesmo momento. Ele nunca a deixaria desamparada, ele nunca a deixaria sozinha. Ele faria qualquer coisa para zelar pela reputação dela, porque ela era tudo que lhe importava. Esse era o tipo de homem que Naruto era, e ele era assim porque a queria.

Mas isso mudou quando ele ouviu a conversa de Susumu há alguns instantes, antes de Hinata retornar.

Incapaz de se manter no lugar como Hinata havia pedido, ele se dirigiu pela imensa pousada até o escritório do pai dela, disposto a resolver isso de uma vez por todas, querendo mostrar seu apoio a Hinata de que estaria o lado dela para amenizar qualquer dano. Eles poderiam fazer isso juntos. Mas a sua determinação foi por água abaixo quando ouviu a voz de Susumu vindo direto de um alojamento próximo ao de Hiashi. Ele parou no lugar quando ouviu o nome de Hinata.

"Oh, é mesmo? Então o senhor está confiante?"

"Sim, depois que Hiashi-san me deu a sua benção para pedir a mão de Hinata em casamento, estou confiante de que tudo dará certo. Noivaremos ainda hoje, antes de sua partida."

Seu tom era inegavelmente animado e confiante e dava para sentir um sorriso acompanhando. O coração de Naruto parou de bater no mesmo instante.

Eles vão noivar?

Hinata e Susumu… vão noivar?

Hiashi-san vai entregar a mão de Hinata para Susumu? Ele aprovou a união entre eles?

"Isso é incrível, Susumu-sama! Hinata-sama vai ficar radiante quando você fizer o pedido a ela. Vocês formam um casal tão lindo! Todos estávamos especulando uma possível união."

"Sim! Vocês são perfeitos um para o outro. Hinata-sama ficará muito lisonjeada."

"Meus parabéns, Susumu-sama!"

Naruto teve que se afastar para processar a informação, tomando o cuidado para não ser visto.

Se o pai de Hinata entregou a mão dela para Susumu, isso só poderia significar que uma união entre eles fazia parte de um acordo desde o início. Hinata estava prometida a Susumu desde sempre. Esse tempo todo…

Algo dentro de Naruto se quebra e ele tem a sensação de que irá vomitar a qualquer momento. Ele retorna para a pequena cabana onde deveria ter ficado e volta a ser atormentado pelos seus pensamentos. Estes sendo mais esmagadores do que os anteriores.

Hinata estava prometida a outro homem e com esse pequeno incidente em que acabaram de se envolver, Naruto só conseguia pensar em uma coisa. Ela precisava desfazer o mal-entendido para seu pai ou então perderia a oferta do senhor feudal.

Ela omitiu isso dele. Em nenhum momento disse que iria assumir compromisso com Susumu no final da viagem ou que isso fazia parte do acordo deles. Talvez eles fossem revelar isso mais tarde, afinal, segundo o que Susumu compartilhou com seus empregados, ele faria a proposta hoje a noite.

Tudo fazia parte dos planos, já estava tudo de acordo entre eles.

Naruto se sentia um completo idiota por acreditar na mínima possibilidade de estender o que Hinata e ele estavam tendo. Não havia a menor chance, ela já estava prometida a outro homem, com a benção de seu pai e tudo mais. Um homem que era irritantemente compatível com ela, um homem que poderia lhe oferecer muito mais que Naruto.

A sensação é de estar sendo rasgado por cacos de vidro quando ele engole em seco, engolindo uma enorme bola de decepção.

Tentando ser razoável e otimista, não por ele, mas por ela, se mais alguém tivesse ouvido algo sobre o caso deles, um compromisso com Susumu colocaria um fim em qualquer rumor que surgisse a partir do que Sakai-san viu. O senhor feudal poderia proteger Hinata de qualquer dano à sua imagem. Ninguém ousaria questionar o casamento deles. Qualquer calúnia sobre a reputação de Hinata cairia por terra e ela teria a chance de ser feliz novamente, sem que Naruto estragasse tudo.

O caminho de Hinata já estava entrelaçado e decidido e ele estava completamente fora dos planos dela.

Ele pretendia fazer uma proposta a ela hoje também. Ele pensou muito sobre isso de ontem para hoje. Gostaria de sugerir que eles não colocassem um fim no que começaram, que, na verdade, ele queria estender esse envolvimento, talvez encaminhando para algo mais sério. Ele estava a considerando fazia tempo, ele a queria mais do que tudo. Ele queria levá-la ao encontro que prometeu, sair na rua de mãos dadas e lhe dar um beijo de boa noite ao deixá-la em casa. Ele queria se sentir como um adolescente a levando para os lugares e tentando fazê-la rir só para ouvir a risada gostosa dela. Fazer papel de bobo a persuadindo a querer mais da companhia dele, porque ele queria mais da dela. Não importava se eles já tivessem ultrapassado algumas regras de relacionamento, ele faria tudo do zero porque ela era importante e ele queria lhe proporcionar uma experiência completa, com jantares, encontros no parque, beijos roubados, amassos e tudo mais. Ele até já havia se imaginado pedindo ela em namoro em um futuro próximo…

Como ele foi ingênuo.

Hinata não poderia ser dele assim como nunca foi em momento algum. Ele se iludiu sozinho. Ela nunca lhe prometeu nada. Ele foi um tolo!

A ideia dela ser feliz ao lado de Susumu o incomoda, mas ele sabe que ele provavelmente vai fazê-la feliz. Ele era um bom partido e gostava dela. Ele era um homem de sorte, pois foi escolhido por ela.

Talvez se Naruto tivesse enxergado melhor a incrível mulher que Hinata sempre foi há alguns anos em Konoha, ele teria alguma chance agora. Mas já era tarde demais.

Ele levanta os olhos desiludidos para ela sob a máscara e agradece por estar a usando. Não conseguiria esconder sua decepção de Hinata. Estava difícil até de completar qualquer sentença sem sua voz falhar porque, sinceramente, ele queria desabar. Não era esse desfecho que ele havia imaginado para hoje quando combinaram de se encontrar.

Se Hinata o usou ou não já não importava mais. Ele amou cada segundo que teve com ela e agradece por ter essa chance. Ele a deixaria em paz voltando para Konoha e não arruinaria a sua chance de ser feliz ao lado de quem talvez a mereça mais do que ele.

A expressão dela parecia dura, incerta e confusa. Era de se esperar, Naruto não conseguiu protelar por mais tempo. Ele colocaria um fim nisso o mais rápido possível antes que ele se machucasse ainda mais. Nesse momento, só de olhar para ela, machucava.

"Foi bom enquanto durou, foi divertido, a gente… se divertiu, mas tinha um prazo de validade, não é? Íamos ter essa conversa mais cedo ou mais tarde mesmo, então é melhor que a gente resolva isso antes de partirmos. Sem pontas soltas." Ele finalmente a encara.

"Era isso que você tinha para me falar antes de Sakai-san aparecer?" A voz dela sai incrivelmente fraca, sem força alguma, Naruto mal conseguiu distingui-la de um sussurro. Os olhos dela nunca deixam os seus, mesmo que escondidos.

Naruto solta um suspiro. "Isso ia acontecer aqui ou em Otahan, Hinata. Melhor que seja aqui."

Ela apenas o encara e seus lábios fazem menção de abrir, mas Naruto é mais rápido.

"Acho que passamos do ponto e confundimos as coisas…" Ele confundiu as coisas. "... não queremos que ninguém saia ferido… não é? Somos amigos. Não queremos estragar isso."

A punhalada no coração de Hinata foi tão perfurante que ela sentiu todo o seu corpo estremecer. Ela conseguia sentir seu rosto queimar e sua garganta doer, porque naquele momento, ela usava todas as suas forças restantes para não chorar diante de Naruto.

"É melhor assim, sem riscos para nenhum dos lados. A última coisa que eu quero é atrapalhar a sua vida, Hinata. Você também não precisa de um escândalo."

Os lábios tremem querendo transparecer a dor que a invadia, se tornando a cada segundo maior do que ela. O seu corpo inteiro está paralisado no lugar, incapaz de mover qualquer músculo do pescoço para baixo. Enquanto ela apenas observa Naruto com as mãos nos bolsos, ele continua falando, como se ela não tivesse entendido direito.

Ele estava terminando com ela, seja lá o que eles tinham, ele estava colocando um fim. Era bom que ela entendesse.

Ele estava desistindo dela.

"Talvez isso tenha ido longe demais… é melhor colocarmos um fim nisso, antes que alguém se machuque."

É a sua última sentença antes de parar finalmente de encarar os próprios pés e levantar a cabeça para ela.

Não tinha como alguém se machucar mais, Naruto pensou, era impossível ele se machucar mais do que já estava machucado.

Seus olhos escondidos a encaram da porta e tentam inutilmente decifrar seus pensamentos. Seu coração está pesado e doendo, mas gritando desesperadamente para que ela rejeite tudo que ele acabou de dizer. Mesmo desesperançoso, em seu íntimo, Naruto torce para que ela não aceite o fim, que ela lhe diga o que ele deseja ouvir como ela fez durante todo esse tempo.

Mas a expressão dela o entrega outra coisa e ele se conforma com a resposta que sai de seus lábios, terminando de massacrar o que restou de seu coração.

Lutando contra seus sentimentos destroçados e rejeitados, a recente ideia de entregar seu coração para Naruto evapora de seu interior. Ele não o quis antes, não o quer agora, não vai o querer nunca.

Hinata endurece seu olhar para Naruto em uma mudança de postura quase imperceptível. Com um esforço além de sua compreensão, nenhuma gota de lágrima caiu de seus olhos e, portanto, ela endireita a coluna.

"Como quiser, Naruto-kun."

Naruto a encara e o tom cortante dela o atinge. Ela se dirige a ele como um subordinado sendo dispensado de seus serviços, levantando o queixo para finalizar.

"Em menos de 24 horas o liberarei de suas atividades e obrigações desta missão e assim estará dispensado para retornar à Konoha imediatamente. Lembrarei a otou-san de escrever sua carta de menções honrosas para Kakashi-sensei, o parabenizando pela indiscutível eficiência nos serviços prestados." Hinata faz uma reverência a ele. "Obrigado pelo seu trabalho duro."

Sentindo que estava falando com a líder Hyuga pela primeira vez, Naruto observa o mínimo sorriso no rosto de Hinata sumir com ela assim que ela se vira para se retirar do mesmo ambiente que ele, deixando para trás um Naruto de coração quebrado e pela primeira vez na vida, derrotado.

A primeira lágrima cai de seus olhos assim que ela lhe dá as costas e sua mão a limpa imediatamente. Sentindo seus lábios tremerem e sua garganta arranhar a cada choro engolido, Hinata adianta os passos a medida que se afasta da pousada, atravessando seus muros e adentrando a floresta escura.

Ela decide caminhar a passos duros e largos, sua cabeça estava doendo e seu peito estava ardendo. Ela não sabe por quanto tempo apenas seguiu em frente. O vento gelado ia de encontro às suas bochechas quentes e seu cabelo era varrido pelos ares. Sem saber direito para onde seguir, ela apenas anda por entre as árvores, sendo guiada pela brisa ou pela lua. Uma lufada de ar escapa de sua garganta e ao piscar, seus olhos se derramam de novo. Ela não limpa suas bochechas novamente. Sua expressão dura se esvai, dando lugar a olhos lacrimejados, lábios trêmulos e sobrancelhas caídas. Sua visão fica embaçada e ela pisca novamente para limpá-la, a lágrima morna pinga de seu queixo e agora ela esta debruçada no chão, havia tropeçado em um galho. As costas de sua mão é aquecida pelo líquido novamente e desta vez ela não consegue segurar, ela nem sequer levanta. Ela desaba, suas forças sendo derrubadas assim como seu corpo. A queimação crescente em seu tórax escapa por sua garganta e ela ouve o som do próprio choro ecoando mais alto do que ela gostaria. Seus ombros tremem compulsivamente enquanto ela deixa enfim toda a dor a dominar, a engolir, a consumir. A floresta densa e fria ao seu redor testemunhando a sua pobre alma quebrada, tentando colocar para fora através de seus olhos toda dor que a invadia, toda tristeza que a consumia.

Pela primeira vez em muito tempo ela chora feito uma criança, completamente desamparada e desolada. Sozinha no meio da floresta, o soluço de sua tristeza incomparável ecoa entre os troncos sem fim, não sendo ouvidos por ninguém, não sendo acolhidos por ninguém, não alcançando ninguém. Seu peito dói tanto que ela precisa levar a mão cheia de terra até o mesmo, sentindo que seu coração iria parar de bater a qualquer momento, ele não aguentaria mais tanta dor. Seus pulmões não sugam ar o suficiente, porque ela não conseguia parar de chorar. Ela se rendeu completamente ao seu sofrimento, que copiosamente retornou para consumi-la, da mesma forma que antes, através da mesma pessoa. Mais uma vez ela se iludiu e mesmo tentando se preparar para esse momento de forma ingenua, ela estava desolada e tudo que lhe restava fazer era chorar. Chorar porque a dor precisava ir embora de alguma maneira, chorar porque ela estava triste, inconsolável, chorar porque ela estava cansada de ser forte o tempo todo, esbanjando sorrisos que escondiam a gritante solidão que habitava dentro dela. Hinata precisava chorar porque ela se esforçava tanto, mas nunca alcançava suas próprias metas, nunca se sentia boa o suficiente. Hinata precisava chorar porque sua alma precisava ser lavada. Precisava chorar porque naquele momento ela não passava de uma ordinária mulher com um coração irremediavelmente partido. Se lamentando até os ossos por amar um homem que nunca iria amá-la de volta. Retornando ao seu principal tormento da qual nunca se livrou completamente. Ela estava condenada a um amor impossível.

Quando ela seria livre desse tormento? Por que ela tinha que carregar o fardo de amar alguém que não a queria? Por que apesar de todos os seus esforços, suas lutas e batalhas, ela estava aqui, sozinha, na floresta, debruçada contra a terra, chorando feito um bebê? Deixando seus soluços miseráveis de dor e angústia ecoarem pela noite fria transparecendo pateticamente toda a sua dor? Ela merecia isso? Talvez merecesse, porque ela não era boa o suficiente, nunca seria. Sempre falhou em tudo que se propôs, em tudo que se dedicava, falhava até mesmo em ser amada. Mesmo quando entregava tudo que tinha, isso nunca seria o suficiente, porque o seu tudo era o mesmo que nada. Sempre iludida.

Seus feitos e suas conquistas nunca seriam maiores do que a solidão que consumia Hinata, dia após dia, em uma jornada regada de lutas diárias para ser uma pessoa melhor para os outros, sempre se dedicando aos outros, sempre se deixando para depois, sempre desejando o melhor, entregando o melhor e sempre recebendo o pior.

Nenhum homem valia tanto sofrimento, não de uma mulher como Hinata, não de um ser humano como ela, com uma alma como a dela. Mas que culpa ela tinha por ser portadora de um dos amores mais puros e genuínos que existe? Que culpa Hinata tinha de carregar no peito a vastidão de um amor capaz de transcender gerações? Um amor imutável, incomparável e imensurável.

Um amor que mais a fazia mal do que bem. Um amor que tinha acabado de ser rejeitado antes mesmo de ser entregue. Um amor que Hinata levaria com ela até o tumulo, intocado e não compartilhado.

Um amor que a derruba nesse chão cheio de terra nesse exato momento, beijando suas bochechas molhadas e geladas, sujando suas roupas e se misturando com seu cabelo. Um amor que a fez chorar por horas a fio até que ela se sentisse seca e incapaz de produzir mais lágrimas tão pesadas e sufocantes, o que a fez se encolher contra o frio que a cercava, abraçando o próprio corpo e enfim se rendendo mais uma vez aos braços da sua infinita e fiel solidão, podendo ser comparada a vasta escuridão que, a cada piscar de olhos marejados e tristes, a embalava ainda mais em um sono sem sonhos, sem esperanças e sem conforto algum.


"Eu te amei tanto,

que até quando você me destruiu,

eu tentei te entender."