Isabella

A casa estava em silêncio. Um silêncio que eu precisava, mas que, ao mesmo tempo, parecia alto demais dentro da minha cabeça. Chloe dormia em seu quarto, seu corpinho pequeno afundado entre os travesseiros macios no espaço que Esme havia montado ali para ela. Eu tinha ido até lá pouco depois da conversa com Edward e fiquei alguns minutos apenas observando-a respirar.

Tão tranquila. Tão alheia à confusão do mundo dos adultos.

Agora, de volta à sala, eu me peguei olhando para as almofadas do sofá, tentando absorver tudo que havia acontecido nas últimas horas. Edward estava conversando baixinho com Esme na cozinha. Carlisle tinha ido atender um chamado no hospital. Os outros, estavam por aí em algum lugar da casa.

Mas mesmo que ele não estivesse mais na minha frente, sua presença ainda pairava sobre mim. Eu não sabia o que esperar desse reencontro. Por tanto tempo, eu imaginei como seria esse dia. A verdade? Eu achei que ele iria surtar.

Edward me surpreendeu. Eu vi o medo nos olhos dele. Vi a forma como ele se encolheu diante da palavra papai, como se fosse algo grande demais para carregar. Mas também vi o jeito como ele olhou para Chloe.

Vi como seu corpo relaxou quando ela riu. Como ele se deixou envolver pelo momento, como se estivesse descobrindo algo novo e assustador… mas que, no fundo, queria desesperadamente entender. E foi ali que percebi. Ele queria estar ali.

Suspirei - já estava ficando cansada de fazer isso - e passei as mãos pelo rosto. Eu ainda me lembrava de como foi difícil no começo. O medo de criar uma filha sozinha. O pavor das incertezas, das noites sem dormir, dos dias intermináveis tentando equilibrar trabalho e maternidade, mas eu fiz o que precisava ser feito.

E agora, pela primeira vez, parecia que não precisava mais fazer tudo sozinha. A porta da cozinha rangeu e eu levantei o olhar a tempo de ver Edward entrando na sala. Ele hesitou por um segundo, como se me analisasse, tentando medir meu humor antes de falar.

— Você volta amanhã?

Piscando algumas vezes, levei um momento para processar aquelas palavras.

— Amanhã?

Eu o observei por um instante. A expressão de Edward não era de alguém que queria impor sua presença. Era de alguém que estava pedindo. Por um segundo, pensei em todas as formas como poderia responder.

Poderia estabelecer regras. Poderia me proteger mais, erguer barreiras. Mas então lembrei do sorriso de Chloe quando ele segurou o pônei. Lembrei dela puxando minha mão, me levando até ele, sem medo. Então, ao invés de complicar, respirei fundo e simplesmente disse:

— Tudo bem.

Edward piscou. Como se não tivesse certeza se tinha ouvido certo. Eu soltei um pequeno sorriso.

— Nós voltaremos amanhã.

Ele pareceu perder um pouco do ar, como se estivesse prendendo a respiração desde que fizera a pergunta.

— Certo — ele assentiu — Obrigado.

Eu dei de ombros.

— Ela vai perguntar de você, de qualquer jeito.

Edward sorriu de lado, e algo quente se espalhou pelo meu peito. Um sorriso pequeno. Inseguro. Mas era real, estava ali. Talvez pudéssemos encontrar um jeito de fazer funcionar.

Pelo bem de Chloe. E, quem sabe… pelo nosso também.

No dia seguinte, a estrada até a casa dos Cullen parecia mais longa do que o normal. Eu sabia que não era. Eu já tinha feito aquele caminho centenas de vezes, levando Chloe para ver Esme e Carlisle, deixando-a brincar nos jardins e correr pela casa espaçosa. Mas hoje, era diferente. Hoje, eu estava sozinha, sem Alice para me amparar. Hoje, Edward estaria lá.

Olhei pelo retrovisor e vi Chloe balançando as perninhas no banco da cadeirinha, distraída com o pônei de pelúcia em suas mãos. Desde ontem, ela havia perguntado pelo pai duas vezes e não tinha largado do pônei. Foi simples, do jeito que crianças pequenas fazem perguntas:

"Papai vem?"

"Cadê o papai?"

Cada vez que ouvi isso, senti um nó diferente no peito. Ela não perguntou com tristeza, nem com impaciência. Apenas como quem estava adicionando uma nova peça ao quebra-cabeça de sua pequena vida. E agora, ali estávamos nós.

Quando estacionei na entrada da casa dos Cullen, respirei fundo antes de soltar o cinto de segurança.

— Vamos ver os titios? — perguntei, tentando tornar aquilo algo casual.

Chloe sorriu, empolgada.

Desci do carro e fui até a porta de trás, soltando os cintos da cadeirinha e ajudando-a a descer. Chloe agarrou meu pescoço e assim que subi os degraus da varanda e toquei a campainha, não demorou para a porta ser aberta.

Edward estava lá. Ele parecia um pouco diferente de ontem. Ainda tenso, ainda carregando aquela hesitação nos ombros, mas… havia algo novo. Algo determinado em sua postura.

— Oi — ele disse, num tom cuidadoso.

Antes que eu pudesse responder, Chloe se lançou para frente, segurando meu pescoço com uma mão e estendendo o pônei para Edward com a outra.

— Papai!

Meu coração apertou. Edward piscou, parecendo completamente paralisado por um instante. Mas então, algo nele mudou. Dessa vez, ele não hesitou tanto antes de pegar o pônei.

— Oi, Chloe — respondeu, sua voz levemente carregada de algo genuíno.

Era amor.

Chloe balançou a cabeça, satisfeita, e pediu para ir para o chão, entrando na casa sem cerimônia e indo na direção da sala, algo normal para sua rotina. Não parecia que seu pai era uma novidade.

Eu segui atrás dela, sentindo Edward se mover ao meu lado. Carlisle e Esme apareceram logo depois, ambos sorrindo.

— Bom dia, querida — Esme disse, se abaixando para cumprimentar Chloe, que correu até ela sem hesitação.

Carlisle se aproximou e bagunçou os cabelos dela com carinho.

— O que vão fazer hoje? — ele perguntou, olhando para mim.

Antes que eu pudesse responder, Edward limpou a garganta.

— Eu… queria passar um tempo com ela.

Meu olhar encontrou o dele. Ele estava sério, mas não rígido. Apenas… atento. Ele estava tentando. Chloe se virou, olhando para ele com curiosidade.

— Quer brincar? — Edward perguntou, sem saber exatamente como agir.

Chloe franziu o nariz e olhou para mim, como se esperasse minha aprovação. Eu sorri, me agachando ao lado dela.

— Que tal mostrar seus brinquedos pro papai?

Chloe ponderou por um instante, segurando o pônei com força. Então, sem dizer nada, estendeu a mão livre para Edward. Ele congelou por um segundo. Então, devagar, fechou os dedos ao redor da pequena mão de Chloe. E eu soube. Aos poucos, ele estava encontrando seu espaço na vida dela.

A cena à minha frente era algo que eu sonhei muitas vezes em presenciar. Edward, sentado no tapete da sala dos Cullen, com Chloe em sua frente, rodeado por um pequeno caos de brinquedos espalhados.

No começo, ele parecia perdido. Chloe, por outro lado, não estava preocupada com sua hesitação. Ela apenas pegou alguns dos blocos de montar e começou a empilhar, como se não houvesse nada de estranho em seu pai estar ali, ao seu lado.

Edward observava cada movimento dela com um cuidado intenso. Foi quando Chloe pegou um dos blocos e estendeu para ele.

— Papai faz — ela ordenou, do jeito simples e direto característico dela.

Edward olhou para o bloco como se fosse um objeto alienígena. Quase soltei uma risada.

Ele respirou fundo e pegou o bloco com a mesma seriedade com que seguraria um documento importante no tribunal.

— Ok — murmurou — Eu faço.

E então, cuidadosamente, ele o encaixou em cima da pequena torre que Chloe estava construindo. Ela bateu palminhas.

— Mais, papai.

Vi algo mudar em Edward. Foi ali que ele percebeu que era só isso. Não precisava de grandes discursos, nem de estratégias complicadas. Chloe não estava esperando nada além de um bloco no topo da torre.

Então, pela primeira vez, ele relaxou um pouco. E pegou outro bloco. Eu observava da poltrona, sem interferir. Esme e Carlisle estavam na cozinha, dando espaço. Emmett e Rosalie já tinham saído. Era só nós três.

E, de repente, não parecia tão estranho.

Chloe ria cada vez que Edward errava o encaixe de um bloco e derrubava tudo, e ele não ficava tenso com isso. Apenas soltava um suspiro exagerado e recomeçava. Até que, depois da terceira torre desmoronar, Chloe se jogou contra ele, rindo e agarrando seu braço.

— Papai bobo!

Edward arregalou os olhos. Mas então, lentamente, um sorriso apareceu em seu rosto.

— Ah, é?

— Uhum.

Chloe soltou um bocejo e esfregou os olhinhos, ainda rindo.

— Ela deve estar ficando com sono — eu disse, levantando-me da poltrona.

Edward olhou para mim, e pela primeira vez, havia um brilho diferente em seus olhos.

— Eu posso colocá-la para dormir?

Eu hesitei. Não por medo de que ele errasse, mas porque essa era uma parte íntima da rotina dela. Mas então olhei para Chloe, ainda agarrada ao braço dele, e percebi que ela parecia confortável. Respirei fundo e assenti.

Ele pareceu aliviado e aterrorizado ao mesmo tempo. Eu estava curiosa, seria uma cena interessante.

Eu o acompanhei até o quarto de Chloe e observei quando ele a colocou no colchão com um cuidado quase devocional, como se ela fosse feita de vidro. Ela se aconchegou imediatamente, abraçando o pônei de pelúcia. E então, com a voz ainda carregada de sono, murmurou:

— Papai, canta?

Meu coração perdeu uma batida. Eu nunca tinha dito nada a ela sobre Edward cantar.

— Cantar? — ele repetiu, como se as palavras não fizessem sentido.

Chloe apenas virou o rostinho sonolento para ele e esperou. Edward engoliu em seco e me olhou, desesperado. Eu sorri de leve.

— Ela gosta de música. Você pode tentar qualquer coisa.

Ele hesitou por mais um segundo e, então, tomou fôlego e começou a cantar baixinho. Uma melodia baixa, rouca, mas que aos poucos foi tomando forma. Uma canção que eu conhecia. Minha garganta apertou e eu queria chorar.

Ele estava cantando a nossa música. Aquela que um dia ele tocou para mim, quando ainda éramos apenas dois jovens apaixonados, sem ideia do que o futuro reservava. A música que inspirou o nome de nossa filha. Minha visão ficou turva pelas lágrimas quando olhei para Chloe e vi seu pequeno rosto relaxar completamente.

Em poucos minutos, ela dormiu e Edward ficou ali, parado, olhando para ela como se nunca tivesse visto nada tão precioso. Ele não se virou para mim, mas falou muito baixo, quase um sussurro.

— Eu estou apavorado, Bella.

Fechei os olhos antes de responder, tentando evitar que as lágrimas caíssem.

— Eu sei — subi a mão até seu ombro — Mas você está se saindo bem.

Edward soltou um longo suspiro, parecendo finalmente acreditar nas minhas palavras. Quando voltamos para a sala, ele parecia diferente. Mais leve, talvez. Ele não disse nada enquanto se sentava no sofá, esfregando as mãos no rosto como se estivesse processando tudo que aconteceu.

Eu também fiquei em silêncio, me acomodando na poltrona, não queria quebrar aquele momento. Foi Esme quem apareceu primeiro, trazendo uma xícara de chá e colocando-a na mesinha de centro.

— Foi uma grande conquista, meu bem — disse suavemente, olhando para Edward.

Ele riu baixinho, ainda parecendo atordoado.

— Eu coloquei minha filha para dormir — ele balançou a cabeça, como se não acreditasse — Isso parece… surreal.

Carlisle sentou-se ao lado da esposa, cruzando as mãos no colo.

— É assim que começa.

Edward ergueu os olhos para ele e Carlisle continuou, sua voz calma e carregada de significado.

— Cada pequeno momento. Cada noite em que você a coloca para dormir. Cada vez que ela te chama. Quando você menos perceber, não conseguirá mais imaginar sua vida sem isso.

Eu tentei imaginar um pouco de como tinha sido aquela dinâmica para ele. Edward soltou um longo suspiro, apoiando os cotovelos nos joelhos.

— Eu não sei como agradecer vocês — ele murmurou — Por estarem aqui para ela, quando eu não estive. Eu queria culpar vocês por não terem me contado, mas agora…

Esme balançou a cabeça.

— Nós a amamos, Edward — disse simplesmente — Mas ela precisa de você.

Ele fechou os olhos por um momento. Então, olhou para mim. Não havia mais desespero no olhar dele, nem insegurança esmagadora, só um reconhecimento silencioso. Um pedido silencioso para que eu acreditasse nele, mal sabendo que eu já acreditava.

Eu sustentei seu olhar por um momento antes de falar.

— Ela já gosta de você, Edward. Agora só precisa aprender a confiar.

Ele assentiu devagar. E naquele instante, eu soube que talvez, só talvez, isso fosse o suficiente para começar.